Direito do Consumidor

Modelo de Ação Civil Pública – comercialização irregular – leite adulterado

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ….. VARA CÍVEL DA COMARCA DE ….., ESTADO DO …..

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO …………, por seus Promotores de Justiça adiante assinados, no uso de suas atribuições legais, vem com fulcro nos artigos 127 e 129 da Constituição Federal, nos artigos 1º, inciso II; 2º; 3º; 5º, caput; 11; 12 e seguintes da Lei Federal nº 7.347/85, e nos artigos 2º; 3º, §§ 1º e 2º; 6º e incisos; 22 e parágrafo único, 39 e incisos; 81, parágrafo único; 82; 83; 84; 91; 92; 93, inciso I e 94 da Lei Federal nº 8.078/90, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

em face do MUNICÍPIO de ……………, com sede administrativa na avenida …….., nesta cidade, representado pelo Exmº Sr. Prefeito Municipal;……………, brasileiro, casado, pecuarista, filho de ………. e de ….., inscrito no CNPJ sob nº ………., residente na rua ……, ….., ….., nesta cidade;……………, brasileiro, casado, comerciante e pecuarista, filho de …………… e ……………., residente na rua ………, nesta cidade; e,…………… , brasileiro, casado, comerciante, filho de …………… e ………., residente na avenida ………., ……, ……… e domiciliado junto à Fazenda ……… neste Município, pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos.

DOS FATOS

a) Das irregularidades

Em ……. de ………. de …….. foi instaurado no âmbito da Promotoria de Justiça da Comarca de …………… Procedimento Investigatório Preliminar (PIP), através da Portaria n. ………, visando apurar denúncia quanto a aquisição e distribuição, pelo Município, de leite não pasteurizado e não inspecionado. Autuado o procedimento, prestou declarações …………… (fls. 04) que confirmou as irregularidades apontadas. Requisitadas informações ao Prefeito Municipal e Secretário Municipal de Saúde quanto à qualidade do leite adquirido e distribuído às entidades assistenciais e população carente do município, apresentou este os esclarecimentos acostados aos autos do PIP, às fls. 21, onde declara prestar o Município assistência aos produtores de leite da região, estando a produção dentro dos padrões exigidos pelo Município, não tendo se apresentado nenhum problema de saúde para os consumidores.

b) Do exame técnico inicial

Vieram aos autos de PIP, às fls. ………, Laudo Técnico encaminhado à Promotoria, mediante requisição para a Dra. …………, médica veterinária, fiscal do Serviço de Inspeção do ……… para Produtos de Origem Animal – SIP/POA, do Núcleo Regional de ……….. da Secretaria de Agricultura e do Abastecimento do ……. (SEAB), que efetuou, em ……., a coleta e análise de amostras do leite fornecido pelos réus …………… e …………… ao município, que concluiu serem os resultados obtidos insatisfatórios, revelando ausência de tratamento térmico e adição fraudulenta de água, caracterizando o produto impróprio para o consumo.

Posteriormente, às fls. 35 dos autos de PIP, postulou referida agente fiscal pela desconsideração da citação “adição fraudulenta de água”, haja vista que em razão do acondicionamento do material coletado não se poderia atribuir a fraude de água aos fornecedores.

Diante do resultado apontado no laudo supracitado foi requisitado ao Prefeito Municipal e ao Diretor de Vigilância Sanitária Municipal a imediata suspensão da distribuição do leite fornecido pelos réus …………… e ……………, bem como a adoção de providências no sentido de ser efetivada fiscalização da produção, transporte e comercialização de leite no município de …………….

