Direito do Consumidor

Modelo de ação revisional de contrato de leasing c/c manutenção de posse

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ….. VARA CÍVEL DA COMARCA DE ….., ESTADO DO …..

….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG n.º ….. e do CPF n.º ….., residente e domiciliado (a) na Rua ….., n.º ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., por intermédio de seu (sua) advogado(a) e bastante procurador(a) (procuração em anexo – doc. 01), com escritório profissional sito à Rua ….., nº ….., Bairro ….., Cidade ….., Estado ….., onde recebe notificações e intimações, vem mui respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor:

AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE LEASING CUMULADA COM MANUTENÇÃO DE POSSE

em face de

….., pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o n.º ….., com sede na Rua ….., n.º ….., Bairro ……, Cidade ….., Estado ….., CEP ….., representada neste ato por seu (sua) sócio(a) gerente Sr. (a). ….., brasileiro (a), (estado civil), profissional da área de ….., portador (a) do CIRG nº ….. e do CPF n.º ….., pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.

DOS FATOS

O autor firmou contrato de arrendamento mercantil (leasing), com a empresa requerida em …. de …. de ….

Pretendia, no primeiro momento, realizar um simples financiamento, sendo, no entanto, oferecido ao consumidor um negócio que, ora mantinha características de compra e venda, ora apresentava características totalmente díspares do modelo contratual oferecido.

Na realidade, sendo pessoa destituída de conhecimentos específicos na área jurídica, foi simplesmente apresentado “contrato de adesão”, que no intuito do consumidor, representava um financiamento, sem qualquer explicação sobre juros e forma de cálculo do mesmo.

Diligente com suas obrigações, contudo, o autor foi percebendo um excessivo valor nas parcelas a serem pagas mensalmente, totalmente incompatíveis com o valor que foi emprestado.

Por diversas vezes o autor procurou o banco requerido, recebendo como resposta que:

“se o contrato estava assinado, deveria assim ser cumprido.”

Diante de qualquer atraso, encargos altíssimos vinham a incidir sobre as parcelas, dificultando o adimplemento do contrato.

Apenas neste momento, o autor tomou conhecimento de ilegalidades plasmadas no negócio, que proporcionavam um excesso na cobrança do empréstimo.

Sob os auspícios do princípio do pacta sunt servanda pretende a requerida desconsiderar a norma constitucional e a legislação infraconstitucional impelindo o consumidor à busca de seus direitos perante o poder judiciário.

DO DIREITO

1. A relação de consumo e aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

O Código de Defesa do Consumidor promoveu uma radical mudança de enfoque para as relações contratuais nas quais uma Empresa fornece serviços e um particular os aufere como destinatário final. Tamanha foi a transformação no direito dos contratos e no direito das obrigações em geral que novos paradigmas de “relação jurídica” foram criados, chamando para si outras garantias conferidas pelo Estado, que não aquelas vazadas no Código de Beviláqua.

O que temos no caso sub iudice, conforme os elementos internos da relação travada entre o Sr. …. e a empresa …., confrontados com o disposto nos artigos 1º, 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, é uma Relação de Consumo. Isto porque, analisando o papel social juridicamente relevante do autor, percebemos que este é consumidor final do objeto de prestação de serviços do banco: a prestação de crédito; por outro lado, analisando o papel social juridicamente relevante do banco requerido, chegamos à conclusão de que este fornece diversos serviços de crédito e gestão patrimonial, como no caso em tela.

Doutrina e jurisprudência demonstram entendimento uníssono:

“A CARACTERIZAÇÃO DO BANCO OU INSTITUIÇÃO FINANCEIRA COMO FORNECEDOR ESTÁ POSITIVADA NO ART. 3º, CAPUT DO CDC E ESPECIALMENTE DO § 2º DO REFERIDO ARTIGO, O QUAL MENCIONA EXPRESSAMENTE COMO SERVIÇOS AS ATIVIDADES DE NATUREZA BANCÁRIA, FINANCEIRA, DE CRÉDITO.” (MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 198)

O MM. Juiz de direito da 3ª Vara Cível, Dr. Fernando Antonio Prazeres é enfático ao propugnar a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor:

