MPF/RS

Simpósio encerra com Carta de Compromisso em defesa do consumidor nas telecomunicações



Uma Carta de Compromisso firmada entre o Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul (MPF/RS), o Ministério Público Estadual e Procons marcou o encerramento do III Simpósio dos Direitos dos Consumidores nas Telecomunicações, no início da noite desta sexta-feira (11). O documento, que pontua as principais causas da inefetividade dos direitos destes usuários, destaca os compromissos dos agentes envolvidos assumidos para a reversão deste quadro de desrespeito aos consumidores. O evento foi coordenado pelo MPF e realizado em parceria com o Procon-RS e o Fórum Estadual de Defesa do Consumidor.

No pacto fechado para garantir efetividade dos direitos dos usuários e a qualidade dos serviços prestados, Anatel e MPF atuarão estrategicamente para viabilizar a interlocução destinada a diminuir a reversão judicial de multas aplicadas de valores significativos como resultado de fiscalização em defesa dos consumidores. Outro compromisso acertado foi o de promover a troca de informações organizada entre os Procons Municipais e Procon-RS sobre as deficiências nos serviços, em especial quanto à qualidade de sinal, atendimento presencial e por call center, cobranças indevidas e dificuldades de rescisão de contratos. Também ficou acordada a organização de um mutirão estadual de produção de prova por meio das fiscalizações direcionadas para a caracterização da má qualidade do serviço e verificação do atendimento pessoal da OI em cumprimento ao TAC firmado com o MPF e das demais prestadoras em cumprimento ao que obriga a regulamentação, entre outros.

“Esse documento é simbólico pois representa toda essa união articulada e bem informada na defesa do consumidor”, enfatizou o procurador da República Alexandre Amaral Gavronski, coordenador do simpósio e titular do 2º Ofício do Consumidor e Ordem Econômica da Procuradoria da República no Rio Grande do Sul. Para Gavronski, a carta é de extrema importância por prever um planejamento estratégico de ação e por aprofundar as principais causas dos problemas enfrentados pelos usuários.

Na visão do presidente do Fórum Estadual de Defesa do Consumidor, Alcebíades Adil Santini, os agentes envolvidos fizeram o dever de casa. “E essa carta serve de documento de pressão da sociedade ante o legislativo e o executivo”, afirmou.

Veja abaixo a íntegra da Carta de Compromisso do III Simpósio dos Direitos dos Consumidores nas Telecomunicações:


Carta Compromisso do III Simpósio dos Direitos dos Consumidores nas Telecomunicações

Os representantes do Ministério Público, dos PROCONs, da sociedade civil organizada e demais participantes do III Simpósio dos Direitos dos Direitos das Telecomunicações realizado em Porto Alegre nos dias 10 e 11 de outubro de 2013 que ao final subscrevem esta Carta Compromisso;

Considerando que a defesa dos consumidores é garantia constitucional fundamental e dever do Estado (art. 5º, XXXII, CF) e política de Estado, pelo que se impõe a integração interinstitucional em defesa dos consumidores, nos termos do Decreto 7.963/2013, que institui o Plano Nacional de Consumo e Cidadania;

Considerando as informações, reflexões e debates desenvolvidos durante os painéis e grupos de trabalho no referido Simpósio, em especial, a constatação generalizada de baixa efetividade dos direitos dos consumidores nas telecomunicações previstos no CDC, nas normas que o regulamentam e na disciplina regulatória editada pela ANATEL, e da má qualidade do serviço disponibilizado, em especial da telefonia móvel e de banda larga (que viabiliza a conexão a internet), apesar dos preços elevados em comparação com o praticado em outros países onde há maior concorrência entre as empresas, notadamente na telefonia móvel pré-paga, serviço no qual se verificou a universalização do serviço;

