Sociedade

Em meio à crise, enviei e-mail a Dilma Roussef

Antes que algum exaltado comece a fazer mandinga, ou desconjurar, por favor, leia o texto. Afinal de contas, expressar-se sobre assuntos políticos ou direitos humanos, neste país, não é tarefa das mais fáceis.

Transcreverei o e-mail que recebi, para confirmar o e-mail que enviei a presidenta da República (nota: os asteriscos foram aqui colocados para preservar a minha localidade):

“Sérgio Henrique da S Pereira,

Consta em nosso banco de dados uma mensagem enviada à Presidenta da República deste endereço eletrônico. Precisamos de sua confirmação ou cancelamento.

Para confirmar ou cancelar o envio da mensagem favor seguir as instruções logo a seguir.

Dados da mensagem:

Nome: Sérgio Henrique da S Pereira

Cargo: *

Endereço: *

Bairro: *

Cidade: RIO DE JANEIRO

UF: RJ

CEP: *

País: BRASIL

E-mail: sergioH28@gmail.com

Telefones: 993048581

Sexo: MASCULINO

Faixa etária: ADULTO (de 21 a 60 anos)

Mensagem:

Saudações! Em meio ao “panelaço”, acredito que a situação só se contornará com medidas efetivas de vossa parte. Diante do caos – péssimos serviços públicos, improbidades administrativas etc. -, é necessário comprometimento do Estado com o povo, o detentor, real de direitos. Assim, faz-se necessário: políticas eficientes de combate à corrupção; grade curricular nas instituições públicas e particulares sobre direitos humanos, garantias fundamentais e improbidades administrativas; o Estado ensinando sobre os direitos/deveres do povo, que pode ser através do YouTube, ou apostila distribuída em todos os setores públicos. Através destas medidas, o povo verá a vossa seriedade e comprometimento com o bem-estar de todos.

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Caso não seja possível você também poderá cancelar copiando e colando o seguinte endereço no seu navegador:

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Atenciosamente,

Fale com a Presidenta

Gabinete Pessoal da Presidenta da República

Presidência da República

NOTA Por favor, não responda esta mensagem, sua resposta vai-se perder.

Se julgar necessário manifestar-se a respeito, entre no saite www.presidencia.gov.br,

entre na página da Presidenta e clique no linque “Fale com a Presidenta”.

Por que enviei o e-mail à presidenta? Será que sou comunista? Será que foi sarcasmo a presidenta por ser de direta? Nem um, nem outro. Qualquer estudante de direito, ou operador de direto, assim como estudantes, ou já formados, em áreas como história, sociologia não irão dizer que há um melhor, substancialmente.

Analisando a historicidade dos direitos humanos, cada dimensão contribuiu para o que se tem atualmente na composição dos direitos humanos. De uma lado se tem o Estado liberal, de outro o Estado social. Cada qual se desenvolveu em determinados momentos da história humana. O Estado liberal libertou os súditos das crueldades do soberano. Se antes este detinha poder supra-humano, e até sobre a vida e a morte, com o Estado liberal o soberano não poderia mais fazer o que queria. Seus atos, então, seriam delimitados, controlados e punidos, como de qualquer outro ser humano.

Conquanto o Estado liberal – o qual se iniciou na Revolução Gloriosa, e se aperfeiçoou com as Revoluções Americana e Francesa – soasse como uma liberdade inerente a qualquer ser humano, dentro das liberdades públicas, se mostrou desastroso diante de seres humanos destituídos de solidariedade ao próximo moribundo. Desigualdades sociais aumentaram e surgiram novos escravos modernos; não mais com correntes aos pés, ou chibatadas nas costas, todavia a escravidão monetária.

Com o novo sistema escravagista, agora sem diferenciação de ser ou não negro, a vida de milhões de seres humanos, ou quase a totalidade dos seres humanos, se mostrou caótico – alguns historiadores dizem que na Revolução Industrial boa parte da humanidade vivia pior que os servos no período feudal. A famigerada corrida pela riqueza, individual, não poupou atos de crueldades. Por exemplo, no clássico filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin, o visível condicionamento do ser humano [lê-se: proletariado] à máquina.

Síntese do filme: no filme, já tratando sobre a problemática do Estado liberal, o personagem de Charles Chaplin trabalha de forma exaustiva, sendo perseguido pelo controlador da produção. A velocidade da esteira é acelerada para aumentar a produção da fábrica – e nisto o proletariado trabalha além de sua resistência física. Com a ganância exacerbada, os proletariados são forçados a sentarem numa cadeira mecanizada para que possam comer mais rápido – felizmente, a cadeira não funcionou. O operário, interpretado por Charles Chaplin, diante da exaustiva jornada laboral, enlouquece. Ele consegue sair do hospício, mas é confundido com um grupo protestante que reivindicam melhores condições de trabalho. Charles acaba sendo preso. Depois, Charles vai trabalhar em outra fábrica, mas se vê diante de uma greve dos trabalhadores reivindicando melhores salários, diminuição da carga horária etc.