“NÃO TENHO A MENOR DÚVIDA NO QUE DIZ RESPEITO À APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AOS CONTRATOS BANCÁRIOS. POSIÇÕES EM CONTRÁRIO EXISTEM, É CLARO, E A RESPEITO, POR ÓBVIO. CONTUDO, NÃO PASSAM DE MERO EXERCÍCIO DE RETÓRICA, SIMPLES JOGO DE PALAVRAS QUE TENTAM EVITAR O INEVITÁVEL.” (DECISÃO LIMINAR PROFERIDA NOS AUTOS 96/99, 3ª VARA CÍVEL DE CURITIBA, JUIZ DE DIREITO FERNANDO ANTONIO PRAZERES)

Assim também o entendimento do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná:

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO PARANÁ. APELAÇÃO CÍVEL 0121715-8 – CURITIBA – 10ª VARA CÍVEL – Ac. 10017. JUIZ CONV. ALBINO JACOMEL GUERIOS – QUARTA CÂMARA CIVEL – Revisor: JUIZ CONV. JURANDYR SOUZA JUNIOR.

Unânime – Julg: 09/09/98 – DJ: 25/09/98.

O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR APLICA-SE À ATIVIDADE BANCÁRIA, RELATIVIZANDO A PACTA SUNT SERVANDA E POSSIBILITANDO AO JUIZ O REEXAME DO CONTEÚDO DO CONTRATO PARA REEQUILIBRÁ-LO E EVITAR QUE O CONTRATANTE ECONOMICAMENTE MAIS FORTE ESTABELEÇA CONDIÇÕES INÍQUAS E ABUSIVAS.”

A letra da lei realmente não deixa espaço para dúvidas a respeito da natureza consumerista da relação jurídica, definindo expressamente o serviço bancário como espécie subsumida às diretivas do CODECON:

“§ 2º SERVIÇO É QUALQUER ATIVIDADE FORNECIDA NO MERCADO DE CONSUMO, MEDIANTE REMUNERAÇÃO, INCLUSIVE AS DE NATUREZA BANCÁRIA, FINANCEIRA, DE CRÉDITO E SECURITÁRIA, SALVO AS DECORRENTES DAS RELAÇÕES DE CARÁTER TRABALHISTA.”

Se estamos diante de uma relação de consumo, devemos afastar a tratativa clássica dos contratos, adotando o disposto na legislação protetiva do Código de Defesa do Consumidor.

Neste sentido, assevera Fábio Ulhoa COELHO:

“A relação de consumo, tal como se pode concluir das definições contidas nos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor configura o objeto da legislação protecionista do consumidor. Se o ato jurídico envolve, de um lado, pessoa que se pode chamar de consumidora e, de outro, alguém que se pode ter por fornecedor, então o regime da disciplina do referido ato se encontra no Código de Defesa do Consumidor.” (COELHO, Fabio Ulhoa. O empresário e os Direitos do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 43)

O fato do litígio ter por objeto um dano proveniente de um contrato de consumo promove uma mudança de enfoque da autonomia da vontade para a diretiva tutelar visando a igualdade material dos contratantes – a garantia conferida pelo ordenamento jurídico é diferenciada, pois é teleologicamente orientada.

Esta é a opinião do civilista argentino Gabriel Stiglitz:

“A partir da cunhagem desta nova concepção humanista e solidária, se reconhece a necessidade de intervenção do Estado, através de soluções legislativas, judiciais e administrativas, para que os contratos se conformem ao bem comum, aos princípios essenciais da justiça e da ordem pública, objetivando, destarte, recompor o equilíbrio no âmbito do interesse social.” (STIGLITZ, Gabriel. O direito contratual e a proteção jurídica do consumidor. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, Revista dos Tribunais, n. 1, p. 185)

2. A qualificação dos contratos

Trata-se de contratos no qual todas as cláusulas são predispostas, sendo assim classificado enquanto “contrato por adesão”.

Nesta espécie de contrato tem-se como característica a limitação da vontade do contratante hipossuficiente – no caso o consumidor – à adesão ou não ao pré-disposto.