c) Do Compromisso de Ajustamento

Suspensa a compra do leite pelo Município, compareceram na Promotoria de Justiça os réus, …………… e …………… que tomaram conhecimento das normas sanitárias relativas à produção e comercialização de leite, firmando em ………., Compromisso de Ajustamento (fls. ……), assumindo o compromisso legal de regularizarem a situação da qualidade do produto e meio de transporte, comprometendo-se, ainda, os réus, a somente entregarem a partir daquela data (…….) leite pasteurizado, pasteurização essa que seria realizada junto ao …………, situado neste Município. Considerando o Compromisso de Ajustamento firmado, requisitou a Promotoria de Justiça de Defesa da Comarca de ……………, a realização de novo exame técnico-laboratorial ao SIP/POA – Núcleo Regional da SEAB, de ………… com o objetivo de constatar-se o efetivo cumprimento, pelos réus, …………… e ……………, das normas sanitárias pertinentes à produção e comercialização de leite, em obediência ao compromisso firmado.

Foi requerido, da mesma forma, pela Promotoria à Cooperativa de Laticínios Campina (que conforme consta do compromisso de ajustamento faria, a partir de sua assinatura, a pasteurização do leite produzido pelos réus …………… e ……………) a coleta e exame técnico-laboratorial de amostras do leite, objetivando aferir a qualidade do leite distribuído ao município de …………… pelos réus, obtendo como resposta (fls. 39 do PIP), que o leite distribuído estava dentro dos padrões sanitários vigentes e sendo pasteurizado.

d) Do novo exame técnico

Às fls. 42 e 43 foi juntado aos autos do Procedimento Investigatório novo laudo técnico, encaminhado pelo Núcleo Regional de …………/SEAB/SIP/POA, com coleta realizada no dia 18.02.99, que concluiu:

“Os resultados obtidos foram insatisfatórios, revelando ausência de tratamento térmico, adição fraudulenta de 15,8% de água. Padrões microbiológicos revelou enumeração de microrganismos totais e patogênicos acima dos padrões máximos permitidos para leite consumo, presença de microrganismo do grupo coliforme – Escherichia coli, indicador de contaminação fecal, caracterizando o produto impróprio para consumo.”

Esclareceu, ainda, a Dra. ….que o produto coletado para exame foi recolhido na presença do réu …………… e que o mesmo estava sendo transportado em latões plásticos, sobre o bagageiro de um veículo saveiro, sem proteção contra sol ou chuva, sem qualquer refrigeração e cuja temperatura no momento da coleta era de 27,2ºC (fls. 40/41).

Em razão das divergências verificadas entre a resposta apresentada pelo …………, na pessoa do médico veterinário ………….. e o laudo supracitado, foi designada audiência, realizada na Promotoria de Justiça em data de ………, quando então, referido médico veterinário esclareceu que em …….., como de costume, analisou o leite entregue pelo réu …………, constatando que o produto estava em boas condições sanitárias, tendo sido feito todo o acompanhamento até a entrega do leite pasteurizado ao produtor. Esclareceu, ainda, que o réu …………… entregava cerca de 250 litros de leite/dia para pasteurização e que enquanto o produto encontrava-se no interior do laticínio estava de acordo com a lei, não sabendo dizer quantos litros de leite o réu …………… entregava diretamente ao município ou a outros consumidores. Esclareceu, por fim que o ………… possui SIF – Serviço de Inspeção Federal. (fls.64 e 65 dos autos de PIP).

e) Do descumprimento do Compromisso de Ajustamento

Não satisfeito em descumprir o Compromisso de Ajustamento firmado com o Ministério Público, ao continuar fornecendo leite impróprio para o consumo, o réu …………… celebrou em ……. de …… de ……, Contrato Particular de Prestação de Serviço com …………… Filho, igualmente réu na presente ação, empresário e pecuarista no município de ……………, para que este a partir de …./…./….. e pelo prazo de seis meses, recebesse o leite produzido pelo requerido e, após pasteurizá-lo, o fornecesse para o Município. À vista dos fatos levantados no Procedimento Investigatório instaurado onde ficou devidamente comprovado que o produto (leite) fornecido pelos réus …………… e …………… encontrava-se adulterado mediante adição de água, contaminado e sem tratamento térmico (pasteurização), foi oficiado ao Município e aos próprios réus, visando a imediata interrupção no fornecimento do leite.