Considerando que foram identificadas durante o Simpósio como causas da pouca efetividade dos direitos e da má qualidade do serviço, dentre outras:

b.1) a baixa efetividade das medidas administrativas sancionatórias usualmente adotadas pela ANATEL contra o reiterado e difundido quadro de desrespeito aos direitos dos consumidores nas telecomunicações, notadamente as multas, visto que menos de 10% do valor total aplicado em multas pela ANATEL às prestadoras é efetivamente pago por estas, havendo elevando percentual de sanções que tem sua exigibilidade suspensa em juízo;

b.2) as graves deficiências de natureza financeira da agência reguladora, cujo orçamento tem se mantido praticamente invariável nos últimos anos e muito inferior (entre 7% e 10%) aos recursos arrecadados pelo FISTEL (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações), objeto de contingenciamento pelo Governo, ocasionando toda sorte de prejuízo às fiscalizações, desde a indisponibilidade de recursos para combustível até dificuldades para que a ANATEL realize fiscalizações destinadas a coletar dados independentemente dos fornecidos pelas prestadoras, além de graves prejuízos à participação social no processo regulatório, comprometendo a realização de audiências públicas fora da Capital Federal e prejudicando o funcionamento dos conselhos socais ligados à agência (Conselho de Usuários de Telecomunicações e Conselho Consultivo, em particular), tudo em grave desconformidade com a configuração legal e constitucional das agências, em especial ao que se refere à configuração de autarquia em regime especial e à independência que deve caracterizar uma agência reguladora ;

b.3) a utilização pela ANATEL de dados fornecidos pelas prestadoras quanto à cobertura de sinal e qualidade no atendimento, apurando diretamente apenas os dados relacionados à queda e completamento de chamadas;

b.4) a deficiência de estrutura dos PROCONs, com quadros insuficientes de fiscais nos PROCONs existentes e excessivo número de municípios sem PROCONs, quadro agravado pelos questionamentos ainda existentes sobre a exigibilidade dos acordos tomados pelos PROCONs entre os consumidores e as prestadoras;

b.5) a adoção de práticas pelas prestadoras em contrariedade com a boa fé, em especial a de prestar informações inverídicas à ANATEL no sistema Focus (sistema de registro das reclamações dos consumidores) e aos PROCONs, dando por resolvidas reclamações que não o foram,

b.6) a terceirização do atendimento aos consumidores, tanto no atendimento pessoal como nos call centers, com remuneração contratada por número de atendimentos e não por efetiva resolução da questão levada;

b.7) deficiência de comunicação interna das prestadoras entre o setor jurídico/de acompanhamento regulatório e o setor de marketing/área comercial, seguindo este uma lógica própria de cumprimento de metas de contratação sem preocupação com a qualidade e observância do CDC, das normas que o regulamentam (como o Decreto do SAC) e da disciplina regulatória;

b.8) dificuldades impostas ao consumidor para rescisão por todos os meios mais usuais de contratação e reclamações: atendimento pessoal, call center e Internet;

b.9) resistência das prestadoras e dos fabricantes em reconhecer a condição de produto essencial dos aparelhos celulares e os seus deveres decorrentes dessa condição, em especial a substituição do produto quando seu defeito impossibilitar o acesso ao serviço;

b.10) retrabalho e desarticulação entre a atuação fiscalizatória dos vários órgãos, instituições e entes de defesa do consumidor, incluída a ANATEL;

b.11) deficiente informação das prestadoras aos consumidores sobre as condições dos serviços prestados, em especial dos planos e promoções, das limitações e da efetiva disponibilidade (incluindo abrangente) e qualidade do serviço, e a entrega de cópia dos contratos;

b.12) deficiências da participação social dos consumidores nos conselhos da ANATEL e nas audiências e consultas públicas que tratam de assuntos dos seus interesses, seja por excesso de tecnicismo nas informações disponibilizadas, seja por insuficiente, deficiente ou distorcida representação;

RESOLVEM assumir os seguintes compromissos de atuação estratégica para reversão do quadro de baixa efetividade dos direitos dos consumidores nas telecomunicações e de má qualidade do serviço:

Relacionados à articulação:

– promover intensa troca de informações de forma organizada entre os PROCONs Municipais e PROCON-RS sobre as deficiências nos serviços de telecomunicações, em especial quanto à qualidade de sinal, deficiências do atendimento (presencial e por call center), cobranças indevidas, dificuldades de rescisão e outros;

– aprimorar a troca de informações estatísticas entre PROCONs e os Ministérios Públicos e entre estes e a ANATEL com vistas a orientar a formulação de estratégia na atuação em defesa dos consumidores nas telecomunicações;