Justamente pela necessidade de proteção ao contratante que não possui a menor possibilidade de decidir sobre os termos do contrato, é que o Código de Defesa do Consumidor regula extensivamente a questão:

“ART. 54. CONTRATO DE ADESÃO É AQUELE CUJAS CLÁUSULAS TENHAM SIDO APROVADAS PELA AUTORIDADE COMPETENTE OU ESTABELECIDAS UNILATERALMENTE PELO FORNECEDOR DE PRODUTOS OU SERVIÇOS, SEM QUE O CONSUMIDOR POSSA DISCUTIR OU MODIFICAR SUBSTANCIALMENTE SEU CONTEÚDO.

§ 1º A INSERÇÃO DE CLÁUSULA NO FORMULÁRIO NÃO DESFIGURA A NATUREZA DE ADESÃO DO CONTRATO.

§ 2º NOS CONTRATOS DE ADESÃO ADMITE-SE CLÁUSULA RESOLUTÓRIA, DESDE QUE A ALTERNATIVA, CABENDO A ESCOLHA AO CONSUMIDOR, RESSALVANDO-SE O DISPOSTO NO § 2º DO ARTIGO ANTERIOR.

§ 3º OS CONTRATOS DE ADESÃO ESCRITOS SERÃO REDIGIDOS EM TERMOS CLAROS E COM CARACTERES OSTENSIVOS E LEGÍVEIS, DE MODO A FACILITAR SUA COMPREENSÃO PELO CONSUMIDOR.

§ 4º AS CLÁUSULAS QUE IMPLICAREM LIMITAÇÃO DE DIREITO DO CONSUMIDOR DEVERÃO SER REDIGIDAS COM DESTAQUE, PERMITINDO SUA IMEDIATA E FÁCIL COMPREENSÃO.”

Há que se ressaltar que estamos em um campo do Código de Defesa do Consumidor aplicável mesmo diante da inexistência de relação de consumo (o que não se admite), pois nos termos do artigo 29 deste diploma legal temos o “consumidor por equiparação”.

Cabe ressaltar que desvirtuamento do modelo de “contrato de arrendamento financeiro”, em desfavor ao consumidor, em nenhum momento fica claro para o negociante leigo. Apenas através da leitura técnico-jurídica e técnico-matemática as ilegalidades afloram, sendo topicamente abordadas, a seguir.

Neste sentido, cabe lembrar a advertência do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, José Antônio Delgado:

“O LEASING, NA PRÁTICA, VEM SEMPRE AFETADO, EM SUA CONSTITUIÇÃO, PELA FORMA CONTRATUAL ADESIVA. EM CONSEQÜÊNCIA, A INTERPRETAÇÃO DE SUAS CLÁUSULAS HÁ DE SER FEITA TENDO EM CONSIDERAÇÃO ESSE FATO, PELO QUE NÃO SE PODE CONSIDERAR, COMO REGRA ABSOLUTA, DE QUE A VALIDADE E A EFICÁCIA DAS MESMAS ESTÃO APEGADAS AO PRINCÍPIO DO ‘PACTA SUNT SERVANDA’ (DELGADO, JOSÉ ANTÔNIO. LEASING: DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA. CURITIBA: JURUÁ, 1999, P. 123)

3. O desvirtuamento do contrato e a cobrança antecipada do valor residual

O contrato de arrendamento mercantil financeiro, segundo Magistério do Ministro do Superior Tribunal de Justiça, possui:

“a) os equipamentos são adquiridos, primeiramente, pela empresa leasing, a qual vai financiar, por indicação do cliente;

b) após a aquisição, os referidos equipamentos são arrendados, fazendo-se constar nos contratos a cláusula de compra tão logo se extinga o prazo contratual.”

(DELGADO, José Antônio. Leasing: Doutrina e Jurisprudência. Curitiba: Juruá, 1999, p. 123)

Neste sentido, a explicação clara e precisa do precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça:

“O leasing é contrato complexo, consistindo fundamentalmente num arrendamento mercantil com promessa de venda do bem após o término do prazo contratual, servindo então as prestações como pagamento antecipado da maior parte do preço.” (Superior Tribunal de Justiça. Resp 16.824-0 São Paulo, Rel. Min. Athos Gusmão Carneiro)

Digníssimo Julgador …

O negócio jurídico, exigiu do consumidor, conforme item …. do contrato, pagamento de valor residual, no momento da contratação, antecipando a opção de compra do bem, no valor de R$ …. (….)!

