Teses Jurídicas

Modelo de tese jurídica – Nos casos de acidente em rodovia federal, impõe-se ao Estado o dever de indenizar, quando demonstrada a ação ou a omissão do ente público na conservação ou sinalização da pista

Tema: Direito Administrativo

Subtema: Responsabilidade Civil do Estado

Tese: Nos casos de acidente em rodovia federal, impõe-se ao Estado o dever de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa, quando demonstrada a ação ou a omissão do ente público na conservação ou sinalização da pista.

Aplicação: Situações em que se discute a responsabilidade do Estado nas hipóteses de acidente ocorrido em rodovia federal. A tese jurídica é de que, nos casos de acidente em rodovia federal, impõe-se ao Estado o dever de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa, quando demonstrada a ação ou a omissão do ente público na conservação ou sinalização da pista.

Conteúdo da tese jurídica:

I. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO EM RODOVIA FEDERAL. DANOS ESTÉTICOS E MORAIS. DEVER DE INDENIZAR. JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA.

Conforme é cediço, a Constituição Federal atribui, no § 6º do seu artigo 37, a responsabilidade civil de natureza objetiva ao Estado brasileiro. Nos termos do dispositivo, o Estado brasileiro é responsável por restituir os danos que seus agentes, no exercício de suas funções, causarem a terceiros, independentemente da comprovação de culpa ou dolo:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […]

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. [Grifou-se]

Em relação a este dispositivo, Maria Sylvia Zanella Di Pietro ensina que, em se tratando de dano causado a terceiros, “aplica-se a norma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, em decorrência da qual o Estado responde objetivamente, ou seja, independentemente de culpa ou dolo”.[1]

Tal análise decorre de uma simples interpretação do dispositivo constitucional, haja vista que a Constituição Federal, no § 6º de seu artigo 37, não faz referências ao aspecto subjetivo do agente público em se tratando de atos que resultaram em dano a terceiro. Desse modo, embora no presente caso seja evidente a negligência dos agentes responsáveis pelo serviço público, não haveria sequer a necessidade de comprovação de dolo e culpa para se fazer valer o direito à indenização. Basta que se comprove a existência do dano e o nexo de causalidade com o serviço público ou o bem de utilidade pública que foi utilizado pela vítima.

A teoria do risco, que é amplamente aceita pelo ordenamento jurídico brasileiro, corrobora a responsabilidade civil objetiva do Estado, pelo fato de haver uma relação consequencial entre ambos. Nesse sentido, com o alicerce da lição de Maria Sylvia Zanella, evidencia-se que “a atuação estatal envolve um risco de dano, que lhe é inerente”, de forma que, diante da existência de dano causado a terceiros por agente que representa o Estado, este “responde como se fosse uma empresa de seguro em que os segurados seriam os contribuintes que, pagando os tributos, contribuem para a formação de um patrimônio coletivo”.[2]

No que concerne a este caso, é evidente que a responsabilidade civil do Estado, com fundamento no § 6º do artigo 37 da Constituição Federal, contempla os danos causados por falhas na prestação de serviços públicos ou bem de utilidade pública, que são prestados aos cidadãos por determinação do artigo 175 da Constituição Federal[3].

Ademais, não há que se questionar a existência do nexo de causalidade neste caso concreto, visto que o acidente somente ocorreu em função da omissão da Administração Pública quanto à sinalização da rodovia em que se sucedeu o fato, conforme demonstrado no relatório dos fatos.

A jurisprudência brasileira também fundamenta o presente pleito. Tome-se como exemplo o recente acórdão do egrégio Tribunal Federal da 4ª Região (TRF-4), prolatado em março de 2019, que versa sobre situação semelhante ao presente caso (falta de sinalização), no qual se manifestou entendimento no sentido de responsabilizar o Estado nos casos em que, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa, for demonstrada a ação ou a omissão imputável ao ente público no tocante à conservação e à sinalização da rodovia. Leia-se:

DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ACIDENTE EM RODOVIA FEDERAL ENVOLVENDO BLINDADO DO EXÉRCITO. VEÍCULO MILITAR QUE TRAFEGAVA À NOITE EM BAIXA VELOCIDADE, SEM SINALIZAÇÃO E DESACOMPANHADO DE BATEDORES. MOTOCICLETA QUE SE CHOCA NA TRASEIRA DO BLINDADO. CARONEIRO QUE SOFRE DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS.  FALHA DO SERVIÇO. NEXO CAUSAL COMPROVADO. DEVER DE INDENIZAR. DANOS MORAIS, MATERIAIS E ESTÉTICOS.

