Inicial

Modelo de Ação Declaratória de Inconstitucionalidade cumulada com repetição de indébito

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DR. JUIZ DA ….. VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE …….


….., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ….., com sede na Rua ….., n.º ….., Bairro ……, Cidade ….., Estado ….., CEP ….., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). ….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG nº ….. e do CPF n.º ….., por intermédio de seu advogado (a) e bastante procurador (a) (procuração em anexo – doc. 01), com escritório profissional sito à Rua ….., nº ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., onde recebe notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor


AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO

em face de

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.


DOS FATOS

A autora é empresa sediada na cidade de ………./….., tendo como objetivo social o Comércio de Gêneros Alimentícios em Geral, dentre outras, consoante se vê de cópia do incluso contrato social e sua última alteração (doc. anexo).


Nessa condição, é contribuinte, por força de expressa disposição legal, da contribuição social denominada SAT – SEGURO ACIDENTE DE TRABALHO. (comprovantes anexos)


Todavia, insurge-se a autora à imposição da contribuição ao SAT – Seguro Acidente do Trabalho exigida pelo Instituto Nacional de Seguro Social, pelas razões que passa a expor:


DO DIREITO

01 – Com o advento da CF/88 desapareceram as dúvidas que existiam acerca da natureza tributária das contribuições. E nem poderia ser de outra maneira, diante do que dispõe o artigo 149, da Carta Magna de 1988, “Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, observado o disposto nos artigos 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no artigo 195, § 6º relativamente à contribuições a que alude o dispositivo”. Portanto, as contribuições são, sem sombra de dúvida, tributos, uma vez que devem obedecer ao regime jurídico tributário.


02 – A contribuição ao SAT tem caráter nitidamente tributário. Ela na verdade, está prevista no art. 149, da Carta Suprema. A contribuição ao SAT prevista no artigo 201, I, da Constituição Federal é do tipo de contribuição social para a seguridade social. Deve, portanto, também, ela, obedecer, em tudo e por tudo, ao regime jurídico tributário. (ROQUE ANTONIO CARRAZZA, RDT n.º 70, p.54).


03 – No entender de CELSO RIBEIRO BASTOS, Curso de Direito Constitucional, Saraiva São Paulo, 14ª ed., 1992, p.44, ” .. as normas componentes de um ordenamento jurídico encontram-se dispostas segundo uma hierarquia e formando uma espécie de pirâmide, sendo que a Constituição ocupa o ponto mais alto, o ápice da pirâmide legal, fazendo com que todas as demais normas que lhe vêm abaixo a elas se encontrem subordinadas”.


04 – No caso do SAT, a primeira citação constitucional envolvendo o tema consta do capítulo que trata dos direitos trabalhistas, onde é garantido ao trabalhador um seguro contra acidente do trabalho. Com efeito, a primeira parte do inciso XXVIII do artigo 7° da Carta Magna é clara e contundente no sentido de garantir que todo o empregado tenha um seguro que lhe atenda quando da ocorrência de um acidente do trabalho, ou seja, o empregado é contemplado com um verdadeiro “direito social” consistente no seguro contra acidentes de trabalho.


05 – Já a outra parte do preceito constitucional determina que o seguro contra acidentes do trabalho seja mantido e pago exclusivamente pelo empregador, sem prejuízo de sua responsabilidade cível quanto ao respectivo evento ilícito. Ora, o texto constitucional, ao impor ao empregador o dever de custear um seguro contra acidente de trabalho, na verdade, lhe impõe uma “obrigação tributária” vinculada a um determinado fim e exigível por um dos órgãos da administração pública direta, no caso o Instituto Nacional do Seguro Social.


06 – Ainda para se formar o perfil constitucional da “obrigação tributária” em baila, tem-se o “caput” do artigo 195 da Carta de 1988, onde é estabelecido que o financiamento da seguridade social está a cargo de toda sociedade, aí incluindo os empregadores, consoante primeira parte do inciso I do artigo citado. Entretanto deve restar claro que a “obrigação tributária” oriunda do inciso XXVIII do artigo 7° da Carta Magna tem sua incidência limitada às bases de cálculo exaustivamente arroladas no citado inciso I do artigo 195, sendo eleita, para o caso em tela, a folha de salários, sobre a qual incide um percentual de acordo com o respectivo grau de risco, ou do estabelecimento.


07 – Prosseguindo-se nas citações o Seguro de Acidente do Trabalho – SAT, é reportado no artigo 201 da Constituição Federal, pelo qual o Estado assume o “dever social” de atender e cobrir os acidentes de trabalho. A cobertura dos acidentes de trabalho é expressamente atribuída a Previdência Social, donde é ratificada a afirmativa de que a concessão do respectivo benefício é um “direito social”, financiado pela sociedade para suprir as necessidades dos trabalhadores atingidos por um infortúnio decorrente da prestação de seu labor.


08 – A CF/88, ao conferir, às pessoas políticas, competências tributárias, teve o cuidado de definir todos os contornos, onde o legislador ordinário federal, ao descrever os vários aspectos da norma jurídica instituidora (ou majoradora) e cada tributo, deve observar os parâmetros constitucionais que disciplinam o exercício de sua competência.


09 – Embora o texto constitucional seja expresso e repetitivo no sentido de oferecer ao trabalhador vítima de infortúnio, e durante o período que perdurar a incapacidade para o trabalho, um seguro social, não pode o INSS exigir das empresas uma contribuição que não atenda aos preceitos constitucionais para sua instituição.


10 – Sucede que o dispositivo instituidor do SAT, não estabeleceu o conceito de atividade preponderante, nem de risco de acidente do trabalho leve, médio ou grave, elementos essenciais e necessários para a cobrança da Contribuição. Dessa forma, enquanto não houver lei determinando a abrangência de aludidas expressões, não é possível a exigência da Contribuição Social para o SAT.


A LEI 8. 212/91


11 – A Contribuição Previdenciária para o Seguro Acidente Trabalho – SAT, teve sua sistemática de recolhimento alterada pela Lei n.º 8.212/91, que em seu artigo 22, que revogando a legislação anterior, assim dispõe:


Art. 22 – A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no artigo 23, é de:

I-………………………….