Não bastasse tal fato, também foi cobrado, em todas as prestações, valores residuais diluídos, no valor de R$ …. (….), perfazendo um total de R$ …. (….).

Tal fato, aliado a outras ilegalidades abaixo delineadas, conferem à Empresa requerida a agradável situação de cobrar quantias ilegais e, diante da falta de pagamento de prestações, simplesmente, solicitar a reintegração de posse do bem, fazendo com que o consumidor perca, não só todas as quantias pagas referentes ao arrendamento em si, mas também o valor de compra adiantado.

Trata-se de cláusula que proporciona o enriquecimento sem causa do fornecedor, em duas situações:

a) no caso do consumidor optar pela devolução do bem, ao final do contrato;

b) no caso do consumidor deixar de pagar alguma prestação.

Nestas duas hipóteses, o consumidor simplesmente perde a quantia paga no início do contrato, ficando o fornecedor com o numerário, sem qualquer causa jurídica para tanto!

Mostra-se aplicável, para superação de referida ilegalidade, o disposto no artigo 51, inciso IV e § 1º:

“ART. 51. SÃO NULAS DE PLENO DIREITO, ENTRE OUTRAS, AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS RELATIVAS AO FORNECIMENTO DE PRODUTOS E SERVIÇOS QUE:

(…)

IV – ESTABELEÇAM OBRIGAÇÕES CONSIDERADAS INÍQUAS, ABUSIVAS, QUE COLOQUEM O CONSUMIDOR EM DESVANTAGEM EXAGERADA, OU SEJAM INCOMPATÍVEIS COM A BOA-FÉ OU A EQÜIDADE;

(…)

§ 1º PRESUME-SE EXAGERADA, ENTRE OUTROS CASOS, A VONTADE QUE:

(…)

III – SE MOSTRA EXCESSIVAMENTE ONEROSA PARA O CONSUMIDOR, CONSIDERANDO-SE A NATUREZA E CONTEÚDO DO CONTRATO, O INTERESSE DAS PARTES E OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS PECULIARES AO CASO.”

A onerosidade excessiva encontra-se no cobrar, antecipadamente, quantia, retirando do consumidor o que deve ser uma “opção de compra”, e não uma “coação à compra”.

Ocorre através desta cláusula verdadeiro desvirtuamento do contrato de leasing, fazendo com que esse assuma muito mais a característica de compra e venda à prazo, do que de arrendamento mercantil propriamente dito, no qual existe uma locação com opção de compra, ao final do contrato.

Neste sentido, no cálculo em anexo, retira-se o pagamento do Valor Residual do Bem, para fins de determinação se existe real inadimplência ou não.

4. Os juros aplicados

O contrato pactuado, ao arrepio do disposto em toda a legislação aplicável, fixa taxas de juros no montante de ….% de juros ao mês, alcançando o montante de ….% ao ano.

Nestes termos, apresenta-se no anexo 1, primeira planilha contábil demonstrando que, nos meses pactuados, com taxas de juros de ….% ao ano tem-se uma prestação de R$ …. (….).

A Constituição Federal, contudo, é expressa ao fixar como limite máximo para cobrança de juros o patamar de 12% ao ano, em seu artigo 192:

“AS TAXAS DE JUROS REAIS, NELA INCLUÍDAS COMISSÕES E QUAISQUER OUTRAS REMUNERAÇÕES DIRETA OU INDIRETAMENTE REFERIDAS À CONCESSÃO DE CRÉDITO, NÃO PODERÃO SER SUPERIORES A DOZE POR CENTO AO ANO;”

Na continuação de referido dispositivo também está expressa a qualificação jurídica de cobrança superior a 12% ao ano de juros:

“A COBRANÇA ACIMA DESTE LIMITE SERÁ CONCEITUADA COMO CRIME DE USURA, PUNIDO , EM TODAS AS SUAS MODALIDADES, NOS TERMOS QUE A LEI DETERMINAR.”

Trata-se portanto de cobrança criminosa que, pautada em informes publicitários que desenvolvem o desejo pelo consumo, levando o consumidor à uma fictícia inadimplência, já que na verdade o quantum cobrado não corresponde aos padrões de legalidade dispostos em nosso ordenamento.

