Mandado de Segurança

Mandado de Segurança (com pedido de liminar) – Cotas

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA [XXXXX]

 

 

 

 

 

       NOME DA IMPETRANTE, qualificação, vem, por seu procurador in-fine, com fundamento no art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e art. 1º, da lei nº. 1.533/51, impetrar

 

MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR

 

Contra atos do Sr. REITOR DA UNIVERSIDADE, Presidente do Conselho Universitário, e do Presidente da Comissão Permanente do Vestibular encontrados no Campus Universitário [XXXXX], qualificação, pelos seguintes fatos e fundamentos:

 

 

 

I-        DOS FATOS:

 

Conforme atesta a documentação anexa, o impetrante inscreveu-se para prestar o vestibular da [XXXXX], ao curso de [XXXXX], que foi realizado nos dias [XXXXX].

 

Consta da resolução nº.  [XXXXX],  a relação da quantidade de vagas disponíveis a todos os cursos oferecidos por aquela instituição de ensino, do qual se depreende a existência de 40 (quarenta) vagas para o curso em que o impetrante se inscreveu.

 

Ocorre que o Edital [XXXXX] informa que, nos termos da Resolução Normativa nº. [XXXXX], haverá uma distribuição de vagas na seguinte forma:

 

I-        20% (vinte por cento) das vagas de cada curso serão destinadas para candidatos que tenham cursado integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino;

II-       10% (dez por cento) das vagas de cada curso serão destinadas para candidatos autodeclarados negros, que tenham cursado integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino;

III-      6  (seis) vagas serão destinadas para candidatos autodeclarados indígenas.

 

Assim, para o curso de [XXXXX], tem-se que 20 (vinte) vagas serão destinadas a “candidatos provenientes das instituições públicas de ensino” e 10 (dez) vagas serão destinadas aos autodeclarados “negros”, restando apenas 70 (setenta) vagas para os demais candidatos excluídos do sistema de cotas (brancos, pardos, ruivos, orientais, etc, e até mesmo “negros”, provenientes de escolas particulares), por não se enquadrarem nas chamadas “ações afirmativas de acesso aos cursos de graduação”, entre os quais se inclui o impetrante.

 

Ainda, esta reserva de vagas pelo sistema de cotas apresenta-se maculada por vícios também pelo fato de que os candidatos não-negros, estão sendo culpados por não serem “negros”, e ainda discriminados por haverem optado, com sacrifício próprio ou de seus pais, por realizar seus estudos em escolas particulares, o que, em absoluto implica em não possuírem a condição de carentes, em que pese hajam realizados seus estudos em escolas pagas.

 

Então porque as disposições previstas para o vestibular [XXXXX], além de representarem uma “aberração jurídica”, ferem integralmente o direito líquido e certo do impetrante, como se verá pela fundamentação a seguir exposta.

 

II-      DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

 

II. 1- DA AUTORIDADE COATORA E DO ATO COATOR

 

Ato de autoridade, na acepção de HELY LOPES MEIRELLES (Mandado de Segurança e Ação Popular. 10ª Ed., São Paulo, RT, 1.985, p. 8), é toda manifestação ou omissão do poder Público ou de seus delegados, no desempenho de suas funções ou a pretexto de exercê-las.

 

Assim, autoridade coatora, para efeitos da Lei Mandamental, é aquela que possui o poder decisório, no caso TODOS aqueles que, no uso de suas atribuições, baixaram por meio das Resoluções e Edital acima mencionados, critérios que impediram o impetrante de concorrer à totalidade das vagas (40) ofertadas para o curso de DESIGN DE ANIMAÇÃO.

 

Para os efeitos do presente mandamus, o Edital [XXX], tem como autoridade coatora, o Presidente da Comissão Permanente do Vestibular; a Resolução Normativa nº. [XXX], que cria o “programa de ações afirmativas” da universidade, tem como autoridade coatora o Presidente do Conselho Universitário e; o Reitor da por ser ele a autoridade máxima responsável da instituição que chancelou e aplicou estas normas afrontadoras aos princípios constitucionais vigentes.

 

Tais atos são concretamente os responsáveis pelo ato de coação a que se refere o Art. 1º Lei nº 1.533/51 e o Inciso LXIX do artigo 5º, da Constituição Federal.

 

No que tange especificamente ao ato de coação, o mesmo é claramente observado na Resolução Normativa [XXX] que, motivado por falsas idéias, na ordem Constitucional de Redução das Desigualdades Sociais, criou o “programa de ações afirmativas”,  com o objetivo de garantir suposto acesso aos cursos de graduação a supostos candidatos que preencham os requisitos contidos nos artigos 6º a 8º da referida Resolução, assim redigidos:

 

(…)

CAPÍTULO III

DAS AÇÕES AFIRMATIVAS DE ACESSO AOS CURSOS DE GRADUAÇÃO

Art. 6º Para a implementação da ação afirmativa de acesso aos cursos de graduação da Universidade, a que se refere o inciso II do art 4º, será destinado 30% (trinta por cento) das vagas do vestibular, em cada curso, que serão distribuídas da seguinte forma:

 

I-                20% (vinte por cento) para candidatos que tenham cursado integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino;

II-              10% (dez por cento) para candidatos auto declarados negros, que tenham cursado integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino.


§ 1º Os candidatos a que se referem os incisos I e II deste artigo, interessados em participar na ação afirmativa de acesso aos cursos de graduação, deverão fazer a sua opção no ato de inscrição do vestibular.
§ 2º Os candidatos que optarem pelo “Programa de Ações Afirmativas” também concorrerão às vagas pela classificação geral.
§ 3º Caso o percentual de vagas estabelecido pelo inciso I deste artigo não venha a ser preenchido, as vagas remanescentes serão ocupadas por candidatos da classificação geral.


§ 4º Caso o percentual de vagas estabelecido no inciso II deste artigo não venha a ser preenchido, as vagas remanescentes poderão ser preenchidas por candidatos auto declarados negros, oriundos de outro percurso escolar.
§ 5º Caso as vagas remanescentes a que se refere o parágrafo anterior não venham a ser preenchidas por candidatos auto declarados negros, oriundos de outro percurso escolar, poderão ser ocupadas por candidatos da classificação geral.
Art. 7º Os candidatos classificados no vestibular para as vagas a que se refere o inciso I do art. 6º deverão comprovar, no ato de matricula, que cursaram integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino.
Art. 8º os candidatos classificados no vestibular para as vagas a que se refere o inciso II do art. 6º deverão possuir fenótipos que o caracterizem na sociedade como pertencentes ao grupo racial negro.

§ 1º A comprovação da condição de pertencente ao grupo racial negro dar-se-á no ato de matricula, mediante o preenchimento de declaração que será assinada pelo candidato.

§ 2º Os candidatos auto declarados negros classificados poderão ser submetidos à entrevista por comissão institucional criada na forma prevista nesta Resolução normativa, que decidirá se atendem aos requisitos estabelecidos para a moralidade de vaga para a qual optaram.

 

No tocante às vagas destinadas aos candidatos “indígenas” contidos no artigo 9º. da referida norma, não há interesse processual no caso em concreto, visto não haver qualquer inscrição para concorrer a uma das vagas do curso de DESIGN DE ANIMAÇÃO.