Contudo diante do contrato celebrado entre os réus …………… e …………… e a inexistência de resposta à Promotoria de Justiça quanto às providências adotadas pelo Município para o fiel cumprimento das normas sanitárias que tratam da produção, distribuição e comercialização de leite propôs-se a presente ação civil pública.

DO DIREITO

Dos fatos apontados no Procedimento Investigatório Preliminar anexo, caracterizada e incontestável está a relação de consumo nos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, que tem dentre outros objetivos o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à saúde e segurança, proteção de seus interesses econômicos e melhoria da qualidade de vida. A defesa do consumidor, portanto, faz-se necessária na presente ação em face da lesão a direitos difusos, no que se refere ao fornecimento de produto (leite), pelos réus, em desacordo com as normas sanitárias, à população do município de ……………, assim entendido os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Num segundo plano, a defesa do consumidor se fará na presente ação, em face da lesão a direito individual, no tocante à reparação dos danos causados, caracterizando-se como direito individual homogêneo, nos termos do artigo 81, parágrafo único, inciso III, decorrentes de origem comum, na medida em que o consumo do leite sem inspeção sanitária, fraudado e contaminado e, portanto, impróprio para consumo, fornecido pelos réus à população de …………… coloca em risco sua saúde acarretando como consequência a reparação de eventuais danos já sofridos pelos consumidores.

E, nessa linha é de se observar que na defesa dos direitos e interesses dos consumidores são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela, conforme dispõe o artigo 83 do Código de Defesa do Consumidor e artigo 21 da Lei nº 7.347/85 – Lei de Ação Civil Pública.

Não estando o Ministério Público adstrito às ações expressamente previstas, sendo possível o ajuizamento de quaisquer medidas tendentes à tutela coletiva de lesados (art. 81, I, II e III do CDC).

3. Das disposições específicas aplicáveis ao caso

A obrigatoriedade da prévia inspeção sanitária e industrial dos produtos de origem animal vem regulada pela Lei Federal nº 7.889, de 23.11.89, que assim determina em seu artigo 7º:

“Nenhum estabelecimento industrial ou entreposto de produtos de origem animal poderá funcionar no País, sem que esteja previamente registrado no órgão competente para a fiscalização de sua atividade, na forma do art. 4º.” Esclarece, ainda, o artigo 4º da Lei 7.889/89 serem competentes para realizar a inspeção, o Ministério da Agricultura (no âmbito do comércio interestadual ou internacional), Secretarias da Agricultura dos Estados (comércio intermunicipal) e Secretarias ou Departamentos de Agricultura dos Municípios (comércio municipal).

No Estado do …………, a matéria está regulada no Decreto Estadual nº 10.799, de 24.05.94, que criou o Serviço de Inspeção do …………/Produtos de Origem Animal – SIP/POA, vinculado diretamente à Secretaria de Agricultura e do Abastecimento – SEAB, tornando da mesma forma que a lei federal, obrigatória a prévia inspeção sanitária e industrial, em todo o território estadual (SIP), de todos os produtos de origem animal, comestíveis e não comestíveis.

Determina, ainda, ser competente para realizar o registro, a inspeção e a fiscalização de tais produtos além da SEAB (comércio intermunicipal), os Departamentos ou Secretarias das Prefeituras Municipais nos estabelecimentos que realizarem comércio exclusivamente no âmbito territorial municipal (SIM).Impõe o Decreto Estadual nº 10.799 de 24.05.94 aos infratores à legislação referente aos produtos de origem animal, sanções que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, que vão desde a advertência, passando para aplicação de multa, interdição total ou parcial, até o cancelamento do registro do estabelecimento infrator.