1. A atual Constituição Federal, seguindo a linha de sua antecessora, estabeleceu como baliza principiológica a responsabilidade objetiva do Estado, adotando a teoria do risco administrativo. Consequência da opção do constituinte é que de regra os pressupostos dar responsabilidade civil do Estado são: a) ação ou omissão humana; b) dano injusto ou antijurídico sofrido por terceiro; c) nexo de causalidade entre a ação ou omissão e o dano experimentado por terceiro.

2. Em se tratando de comportamento omissivo, o tema foi objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal em regime de recurso repetitivo no Recurso Extraordinário nº 841.526, definindo-se que a responsabilidade civil do Estado por omissão também está fundamentada no artigo 37, §6º, da Constituição Federal, ou seja, configurado o nexo de causalidade entre o dano sofrido pelo particular e a omissão do Poder Público em impedir a sua ocorrência – quando tinha a obrigação legal específica de fazê-lo – surge a obrigação de indenizar, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa.

3. Extrai-se do paradigma que, em se tratando de acidente ocorrido em rodovia federal, impor-se-á ao Estado o dever de indenizar quando demonstrada a ação ou omissão imputável ao Ente Público no tocante à conservação e à sinalização da rodovia, porquanto, nesta situação, o Poder Público tem o dever legal de agir para impedir o evento danoso, responsabilidade esta que poderá ser afastada quando houver o rompimento do nexo de causalidade, o que ocorre, v.g.,  quando ausente a efetiva possibilidade de agir, ou, ainda, reduzida caso reste demonstrado que o administrado também contribuiu para o evento danoso.

4. Acidente em rodovia federal caracterizado pelo choque de motocicleta na traseira de blindado do Exército que trafega à noite em baixa velocidade, sem sinalização e desacompanhado de batedores. Não é aceitável que um veículo do porte de um blindado trafegue nessas condições, pois fora da normalidade. A União deve responder pelos danos materiais, morais e estéticos causados ao autor, que viajava como caroneiro da motocicleta.

5. Em ações envolvendo morte em acidente de trânsito, o Superior Tribunal de Justiça tem fixado indenizações por danos morais na faixa dos R$ 100.000,00 ou 100 salários mínimos. Reduz-se o valor da indenização quando fixado próximo ao patamar utilizado pelo tribunal superior para os casos de falecimento se não houver vítimas fatais, ainda que grave as consequências do infortúnio.

6. Dano estético é toda ofensa, ainda que mínima, à integridade física da vítima, que ocorre quando há uma lesão interna ou externa no corpo humano, afetando a saúde, a harmonia e incolumidade das respectivas formas. Trata-se de espécie do gênero dano moral.

7. Cabível a cumulação das indenizações por dano moral e estético, nos termos do enunciado nº 387 da súmula da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, pois aquele decorre do sofrimento experimentado pela vítima em razão do evento danoso, ao passo que este advém de uma alteração da aparência da pessoa que repercute individual e socialmente. [Grifou-se]

(TRF4, AC 5003423-91.2016.4.04.7106, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 14/03/2019)

É fato incontroverso que as rodovias brasileiras se caracterizam como uma utilidade pública disponibilizada pelo Estado aos cidadãos e que a existência de defeitos nas vias resultam em condições inadequadas de tráfego. A falha na prestação dessa utilidade pública pode gerar acidentes automobilísticos, os quais resultam em danos de diferentes gravidades à vítima, que deverá ser indenizada pelo Estado.

Em razão da evidente responsabilização civil do Estado, nos termos expostos acima, faz-se presente o direito de requerer indenização a título de danos morais e estéticos, nos termos do artigo 186 do Código Civil, in verbis:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Além disso, de acordo com o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, em determinados casos – como o presente – é possível falar em responsabilidade civil de natureza objetiva, ou seja, independentemente de culpa. Veja-se:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Portanto, diante de acidente ocorrido em rodovia federal, é seguro concluir que o Estado possui o dever de indenizar a vítima, independentemente de prova da culpa na conduta administrativa, uma vez que restou demonstrada a omissão do ente público na conservação e sinalização da pista.

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[1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 685.

[2] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 719-720.

[3] Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Como citar e referenciar este artigo:
INVESTIDURA, Portal Jurídico. Modelo de tese jurídica – Nos casos de acidente em rodovia federal, impõe-se ao Estado o dever de indenizar, quando demonstrada a ação ou a omissão do ente público na conservação ou sinalização da pista. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2022. Disponível em: https://investidura.com.br/modelos/teses-juridicas/modelo-de-tese-juridica-nos-casos-de-acidente-em-rodovia-federal-impoe-se-ao-estado-o-dever-de-indenizar-quando-demonstrada-a-acao-ou-a-omissao-do-ente-publico-na-conservacao-ou-sinalizacao-da-pista/ Acesso em: 19 abr. 2024