Foi durante a Revolução Industrial que “floresceram o socialismo e o comunismo, representados, sobretudo, por seu principal teórico, Karl Marx, que, com Friederich Engels, lançou, em 1848, o Manifesto Comunista”.[1]

Dois documentos de suma importância para entendermos, modernamente, os direitos humanos são: o Pacto Internacional dos Direitos Sociais, Econômicos e Culturais e o Pacto Internacional sobre Direito Civis e Políticos. O primeiro fora idealizado pelos países do bloco socialista; o segundo, pelos países ocidentais. O bloco ocidental, em sua concepção teórica, entendia que tais direitos eram autoaplicáveis, isto é, os cidadãos seriam capazes de regular suas condutas de forma a beneficiar a todos, sendo que os direitos sociais teriam caráter meramente programático. Já o bloco socialista, pela sua concepção teórica, entendia que o Estado, por causa da natureza humana individualista, deveria atuar e regular os direitos políticos e civis, mesmo que fosse necessário privar tais direitos aos cidadãos.

Nem um, nem outro, se mostraram de substancial veracidade quanto ao bem-estar do ser humano. A liberdade total do cidadão diante do Estado, ou Estado liberal, se demonstrou perigoso para as relações humanas, a concentração de riquezas nas mãos de poucos – conseguidas por pérfidas atitudes e conluios – [2]. Já o Estado social se mostra perigoso quando há assistencialismo, do Estado aos cidadãos, sem que estes tenham condições razoáveis de se emanciparem, isto é, não ficarem na dependência eterna da ajuda do Estado. Por sua vez, quando o Estado age ditando o modo de vida dos cidadãos, não há liberdades como às quais existem no bloco capitalista – exemplos de Estado sociais são a Coreia do Norte e a China. Todavia, nesses países, as liberdades [direito de ir e vir, imprensa, pensamento etc.] são controladas pelo Estado.

Militarismo ou democracia? Qual a melhor?

Um sistema de controle é necessário – já dizia Pitágoras: “Enquanto as leis forem necessárias, os homens não estarão capacitados para a liberdade”! – para as relações humanas.

Na ditadura as pessoas [os cidadãos não agentes políticos] querem delegar as próprias responsabilidades a uma minoria [os agentes políticos]. Caso estas errem, é fácil culpá-las sem que àqueles se imputem responsabilidades por crimes diversos contra os direitos humanos.

Na democracia a responsabilidade é de todos, e isto incomoda o ser humano. De certa forma, o ser humano é indolente. Por isso existem os líderes, ditadores, profetas etc.

Ditadura é melhor, pois não há necessidade de pensar muito: matar é melhor. Mata-se e pronto. Furtou uma maçã? Não há justificativas: cadeira elétrica, amputação da mão.

Numa democracia se analisaria o porquê do ato. É costumeiro tal ato? A sociedade em si se mobiliza para diminuir as desigualdades sociais? A sociedade se desempenha na fiscalização aos bens públicos?

Ditadura é um colírio. As notícias são filtradas e reeditadas. Mostra-se apenas o lado bom. Miséria não existe. Democracia é amarga. Mostram os dois lados da vida: felicidade e aberrações. Pode ter distorções, persuasões, mas as pessoas podem pensar por elas mesmas e dizer o que pensam [liberdade de pensamento e de pensamento]

Na ditadura há corrupção, mas de forma privilegiada para apenas alguns. Aí daquele que quisesse tomar o trono, seria fuzilado. Na democracia, não. O trono está disposto para qualquer pessoa – de má índole e munido de muito dinheiro.

O próprio Montesquieu disse que a democracia é o fomento do povo ante o direito à vida digna, mas jamais desconsiderou a falta de força punitiva, eficiente, na democracia. Para muitos, a democracia é só direitos e nada de deveres. Quando se fala em punição, na democracia, alguns invocam, erroneamente, o conceito de punição com fatos passados de governos militares e da Idade Média. O próprio Sócrates disse que “A lei é dura, mas é lei!” – a alguns interpretam que violações ao contrato social [concepções teóricas de uma sociedade] deve, o violador, pagar na mesma medida do ato danoso.

A democracia, para ser humanitária a todos os cidadãos, pressupõe a existência das virtudes humanas. E a virtude humana é o norte tanto do Estado como de cada cidadão.

“Em que governo se precisa de censores? São necessários numa república, onde o princípio do governo é a virtude. Não são apenas os crimes que destroem a virtude, mas também as negligências, as faltas, certa indolência no amor à pátria, exemplos perigosos, sementes de corrupção, o que não fere as leis, mas as desvia, o que não as destrói, mas enfraquece: tudo isso deve ser punido pelos censores.