II – para financiamento da complementação das prestações por acidentes de trabalho, dos seguintes percentuais, incidentes sobre (…………….) :

a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.

§ 3º – O Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá alterar, com base nas estatísticas de acidente do trabalho, apuradas em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição a que se refere o inciso II deste artigo, a fim de estimular investimentos em prevenção de acidentes.

12 . A Lei n° 8.212/91 cuidou da base de cálculo da contribuição social do SAT, bem como estabeleceu as alíquotas progressivas já mencionadas, omitindo-se, contudo, quanto à classificação das atividades econômicas a serem categorizadas em patamares de riscos acidentários, previamente adjetivados em leves, médios e graves. Enfim, o legislador deixou de dizer quais são as atividades consideradas de risco leve e sujeitas à alíquota de 1%, o mesmo ocorrendo com as reputadas como de risco médio e passíveis da percentagem de 2% e as de risco grave susceptíveis à tributação de 3%.

13 – O legislador não preencheu a integralidade do critério quantitativo da norma matriz de tributação, abrindo espaço, por conseguinte, a que o Executivo editasse o respectivo Decreto com o objetivo de implementar o ponto lacunoso contido na lei em comento. A tributação está sujeita ao princípio da legalidade, a teor do artigo 5º da CF/88, segundo o qual ninguém está obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

14 – Pelas normas constitucionais vigentes, o Poder Tributante está impedido de exigir ou

aumentar tributos sem a devida previsão em lei. O CTN, no artigo 97, dispõe:

I- a instituição de tributos, ou a sua extinção;

II – a majoração de tributos a sua redução, ressalvado o disposto no arts. 21,26.39, 57 e 65;

III – a definição do fato gerador da obrigação principal, ressalvado o disposto no inc. I, § 3º, do art. 52, e do seu sujeito passivo;

IV – as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa de redução de penalidades.


15 – Na lição de Alberto Xavier, citado na Revista Dialética de Direito Tributário n.º 32, pág. 53, por Marcelo de Aguiar Coimbra:

“coloca-nos perante a necessidade de uma lex stricta: a lei deve conter em si mesma todos os elementos da decisão no caso concreto, de tal modo que não apenas o fim, mas também o conteúdo daquela decisão sejam por ela diretamente fornecidos. A decisão do caso concreto obtém-se, assim, por mera decisão a subsumir o fato na norma, independentemente de qualquer livre valoração pessoal”.

16 – Afrontando disposição do CTN, a legislação instituidora da nova sistemática de recolhimento da Contribuição para o SAT (Lei 8.212/91) não definiu exaustivamente elementos necessários para a cobrança do tributo – atividade preponderante, risco leve, médio e grave introduzindo, portanto, tipo aberto.

17 – Deveras, o legislador in casu utilizou-se de tipo aberto, que apenas descreve, isto é, faz uma enumeração não exaustiva de suas notas características, utilizando-se para tanto de termos em branco. A tipicidade no Direito Tributário, assim como no Direito Penal, é rígida, cerrada, não sendo lícita a utilização de tipo aberto, impondo-se o emprego de um tipo oposto – o tipo cerrado -, que define de modo exaustivo seus elementos e notas características. Nesse sentido os ensinamentos de Yoshiaki Ichihara, Princípio da Legalidade Tributária na CF/88, Atlas, 1995, p.92 e Yonne Dolacio de Oliveira, Curso de Direito Tributário, Cejup, v.1, 2ª ed.1.993, p.141.

18 – No dizer sempre expressivo de Carlos Mário da Silva Velloso, insigne Ministro do Supremo Tribunal Federal, citado na Revista Dialética n.º 32, p.54 “… a Constituição (art. 6°, parágrafo único; art. 81, 111; art. 153, §2°) impede que o Executivo estabeleça, por fora ou para além das leis, direito ou muito menos obrigações aos indivíduos’, certo que nenhuma restrição à liberdade ou à propriedade pode ser imposta se não estiver previamente delineada, configurada e estabelecida em alguma lei”. (Temas de Direito Público, Belo Horizonte, Del Rey, 1993, p.432).

19 – A estrita legalidade exige tão somente que a função legislativa descreva a norma matriz tributária, pormenorizando em sua plenitude todos os seus elementos, sendo vedado, pois, ao legislador, delegar poderes legiferantes ao Executivo no sentido de normatizar sobre parcela do critério quantitativo, a exemplo do caso em tela. Como sabido e ressabido, aliás, o primado da estrita legalidade ocupa um lugar de incontendível magnitude na graduação de riscos não uniformes. Nesse sentido, também, são os termos da Orientação Normativa n° 2, de 21/08/97.

20 – Assim, não tendo o legislador, ao descrever o tipo legal da contribuição para o SAT, delimitado em contornos precisos os termos “atividade preponderante”, “risco leve”, “médio” ou “grave”, a fim de que seja possível a exigência da Contribuição para o SAT, há a necessidade da edição de lei tornando o tipo em tela fechado. Assim, a norma tributária contida no artigo 22, da Lei 8.212/91, carece ser aperfeiçoada, o que deve ser feito com a agregação, em nova lei (nunca em decreto), dos elementos que nela faltam, concernente às alíquotas.

 

DA IMPOSSIBILIDADE DO PODER EXECUTIVO SUPRIR A OMISSÃO EXISTENTE NA LEI POR DECRETO

21 – Em face da omissão do art. 22 da Lei 8.212/91, foi editado o Decreto n° 612/92, identificando no § 1º o alcance do termo “atividade preponderante”:

Art. 26. A contribuição da empresa, destinada ao financiamento da complementação das prestações por acidente do trabalho, corresponde à aplicação dos seguintes percentuais incidentes sobre o total da remuneração paga ou creditada a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e médicos – residentes:

I – 1 % (um por cento) para a empresa em cuja atividade preponderante o risco de acidente do trabalho seja considerado leve;

II – 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

III – 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.