 

Dessa forma, resta ver como tais disposições ofendem o direito líquido e certo do impetrante:

 

II.2 – DA OFENSA  AO DIREITO LÍQUIDO E CERTO DO IMPETRANTE

 

Reza o artigo 5º da Constituição Federal,  que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no país, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à prosperidade, nos termos seguintes: (…)(grifos nossos)

 

A Carta Magna dispõe ainda, em seu artigo 206, inciso I,  que o ensino será ministrado com base, entre outros, nos seguintes princípios: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; (…)

 

Contrapondo-se o teor das disposições contidas nos artigos 6º a 8º da Resolução Normativa [XXX] aos dispositivos constitucionais acima transcritos, nítida se mostra a ofensa ao direito líquido e certo do impetrante de concorrer em igualdade de condições com todos os demais candidatos, a uma das 40 vagas do curso de DESIGN DE ANIMAÇÃO oferecido pela [XXX]. Senão vejamos:

 

A)Não existe qualquer critério objetivo e científico, que permita identificar alguém como “negro”, muito menos uma auto-declaração pode servir para atribuição de tal qualidade, haja vista, que o diagnóstico fundado na morfologia e constituindo corporal sabidamente não autoriza a identificação da raça.

 

Nem mesmo a Comissão Institucional prevista na referida Resolução Normativa (art 8º par. 2º) para “validar a auto-declaração”, tem condições técnicas e científicas para aferir tal qualidade de forma precisa.

 

Todavia, ainda que fosse possível a identificação de tal qualidade a uma determinada pessoa, o fato de alguém ser considerado “negro”, “branco” ou “amarelo”,  não importaria em critério de erradicação das desigualdades sociais, visto que o fato de alguém ser considerado um ou outro não caracteriza motivo determinante de inferioridade ou superioridade intelectual ou social.

 

Portanto, o critério de acesso às vagas, delimitada pelo programa de “ações afirmativas”, em especial às vagas destinadas aos “negros” (artigo 6º, I da mencionada Resolução Normativa), afronta o principio constitucional da igualdade, especificamente, o de igualdade de condições ao acesso e permanência à escola, sem dizer que impõe uma injustificada discriminação aos demais candidatos, entre os quais se insere o impetrante.

 

B) No que tange às cotas destinadas aos que tenham cursado integralmente o ensino em instituição pública (artigo 6º, II da referida Resolução Normativa), vislumbra-se clara afronta ao dispositivo constitucional que determina ao Estado promover a educação com garantia de padrão de qualidade (art. 206, VII), pois efetuar uma reserva de vagas àqueles oriundos do ensino público, significa dizer que os alunos dele proveniente são intelectualmente inferiores ou que o próprio Estado não está cumprindo com seu dever constitucionalmente imposto.

 

Tais ilações também não possuem qualquer critério objetivo e científico que permitam identificar e ainda por cima, qualificar as condições dos alunos provenientes do ensino público e dos oriundos do ensino privado, mesmo porque, O ENSINO é serviço público e deve ser, por isso, UNIVERSAL E IGUALITÁRIO.

 

Dessa forma, o critério de reserva de vagas aos candidatos que tenham “cursado ensino público” impõe a mesma desigualdade e injustificada discriminação entre todos os candidatos ao curso de [XXX], demonstrando clara ofensa ao direito líquido e certo do impetrante.

 

Não tem como negar-se que as instituições universitárias detém autonomia didático-científica, a teor do que dispõe a Carta Magna em seu artigo 207.

 

Porém, necessário interpretar tal comando com as devidas restrições, para que não acabe-se por deturpar a intenção do legislador ao instituir a regra.

 

Por isso, quando se refere à autonomia didática, remete à “… atividade-fim da universidade… fundamentalmente, com a competência da universidade para definir o conhecimento a ser transmitido, bem como sua forma de transmissão” (Anna Cândida da Cunha Ferraz. A Autonomia Universitária na Constituição de 05/10/1.988. RDA215/117) e envolve “o estabelecimento de critérios e normas para avaliação do desempenho dos estudantes… e a possibilidade de experimentar novos currículos e fazer experiências pedagógicas” (idem, p. 129)

 

Ocorre que nem é preciso aprofundar-se na amplitude que tal autonomia insere-se num  eventual cotejo com o princípio da legalidade, pois é suficiente limitar-se a crer que, inequívoco que a Lei 9.394/96, atual Lei das Diretrizes Básicas da Educação, “… não se afasta do sentido acima mencionado, construído pela doutrina e inequivocamente abrigado pela Constituição.” (Anna Ferraz, op. Cit. P. 129), pelo que, num primeiro momento, não é correto admitir-se que a mera Resolução da [XXX] possa criar distinção e restrição na prestação do serviço público por qualquer fator, por isso que somente Lei Federal pode cuidar do tema relativo à prestação da educação superior, nos exatos termos do artigo 21, XXIV, da Constituição Federal, como segue:

 

“Art. 21. Compete privativamente à União legislar sobre: (…)

XXIV- diretrizes e bases da educação nacional.”

 

Precisa se levar em conta também que a noção de serviço público, conquanto variável ao sabor das iniciativas legislativas, ao se dispor a atender aos interesses ou necessidades públicas, impõe-se seja oferecida de maneira igual, sendo este um princípio consagrado na doutrina a respeito do assunto.

 

Já quanto às cotas, não se podemos chegar ao ponto de, sob o manto do princípio da igualdade, considerar legítima qualquer discriminação entre brasileiros. De outro lado, não se desconhece o preconceito racial no Brasil, entretanto, impossível que, dentro da legalidade, justifiquemos a prática de discriminação entre brasileiros ao acesso às Universidades, agasalhados pelos argumentos da prática do racismo.

 

Recorre-se à jurisprudência, mais especificamente à passagem do voto do Exmo. Juiz Luiz Carlos de Castro Lugon, no precedente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Apelação Criminal nº 96.04.19980-3/RS, publicada na RTRF 4ª Região, nº 27, p. 219, quando se ensina que A discussão sobre a existência ou inexistência do racismo no Brasil não restará aqui solvida. É inarredável verdade que não há no país estabelecimentos escolares específicos para raças determinadas, nem se toleram quaisquer discriminações. Não se registram, nas forças armadas, negativas de obediência do soldado branco ao oficial negro; não repudia o aluno branco o professor negro. Nossa realidade é absolutamente diversa da dos países onde há a discriminação declarada; e a miscigenação é generalizada no país. A assertiva de que a situação do negro no país é pior do que nos países onde há discriminação aberta, as estatísticas demonstrando que o negro no geral percebe menos do que o branco; as dificuldades de ascensão do negro aos cargos mais elevados na escala social; tudo encontra resposta no fato de que o negro veio de um regime escravagista, a que sucedeu uma situação economicamente hipossuficiente. Está ele, em decorrência, junto a uma massa de miseráveis em que pululam brancos também sem quaisquer perspectivas de melhoria social. Dizer que o preconceito é social, e, não, racial, nada acrescenta. O que se deve ter em mente é que o preconceito racial é um mal a ser extirpado; que se deve respeitar a cultura de cada povo; que, frente à lei brasileira, racismo é crime. Assim, o silogismo armado no sentido de que o preconceito existe; de que negar sua existência seria hipocrisia; para concluir que a punição por racismo seria mascaramento da realidade, absolutamente não colhe. O ódio racial não é uma postura ingênua, é a inspiração de crimes contra a humanidade. Na expressão feliz de Martin Luther King, há que se buscar a igualdade na diferença, com império do relativismo cultural, que, segundo Zilá Bernd, ‘deriva da idéia de relatividade, apóia-se no princípio de que as culturas se equivalem, cada uma em seu meio, rejeitando formalmente a idéia de hierarquização, ou seja, a idéia de que umas culturas seriam superiores e outras inferiores. Essa foi a grande inovação de Lèvi-Strauss na área da moderna antropologia; as culturas não são superiores ou inferiores, mas diferentes umas das outras.’ (in Racismo e Anti Racismo, Ed. Moderna, 1ª ed., p. 35).”