(…)

O amor à república, numa democracia, é o amor à democracia; o amor à democracia é o amor à igualdade. O amor à democracia é também o teor à frugalidade. Cada um deve possuir a mesma felicidade e as mesmas vantagens, deve experimentar os mesmos prazeres e ter as mesmas esperanças; coisa que só se pode esperar da frugalidade geral”.[3]

Conclusão

Seja PT, ou qualquer outro partido, a máxima e uma democracia é a virtude humana. A Carta Políticade 1988, em seu artigo, consagra as virtudes humanas, pois não há materialização de cada objetivo se não houver as virtudes humanas. Todavia, não basta o Estado ser assistencialista aos párias, mas criar mecanismos sociais e monetários para que os párias possam, por si mesmo, conseguirem atingir qualidade de vida. Outro importante fator ao crescimento de todos os nacionais é o combate à corrupção nas intuições públicas, nos serviços públicos. A aprendizagem sobre direitos e deveres, do cidadão à sociedade, desta ao Estado e deste aos cidadãos, não podem ser negligenciados pelos gestores públicos. E somente pelo conhecimento, fiel, dos direitos e deveres é que se construirá uma pátria consagrada nas virtudes humanas.

Através da educação, o controle sobre os atos danosos as instituições democráticas, aos direitos humanos e as garantias fundamentais de cada cidadão dar-se-á pela vigilância de cada membro nacional. O entendimento dessa vigilância, então, será de que um direito alheio violado representará, futuramente, o próprio direito violado. Essa ideia, no inconsciente coletivo, de importância com o bem-estar do próximo configurará uma relação social benéfica a todos os nacionais, e qualquer pessoa que transite sobre o solo pátrio.

O contrato social, então, se sustentará pelas virtudes humanas, não pelo sadismo, pela egolatria, tão comuns em sociedades bárbaras, como, infelizmente, é a nossa. Acusar somente o PT de vários problemas, de ordem secular, em nosso país é quimera. Os direitos humanos, no Brasil, vêm se delineando, se aperfeiçoando ao logo dos séculos, e isto é visível em cadaConstituição brasileira. Porém, nenhuma lei há de mudar o espírito coletivo brasileiro, secular, de discriminações, se não houver educação à civilidade. A cada geração, se presencia ódio entre classes sociais diferentes, e dentro de mesmas classes sociais. Por quê? Porque cada ser humano, apesar dos valores e das leis a conduzir o comportamento humano, ou do corpo social, tem sua personalidade. Mesmo durante o período machista institucionalizado – no Império o homem poderia matar a mulher com o consentimento do Estado -, alguns homens respeitavam as mulheres. No presente Estado, assentado na Carta Cidadã, as mulheres têm direitos iguais aos dos homens, a proteção à mulher se acentuou com aLei Maria da Penha. Todavia, ainda há homens que acham senhores soberanos dos corpos e almas femininas.

Se o espírito do homem é livre – o comportamento pode ser controlado pelas leis, até certo momento em que eclodem protestos -, não há lei que possa represá-lo, mudá-lo. Somente através da educação universalista é possível ter comportamentos humanizados. Leva tempo, mas é mais eficaz do que leis contentivas aos ânimos exaltados, egoístas e sádicos. E vemos tais atos bárbaros, diuturnamente, em nossa sociedade. Infelizmente, a educação [civilidade] se mostra escassa, e quase ausente, em certos momentos, em nossa pátria. Os governantes nada fazem efetivamente para contornar a situação precária. O resultado é a conduta diária de calamidades que não causam mais indignações – exemplo é o acidente de trânsito. Um dia de cada vez, é a vida dos milhões de brasileiros que se debruçam num sistema perverso de vida, a desigualdade social. Dizer que houve melhorias sociais, a ascensão social, não é falácia. Houve, mas não tão proficiente a ponto de tirar os cidadãos [lê-se: párias] dos lixões, das palafitas. Qualidade de vida não se resume em viajar de avião, aquisições de eletroeletrônicos. Qualidade de vida, real, é a condição do cidadão em participar, ativamente, dos processos democráticos no país, na possibilidade de comer, todo dia, refeições nutritivas, de saborear as frutas, os grãos produzidos no solo pátrio, de poder morar em localidade segura, com água potável, esgoto canalizado; ter acesso rápido as instituições de ensino, ao sistema de saúde eficiente, poder contar com a proteção do Estado diante das arbitrariedades das empresas privadas – as quais violam dos direitos dos consumidores, sem a menor cerimônia, e sob a proteção matriarca das agencias reguladoras.

Enfim, o e-mail é um aleta, mas serve para qualquer gestor público que virá futuramente, e para a própria sociedade que clama por seus direitos sociais e políticos. Se houver um representante do povo, as minhas opiniões – e acredito que de muitos brasileiros – serão plausíveis.

P. S.: nenhum Plano Nacional de Direitos Humanos alcançará seus objetivos sem participação de todos os brasileiros sejam agentes público ou não.

Notas:

[1] – Casado Filho, Napoleão. Direitos humanos e fundamentais / Napoleão Casado Filho. – São Paulo: Saraiva, 2012. – (Coleção saberes do direito; 57), p. 33.

[2] – GIGANTES DA INDÚSTRIA – Comprando um Presidente. Disponível em:<

[3] – Montesquieu, Charles Luis de Secondat. Do Espírito das Leis – Col. A Obra Prima de Cada Autor – Série Ouro. Saraiva.

Como citar e referenciar este artigo:
PEREIRA, Sérgio Henrique S.. Em meio à crise, enviei e-mail a Dilma Roussef. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2015. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/em-meio-a-crise-enviei-e-mail-a-dilma-roussef/ Acesso em: 30 abr. 2024