§1° – Considera-se preponderante a atividade econômica que ocupa, em cada estabelecimento da empresa, o maior número de empregados, trabalhadores avulsos e médicos-residentes.§2° – Considera-se estabelecimento da empresa a dependência, matriz ou filial, que possui número de CGC próprio, bem como a obra de construção civil executada sob sua responsabilidade.

22 – Posteriormente, foi editado o Decreto n.º 2.173, de 05 de março de 1.997, regulamentando a Lei 8.212/91 e alterando o conceito de atividade preponderante, ao determinar que:

Art. 26 – A contribuição da empresa, destinada ao financiamento dos benefícios concedidos em razão de maior incidência de incapacidade laborativa decorrentes de riscos ambientais do trabalho corresponde à aplicação dos seguintes percentuais, incidentes sobre o total da remuneração paga ou creditada a qualquer título, no decorrer do mês, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e médicos – residentes:

I- um por cento para a empresa em cuja atividade preponderante o risco de acidente do trabalho seja considerado leve;

II- dois por cento para a empresa em cuja atividade preponderante o risco de acidente do trabalho seja considerado médio;

III- três por cento para a empresa em cuja atividade preponderante o risco de acidente de trabalho seja considerado grave.

§ 1º – Considera-se preponderante a atividade que ocupa na empresa, o maior número de segurados empregados, trabalhadores avulsos e médicos – residentes.
……………………….

§ 3º – O enquadramento no correspondente grau de risco é de responsabilidade da empresa, observada a sua atividade econômica preponderante e será feito mensalmente, cabendo ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS rever o auto – enquadramento em qualquer tempo.

§ 4º – Verificado erro no auto – enquadramento, o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS adotará as medidas necessárias à sua correção, orientando o responsável pela empresa em caso de recolhimento indevido e procedendo à notificação de valores devidos.

Obs.: Percebe-se que os artigos 26 e 27 do Decreto 612/92 (revogado), assim como do Decreto n.º 2.173/97 (em vigor), foram afinados no mesmo diapasão.


23 – A lei que cria qualquer tributo deve descrever, pormenorizadamente, todos os elementos essenciais da norma jurídica tributária (hipótese de incidência, sujeito ativo, sujeito passivo, base de cálculo e alíquotas). Esta é uma exigência incontornável do princípio da tipicidade tributária fechada. Quando a norma tributária é incompleta, vale dizer, não descreve de modo exaustivo, o tipo tributário, a exação não poderá ser exigida. É o que podemos chamar de insuficiência da norma jurídica tributária, que impede o surgimento do tributo. Neste sentido, a norma tributária contida no art. 22, da Lei 8.212/91, carece de ser aperfeiçoada, o que só será feita com agregação, em nova lei (nunca em decreto), dos elementos que nela faltam, concernentes à alíquota. (ROQUE ANTONIO CARRAZZA, RDT n.º 70, p.66).

24 – Ocorre que, sendo a lei omissa quanto aos elementos necessários à cobrança do tributo – no caso, quanto à identificação da atividade preponderante, risco leve, médio e grave – não cabe ao Poder Executivo, por intermédio da edição de decreto (612/92 e 2.173/97) suprir a lacuna legal existente na Lei 8.212/91. Com efeito, não há a possibilidade em ordenamento vigente de se editar regulamentos autônomos. O Direito Constitucional brasileiro apenas acolhe a figura do regulamento de execução, onde tão somente a lei pode inovar originariamente na ordem jurídica.

25 – Os regulamentos são atos administrativos, postos em vigência por decreto, para especificar os mandamentos da lei, ou prover situações ainda não disciplinadas por lei. O regulamento, embora não possa modificar a lei, deve evidenciar e tornar explicito tudo aquilo que a lei encerra. Assim, se uma faculdade ou atribuição está implícita ao texto legal, o regulamento não exorbitará, se lhe der forma articulada e explicita. (HELY LOPES MEIRELLES, Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Revistas dos Tribunais, 16ª ed., p.157)

26 – Nesse sentido, destacando a impossibilidade do administrador exercer a função integrativa da lei, vale assinalar o magistério de SACHA CALMON NAVARRO COELHO (Comentário à Constituição de 1988, Sistema Tributário, RJ, Forense, 4ª ed., 1992, p.285):

“Se a lei for omissa ou obscura ou antitética em quaisquer desses pontos, descabe ao administrador (que aplica a lei de ofício) e ao juiz (que aplica a lei contenciosamente) integrarem a lei, suprindo a lacuna por analogia ou interpretação extensiva”.

27 – Pois bem, como já citado, em decorrência do princípio da estrita legalidade, tão-somente a lei tem a aptidão de fixar os elementos da hipótese de incidência, e, não sendo essa exaustiva, não tem o decreto o condão de exercer tal mister, havendo a necessidade da edição de lei para tanto. O decreto não pode criar obrigações não previstas em lei, nem pode contrariar o texto expresso da lei. O decreto que contraria a lei ou cria obrigações nela não previstas, é inválido.

28 – Nessa linha de raciocínio, ALBERTO XAVIER, Revista de Direito Tributário, n.º 41, pp. 123-124) salienta a impossibilidade do decreto tratar dos elementos essenciais dos tributos:

“Afora estes precisos casos a alíquota e a base de cálculo dos demais tributos só podem ser determinados por lei e o decreto não pode atuar dentro do campo dos elementos essenciais dos tributos”.

29 – Com efeito, é da essência do Estado de Direito o primado da legalidade. Ao tempo em que alerta para os diversos perfis que o princípio da legalidade assume nos vários países, conformado que é pelo Direito Constitucional positivo de cada qual, CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (afirma que, no Brasil, todos os administradores públicos, do Presidente da República ao seu mais modesto subordinado, só podem ser “dóceis, reverentes, obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no direito brasileiro”. Aduz ainda o Autor (Curso de Direito Administrativo, São Paulo, Malheiros Editores, 1995, 6ª ed., pág. 48/49):

“No Brasil, o princípio da legalidade, além de assentar-se na própria estrutura do Estado de Direito e, pois, do sistema constitucional como um todo, está radicado especificamente nos arts. 5º, II, 37 e 84, IV. Estes dispositivos atribuem ao princípio em causa uma compostura muito estrita e rigorosa, não deixando válvula para que o Executivo se evada de seus grilhões. É, aliás, o que convém a um país de tão acentuada tradição autocrática, despótica, na qual o Poder Executivo, abertamente através de expedientes pueris – cuja pretensa juridicidade não iludiria sequer a um principiante – viola de modo sistemático direitos e liberdades públicas e tripudia à vontade sobre a repartição de poderes”.

