Administrativo

Reexame de Sentença. Mandado de Segurança. Prefeito Municipal. Atos de improbidade administrativa. Separação dos Poderes. Competência inspectiva. Obrigatoriedade da prestação de contas.

Reexame de Sentença.  Mandado de Segurança. Prefeito Municipal. Atos de improbidade administrativa. Separação dos Poderes. Competência inspectiva. Obrigatoriedade da prestação de contas.

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

 

EGRÉGIA XXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA

PROCESSO :  XXXXXXXX

RECURSO:       REEXAME DE SENTENÇA 

SENTENCIANTE: JUÍZO DE DIREITO DA COMARCA DE ORIXIMINÁ

SENTENCIADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ

SENTENCIADO: XXXXXXX

RELATORA: EXMA.  DESA.  XXXXXXXXX

PROCURADORA DE JUSTIÇA: XXXXXXXXXX

 

 

 

Ilustre Desembargadora  Relatora:

 

 

Trata o presente do Mandado de Segurança impetrado pelo Ministério Público Estadual, através da Promotoria de Justiça da Comarca de Faro, contra o Exmo. Sr. XXXXXXXXXXXXX, Prefeito Municipal de Terra Santa.

 

Em síntese, os autos informam que:

 

         Em sua Exordial, de fls. 2- 8, o Ilustre Promotor de Justiça XXXXXXXXX pediu a concessão da Ordem, atendendo a uma Representação apresentada pelos Srs. XXXXXXXX, XXXXXXXXX, XXXXXXX e XXXXXXXX, todos vereadores do Município de Terra Santa, pela qual o Sr. XXXXXXX, atual Prefeito Municipal, é acusado de vir praticando, de forma reiterada, vários atos de improbidade administrativa, contando com a complacência da maioria dos membros do Legislativo Municipal, seus aliados políticos.

 

         Transcreveu, inicialmente, diversos dispositivos da Constituição Federal, da Constituição Estadual e da Lei Orgânica do Município de Terra Santa, todos relacionados com o processo de fiscalização financeira e orçamentária. Citou doutrina. Disse que o Impetrado negou aos membros do Legislativo Municipal o acesso aos documentos pertinentes à administração municipal, o que impossibilitou o exercício da função inspectiva da Câmara Municipal.

 

         Pediu a concessão do Mandamus, para que o Impetrado fosse compelido a enviar à Câmara Municipal de Terra Santa, no prazo de trinta dias, todos os documentos relacionados com as prestações de contas do Executivo Municipal junto ao Tribunal de Contas dos Municípios, a partir do ano de 1.997. Juntou documentos (fls. 9- 18).

 

         O Impetrado prestou as Informações de praxe (fls. 23- 27). Alegou a inépcia da Inicial, dizendo que o Impetrante não comprovou a existência do direito líquido e certo. Citou doutrina. Citou o art. 8o da Lei 1.533/51. Pediu a extinção do processo sem o julgamento do mérito. No mérito, disse que o pedido é improcedente, porque ficou comprovado que as contas já foram prestadas. Juntou certidão, às fls. 29.

 

         Ouvido o representante do Parquet, às fls. 32- 33, disse que o Impetrado comprovou a prestação de contas junto ao Tribunal de Contas dos Municípios, porém em data posterior à do ajuizamento da ação. Disse, ainda, que o Mandamus visa compelir o Impetrado a prestar todas as informações solicitadas pelos Vereadores, e não a prestar contas perante o TCM.

 

         A Mma. Juíza de Direito Titular da Comarca de Oriximiná, Dra. XXXXX,  em Despacho de fls. 34, determinou a indicação de outro membro do Parquet, para funcionar no Feito.

 

         O Ilustre Promotor Dr. XXXXXX juntou Parecer (fls. 39- 46). Relatou o processo. Disse que a preliminar está prejudicada, porque se confunde com a matéria de mérito. Disse que realmente o Mandamus visa compelir o Impetrado a enviar à Câmara Municipal de Terra Santa cópias das prestações de contas. Citou doutrina. Discorreu longamente a respeito das obrigações do administrador e dos princípios básicos da administração pública. Citou o art. 11 da Lei 8.429/92, a respeito de atos de improbidade administrativa. Discorreu a respeito do princípio da legalidade. Concluiu que a omissão da autoridade impetrada fere a Lei Orgânica Municipal, a Constituição do Estado do Pará e os princípios basilares da administração pública, pelo que deve ser acolhido o Mandamus. Requereu, ainda, que fosse encaminhado traslado ao Exmo. Sr. Procurador Geral de Justiça do Estado do Pará, para a apreciação de eventual medida judicial criminal contra a autoridade coatora.