– promover reuniões interinstitucionais periódicas, tri ou quadrimestralmente, entre o PROCON-RS, a ANATEL, os Ministérios Públicos e o FEDC, e de todos com as prestadoras, tendo por objetivo principal resolver consensualmente as reclamações relacionadas à qualidade de sinal;

– providenciarem os PROCONs, notadamente o Estadual, a disponibilização de dados do SINDEC para a ANATEL, devendo esta considerar estes dados nas suas atividades de fiscalização;

– entre ANATEL e o Ministério Público Federal, viabilizar estratégia de interlocução destinada a diminuir a reversão judicial de multas aplicadas de valores significativos como resultado de fiscalização em defesa dos consumidores, incluindo interlocução com o Poder Judiciário e provocação de intervenção do Ministério Público Federal, por interesse público e social (art. 82, III, CDC) nas causas em que se discutem essas aplicações;

Relacionados à adequada informação dos consumidores:

– empreender esforços para promoção adequada do direito dos consumidores à informação, em especial no que respeita ao acesso ao conteúdo do contrato de prestação de serviço, adequadas informações sobre as condições de contratação (adequada e ampla informação sobre os planos de serviços e promoções) e sobre a efetiva disponibilidade e cobertura do serviço (incluindo disponibilização de mapa de cobertura), assegurando para que a publicidade seja compatível com o serviço efetivamente oferecido;

– empreender esforços conjuntos para a que as empresas adotem uma padronização dos contratos e faturas de forma que fiquem claros, intelegíveis e que contenham requisitos pré-estabelecidos, independente da forma de contratação;

– empreender esforços conjuntos para assegurar atendimento presencial e responsabilização da loja oficial/franquia, na informação e atendimento pós-venda, sem restrição do número de habitantes/usuários, como previsto no art. 96 da Res. 477/2007, promovendo, inclusive, a alteração do regulamento), cuja efetividade deve ser assegurada pela ANATEL como patamar mínimo de atendimento;

– empreender esforços conjuntos para assegurar publicidade clara, combatendo o uso de termos enganosos, especialmente os especificados como tais pelo PROCON.

Relacionadas à instrução (produção de prova):

– organizar mutirão estadual de produção de prova por meio das fiscalizações direcionadas, especificamente para:

a) caracterização da má qualidade do serviço (ausência ou deficiência do sinal), como fotos da do local e do sinal no aparelho celular, com indicação do dia e horário, preferencialmente registrando os dados de duas testemunhas residentes no local;

b) verificação do atendimento pessoal da OI em cumprimento ao TAC firmado com o Ministério Público Federal e das demais prestadoras em cumprimento ao que obriga a regulamentação, seguindo orientações sugeridas pelo PROCON-RS em parceria com o Ministério Público;

c) gravação de atendimentos feitos pelo sistema de call center de todas as prestadoras para formação de um “banco de gravações” que exemplifique concretamente as dificuldades e deficiências do setor, com sucinto relato escrito do que acontece em cada um (prestadora, consumidor e data, tempo de atendimento, resolutividade);

d) realizar reuniões e audiências administrativas com as operadoras para cobrar a qualidade de seus serviços e a disponibilidade de sua rede de sites e antenas, bem como a cobertura efetiva que estas possuem na cidade, encaminhando, se necessário, intimação para comparecimento com base em reclamações coletivas de consumidor sob pena de incorrer em crime de desobediência;

Relacionados à atuação extrajudicial e judicial:

Extrajudicial dos PROCONs:

– adoção de outras medidas sancionatárias além da multa, em especial a contrapropaganda;

– divulgação nas sedes do PROCON, em local visível e permanentemente, do resultado divulgado anualmente pelo PROCON-RS das empresas contra as quais há mais reclamações fundamentadas e daquelas em que não houve atendimento;

– divulgação ampla do cadastro de fornecedores mais demandados na imprensa local, orientando os conselheiros municipais de defesa do consumidor a levá-los as suas respectivas instituições;

– propor e defender alterações legislativas que para que se destine parte dos recursos do FISTEL para os órgãos do sistema de defesa do consumidor nas três esferas , União, Estados e Municípios, considerando que também atuam, com destaque, na fiscalização do respeito dos direitos dos consumidores nas telecomunicações;

Encaminhamento aos Ministérios Públicos e/ou Polícia Federal ou Civil (Delegacia do Consumidor) de cópias dos expedientes noticiando possíveis ilícitos penais acerca das Informações inverídicas repassadas por parte das operadoras, em especial as mais graves, como é o caso da oferta/disponibilidade de serviço onde ela não ocorre (art. 7, VII, Lei 8137/90)

Implementação de um grupo de análise das causas de revisão do ato administrativo sancionador pelo Poder Judiciário promovendo o esclarecimento (atuação política) junto aos magistrados da importância da manutenção das penalidades administrativas já aplicadas.