30 – O sistema constitucional brasileiro não admite o regulamento independente ou autônomo, porque se prevê que seja expedido, na forma da lei, fica pois sujeito a uma reserva relativa de lei. Não é poder legislativo. Não pode, pois, criar normatividade, que inove a ordem jurídica. Ultrapassar esses limites importa em abuso de poder, em usurpação de competência, tornando írrito o regulamento dele proveniente. (JOSÉ AFONSO DA SILVA, Curso de Direito Constitucional, 5ª ed. SP, RT, 1989, p.367, citado na Revista Dialética, n.º 32, p. 58)

31 – Os regulamentos são atos administrativos destinados a dar condições de aplicabilidade à lei, explicitando-lhe as minudências. Não podem ampliar ou restringir os direitos e deveres nela estabelecidos, nem regular além do que ela própria fez. Nas palavras de HUGO DE BRITO MACHADO ” no que permite à instituição de tributos, pode-se afirmar que o principio da legalidade não admite exceção alguma. Todo e qualquer tributo há de ser instituído por lei.” (Os Princípios Jurídicos da Tributação da Constituição de 1988, RT, 1989, p. 38). ROQUE ANTONIO CARRAZZA é da mesma opinião (O Regulamento no Direito Tributário Brasileiro, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1981, pág. 103):

32 – Assim, é corolário natural de tudo o que predicamos que nenhum regulamento, no Brasil, pode modificar ou ab-rogar qualquer lei tributária. Nem, tampouco, suspender ou adiar a execução da mesma.

33 – Demais disso, lhe é proibido estabelecer normas tributárias ou prescrições concernentes a matérias que só devem ser reguladas pela Carta Magna ou que importem no exercício de funções privativas do legislador. Segue-se do considerado que o regulamento, entre nós, não pode invadir os domínios constitucionalmente reservados ao legislador, o que, de resto, reafirma o princípio da superioridade da lei e da Constituição.

34 – Isto nos reconduz à premissa inicial de que o regulamento não inova originalmente na ordem jurídica, isto é, não cria nem direitos, nem obrigações. Destarte, em matéria tributária, lhe é defeso prever tributos, descrever infrações e impor quaisquer encargos que possam vir a repercutir na liberdade ou patrimônio das pessoas.

35 – Muito embora a questão já estivesse regulamentada anteriormente através do Decreto 612/92, o ponto fundamental é que a modificação do critério adotado para determinar o grau de risco da empresa, em lugar do estabelecimento, acabou aumentando a contribuição previdenciária do SAT, e isto só poderia ser efetuado através de Lei e não por decreto. Esse é o entendimento exarado no Parecer CJ n.º 935, de 04.08.97, da Consultoria Jurídica do Min. Previdência e Assistência Social, DOU de 22.09.97, onde o eminente Consultor Tributário, em brilhante, fundamentado e conclusivo parecer, sobre matéria análoga e totalmente aplicável às espécie aqui tratada, assevera:

“Não tendo o legislador escolhido estas condições especiais acima enumeradas não é lícito ao regulamento detalhá-las ou regulamentá-las” ……(g.n.)

36 – A inteligência restritiva do poder regulamentar é da tradição de nossas instituições, estando já assente na obra de PIMENTA BUENO, o grande nome do Direito do Brasil Império (Direito Público Brasileiro e Análise da Constituição do Império, Rio de Janeiro, 1857, § 326, pág. 237, apud ROQUE ANTONIO CARRAZZA, op.cit.pág. 105).

“Do princípio incontestável que o poder executivo tem por atribuição executar, e não fazer a lei, nem de maneira alguma alterá-la, segue-se evidentemente que cometeria grave abuso em qualquer das hipóteses seguintes:

1º. Em criar direitos ou obrigações novos, não estabelecidos pela lei, porquanto seria uma inovação exorbitante de suas atribuições, uma usurpação do poder legislativo, que só pudera ser tolerada por câmaras desmoralizadas. Se assim não fora, poderia o governo criar impostos, penas ou deveres, que a lei não estabeleceu, teríamos dois legisladores, e o sistema constitucional seria uma verdadeira ilusão.

2º. Em ampliar, restringir ou modificar direitos ou obrigações, porquanto a faculdade lhe foi dada para que fizesse observar fielmente a lei, e não para introduzir mudança ou alteração alguma nela, para manter os direitos e obrigações como foram estabelecidos, e não para acrescentá-los ou diminuí-los, para obedecer ao legislador e não para sobrepor-se a ele.

3º. Em ordenar ou proibir o que ela não ordena, ou não proíbe, porquanto, dar-se-ia abuso igual ao que já notamos no antecedente número primeiro. E demais, o governo não tem autoridade alguma para suprir, por meio regulamentar, as lacunas da lei, e mormente do direito privado, pois que estas entidades não são simples detalhes, ou meios de execução. Se a matéria como princípio é objeto da lei, deve ser reservada ao legislador; se não é, então não há lacuna na lei, sim objeto de detalhe de execução.

4º. Em facultar, ou proibir, diversamente do que a lei estabelece, porquanto deixaria esta de ser qual fora decretada, passaria a ser diferente, quando a obrigação do governo é de ser em tudo e por tudo fiel e submisso à lei. “

37 – Além de ferir o princípio da legalidade, as novas determinações acabam também por ferir o princípio da capacidade contributiva das empresas, na medida em que acaba impondo a taxa de risco mais grave sobre remuneração de empregado que não estão sujeitos ao grau de risco mais grave.