 

Com estes valores, que derivam da própria Constituição Brasileira, o Judiciário Brasileiro vem reconhecendo, inclusive, a responsabilidade civil de tantos quantos perpetrem a conduta de racismo, já reprimida na esfera penal.

 

Neste sentido, o importante precedente da Justiça Catarinense, no julgamento da ação ordinária nº 039.97.012443-9, da Comarca de Lages, julgada pelo Juiz Leopoldo Augusto Brüggemann que, após reconhecer que, conforme se vê da prova encartada, dúvidas não restam de que a primeira demandada agiu com manifesto preconceito racial, discriminando e ofendendo publicamente, de forma leviana e baixa, a pessoa da autora, descendente que é da cor negra, colocando-se como uma raça superior…”, concluiu que “qualquer agressão à dignidade pessoal lesiona a honra, constitui dano moral e é por isso indenizável.”

 

Assim também o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao julgar a Apelação Cível nº 2000.72.07.1364-6/SC, publicada na RTRF 4ª Região, nº 46, p. 127, decidiu que:

 

“Ofensa racial proferida em público por superior hierárquico em formatura militar. Litisconsórcio passivo. Condenação em danos morais. Vinculação ao salário mínimo. Impossibilidade – Não se tratando de litisconsórcio passivo necessário e tendo um dos réus deslocado a competência para a Justiça Federal, em razão da pessoa – competência relativa – deve-se extinguir o feito com relação ao outro réu, pela incompetência absoluta do Juízo Federal para o processamento e julgamento das lides entre particulares.

 

As expressões repetidamente utilizadas por pessoa com bom nível sócio-econômico-cultural, em flagrante e ofensivo desabono a subordinado, em ato oficial é de ser indenizado monetariamente, como forma de compensar os danos morais sofridos pelo ofendido.”

 

Colhe-se a configuração da ofensa em “… que o referido pelo Comandante da companhia em que servia o autor, chamando-o de ‘macaco’, repetindo por três vezes durante a formatura do Batalhão, não há como considerar que possa ter sido feito sem conotação pejorativa, ou que teria o mesmo sentido dos adjetivos ‘mocorongo’, ‘tanso’, ou outros habitualmente utilizados na caserna com o fim de diminuir a distância imposta pela hierarquia militar, pois, como relatado pelas testemunhas, não é normal sua utilização, e, ao contrário, como se pode ver da maioria dos depoimentos testemunhais, seria considerado ofensivo.

 

Evidencia-se que a conduta é praticada e tem sofrido repulsa na Justiça Brasileira. Só que tal repulsa à prática do racismo combate-se da maneira adequada,  não podendo-se tentar compensá-la simplesmente criando-se atos inconstitucionais para garantir o acesso dos “negros” , que já tanto sofreram pelas práticas do racismo.

 

A respeito da inconstitucionalidade do sistema de cotas, já manifestou-se exaustivamente a jurisprudência. Colhe-se sábio e genial trecho do voto da Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, nos autos de Apelação/Reexame Necessário nº. 2008.72.00.000742-5, pois suas palavras são unanimidade quando fala-se em respeito aos princípios constitucionais, tornando qualquer entendimento em sentido contrário, mera insignificância:

 

Tenho que procede a pretensão da impetrante. O sistema da [XXX], a exemplo do adotado por outras instituições de ensino superior, quebra princípios básicos e prestigiados pela Constituição Federal de 1988 e não se sustenta em lei. Assim, embora os bons propósitos que as inspiram, as cotas raciais e sociais não podem ser no caso prestigiadas, em face do princípio democrático da legalidade. Aduzo que não resta dúvida de que o Brasil é um país socialmente desigual, também está fora de dúvida de que somos uma nação de mestiços. Por outro lado, a classificação racial bipolarizada enfrenta dificuldades. As classes menos favorecidas não podem ser reduzidas aos negros e índios. Afastados emocionalismos, o mais racional parecer ser a cota social aos mais pobres, egressos de escolas públicas, mas sem fundamentalismo, ou radicalismo. Distinções baseadas em raça, etnia, nota extrínseca ou intrínseca do indivíduo já foram afastadas pelo Supremo Tribunal Federal.

 

O direito à educação é um direito social fundamental (art. 208, inc. I, da Constituição Federal de 1988), sendo dever estatal provê-lo a todos. No ensino superior o acesso é informado pelo critério do mérito, que é fundamental na vida acadêmica. O atingimento dos níveis mais altos do ensino superior depende de esforço individual, o “mérito acadêmico”, que é representativo do “bem de todos”.

 

O objetivo da Universidade Pública não é dar ensino a quem não pode pagar, mas aos melhores, daí a ênfase no mérito. Produzir o melhor em conhecimento e pesquisa para retornar o melhor para a sociedade. Ao argumento de favorecer ou antidiscriminar alguns, não se pode prejudicar a todos, isto é, à coletividade que espera seja vertida à sociedade a excelência em conhecimento e pesquisa. A sociedade – a coletividade – é diretamente prejudicada se não forem seriamente selecionados os melhores. As políticas públicas de subsídio a estudantes pobres – Creduc e ProUni – já são aptas a promover o acesso dos menos favorecidos ao ensino superior, segundo a capacidade de cada um. Aqui, repousa o princípio do mérito acadêmico, que não se destina a proteger interesses individuais, mas sim, é do interesse da sociedade, o retorno do melhor para a sociedade.

 

O estudo universitário público não pode ainda ser universal, é então para os melhores. Na oferta e seleção dos candidatos devem ser observados os artigos 5º, 37 e 206 da Constituição Federal de 1988, com especial ênfase, à legalidade, imparcialidade, moralidade, publicidade e eficiência. A Universidade não tem autonomia para criar um “direito de raça” para seleção de alunos.

 

As ações afirmativas podem e devem ser promovidas pelo Estado, mas se, ao implementá-las, o Estado quebra os princípios constitucionais regedores da espécie, como aqui, a igualdade de acesso, sem distinções de raça, sexo, cor, etc., necessita-se obviamente de interposição legislativa. É o Parlamento que legitimamente obriga a todos. É o princípio da dominação democrática, a quebra só pode ser feita pela lei, emanada do Legislativo.

 

As cotas nas Universidades, aqui discutidas, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, foram instauradas ao desamparo de lei. Neste passo, distinguem-se da política pública Programa de Universidade para Todos (ProUni), convertida na Lei n.º 11.906/2005, servindo o modelo do ProUni de argumento contra a implantação de tais programas ao arrepio da lei. Havendo lei, a sua constitucionalidade será examinada.

 

As ações afirmativas promovidas pelo Estado com a quebra dos princípios constitucionais, como no caso, a igualdade de acesso, e o discrímen por raças ou renda, necessitou de interposição legislativa. O fato de a própria Constituição Federal de 1988 ter discriminado afirmativamente os portadores de necessidades especiais (art. 37, inc. VIII, da Constituição Federal de 1988) e a mulher em algumas hipóteses (art. 7º, inc. XX, da Constituição Federal de 1988), ao invés de apontar no sentido da desnecessidade de lei, a reforça.