 

         Às fls. 48- 52, a Mma. Juíza decidiu. Relatou o Processo. Disse que o objeto da Ação se relaciona ao pedido dos Senhores Vereadores, referente à obtenção de documentos, necessários ao exercício da competência fiscalizadora da Câmara Municipal. Relacionou os dispositivos violados pela autoridade impetrada. Disse que não foi atendido o pedido objeto do presente Mandado de Segurança, ou seja, apresentar à Câmara Municipal cópias das prestações de contas do Executivo, a partir do ano de 1.997. Citou doutrina. Disse que estão presentes os quatro requisitos para a concessão do Mandado de Segurança. Julgou procedente o pedido e determinou que a autoridade impetrada envie à Câmara Municipal de Terra Santa, no prazo de trinta dias, cópias de todos os documentos relacionados com as prestações de contas realizadas pelo Poder Executivo Municipal junto ao Tribunal de Contas dos Municípios, a partir do ano de 1.997. Deferiu também o pedido de remessa do traslado ao Procurador Geral de Justiça do Estado do Pará. Reexame necessário. A autoridade coatora não apelou da decisão.

 

         Distribuídos os Autos, vieram a esta Procuradoria, para exame e parecer.

 

 

É o relatório. Esta Procuradoria passa a opinar:

 

 

         Um dos princípios basilares de nosso ordenamento constitucional é o da Separação dos Poderes, destinado a evitar a tirania, conforme um de seus maiores sistematizadores, Montesquieu, que no “ Espírito das Leis” afirmava que o governante é sempre levado a abusar do poder. Por essa razão, haveria necessidade de que cada um dos Poderes do Estado, ao lado de sua faculdade de estatuir, tivesse também a faculdade de impedir, isto é, de limitar os abusos dos outros poderes.

 

         Essa doutrina foi adotada pela nossa Lei fundamental, prevalecendo em relação às três esferas de competência de nossa Federação, mediante freios e contrapesos, característicos do sistema presidencial de governo.

 

         Por essa razão, os órgãos legislativos, que teoricamente representam o povo, ao lado de sua competência legiferante, de prover a ordem jurídica, têm ainda a competência inspectiva ou fiscalizadora, conforme se verifica, especificamente em relação ao âmbito municipal, pelas disposições do art. 31 da Constituição Federal de 1.988, já exaustivamente citadas no presente processo, ao lado de outras normas, estaduais e municipais, também no mesmo sentido, ou relacionadas com a competência inspectiva do Órgão Legislativo.

 

         Não resta dúvida, portanto, de que cabe ao Poder Legislativo Municipal, que aprovou a Lei Orçamentária, fiscalizar sua correta execução. Trata-se de um controle político, exercido com o auxílio do Tribunal de Contas, encarregado do exame técnico contábil dessas contas.

 

         Como se trata da aplicação de dinheiro público, o § 3o do referido art. 31 estabelece que as contas dos municípios ficarão, durante sessenta dias, à disposição de qualquer contribuinte.

 

         Para tornar mais eficaz esse controle, o art. 73 da Constituição do Estado do Pará exige a apresentação de balancetes trimestrais, que deverão ficar no prédio da Câmara Municipal por trinta dias, à disposição de qualquer jurisdicionado.

 

         Da mesma forma, a Lei Orgânica do Município de Terra Santa, como não poderia deixar de ser, ressalta, em vários de seus dispositivos, essa obrigatoriedade da prestação de contas ao Legislativo Municipal.

 

         A autoridade impetrada comprovou (fls. 29) a apresentação, ao Tribunal de Contas dos Municípios, dos balancetes trimestrais e do balanço geral do exercício financeiro de 1.998, bem como do balancete referente ao primeiro trimestre do exercício financeiro de 1.999, o que foi feito posteriormente à data do ajuizamento do presente Mandamus. Apesar disso, não cumpriu o exigido através do presente Remédio Heróico, isto é, a apresentação à Câmara Municipal das prestações de contas feitas pelo Executivo Municipal, a partir do ano de 1.997.

 

         Ficou evidente, assim, a ofensa ao direito líquido e certo do Impetrante, e da comunidade por ele representada, porque a autoridade impetrada se omitiu em seu dever constitucional básico de prestar contas referentes à sua administração, caracterizando-se, conseqüentemente, a ilegalidade e o abuso de poder.

 

Ex positis, este Órgão Ministerial manifesta-se pela manutenção integral da bem elaborada decisão de primeiro grau, por seus próprios fundamentos.

 

É O PARECER.

 

Belém,        junho de 2.000

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. Reexame de Sentença. Mandado de Segurança. Prefeito Municipal. Atos de improbidade administrativa. Separação dos Poderes. Competência inspectiva. Obrigatoriedade da prestação de contas.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/estudodecaso/administrativo/reexame-de-sentenca-mandado-de-seguranca-prefeito-municipal-atos-de-improbidade-administrativa-separacao-dos-poderes-competencia-inspectiva-obrigatoriedade-da-prestacao-de-contas/ Acesso em: 28 mar. 2024