38 – Sem dúvida alguma, a lei deve esgotar os elementos necessários à identificação do fato gerador da obrigação tributária e à quantificação do tributo, sem que restem à autoridade poderes para, discricionariamente, conforme entender conveniente ou oportuno, estabelecer algum dado faltante. Entretanto, o art. 22 da Lei 8.212/91, ao definir o tipo legal da contribuição para o SAT, em vez de fixar objetivamente o conceito de atividade preponderante, risco leve, médio ou grave, acabou por conferir poderes à autoridade administrativa para, discricionariamente, exercer tal função.

39 – A utilização de decreto para fixação e definição de alíquotas revela-se contrária à Carta Magna atual, já que dela resulta ofensa ao fundamental princípio da legalidade. No caso do SAT, a legislação de regência recebeu sua delegação diretamente da Constituição Federal, não podendo retransmitir a ordem constitucional através de nova delegação, a se corporificar nas vias de Decreto.


DA AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DOS ESTABELECIMENTOS

40 – Como assevera Achiles Augustus Cavallo, a “expressão” empresa, empregada no Decreto n° 2.173/97 como forma de justificar a sutil alteração da sistemática de apuração do percentual do Seguro de Acidente de Trabalho, qual seja, calculada de acordo com o grau de risco de cada estabelecimento sem a utilização de um grau de risco genérico e desvinculado do efetivo risco das diversas e efetivas atividades do contribuinte, é completamente inconstitucional e ilegal. Com efeito, não deve ser interpretada literalmente, visto que o contexto constitucional onde a mesma está inserida leva o intérprete à conclusão de que tal locução é imprecisa e imprópria para definir o alcance da incidência previdenciária, mormente nos casos onde a empresa possui estabelecimentos diversos com variados graus de risco. (obra citada, p.11).

41 – Como anteriormente demonstrado, para a contribuição do SAT, o legislador regulamentar só poderia utilizar a expressão “empresa ” como forma de indicar a situação específica da unidade individualizada do empregador/contribuinte, de acordo com a condição de trabalho desenvolvida em cada compartimento (departamento) físico da empresa, preservando as peculiaridades existentes entre os diversos estabelecimentos do mesmo contribuinte, no que tange ao grau de risco.

42 – O INSS, que acaba de publicar a Ordem de Serviço n.º 190, de 17.08.98, visando estabelecer normas centralizadas de fiscalização, define o conceito de estabelecimento, como sendo uma unidade da empresa, sujeito à inscrição no CNPJ:

1 – Estabelecimento: é uma unidade ou dependência integrante da estrutura organizacional sujeita à inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ ou Cadastro Específico do INSS – CEI, onde a empresa desenvolve suas atividades, para fins de direito e de fato, assim caracterizado no âmbito previdenciário.

43 – Note-se que para a fiscalização centralizada nas empresas, a OS n.º 190/98 admiti a figura do estabelecimento na empresa. Para fins de recolhimento do SAT – Seguro Acidente do Trabalho, o mesmo INSS não admite a figura do estabelecimento na empresa. Admite apenas a atividade da empresa como um todo.

44 – Ora, como já demonstrado, o intento do legislador é reparar um dano em potencial oriundo do trabalho desenvolvido pelo empregado, mediante o oferecimento de um seguro com prêmio calculado de acordo com as condições ambientais do local de trabalho onde o empregado está lotado. Dessa forma, clara a conclusão de que as condições ambientais de trabalho somente são apuradas e conhecidas com a verificação do local onde o mesmo está efetivamente lotado, ou seja, deve-se perquirir qual a graduação de risco oferecida pelo local de trabalho do empregado, o que, como lógico, determina uma averiguação individualizada de cada estabelecimento do empregador.

45 – Ainda na esteira desse raciocínio, tem-se a segunda parte do inciso II do artigo 127 do Código Tributário Nacional, que atribuiu como domicílio tributário do contribuinte o local de cada estabelecimento “… em relação aos atos ou fatos que deram origem à obrigação …”. Ora, sendo cada estabelecimento considerado domicílio tributário das obrigações por ele gerado, clara e óbvia a conclusão de que os respectivos encargos deverão levar em consideração a situação específica e peculiar ali ocorrida, não havendo espaço, portanto, para generalizações de qualquer ordem.

46 – Com efeito, a disposição da lei complementar acima citada, ratifica o entendimento de que o Adicional do Seguro de Acidente do Trabalho – SAT deverá ser recolhido com base no grau de risco de cada estabelecimento da empresa, de acordo com a peculiaridade de sua atividade e riscos colocados a seus funcionários.


DAS ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS

47- Com fundamento na regulamentação anterior, procurando adequar as diferentes atividades de uma mesma empresa, determinou-se através dos parágrafos 1º e 2º do artigo 26 do Decreto n.º 612/92, DOU de 22/7/92, que a atividade preponderante era a que ocupava, em cada estabelecimento da empresa, o maior número de segurados empregados. O mencionado parágrafo 2º determinava, ainda, que podia ser considerada como estabelecimento da empresa a dependência, matriz ou filial, com CNPJ próprios.

48 – As empresas, com base no mencionado dispositivo, contribuíam ao SAT, em cada um deles (C.N.P.J.), com a taxa de risco mais adequada, segundo atividade que era desenvolvida em cada estabelecimento. Nos estabelecimentos fabris, onde o grau de risco é maior, o percentual da contribuição era maior do que nos estabelecimentos comerciais ou administrativos, onde a taxa de risco era leve. Cabe lembrar, que a jurisprudência era pacífica em reconhecer o risco por estabelecimento, independentemente de ter, o estabelecimento, CNPJ próprio.

49 – Com a alteração introduzida, os mencionados parágrafos 1º e 2º do Decreto 612/92, foram modificados pelo artigo 26 do Decreto 2.173/97, passando a ser considerada como preponderante a atividade econômica que ocupa na empresa, e não mais no estabelecimento, o maior número de segurados empregados. Dessa forma, todos os empregados de uma empresa, independentemente do local onde trabalham, passaram a pertencer a um grupo de risco a que pertencer a atividade exercida pelo maior número de empregados da empresa.