 

As Leis nº 10.558/2002 e Lei n.º 10.678/2003 não são suficientes ao propósito almejado, pois não são específicas em relação às cotas, não fazendo um objetivo dimensionamento das mesmas.

 

Ademais, o estudante, ao abrigo de liminar, está cursando o segundo semestre do curso de Medicina, sendo que o postulado da razoabilidade impõe que se mantenha o impetrante a título de fato consumado, hipótese sempre prestigiada pelo Judiciário em matéria estudantil.

 

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial.

 

É o voto.

Desª. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER

 

Finalmente, em razão da excelência das argumentações, que cuidaram do centro do que ora se discute, pertinente colacionar, na íntegra, a decisão da lavra do Juiz Federal Carlos Alberto da Costa Dias:

 

 

“5. Com o objetivo de cumprir a ordem constitucional de “reduzir as desigualdades sociais” (artigo 3º. da Constituição Federal), a [XXX] editou a Resolução Normativa [XXX], que cria o Programa de Ações Afirmativas, com orientação específica, entre outras, de garantir o acesso aos cursos de graduação (artigo 4º., inciso II) a candidatos indígenas (artigo 9º., §§ 1º. e 2º.), negros e outros provenientes do ensino fundamental e médio em instituições públicas, (artigo 6º., incisos I e II), nesses termos:

 

Artigo 6º. Para implementação da ação afirmativa de acesso aos cursos de graduação da Universidade a que se refere o inciso II do artigo 4º. será destinado 30% das vagas do vestibular, em cada curso, que serão distribuídas da seguinte forma:

 

I – 20% (vinte por cento) para candidatos que tenham cursado integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino;

II – 10% (dez por cento) para candidatos auto declarados negros, que tenham cursado integralmente o ensino fundamental e médio em instituições públicas de ensino.

[…]

Art. 9º. Para a implementação do acesso aos candidatos pertencentes aos povos indígenas, a que se refere o inciso III do art. 2º., serão criadas 5 (cinco) vagas suplementares que serão preenchidas pelos candidatos melhor classificados no vestibular.

§ 1º. A vagas a que se refere o caput deste artigo serão criadas especificamente para este fim nos cursos em que houver candidatos aprovados, observado o limite de 2 (duas) vagas por curso.

§ 2º. O número de vagas a que se refere o parágrafo anterior será alterado, a cada ano, mediante a criação de uma nova vaga, até perfazer o total de 10 vagas em 2013.

 

6. No que se refere às vagas destinadas aos candidatos “indígenas”, não há reserva, mas criação de vagas novas, destinadas exclusivamente àqueles candidatos que obtiverem a pontuação mínima exigida. Não havendo candidatos “indígenas” aprovados em determinado curso, não haverá criação de novas vagas. Logo, não há supressão de vagas do total oferecido e, conseqüentemente, não há interesse processual para o pedido para concorrer à totalidade das vagas.

 

7. Para concorrer às vagas reservadas a “negros” (termo a que, neste mandado de segurança, farei referência entre aspas, por ser um critério relativo e de difícil definição, conforme fundamentarei no momento oportuno), por outro lado, o candidato deverá fazer a sua opção pelo benefício da ação afirmativa no ato de inscrição do vestibular (artigo 6º., § 1º.); os candidatos que se interessarem em fazer a sua opção pelas vagas reservadas, também concorrerão às vagas pela classificação geral (artigo 6º., § 2º.). Caso o número de candidatos provenientes do ensino fundamental e médio em instituições públicas não for suficiente para preencher 20% das vagas totais, o percentual remanescente será preenchido por meio da classificação geral (artigo 6º., § 3º.). Caso o número dos candidatos auto-declarados “negros” e provenientes do ensino público não for suficiente para preencher 10% das vagas totais, o remanescente será preenchido por “negros”, oriundos do sistema de ensino privado (artigo 6º., § 4º.). Se ainda existirem vagas remanescentes, serão destinadas ao preenchimento de acordo com a classificação geral (artigo 6º., § 5º.).

 

Conforme se vê, o candidato que não se declarar “negro”, será automaticamente considerado “não-negro”. Essa exigência de auto-declaração e classificação segundo o critério de cor da pele, é, por si só, constrangedora e racista, porque obriga aquele que pretender disputar a

s vagas reservadas a se auto-discriminar, sem que, para isso, haja fundamento científico ou empírico.

Depreende-se das normas transcritas que existe a possibilidade de um candidato considerado “negro”, com menor pontuação, excluir uma vaga de “não-negro” com maior pontuação. Essa hipótese não ocorre, é certo, no caso de o candidato auto-declarado e reconhecido como “negro”, ao concorrer na classificação geral, obter nota superior ao “não-negro” e, nessa qualidade ainda, preencher vaga destinada exclusivamente a “negro”.

 

Logo, o cerne da questão reside em identificar a razoabilidade e a proporcionalidade do fator de discrímen, especificamente da qualidade de “negro”, para efeito de promoção de políticas afirmativas no âmbito do processo seletivo do vestibular universitário.

 

PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DO FATOR DE DISCRÍMEN

 

8. O Edital supramencionado, ao eleger como fator de discrímen a qualidade de “ser negro”, não resiste ao controle de razoabilidade e proporcionalidade, consideradas na forma escalonada da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito.

 

O requisito da adequação consiste em responder à seguinte pergunta no caso concreto: o Edital do concurso vestibular, ao conceder 10% das vagas ao candidato “negro”, proveniente de escola pública ou particular subsidiariamente, é o meio normativo próprio para fomentar o objetivo de não-discriminação no acesso do denominado “negro” ao ensino superior?

 

A título de perseguir o objetivo não-discriminatório, em realidade, a norma discrimina os estudantes “negros”, por serem “negros”, que concorrem em igualdade de condições, sob o critério de mérito, ao acesso à universidade, sem que este fator: “ser negro”, seja o motivo pelo qual não têm acesso ao ensino universitário.

 

9. Quanto ao requisito necessidade, essa análise deve enfrentar a seguinte questão: comparativamente a outros meios de “democratização racial do ensino”, o Edital que privilegia vagas universitárias ao auto-declarado “negro” é o melhor meio para que parte da população, que antes não tinha acesso ao ensino, agora o tenha?

 

A resposta é negativa. O melhor meio para fomentar a não-discriminação é a criação de mais vagas e a melhoria da qualidade do ensino a todos aqueles que desejem o ensino universitário, e não somente ao denominado “negro”, exclusivamente por ser “negro”.

 

10. Quanto ao requisito de proporcionalidade em sentido estrito, a análise deve enfrentar a seguinte questão: a limitação do número de vagas a candidatos “não-negros” em favor dos “negros” é condizente com a idéia de assegurar o direito fundamental de acesso ao ensino universitário em igualdade de condições.

 

Também nesse caso, a análise do Edital não atende ao requisito de proporcionalidade em sentido estrito, porque a reserva de vagas aos auto-denominados “negros” implica diminuição da oferta geral de vagas no ensino público gratuito e subtrai, com isso, direito subjetivo e fundamental dos “não-negros” que, em princípio, têm capacidade e habilitação para cursar o estudo universitário.