Extrajudicial ou Judicial do Ministério Público Federal:

– adoção de providências destinada a evitar o contingenciamento ou outra forma de indisponibilização para a ANATEL dos recursos do FISTEL de modo a garantir recursos suficientes para uma atuação fiscalizatória eficiente e independente;

– adoção de providências destinadas à correção do sistema Focus para que considere, por último, a percepção do consumidor e não da prestadora sobre a resolutividade do atendimento;

– adotar as providências necessárias para assegurar publicidade na destinação das verbas do FISTEL;

– acompanhamento ou, se necessário, adoção de medias judiciais e extrajudiciais, destinada a assegurar efetividade da viabilidade de rescisão pela internet e por outros meios seguros;

– ajuizamento de ações civis públicas destinadas à melhoria da conduta da ANATEL na defesa do consumidor;

– promover a interlocução e compartilhamento de informações entre os membros do Ministério Público Federal, os PROCONs, a ANATEL e demais entidades de defesa do consumidor;

Extrajudicial ou judicial do Ministério Público Estadual:

– Interlocução e compartilhamento de informações entre todos os membros de primeiro e segundo graus do Ministério Público, por meio do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Consumidor e da Ordem Econômica, com os PROCONs, a ANATEL e demais entidades de defesa do consumidor;

– Viabilizar ações conjuntas com os PROCONs e com o Ministério Público Federal ;

– Colaboração com a CPI da Telefonia da Assembleia Legislativa, para revisão de legislação que restrinjam indevidamente a instalação de Estações Rádio Base como forma de viabilizar a melhora da qualidade de serviço;

Além desses compromissos assumidos, entendem os participantes do III Simpósio por posicionarem, unanimemente:

pela necessidade urgente da efetiva e integral implantação do Plano Nacional de Consumo e Cidadania previsto no Decreto n. 7.963/2013, em especial no que respeita à valorização e adequada estruturação dos PROCONs e às políticas e ações previstas no eixe regulação e fiscalização;

pela breve e integral aprovação do Projeto de Lei 5196, em trâmite na Câmara dos Deputados, conhecido como projeto de fortalecimento dos PROCONs e que estabelece medidas corretivas em caso de infração às normas de defesa do consumidor, fim para o qual será enviada cópia desta Carta Compromisso ao relator, Deputado José Carlos Araújo, solicitando que seja considerada em seu relatório;

pela necessária efetividade do Despacho n. 4823/2013 da Superintendências de Controle de Obrigações da ANATEL, que obriga as concessionárias a divulgarem amplamente em seus sítios, em jornais de grande circulação e em emissoras de rádio, a antecipação da 3ª fase de venda do AICE (Acesso Individual de Classe Especial), conhecido como “telefone popular”, como forma de disponibilizar telefonia fixa em valores módicos;

pela necessidade de adoção de soluções legislativas ou regulatórias destinadas a caracterizar o serviço de banda larga para acesso à internet como essencial bem como assegurar a sua prestação em regime público com obrigação de universalidade, pela imprescindibilidade desse serviço para a educação e inclusão digital dos brasileiros;

pela necessidade de as empresas prestadoras implantarem e divulgarem plano de integridade e conformidade da sua política comercial, inclusive com respeito à observância da dignidade dos consumidores e boa fé nas relações de consumo, em cumprimento ao art. 7º, VIII, da Lei 12.846/13.

Assinam os participantes compromissados nos termos desta Carta.

Porto Alegre, 11 de outubro de 2013.

Fonte: MPF/RS

Como citar e referenciar este artigo:
NOTÍCIAS,. Simpósio encerra com Carta de Compromisso em defesa do consumidor nas telecomunicações. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/noticias/mpfrs/simposio-encerra-com-carta-de-compromisso-em-defesa-do-consumidor-nas-telecomunicacoes/ Acesso em: 19 abr. 2024