O Tribunal de Alçada do Estado do Paraná tem reconhecido a limitação dos juros reais de 12% ao ano nos contratos bancários, conforme leading case decidido pela quarta câmara cível:

“A Constituição Federal é de 1988; já se passaram quase dez anos desde que passou a vigorar, e os congressistas não demonstraram apetite em regulamentar o sistema financeiro, como manda o ‘caput’ do artigo 192 da lei maior.

(…)

Não se pode mais aguardar a falta de vontade dos congressistas, cabendo ao judiciário suprir o que deveria ter sido feito pelo legislador, eis que as teses que defendem a autoaplicabilidade do art. 192, § 3º da Constituição Federal, são, igualmente, respeitáveis.

(…)

Os banqueiros brasileiros devem se adaptar a índices civilizados de cobrança de juros. As revistas especializadas contam que na Europa, Estados Unidos e Japão, os bancos não se arriscam a ultrapassar o patamar de 12% ao ano. Menos iates, menos mansões luxuosas, menos carros importados, menos latifúndios especulativos, menos agonia de ficar biliardário em uma geração e mais competência, mais criatividade: estes os caminhos do capitalismo decente. O capital deve ter uma função social, assim como a propriedade.

(…)

Assim, por qualquer ângulo que se olhe, aplicando-se a Constituição Federal ou a lei de usura, os bancos estão proibidos de cobrar juros remuneratórios acima de 12% ao ano, inclusive porque, em derradeiro argumento, por mais que se regulamente o art. 192, § 3º da Carta Magna, os juros reais jamais poderão ser superiores a 12% ao ano.” (Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, apelação cível n.º 126.081-7, Relator Juiz Ruy Cunha Sobrinho)

Tal acórdão vem a sepultar a controvérsia sobre a aplicabilidade imediata do dispositivo constitucional que limita os juros ao patamar máximo de 12% ao ano.

No ano de 1988, em sede de embargos infringentes, a 4ª Câmara Cível reunida do Tribunal de Alçada do Paraná pacificou a questão, declarando a aplicabilidade imediata da norma constitucional:

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO PARANÁ. EMBARGOS INFRINGENTES (GR) 0110677-6/02 – CURITIBA – 11ª VARA CÍVEL – AC. 688 JUIZ CONV. JOSÉ MOLTENI FILHO – QUARTO GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS – Revisor: JUIZ CLAYTON CAMARGO. Por Maioria – JULG: 14/04/98 – DJ: 12/06/98. JUROS – LIMITAÇÃO CONSTITUCIONAL EM 12% AO ANO – ARTIGO 192, 3, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – NORMA AUTO-APLICÁVEL – DESNECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO – RECURSO DESPROVIDO. AS NORMAS CONSTITUCIONAIS QUE CONTENHAM VEDAÇÕES, DECLARAÇÕES DE DIREITO OU PROIBIÇÕES, SÃO, DE REGRA, DE EFICÁCIA PLENA. POR SER UMA NORMA PROIBITÓRIA E POR CONFERIR TAMBÉM UM DIREITO AOS QUE OPERAM NO MERCADO FINANCEIRO, O 3, DO ART. 192, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E DE APLICABILIDADE IMEDIATA E DE EFICÁCIA PLENA.”

Neste sentido também os seguintes precedentes de nosso Tribunal de Alçada:

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO PARANÁ. APELAÇÃO CÍVEL 0121715-8 – CURITIBA – 10ª VARA CÍVEL – Ac. 10017. JUIZ CONV. ALBINO JACOMEL GUERIOS – QUARTA CÂMARA CÍVEL – Revisor: JUIZ CONV. JURANDYR SOUZA JÚNIOR. Unânime – Julg.: 09/09/98 – DJ: 25/09/98. O ARTIGO 192, (…) PARÁGRAFO 3, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL É AUTO-APLICÁVEL. (…)”

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO PARANÁ. APELAÇÃO CÍVEL 0082074-2 – PONTA GROSSA – 2ª VARA CÍVEL – Ac. 7604. JUIZ CONV. ALBINO JACOMEL GUERIOS – OITAVA CÂMARA CÍVEL – Revisor: JUIZ AIRVALDO STELA ALVES. Unânime – Julg.: 10/08/98 – DJ: 28/08/98. EMBARGOS DO DEVEDOR. CONTRATO BANCÁRIO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RELATIVIZAÇÃO DA PACTA SUNT SERVANDA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA – INDÉBITO. AUTO-APLICABILIDADE DO ARTIGO 192, PARÁGRAFO 3, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. (…)”

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO PARANÁ. APELAÇÃO CÍVEL 0117360-4 – SÃO MIGUEL DO IGUAÇU – VARA CÍVEL – Ac. 9702. JUIZ CLAYTON CAMARGO – QUARTA CÂMARA CIVEL – Revisor: JUIZ CONV. ALBINO JACOMEL GUERIOS. Por Maioria – Julg.: 20/05/98 DJ: 07/08/98.