 

 

DISCRIMINAÇÃO POSITIVA E FATOR DE DISCRÍMEN

 

11. Não se nega, na análise deste mandado de segurança, evidentemente, que se possa eleger positivamente um grupo ou categoria de pessoas com o objetivo de erradicar as desigualdades sociais, o que, aliás, é o objetivo do Estado Brasileiro (artigo 3º. da Constituição Federal) e que constitucionalmente é objeto de nosso Direito Positivo. A teor da leitura do artigo 5º., inciso LXXIV (assistência judiciária gratuita), artigo 37, inciso VIII (acesso ao cargo público ao deficiente), artigo 40, parágrafo 1º., inciso III, letra a (tempo de contribuição da mulher), artigo 203, inciso V (salário mínimo ao deficiente e ao idoso), artigo 230, parágrafo 2º. (gratuidade de transporte aos idosos), são várias as hipóteses em que se privilegia uma situação ou categoria coerentes com o que se quer ver protegido ou positivamente discriminado.

 

12. O fator de discrímen, no entanto, para não ser arbitrário e, portanto, inconstitucional, deve se pertinente, guardar relação de causa e efeito, ser determinante, explicitar o motivo por que se considera aquele grupo ou categoria inferior. E diga-se o óbvio: ser negro não é o motivo determinante – por si só – de inferioridade intelectual.

 

Presumindo-se verdadeira a hipótese que a política afirmativa pretende modificar – a dificuldade de acesso ao ensino público ao denominado “negro” -, prevalece, ainda assim, como obstáculo ao acesso do “negro” ao ensino universitário, não o atributo de “ser negro”, mas o fato de o ensino público anterior ao vestibular ser de má-qualidade e a sua condição social, eventualmente, não possibilitar dedicação maior aos estudos, ou outros fatores que devem ser melhor estudados e debatidos.

 

Admitir que o fator de discrímen – ser negro – seja, como política pública, determinante da dificuldade do acesso ao ensino é, por si só, mais do que discriminatório, é estigmatizante, e não tem, como demonstrarei no momento próprio, amparo na literatura especializada.

 

13. Não é sem relevância a análise, ainda que sintetizada, do modelo norte-americano de discriminação positiva em virtude da qualidade de ser “negro”, para acesso ao ensino público, para demonstrar que, no contexto brasileiro, o Edital, da forma preconizada na Universidade Federal, deve ser entendido como retrocesso.

 

É consabido que a origem de modelos como ora atacado, que unem critérios de “meritocracia com processos seletivos sensíveis à qualidade racial” (meritocracy with race-sensitive safety valves), tem como fundamento teórico trabalhos acadêmicos norte-americanos (entre eles, cito por todos: “Race: The Reality of Human Differences”. Editora Basic Books. 2004, autor Vincent Sarich), que não gozam, absolutamente, de unanimidade sequer na aplicação de sua teoria em sua própria Nação.

 

14. A Suprema Corte Americana, em sua fase mais restritiva ao acesso ao ensino público por negros, que se iniciou a partir do caso Plessy v. Ferguson, tinha como mote “iguais, mas separados”. Era assegurado aos “negros” o acesso ao estudo universitário, contanto que se mantivessem separados, exclusivamente por serem “negros”.

 

Esse modelo não se aplica ao caso brasileiro. De fato, ao contrário de integrar o estudante “negro” no ambiente acadêmico, sob o mesmo critério de seleção por mérito, o critério racial de quotas, ao garantir o acesso, o estigmatiza por ser “negro” – ainda que tenha melhor qualificação intelectual. É o que se pretende com o modelo de quotas brasileiro. O “negro”, ainda que proveniente de escola particular; ainda que com melhor qualificação na classificação geral; ainda que obtivesse a vaga sem o sistema de quotas, passa a ter de se auto-declarar “negro” e preencher a vaga segundo fenótipo racial e distinguir-se, separar-se, segregar-se dos demais por ter esse atributo. Enfim, retorna-se ao conservador mote “iguais mas separados”, que tanto maculou o regime de liberdades públicas norte-americano.

 

15. Tampouco é aplicável ao contexto brasileiro a doutrina formada com a ampliação do acesso do negro americano ao estudo universitário, consubstanciada na corrente jurisprudencial que se formou a partir do julgamento do caso Brown v. Board of Education. Segundo esse julgamento, o negro americano ganhou a possibilidade de estudar no mesmo ambiente do estudante “não-negro”, firme na convicção de que o melhor ambiente educacional é o que não estabelece diferenças por motivo de raça.

 

16. São basicamente dois os motivos pelos quais, ainda assim, o modelo norte-americano não serve à realidade brasileira. O primeiro, reside na impossibilidade de se identificar com precisão o que é ser “negro” no Brasil. Diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos da América, a miscigenação entre os denominados “brancos” e “negros”, torna a identificação por fenótipo absolutamente inconsistente, como desenvolverei posteriormente.

 

17. O segundo motivo consiste em que o processo seletivo americano não é baseado constitucionalmente no princípio da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, como de fato é para nós brasileiros, nos termos do artigo 206, inciso I, da Constituição Federal. Lá, diferentemente daqui, não existe o vestibular e os critérios não se atêm à escolha do melhor aluno segundo um único critério, mas segundo vários, tais como: aptidão para esportes, aptidão para esta ou aquela atividade de natureza comportamental, relacionamento, parentesco e potencial para doações para fundos universitários, etc.

 

18. Assim, só é possível que se extraia alguma coerência da ampliação do acesso do “negro” americano ao estudo universitário por motivo racial porque nenhum dos outros critérios de admissão no ensino universitário seriam prevalentes ao de sua condição de “negro”. O mesmo não se pode dizer do sistema de acesso ao ensino público universitário brasileiro. No Brasil, vige a igualdade de condições sob um único critério objetivo – a prova vestibular, que coloca o estudante “negro” em igualdade de condições com o “não-negro”, desde que obedecido que o acesso ao ensino básico e secundário seja de qualidade, igualitário e universal.

 

19. Por fim, a partir do caso Parents v. Seattle and Meredith v. Jefferson, a Suprema Corte Americana deu fim à política de cotas ao julgar inconstitucional que o acesso ao ensino seja justificado por meio de classificação racial, o que denota a falência da discriminação racial positiva nos Estados Unidos da América.

 

20. Antes de prosseguir na análise de que a raça não deve ser o fator de discrímen para privilegiar o “negro” em detrimento do “não-negro”, farei uma sintética referência à impossibilidade de se identificar o que seja o “negro”, porquanto essa questão é anterior à primeira e exige da Universidade Federal “poder discricionário” sem fundamento científico ou empírico.

 

 

IMPOSSIBILIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DO “NEGRO”

 

21. O auto-declarado “negro” submeter-se-á a uma comissão que lhe avaliará essa qualidade (artigo 8º., § 2º., da Resolução Normativa [XXX]). Esse critério, no entanto, não tem nenhum respaldo científico, servindo apenas à arbitrariedade.

 

Eugêne Schreider, especialista em antropologia física da Universidade de Paris, em artigo intitulado “Liaison anthropométriques dans l’espèce humaine” in Anthropologie, vol. LXVII, 1963, é peremptório em afirmar que o diagnóstico fundado na morfologia e constituição corporal não autoriza a identificação de raça. Basta dizer que, muitas vezes, o tipo étnico árabe, ou hindu, tem idênticas características do africano, sem que ninguém, nem mesmo o especialista em classificação étnica, para fins terapêuticos ou médicos, tenha condições de atestar a raça por intermédio de uma aferição visual. Tem exclusiva conotação estatística, portanto, a conclusão a que se chegou no Censo de 1991, no sentido de que a população de negros e pardos do Brasil era de 59,3 milhões, de uma população de 138,5 milhões. (Rio de Janeiro, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, Pesquisa nacional por amostra de domicílios – 1987, Cor da População, v. 1, 1990, p. 2-3).