50 – Assim, na hipótese de a empresa possuir o maior número de empregados sujeitos à taxa de risco mais alta, de 3%, esta passará a incidir também sobre a remuneração daqueles empregados que antes estavam sujeitos à taxa de 1%, como é o caso dos funcionários dos setores administrativos. Mesmo quando os funcionários, não ligados diretamente à área de risco mais grave, ocuparem outro estabelecimento da empresa, ainda que em outro endereço, onde não há o risco grave, pela nova regulamentação, a taxa do SAT será sempre a que ocupar o maio número de empregados na empresa.

51 – Da leitura do novo permissivo, depreende-se que, a fixação da alíquota observa a chamada atividade preponderante desenvolvida pela empresa, ignorando-se as atividades de cada um de seus setores distintamente, que, por óbvio, têm diferentes graus de riscos. Com base na graduação de risco permite-se a variação da alíquota entre empresas, mas não entre os diversos departamentos de uma mesma empresa, impedindo-se a incidência de mais de uma alíquota sobre uma mesma folha de salários.

52 – Tal sistemática, como já mostrado, é flagrantemente contrária aos preceitos delineados pela Constituição Federal de 1988, por utilizar de decreto para fixação e definição de alíquotas, já que dela resulta ofensa fundamental ao princípio da legalidade. O principio da legalidade, sustentáculo das garantias individuais dos cidadãos no estado democrático de Direito, possui vasta proteção, doutrinária e jurisprudencial. Nesse sentido, a CF/88 e o CTN, dedicam especial atenção à matéria, ante palavras do inciso I do artigo 150 e do inciso I do artigo 9º.

53 – Mais uma vez, nos ensinamentos do mestre ROQUE ANTONIO CARRAZZA, RDT n.º 70, pág. 71: ” Evidentemente, as omissões legislativas, maxime em matéria tributária, não podem ser supridas, nem pelo Poder Judiciário, nem, muito menos, pelo Poder Executivo, ao qual compete, apenas, cumprir rigorosamente a lei. Elas só podem ser supridas pelo próprio Poder Legislativo. Enquanto o Legislativo não completar sua tarefa, apontando todos os elementos essenciais da norma jurídica tributária, tanto melhor para o contribuinte, que não poderá se validamente compelido a pagar o tributo, simplesmente porque a exação ainda não existe no plano abstrato (primário), não podendo, pois, nascer, no plano concreto (secundário).”

54 – Para confirmar a irracionalidade do critério adotado pelo regulamento, bem como a sua incompatibilidade com a lei, uma empresa, apesar de sua atividade econômica preponderante se enquadrar no grau de risco mais grave (3%), poderá contribuir ao SAT pela taxa de risco leve (1%), única e exclusivamente por possuir um maior número de empregados nos setores administrativos, comerciais, etc. A hipótese poderá parecer absurda mas, nos dias atuais, de grande automação e crescimento tecnológico, sabe-se da existência de muitas empresas que assim se enquadram.

55 – Além do mais, o mencionado art. 26 faz referência a incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho. Ora, o texto é muito claro quando se refere aos riscos eminentes ao ambiente de trabalho. Como ambiente de trabalho deve-se entender o local onde é realizado o trabalho e, portanto, o local onde há maior ou menor incidência de riscos de acidentes. Em outras palavras, a lei determina, simplesmente, que as atividades com maior risco de acidentes fiquem sujeitas a uma taxa maior, e as atividades de menor risco à taxa menor.

56 – Assim, obrigar o pagamento da contribuição ao SAT pela maior taxa (3%), sobre a remuneração de empregados que nada têm a ver com o local onde são realizadas tarefas de maior risco não encontra amparo na Lei. Em outras palavras, a Lei determina simplesmente, que as atividades com maior risco de acidentes fiquem sujeitas a uma taxa maior, e as atividades de menor risco à uma taxa menor, nada mais.

57 – Ademais, as empresas são organizações técno-econômica que se pressupõe a produzir, comprar e vender. E, para satisfazer as exigências societárias, fiscais, trabalhistas, previdenciárias e de mercado, mantém escritórios que não exploram qualquer ramo de negócio, ao revés, apenas mantém contato com agentes externos. É inadmissível cobrar desses funcionários uma taxa de risco grave (3%), quando deveria ser de 1% (risco leve). A própria lei citada classifica tais estabelecimentos como de risco leve.

58 – O Decreto regulamentar que fixa a Contribuição ao S.A.T não encontra fundamento de validade intrínseco ou extrínseco na Constituição Federal de 1988, haja vista o fato de que seu conteúdo normativo não guarda qualquer congruência com os princípios, regras e valores que informam a Ordem Constitucional. Neste sentido é de que a definição do percentual (alíquota) a incidir sobre o substrato econômico da tributação (base de cálculo) se encontra definida em Decreto, prática esta repudiada no atual sistema constitucional de tributação, a se reger pelo princípio da legalidade.

59 – A Contribuição ao S.A.T., a partir do momento que delega a decreto a fixação das alíquotas incidentes sobre atividades, ofende, além dos incisos I dos artigos 150 da Lei Maior e 9º do Código Tributário Nacional, também o inciso IV do artigo 97 do mesmo Código, razão pela qual padece, igualmente, do vício da ilegalidade.