(…) LIMITAÇÃO DE JUROS – ART. 192, 3, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – DESNECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO (VENCIDO APENAS NESTE TÓPICO O JUIZ RELATOR) – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – IMPOSSIBILIDADE – SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.”

A aplicabilidade deste dispositivo, aliás, é arduamente defendida por constitucionalistas do mais alto quilate (cf. Silva, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998).

Mesmo que esta não fosse considerada norma de eficácia plena e aplicabilidade imediata, na pior das hipóteses, seria considerada norma de eficácia contida e aplicabilidade imediata, ou como as denomina Michel Temer, norma de eficácia contível, ou seja, enquanto não sobrevier dispositivo regulamentador esta deve ser integralmente aplicada: sua contenção só pode ocorrer diante do trabalho efetivo do legislador! (Temer, Michel. Elementos de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 1991).

5. O pedido de tutela antecipada visando consignação em pagamento

Conforme Magistério de Luiz Guilherme Marinoni, em reformulação à clássica lição Chiovendiana, “a justiça em destempo não é justiça”.

O autor nunca negou-se a cumprir com suas obrigações, não podendo, contudo, ser pressionado a pagar quantias nitidamente ilegais.

Diante da revisão do contrato nos termos expostos, conforme planilhas …. e …., tem-se como certo o valor da prestação equivalente a R$ …. (….).

Nestas planilhas, em primeiro momento são aplicados os juros conforme montante constitucional (anexo ….) e posteriormente deduzido o que já foi pago a mais pelo consumidor, devido à injusta incidência de juros e cobrança antecipada do valor de compra do bem (anexo …. e ….).

O consumidor, tendo que arcar com todo o ônus do tempo do processo, acaba sendo compelido a pagar por quantias abusivas, sendo que ao final da cognição ampla e restrita, caso obtenha sucesso na demanda, terá inclusive valores a receber a título de repetição de indébito.

Neste sentido, pede-se a antecipação de tutela no sentido de legitimar a consignação em pagamento do valor alcançado nas planilhas juntadas em anexo, antecipando os termos da revisão do contrato.

Todos os requisitos previstos no artigo 273 do digesto processual encontram-se presentes:

a) prova inequívoca: conforme planilhas contábeis juntadas em anexo, e nos termos do contrato travado entre as partes, fica expressa a cobrança antecipada de valor para compra do bem, assim como a aplicação de juros em patamar muito superior ao permissivo constitucional;

b) verossimilhança: o consumidor não se encontra em situação de inadimplência. Pretende, tão somente, que o contrato seja cumprido nos termos do direito positivo;

c) fundado receio de dano irreparável: caso não seja determinada a antecipação de tutela, o consumidor será impelido a pagar valores excessivos, pautados na ilegalidade. Ademais, sendo parte hipossuficiente, sofre consideravelmente mais os efeitos da injusta perda de numerário que um banco;

d) inexistência de perigo de irreversibilidade: o banco requerido, nos termos dos anexos, tem recebido quantias a mais desde …. de …., ou seja, não corre qualquer risco de irreversibilidade, vez que seu crédito, com a consignação de pagamento, continuará a ser pago!

6. A tutela antecipatória visando a manutenção de posse do bem

Diante da cobrança abusiva de juros e do valor residual de garantia, tanto no momento da contratação, quanto diluído nas parcelas, o consumidor, como demonstrado, tem sido impulsionado a pagar por quantias excessivas.

Da mesma forma, o consumidor tem sofrido diversas ameaças por parte da requerida no sentido de tentar propugnar pela rescisão contratual e reintegração de posse do bem.

Corrigidas as ilegalidades, contudo, mostra-se firme e preciso o negócio entre as partes.