 

22. Por esse motivo, concluo que a comissão especialmente formada para validar a auto-declaração racial não tem fundamento científico para identificar o que seria o “negro”, mormente no contexto brasileiro, em que, como se disse, a miscigenação é a característica essencial da Nação brasileira.

 

O NEGRO NÃO É INFERIOR PARA SER TUTELADO.

 

 

RACISMO E ESCRAVIDÃO

 

23. Após concluir que não é possível identificar o “negro” por fenótipos de aferição visual, seja por conta da falta de fundamento científico, seja por conta da forte miscigenação, penso ser relevante anotar que não é procedente o argumento de que o fator de discrímen teria fundamento histórico em virtude da escravidão.

 

24. Não raras vezes se lê o argumento de que, passados mais de cem anos da abolição da escravatura, o povo Brasileiro continuaria ainda em débito para com o “negro”. Absolutamente não se nega que a escravidão do “negro” no Brasil foi infame e teve conseqüências para a desigualdade social. O que parece, no entanto, imune à dúvida é que após a abolição se iniciou um processo irreversível de mobilidade social, não podendo ser considerado o “negro liberto”, após a abolição, sujeito a tutela por hipossuficiência. Sequer os defensores da abolição à época em que nossa Nação estava ainda em formação étnica admitiam que o “negro” continuaria a ser objeto de tutela, após a escravidão, por ser inferior. Alinho-me às idéias de Joaquim Nabuco, contidas no livro clássico “O Abolicionista”. Ed. Nova Aguilar, 2002, p. 114, para desacreditar na inferioridade do negro após a abolição da escravatura:

 

Não há assim, entre nós, castas sociais perpétuas, não há mesmo divisão fixa de classes […] Esse ente, [o escravo] assim equiparado, quanto à proteção social, a qualquer outra coisa de domínio particular, é, no dia seguinte à sua alforria, um cidadão como outro qualquer, com todos os direitos políticos, e o mesmo grau de elegibilidade. Pode mesmo, ainda na penumbra do cativeiro, comprar escravos, talvez quem sabe? – algum filho do seu antigo senhor. Isso prova a confusão de classes e indivíduos, e a extensão ilimitada dos cruzamentos sociais entre escravos e livres, que fazem da maioria dos cidadãos brasileiros, se se pode assim dizer, mestiços políticos, nos quais se combatem duas naturezas opostas: a do senhor de nascimento e a do escravo domesticado […] A escravidão, entre nós, manteve-se aberta e estendeu os seus privilégios a todos indistintamente: brancos ou pretos, ingênuos ou libertos, escravos mesmos, estrangeiros ou nacionais, ricos ou pobres; e dessa forma adquiriu, ao mesmo tempo, uma força de absorção dobrada e uma elasticidade incomparavelmente maior do que houvera tido se fosse um monopólio de raça, como nos Estados do Sul [dos Estados Unidos da América]. Esse sistema de igualdade absoluta abriu, por certo, um melhor futuro à raça negra, do que era o seu horizonte na América do Norte.

 

25. Não se sustenta, portanto, a tese de que a escravidão teria deixado indelével a dívida histórica com a raça “negra”. Se há dívida social – como de fato há – não é exclusivamente com o negro, mas com toda a universalidade dos que estejam socialmente em desvantagem. Se historicamente sofremos com a escravidão, condição análoga à dos escravos também tiveram os imigrantes europeus que para cá imigraram entre 1890 e 1930, porquanto não possuíam nenhuma qualificação nem recurso econômico, à exceção dos italianos urbanizados do norte da Itália, conforme noticia Carlos Hasenbalg, in Discriminação e Desigualdades Raciais no Brasil. Humanitas. 2005, p. 175.

 

26. Evidentemente não se nega, com isso, a existência de recrudescimento preocupante de racismo contra o “negro” no Brasil, como testemunham vários estudiosos, entre eles Carlos Hasenbalg, em sua tese de doutorado: “Discriminação e Desigualdades Raciais no Brasil”. Humanitas, 2005 e Lúcia Elena Garcial et al. “O Lugar do Negro na Força de Trabalho”. Rio de Janeiro: IBGE. Rio de Janeiro. 1985. O que se deve ter em conta, contudo, na análise deste mandado de segurança, é “se” e “como” o racismo é obstáculo ao acesso ao ensino superior.

 

 

RACISMO E ACESSO AO ENSINO

 

Enfrentar o racismo sem combater as suas causas escamoteia o fim da política pública de eliminação das desigualdades, por fatores raciais. Com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE de 2004, as diferenças de acesso à educação dos diferentes tipos de cor, na definição do IBGE, é possível concluir dois pontos fundamentais. Primeiro: as diferenças de renda e de educação familiar, e não de cor, são os principais indicativos de o candidato ser aprovado no vestibular de uma Universidade concorrida. Segundo: o desempenho do candidato “negro” ou pardo não é absolutamente equivalente à melhoria do seu padrão de educação e de renda. Isso, no entanto, não significa que o acesso universitário tenha sido negado pela discriminação racial. Releva entender, com base nesses dados, é por que famílias que teriam condições de proporcionar as condições adequadas para o estudo não as proporcionam. (confronte a respeito dos números que sustentam essas conclusões, estudo de Simon Schwartzman, in Divisões Perigosas. Políticas Raciais no Brasil Contemporâneo. Civilização Brasileira. 2007, p. 192 e 193)

 

Tenho por verdadeiro, portanto, que a discriminação racial não é fator direto de obstáculo do acesso ao ensino, nem há estudo que conclua dessa forma. “No Brasil contemporâneo, pelo menos, os negros, os mulatos em geral reduzem suas aspirações e deliberadamente limitam sua competição com os brancos, simplesmente para evitar serem lembrados ‘de seus lugares’ e sofrerem a humilhação pessoal e implícita em incidentes discriminatórios. De fato, evitar a discriminação parece constituir a principal causa da técnica de socialização utilizada pelos pais não brancos, para ajustar aspirações subjetivas às possibilidades objetivas e proteger seus filhos de frustrações futuras” Carlos Hasenbalg, in Discriminação e Desigualdades Raciais no Brasil. Humanitas. 2005, p. 210, fundamentado em idêntica conclusão de Florestan Fernandes. A Integração do Negro na Sociedade de Classes. 1965.

 

O enfrentamento e superação dessa questão de racismo demanda política pública de natureza muito mais difícil, complexa e onerosa do que a simples criação de quotas raciais na Universidade para ingresso do estudante. Penso que, de modo diverso, a solução não é simplesmente concorrer para atribuir Diploma de Bacharel mas, de fato, melhorar a qualidade do ensino e aumentar o número de vagas nas escolas públicas de ensino público médio e fundamental, de forma igualitária e universal, de modo a tornar também universal e igualitário o ensino universitário, seja a quem for e seja qual for a cor de sua pele. Diga-se o óbvio: atribuir título de Bacharel ao “negro” não significa eliminação do racismo e não tem o condão de abrir – por si só – oportunidade ao mais desfavorecido. Da forma preconizada pela [XXX], não causaria surpresa se o ingresso do auto-denominado “negro” se transformasse em mais um fator de acirramento das relações inter-raciais, por ser – por si só – discriminatório no sentido negativo.