60- Abraçando esse entendimento, o STF, em voto do Ministro Carlos Velloso, “decidiu que todas as contribuições sociais estão sujeitas, integralmente, ao princípio da legalidade, inclusive no que toca à alteração das alíquotas e das bases de cálculo.” (RTJ 143/320). O STJ assentou entendimento no tocante à ofensa, conforme se verifica: ” Base de cálculo – Pauta fiscais – CTN (art. 97) – A fixação de base de cálculo para o IPI deve resultar de dispositivo legal. O sistema tributário brasileiro não admite delegação de competência, para esse fim. O Decreto – Lei 1593/97, outorgando competência ao Ministro da Fazenda para fixar pauta fiscal, é incompatível com a reserva legal explicitada no art. 97 do CTN ” (STJ Resp . 24.861-2/CE, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 1ª Turma, Decisão: 15/12/93, DJ 21/02/94, p. 2124) (Apud CTN Interpretado, TRF 1ª Região, Saraiva 1995, p. 75)

61 – A delegação inconstitucional e ilegal de competência já é há muito repudiada pelo Direito, corporificada na máxima “delegatur delegare nom potest”, ou seja, não se pode delegar aquilo que se recebeu por delegação. Na hipótese, a legislação de regência da Contribuição ao S.A.T. recebeu sua delegação diretamente da Constituição Federal, não podendo retransmitir a ordem constitucional através de nova delegação, a se corporificar nas vias de Decreto. Admitindo-se tamanha injurisdicidade, haveria quem defendesse a possibilidade deste mesmo decreto delegar a novo diploma a fixação de alíquotas da contribuição, desta feita através de Portaria, um absurdo… (João Caetano Muzzi Filho (IOB Jurisprudência, 23/97)

62 – Conclui-se com as palavras de Wladimir Novaes Martinez, ao comentar não só a legislação de regência da Contribuição ao S.A.T., como também a força atribuída aos decretos regulamentadores na definição das alíquotas que a alíquota do seguro de acidente do trabalho é precariamente disciplinada no PCPS, atribuindo parcela questionável de poder ao RCPS. A mesma dificuldade via-se no art. 173 da CLPS. O assunto é tratado nos arts. 26/27 do Decreto n° 612/92, onde sua competência padece de ilegalidades.” (Comentários à Lei da Previdência Social, LTr, 2ª edição, p. 140).

63 – A Lei, e somente esta, deve traçar os aspectos definidores da obrigação tributária, dentre estes as alíquotas aplicáveis a cada hipótese, caso contrário ofendido restará o princípio da legalidade, como ocorre na hipótese, entendimento contrário, seria o mesmo que validar a cobrança de ISS, de serviço não constante da lista contida na Lei Complementar 56/87, editando-se para tanto simples decreto regulamentar. Prática vedada, e mais, repudiada pelo Direito.

64 – Ora, os funcionários que trabalham no processo produtivo estão, certamente, bem mais expostos a riscos de acidentes de trabalho se comparados com aqueles que desempenham trabalhos meramente administrativos, entendidos estes, como atividade burocrática de escritório e congêneres, alheios a qualquer tipo de risco mais relevante. Não é juridicamente lógica, pois, a adoção de uma mesma alíquota para ambos os “departamentos” pelo simples fato de que as pessoas que neles estão acham-se em condições diversas, sujeitas a riscos também diversos.

65 – A segurança de seus empregados varia de departamento para departamento segundo a própria natureza do trabalho ali desenvolvido. A não – diferenciação dos riscos entre cada um dos departamentos, sem considerar suas particularidades, suprime o caráter dimensível da contribuição, viciando sua exigência. Deverá a alíquota, então, refletir o risco atribuído a cada departamento, espelhando-se a real despesa que o funcionário que ali labora possa vir a gerar em desfavor do Estado em decorrência de acidentes sofridos.

66 – Fácil perceber que a possibilidade do Estado ter que acudir um empregado em caso de acidente de trabalho é diretamente proporcional aos riscos da atividade por este desenvolvida em seu dia-a-dia. Maior o risco, maior também será o valor garantidor necessário para fazer frente ao eventual benefício, decorrendo daí, com fulcro na proporcionalidade da contribuição social, a inafastável necessidade de variação da alíquota entre os departamentos da empresa, desde que os graus de risco destes departamentos sejam discrepantes.

67 – Além do mencionado artigo 26, a proporcionalidade da contribuição é também admitida pelo artigo 27 do Decreto n° 2.173/97, que expressamente prevê a possibilidade de redução da alíquota caso o contribuinte possa comprovar investimentos em prevenção em sistemas gerenciais de risco que impactem positivamente na redução dos agravos à saúde no trabalho. O que se verifica aqui nada mais é que o reconhecimento da necessidade de se reconhecimento da necessidade de se procurar atingir melhor compatibilização possível do risco, da alíquota e do benefício.

68- E como se não bastasse as transparentes disposições dos artigos 26 e 27, o Anexo ao Decreto em questão, ao trazer a “Relação Atividades Preponderantes e Correspondentes Graus de Risco”, reconhece o diminuto risco acidentário das atividades administrativas se comparadas com aquelas industriais, fixando a alíquota de contribuição em 1% para sedes de empresas e unidades administrativas locais (item 74.1 5-2).

69- Ressalte-se que ainda que afastada a natureza tributária da exação, mesmo como uma obrigação constitucional esdrúxula ou mero seguro, a respectiva proporcionalidade não desaparece, porque exigida não só pela Constituição, mas também pelo Direito Privado. Em se tratando de seguro, o pressuposto é exatamente o custo, ou melhor, o risco da atividade exercida pelo empregado e a respectiva e proporcional indenização a ser paga diante de possível sinistro.

70 – Assim, a Contribuição ao S.A.T., como qualquer seguro, no sentido exclusivo e condições relativas ao Direito Privado, é a forma jurídica destinada a satisfazer a necessidade econômico- social de transferência de risco (“Enciclopédia Saraiva de Direito”, Editora Saraiva, Vol. 67, Pág. 322). Ora, se a lei estabeleceu os diversos níveis de risco a partir de um estudo, necessariamente a contribuição ou o prêmio (taxa de seguro) deve respeitar individualmente a possibilidade de perda que a atividade do segurado pode representar e ao benefício que o segurador (Governo) pretende dar (gastar) com o segurado (empregado) na hipótese de algum acidente.

71 – Por fim, e para se atender à objetividade recomendada, o Decreto n° 2.173/97 se revela alheio ao princípio constitucional da isonomia inserido no artigo 150, inciso II, do Texto de 1988, segundo o qual aqueles que se encontram em situações desiguais devem receber tratamento também desigual na proporção de sua desigualdade, na célebre lição de Rui Barbosa.

72 – Revela-se, pelas razões elencadas, que a atual sistemática de cálculo da Contribuição ao SAT discrepa dos comandos da Constituição Federal ao não guardar proporcionalidade entre o custeio e o respectivo benefício, sendo inerente ao próprio instituto a incidência de alíquotas diferenciadas em atividades com graus de riscos igualmente diferenciados.