Requer-se, neste sentido, antecipadamente, a manutenção de posse do bem objeto do contrato, sob os mesmos fundamentos acima dispostos para o pedido de antecipação de tutela quanto a consignação de valores.

O Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, aliás, tem mostrado entendimento favorável a esta espécie de tutela:

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DO PARANÁ. AGRAVO DE INSTRUMENTO 0095159-5 – CURITIBA – 2ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA – AC. 8319 – JUIZ DOMINGOS RAMINA – TERCEIRA CÂMARA CÍVEL. Unânime – Julg.: 15/04/97 – DJ: 02/05/97.

(…)

EM FACE DA CONSIGNAÇÃO DOS VALORES DAS CONTRAPRESTAÇÕES DO ARRENDAMENTO, COM EXCLUSÃO DAS PARCELAS DA ANTECIPAÇÃO DA GARANTIA DO VALOR RESIDUAL, QUE É OBJETO DE DISCUSSÃO JUDICIAL, DESCARACTERIZADA ESTA A MORA DA DEVEDORA, PELO QUE SE JUSTIFICA A CONCESSÃO DA LIMINAR DE MANUTENÇÃO DE POSSE DO BEM ARRENDADO EM FAVOR DA ARRENDATÁRIA ATÉ QUE, NA LIDE PRINCIPAL, SE DEFINA O VALOR EXATO DA DÍVIDA.”

“TRIBUNAL DE ALÇADA DO ESTADO DO PARANÁ. AGRAVO DE INSTRUMENTO 0099092-1 – GUAÍRA – VARA CÍVEL – AC. 7851. JUIZ SÉRGIO RODRIGUES – QUARTA CÂMARA CÍVEL. UNÂNIME – JULG.: 26/02/97 – DJ: 14.03.97 POR UNANIMIDADE DE VOTOS, NEGARAM PROVIMENTO.

(…) A DECISÃO QUE DEFERE A MANUTENÇÃO DE POSSE COM DEPÓSITO A MENOR RETIRA DO ARRENDATÁRIO A CONDIÇÃO DE INADIMPLENTE E ESBULHADOR, CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE – NÃO SE PODE AFASTAR DO JUDICIÁRIO LESÃO OU AMEAÇA A DIREITO – PREJUÍZO NÃO COMPROVADO – PRESENTES OS REQUISITOS PARA A ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.”

DOS PEDIDOS

Nos termos acima expostos, requer-se:

1. O deferimento, sem oitiva da outra parte, de liminar antecipatória, legitimando consignação em pagamento, nos termos da revisão contratual proposta, a ser feita pelo autor, no valor de R$ …. (….), mensais, visando afastar os efeitos da mora e declarando o cumprimento da obrigação;

2. O deferimento, sem oitiva da outra parte, de liminar antecipatória, determinando a manutenção de posse do autor no bem objeto do contrato, afastando as ameaças possessórias por parte da empresa requerida;

3. A citação da empresa requerida, no endereço declinado no cabeçalho, através de carta com aviso de recebimento (AR), para que, querendo, apresente contestação, sob pena de sofrer os efeitos da revelia;

4. Que ao final da presente ação seja concedida revisão do contrato, sendo declarada a aplicabilidade dos juros de 12% ao ano, assim como expurgado o valor pago adiantado a título de valor residual de garantia, tanto no momento da contratação, quanto o valor residual pago em parcelas diluídas, procedendo, assim, a revisão do contrato de consumo, deduzindo o que consumidor, até o presente momento, pagou a mais;

5. Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidas.

6. Seja declarada sua total procedência, sendo os requeridos condenados em honorários advocatícios e demais custas próprias à sucumbência.

Dá-se à causa o valor de R$ …..

Nesses Termos,

Pede Deferimento.

[Local], [dia] de [mês] de [ano].

[Assinatura do Advogado]

[Número de Inscrição na OAB]

Como citar e referenciar este artigo:
MODELO,. Modelo de ação revisional de contrato de leasing c/c manutenção de posse. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2015. Disponível em: https://investidura.com.br/modelos/direito-do-consumidor-modelos/modelo-de-acao-revisional-de-contrato-de-leasing-cc-manutencao-de-posse/ Acesso em: 28 mar. 2024