 

A obsessão da outorga do status universitário foi analiticamente denunciada por Sérgio Buarque de Holanda no seu livro Raízes do Brasil, Ed. Nova Aguilar, 2002, p. 1.056-1058, em que dedica especial atenção ao “sentido do Bacherelismo”, como modelo colonial condenável em que se coloca em primeiro plano a posição social e em plano de descrédito a real capacidade de produzir e gerar riqueza, ou seja, o mérito. É temerária a crença de que a formação universitária outorgaria o status necessário ao individuo, de modo que apenas essa transformação bastaria para resolver as carências de mão-de-obra e de mercado, ou mesmo de “status social”, e, por si só, estaria apta ou de alguma forma contribuiria para resolver os verdadeiros problemas sociais brasileiros.

 

Raymond Boudon, in Education opportunity and social inequality, p.XI, demonstra que “é possível haver um declínio no decorrer do tempo na desigualdade de oportunidades educacionais sem um correspondente declínio na desigualdade de oportunidades sociais.” e sintetiza ainda Hasenbalg em nome do antropólogo norte-americano (opus cit. p. 204): “O raciocínio teórico de Boudon, junto com vários estudos empíricos realizados nos Estados Unidos – onde as relações entre as variáveis de estratificação nos grupos branco e não branco são analisadas – constituem forte evidência a favor da hipótese segundo a qual os relativos avanços educacionais dos não brancos não são necessariamente traduzidos em ganhos proporcionais em outras dimensões de estratificação.”

 

 

CONCLUSÃO

 

27. O ensino é serviço público e deve ser, por isso, universal e igualitário. Não se nega que é sedutora, para não dizer demagógica, a idéia de se prover ensino público da população “negra”, saneamento básico da população “negra”, abastecimento de luz da população “negra”, necessidades de água da população “negra”, enfim, todas as necessidades básicas do “negro”, mas isso não significa que os demais brasileiros devem deixar de ter acesso ao ensino, à luz, à água, ao esgoto, enfim, a todos os serviços públicos, em favor do “negro”.

 

Ora, ser “negro” não é fator adequado para a promoção de política pública porque o que se objetiva com a ampliação do ensino, do saneamento, do fornecimento de água e de luz é a universalização do serviço público independentemente de raça. Portanto, a supressão de vagas ao “não-negro” viola o princípio constitucional da igualdade, sem que haja real fator para privilegiar o denominado “negro”, em detrimento do denominado “não-negro”.”

 

Assim, diante destas considerações e com base em decisões proferidas por esta r. Justiça Federal, é que pode-se afirmar que o sistema de reserva e supressão de vagas, adotados pela [XXX], afronta princípios consagrados pela Constituição Brasileira.

 

Como bem demonstrado nos argumentos da Exma. Desembargadora, não se desconhece a farta mistura de raças que originou o povo brasileiro, nem que nossa nação sempre enfrentou inúmeras dificuldades sociais, entretanto, não podemos generalizar que tais indivíduos reduzem-se a negros e indígenas, de maneira que justificasse um tratamento diferenciado, não reverenciado pela Constituição.

 

Ao passo que não podemos esquecer também que as universidades prestam serviço público, seja pelo próprio Estado, nos casos das Instituições Públicas de Ensino, seja através de autorização/concessão a instituições privadas. Então que, de fato, só não tem o Estado a obrigação de fazê-lo, como também deve fazê-lo com eficiência, logo, não podendo desincumbir-se da prestação deste serviço público, como já tem se desincumbido da saúde, da segurança pública, das rodovias e dos ensino fundamental e médio-, tampouco pode de maneira ineficiente prestar o serviço que restou. E o direito à educação é uma máxime fundamental, sendo obrigação precípua do Estado, provê-lo a toda a coletividade.

 

A criação de vagas no ensino superior deveria ser o almejo principal das Universidades Públicas que, no entanto, deixam este espaço em aberto para ser ocupado pelas instituições privadas, que concentram alunos oriundos justamente de escolas públicas e que, por uma deficiência do modelo de ensino fundamental e médio, são então alijados das Universidades Públicas.

Por isso que se defende a idéia de que a [XXX] pode sim promover ações afirmativas, destinadas às minorias verificadas em seu quadro de estudantes, criando novas vagas para ingresso daqueles que, agasalhados pela política afirmativa, não obtenham o ingresso pela lista da classificação geral, sendo assim, nesse contexto, plenamente válida a criação de vagas suplementares e sua destinação aos indígenas. O que por esse mandado de segurança se condena, é o fato da [XXX] valer-se dessas razões e assim utilizar o caminho mais curto, ao arrepio da Constituição, simplesmente reservando vagas, sem no entanto, ampliar o acesso ao ensino público superior, o que era seu dever não somente se considerarmos o princípio da eficiência consagrado no art. 37 da Constituição Federal, mas também pelo simples fato de que a educação é “direito de todos e dever do Estado”.

 

E por tratar-se a educação superior de prestação de serviço público, deve também seguir seus princípios e normas regedoras. No caso do acesso ao ensino público superior, não há outra forma de prover o preenchimento das vagas oferecidas, que não seja pelo ingresso seletivo dos melhores- ou do mérito acadêmico, em outras palavras-, onde somente ingressariam os melhores, os mais bem preparados, para então, dar o melhor retorno a toda a coletividade, e desta forma, prestigiar sempre, em primeiro lugar, o interesse público, que assim restaria atingido.

 

E não há interesse público maior que não seja a formação profissional dos melhores indivíduos, dos mais capacitados e mais bem preparados, que então representarão, num futuro próximo, o Brasil de amanhã, com menos desigualdades e injustiças.

 

Deve o acesso ao ensino superior respeitar as rigorosas regras que regem a vida da Administração Pública, em especial, à seleção de seu pessoal. Ora, se para o ingresso na Administração Pública deve ser respeitado rigorosos critérios de seleção, qual seja, o concurso público, não se pode permitir que nas universidades públicas o critério de ingresso seja diferente.

 

E o modelo de vestibular hoje adotado (sem o critério de cotas) é o que mais perto se chega desse modelo, por ora vigente. E tal qual em concursos públicos, nas universidades públicas, diante da impossibilidade de prestação universal desse serviço, deve então ser ele destinado aos melhores, pois como afirmado pela ilustríssima Desembargadora Federal, “aqui, repousa o princípio do mérito acadêmico, que não se destina a proteger interesses individuais, mas sim, é do interesse da sociedade, o retorno do melhor para a sociedade”.

 

Ainda, podemos visualizar a ilegalidade cometida pela Universidade [XXX] sob outro prisma, fazendo-se uma analogia do ingresso nas Universidades Públicas ao concurso de ingresso na Magistratura.

 

Isto porque, considerando-se o fato de que o ensino universitário é prestação de serviço público, e que seus princípios e normas deve respeitar, assim como a carreira de Magistrado e seu ingresso nela, imagine-se a situação de insegurança jurídica que se estabeleceria, acaso fosse adotado o sistema de cotas para “negros” e “egressos do ensino público” em um concurso para a Magistratura, seja estadual ou federal.

 

Seria legítimo então vermos aprovados, para exercer o cargo de Juiz togado, um candidato cotista que atingisse média bem inferior a outro candidato “não-cotista”, e que, por esta condição, restou reprovado? O interesse público seria atingido quando aquele suposto candidato “menos favorecido” atingisse o almejado cargo de Juiz?

 

Ou o interesse público somente restaria atingido, acaso fossem rigorosamente selecionados os melhores candidatos para o referido cargo, aqueles que detivessem as maiores notas e os melhores desempenhos, os mais bem preparados?

