Processo Civil

Medida cautelar. Revogação pela sentença.

 

Abordaremos, neste breve estudo, questão prática da maior relevância que diz respeito à possibilidade ou não da execução do ato obstado pela medida cautelar na pendência de apelação com efeito suspensivo.

 

Usaremos a expressão medida cautelar como gênero para abranger a liminar em mandado de segurança, a tutela antecipatória e a medida cautelar propriamente dita, concedida no bojo do processo cautelar preventivo seguida de propositura de ação principal.

 

Como se sabe, julgada improcedente a ação principal revoga-se ou cassa-se a tutela antecipatória ou a liminar concedida no processo cautelar preventivo, ou aquela concedida em caráter incidental. A apelação no caso é recebida em seu duplo efeito consoante a regra geral do art. 520 do CPC. Ademais, prescreve o seu inciso VII que a apelação será recebida apenas no efeito devolutivo quando interposta de sentença que “confirmar a antecipação dos efeitos da tutelar”, o que nos parece óbvio, pois sentença que a confirma não pode valer menos que a medida provisional. A contrario sensu, não bastasse a regra do caput do art. 520 do CPC, significa que na hipótese inversa, isto é, quando interposta a apelação da decisão que cassa ou revoga a tutela antecipatória porque julgada improcedente a ação, o recurso há de ser recebido em seu efeito devolutivo e suspensivo.

 

A questão é simples, mas tem dado bastante dor de cabeça para os que labutam diariamente no contencioso judicial lidando com matérias que envolvem medidas cautelares. Por conta da equivocada jurisprudência, títulos podem ser protestados no curso a apelação, bem como autos de infração podem ser lavrados para constituição do crédito tributário, ou aparelhar a execução fiscal, conforme o caso.

 

É que a jurisprudência do STJ orientou-se no sentido de que a apelação com efeito suspensivo não tem o condão de restabelecer a antecipada revogada pela sentença devendo retornar, de imediato, à situação anterior (AgRg nº 985.846/ RS,; Resp nº 768.363/SP; Resp nº 541.544/SP). Vale dizer, o protesto sustado pode ser efetivado com a negativação do nome do protestado no SERASA; o auto de infração obstado pode ser lavrado; a execução fiscal interditada pela liminar pode ser ajuizada etc.

 

Parece óbvio que a apelação com efeito suspensivo não restabelece a medida cautelar revogada pela sentença de improcedência. Só o provimento do apelo tem esse condão.

 

Tudo indica estar havendo uma grande confusão entre o plano de existência e vigência da sentença de improcedência, que revoga a medida provisional, com o plano de eficácia dessa mesma sentença que produz efeito intra partes.

 

Ora, a sentença que cassa a liminar ante o recebimento do apelo com efeito suspensivo tem sua eficácia suspensa pelo que descabe cogitar-se de devolução ao statu quo ante como se a liminar nunca tivesse existido. Ela foi cassada, sem dúvida alguma, mas a sentença de cassação não produz efeito imediato.

 

A sentença, no caso, existe, é válida e está em vigor, mas desprovida de eficácia intra partes por força do efeito suspensivo da apelação.

 

Logo, o ato interditado pela medida provisional não pode ser executado senão depois de confirmada a decisão monocrática pelo tribunal, em obediência ao princípio do duplo grau de jurisdição, corolário do princípio constitucional do contraditório e ampla defesa que, no entender da Corte Suprema, abrange todas as fases do processo. Por isso, ainda que confirmada a decisão pelo tribunal é possível requerer a permanência dos efeitos da liminar na pendência de recursos especial ou extraordinário.

 

 

* Kiyoshi Harada. Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Membro do Conselho Superior de Estudos Jurídicos da Fiesp. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo. Site:www.haradaadvogados.com.br

Como citar e referenciar este artigo:
HARADA, Kiyoshi. Medida cautelar. Revogação pela sentença.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/medida-cautelar-revogacao-pela-sentenca/ Acesso em: 19 mar. 2024