DAS CONCLUSÕES

1 – A contribuição em questão tem sua base constitucional apoiada no art. 7º, inciso XXVIII, art. 195, inciso I e art. 201, inciso I, todas da Carta Magna, que garantem aos empregados um seguro contra acidente de trabalho, às expensas do empregador, mediante o pagamento de um adicional sobre a folha de salários, cabendo à Previdência Social a respectiva administração.

2 – Ainda, encontra-se legalmente previsto no art. 22, da Lei n.º 8.213/91, cuja redação é a seguinte:

Art.22 . A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:

II – para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente de riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos (inciso II, do artigo 22, da Lei n.º 8.212/91, alterado pela Lei n.º 9.732):

“a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

b) 2% (dois por centro) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;

c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave”. (grifos nossos)

3 – Entretanto, a referida lei não estabeleceu o conceito de “atividade preponderante”, nem, tampouco, os conceitos de risco de acidente de trabalho “leve”, “médio” e “grave”. Tais conceitos são fundamentais para conferir exigibilidade à exação, tendo sido estabelecidos por meio do Decreto 612/92, revogado pelo 2.173, publicado no D.O.U. de 06.03.97.

4 – Ocorre que, tendo natureza claramente tributária, forçoso é obedecer o princípio da legalidade para dar conformidade constitucional à exigência do SAT.

Com efeito, reza o artigo 150, I, da CF/88:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;” (grifo nosso)

Da mesma forma, O Código Tributário Nacional ratifica este entendimento nos seguintes artigos:

“Art. 9º. É vedado à União, aos Estados e aos Municípios:

I- instituir ou majorar tributos sem que a lei o estabeleça, ressalvado, quanto à majoração, o disposto nos arts. 21, 26 e 65;

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:

IV- a fixação de alíquota do tributo e de sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos arts. 21, 26, 39, 57 e 65;” (grifos nosso)

5 – Tanto o Decreto 612/92, como o 2.173/97, nos termos acima aduzidos, padecem do vício de inconstitucionalidade, por não serem leis, e tratarem de matéria de competência de lei.

6 – O Dr. Wellington Mendes de Almeida, DD. Juiz Federal da 4ª Vara dessa Capital, manifestou interessante entendimento, do qual extrai-se o seguinte acerto:

“Em síntese, as contribuições sociais são verdadeiros tributos, e terão vigência e aplicação se em sua instituição, lançamento e modo de cobrança respeitarem o regime tributário previsto na Constituição.

Cumpre ressaltar que na hipótese em apreço, a alíquota a incidir sobre a base de cálculo se encontra definida em decreto, o que é taxativamente vedado pela Constituição.

Assim sendo, a contribuição cobrada pelo INSS, em decorrência da sua atividade fiscalizatória, é tributo, concluindo-se pela necessidade de observância ao regime jurídico tributário e aos princípios a ele inerentes. Consequentemente, essencial é, para sua exigência, a previsão em lei, tendo em vista a regra do art. 150, I, da CF, que consagra o princípio da legalidade.

Porque inexiste lei que preveja a contribuição em questão com a definição de todos os aspectos de sua hipótese de incidência, alíquota, a exigência é ilegítima.” (Autos de Mandado de Segurança n.º 98.0011511-0).

7 – Porquanto, tal situação viola o próprio princípio constitucional da estrita legalidade. Tal princípio exige que tão somente o legislador descreva a norma matriz tributária, pormenorizando em sua plenitude todos os seus elementos, sendo vedado, pois, ao legislador, delegar poderes legiferantes ao Executivo no sentido de normatizar sobre parcela do critério quantitativo (aspecto valorativo do fato gerador), como no caso sob exame.

8 – Há, ainda a violação ao princípio da tipicidade, já que a incidência não recai sobre um fato típico, mas sobre um conceito elástico e determinado.

9 – Além disto, a natureza genérica do conceito dado pela norma já apontada resulta num tratamento diferenciado aos contribuintes, pois a legislação acaba de atribuir tratamento igual a sujeitos passivos em situações desiguais o que resulta na afronta ao princípio constitucional da igualdade ou isonomia tributária. Tal contexto, por via de conseqüência, acaba por caracterizar também a violação ao princípio da capacidade contributiva, já que na prática, contribuintes com a mesma capacidade contributiva podem ser compelidos a recolher a exação em questão em percentuais diversos, dependendo da natureza predominante dos riscos de suas atividades.

 

DOS PEDIDOS

DIANTE DO EXPOSTO, pleiteia a Autora:

a) Seja reconhecida a inexigibilidade do S.A.T., posto que não existe relação tributária válida entre as partes, uma vez que a Lei 8.212/91 não definiu os elementos necessários para a cobrança do tributo – (atividade preponderante, risco leve, médio e grave), declarando incidentalmente a ilegalidade dos Decretos 612/92 e 2.173/97 que extrapolaram o poder normativo concedido pela citada Lei;

b) A condenação do Requerido à restituição dos valores indevidamente recolhidos, acrescidos de correção monetária e juros legais;

c) A citação do Requerido, para, querendo, conteste a presente no prazo legal, sendo ao final julgados procedentes os pedidos formulados, condenando-o, também ao pagamento das custas e honorários advocatícios;

d) Seja o representante do DD. Ministério Público Federal intimado para se manifestar em todos os atos do processo;

e) Protesta-se pela produção de todas as provas em direito admitidas.

Dá-se à causa o valor de R$ …..

Nesses Termos,

Pede Deferimento.


[Local], [dia] de [mês] de [ano].

[Assinatura do Advogado]

[Número de Inscrição na OAB]

Como citar e referenciar este artigo:
MODELO,. Modelo de Ação Declaratória de Inconstitucionalidade cumulada com repetição de indébito. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2013. Disponível em: https://investidura.com.br/peticoes/inicial/modelo-de-acao-declaratoria-de-inconstitucionalidade-cumulada-com-repeticao-de-indebito/ Acesso em: 19 abr. 2024