 

A própria situação do Judiciário catarinense responde essa pergunta, se levarmos em conta que em TODOS OS CONCURSOS PARA JUIZ ESTADUAL realizados nos últimos anos, o número de vagas disponíveis foi sempre bem maior do que o número de candidatos aptos para preenchê-las, tanto o é que temos inúmeras Varas e Comarcas, estado afora, sem nenhum Juiz.

 

Isto porque, simplesmente, não podemos selecionar tantos candidatos quantos números de vagas existam, mas sim, os melhores e os mais bem preparados para o exercício deste importante ofício.  Aqui, repousa também o critério do mérito, de maneira que, ao argumento de favorecer ou discriminar alguns, não se pode prejudicar a todos.

Daí porque afirmamos que o sistema de cotas adotado pela [XXX] foi instaurado ao desamparo da lei, e nela não se sustenta. Não podemos deixar que fortes sentimentalismos tape-nos os olhos e, sob o manto da autonomia universitária, possam as instituições de ensino legislar, posto que tal autonomia deve ser interpretada restritivamente, bem como a função de legislar é inerente ao Poder Legislativo, tão somente.

 

 

 

II.3 DA NECESSIDADE DE CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR

 

Dois são os requisitos fundamentais para concessão de Liminares que antecipam os efeitos de sentenças concessivas de Mandados de Segurança; o fumus boni juris e o periculum in mora, conforme o Art. 7º, II, da Lei nº 1.533, de 13/12/51.

 

O fumus boni juris acha-se perfeitamente demonstrado, face à cristalina afronta ao texto constitucional que propugna a IGUALDADE de condições para o acesso e permanência na escola (artigo 206, I da CF).

 

Ademais, a Resolução Normativa [XXX], ao reservar vagas a candidatos “negros” e “provenientes de ensino público”, é INCONSTITUCIONAL, a teor dos artigos 5º e 206, I da Carta Magna, haja vista que trata desigualmente pessoas iguais (o fato de ser “negro” ou “branco” não constitui fator determinante de inferioridade ou superioridade intelectual a ponto de considerá-los desiguais), bem como impõe injusta DISCRIMINAÇÃO em razão de cor, raça e procedência acadêmica!

 

Face a isso, é absolutamente legítimo e primordial que o Impetrante tenha seus lídimos direitos constitucionais reconhecidos e respeitados, a fim de restar aprovado no curso [XXX], que se realizou em 7, 8 e 9 de dezembro de 2.008, uma vez ter atingido a [XXX]ª colocação das 100 vagas oferecidas.

 

O periculum in mora deflui do fato de que a avaliação dos candidatos procede-se logo após a conclusão do concurso de vestibular e, caso não deferida a liminar neste momento, o impetrante, que ficou classificado na 115ª vaga das 100 oferecidas, não poderá efetuar a matrícula e nem cursar a faculdade escolhida.

 

Muito embora, a impetrante não esteja dentro dos classificados pelo vestibular, insta asseverar que na Segunda Chamada do Concurso Vestibular de 2009, divulgado 19/02/2009, mais 9 candidatos foram chamados. Diante disto, como dentro de poucos meses o semestre letivo de 2009.2 se iniciará, e tendo em vista a quantidade de desistências ser grande, resta cristalino que a impetrante certamente será chamada pela instituição de ensino para compor no quadro de alunos.

 

Ante o vislumbrado, resta cristalino o periculum in mora nesta prestação jurisdicional, pois caso o semestre letivo de 2009.2 inicie-se e os candidatos a serem chamados obedeçam a ordem das Ações Afirmativas imposta pela instituição de ensino, a impetrante jamais será chamada, e caso seja, já haverá passado mais de 1 mês de aulas, tornando, por tal razão, inviável e desnecessária a chamada de novos alunos, haja vista já ter transcorrido mais de 25% do semestre letivo e, assim, o aluno chamado ao se matricular na instituição de ensino já estaria automaticamente reprovado em todas as disciplinas por freqüência insuficiente.

 

Portanto, é clarividente que o direito da impetrante em ser a 115ª candidata a ser chamada para o curso de [XXX], estando visivelmente presentes os requisitos essenciais para a concessão da liminar in audita altera part, ou seja, vislumbra-se claramente pelo já exposto o periculum in mora  e o fumus boni iuris no caso em tela.

 

 Ainda, cabe trazer a baila os ensinamentos Hely Lopes Meirelles: A liminar não é uma liberalidade da justiça; é medida acauteladora do direito do impetrante, que não pode ser negado quando ocorrem os seus pressupostos. (Mandado de Segurança e Ação Popular, 10ª. Ed. São Paulo: RT, 1985, pag. 47).

 

III-    DO PEDIDO:

 

Constando a palpável arbitrariedade e ilegalidade do ato praticado e os danos que dele sobrevieram ao Impetrante, REQUER-SE:

 

1 – a notificação dos impetrados para prestarem informações no prazo legal, sob as penas da lei;

 

2 – seja deferida a MEDIDA LIMINAR pleiteada, nos termos do Art. 7º, II, da Lei 1.533/51, para declarar a ilegalidade/inconstitucionalidade de forma incidental dos artigos 2º, incisos I e II, artigo 6º, incisos I e II, 7º e 8º, caput e parágrafos e 14 da Resolução normativa [XXX], determinando que a instituição de ensino proceda com o impetrante o mesmo procedimento adotado para os aprovados no vestibular da [XXX], uma vez ter alcançado a [XXX]ª posição das 100 disponíveis ao curso de [XXX], sem que leve-se em conta os óbices das ações afirmativas relativas às vagas destinadas a “negros” e “alunos provenientes do ensino público”,  previstas na mencionada Resolução e Edital, e, assim, a impetrante seja a [XXX]ª aluna a ser chamada no curso aludido acima, ou seja, requer que este MM. Juízo garanta o direito da impetrante em ser chamada no concurso vestibular [XXX];

 

3 – no mérito, ao final seja concedida a segurança, declarando a ilegalidade/inconstitucionalidade de forma incidental dos artigos 2º, incisos I e II, artigo 6º, incisos I e II, 7º e 8º, caput e parágrafos e 14 da Resolução normativa XXX], determinando que a instituição de ensino proceda com o impetrante o mesmo procedimento adotado para os aprovados no vestibular da [XXX], uma vez ter alcançado a [XXX]ª posição das 100 disponíveis ao curso de [XXX], sem que leve-se em conta os óbices das ações afirmativas relativas às vagas destinadas a “negros” e “alunos provenientes do ensino público”,  previstas na mencionada Resolução e Edital, e, assim, a impetrante seja a [XXX]ª aluna a ser chamada no curso aludido acima, ou seja, requer que este MM. Juízo garanta o direito da impetrante em ser chamada no concurso vestibular [XXX];

 

4- Leve-se ainda em consideração o perigo na demora, bem como seja dada tramitação prioritária ao feito tendo em vista que as matrículas deverão ser realizadas em data próxima.

 

5-  a intimação do Ministério Público Federal para apresentar suas considerações acerca do caso em tela;

 

 

Dá-se a causa o valor de R$ 100,00 (cem reais) para efeitos meramente fiscais.

 

Nestes Termos,

Espera Deferimento.

 

 

Local e data

 

 

 

 

NOME DO ADVOGADO

OAB/UF XXX

Como citar e referenciar este artigo:
MODELO,. Mandado de Segurança (com pedido de liminar) – Cotas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/peticoes/mandado-de-seguranca/mandado-de-seguranca-com-pedido-de-liminar-cotas/ Acesso em: 19 mar. 2024