O Regulamento da Inspeção Sanitária e Industrial do Leite e seus Derivados, aprovado pela Resolução nº 199/94, da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento do Estado do …………, estatui normas que regulam, em todo o território estadual a inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal.

Determina tal regulamento que ficam sujeitos à inspeção e reinspeção, os animais de açougue, o pescado, o leite, o ovo, o mel e a cera de abelhas e seus produtos derivados (art. 2º), estipulando como obrigatória a produção de leite em condições higiênicas desde a fonte de origem, seja qual for a quantidade produzida e seu aproveitamento (art.11).Dispõem os artigos 12 e 13 que:

“Art.12º – Qualquer tipo de leite só pode ser dado ao consumo devidamente pasteurizado. Parágrafo único – A pasteurização de que trata este artigo, deverá ser realizada em estabelecimentos devidamente aparelhado para este fim e autorizados pelo S.I.P./P.O.A.”

“Art.13 – Nas localidades onde existir usina de beneficiamento de leite ou houver condições de abastecimento de leite pasteurizado, não é permitida a venda de leite cru, não podendo a autoridade municipal dar concessão para o comércio deste tipo de leite, sob pena de responsabilização. Parágrafo único – Não havendo a possibilidade de abastecer o mercado com leite pasteurizado, o S.I.P./P.O.A. poderá permitir a venda de leite cru desde que obedecidos os critérios estabelecidos em normas próprias.

Mais adiante, citado regulamento quando trata no item II.6, do beneficiamento do leite, define pasteurização como o emprego conveniente do calor seguido de resfriamento, com o fim de destruir totalmente a flora microbiana patogênica sem alteração sensível da constituição física e do equilíbrio químico do leite, sem prejuízo dos seus elementos bioquímicos, assim como de suas propriedades organolépticas normais, fazendo referência à dois processos de pasteurização (o lento e o rápido ou de curta duração).Em relação ao transporte do leite envasado determina o artigo 49 do mesmo regulamento que este deve ser feito em veículos higiênicos e adequados com temperatura máxima de 10ºC.Do que se conclui, à vista do exposto, que todo e qualquer produto de origem animal somente poderá ser comercializado após prévia inspeção sanitária e/ou industrial a ser realizada pelos órgãos oficiais, ou seja, pelo Serviço de Inspeção Federal – SIF, quando o produto de origem animal destinar-se à comercialização interestadual e internacional, pelo Serviço de Inspeção Estadual – SIP para os produtos de origem animal comercializados no âmbito estadual e pelo Serviço de Inspeção Municipal – SIM, nos municípios onde tiverem sido instalados, para comercialização de produtos de origem animal na região do município.

E em assim sendo, o leite fornecido pelos réus ……………, …………… e ……………, adquirido pelo Município de ……………, está em desacordo com os dispositivos legais acima transcritos, não podendo ser colocados no mercado de consumo sem a prévia inspeção oficial. No que se refere a atuação das esferas de governo na área da saúde fixou a Constituição Federal em seu artigo 23, II, ser de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e assistência pública, organizando as ações e serviços públicos de saúde num sistema único, descentralizado, competindo dentre outras atribuições controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse da saúde, executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, fiscalizar e inspecionar alimentos, etc. (artigos 198 e 200).

A Lei Federal nº 8.080, de 19.09.90, ao definir os objetivos e atribuições do Sistema Único da Saúde – SUS, incluiu no seu campo de atuação a execução de ações de vigilância sanitária nas diversas esferas de governo (federal, estadual e municipal), compreendendo as ações de vigilância sanitária eliminar ou prevenir riscos e agravos à saúde da coletividade, intervindo nos problemas sanitários decorrentes da produção, distribuição e comercialização de bens de consumo, com efetivo controle de todas as etapas e processos da produção à comercialização.

Assim, ao adquirir produto de origem animal (leite) sem a devida inspeção sanitária oficial (SIF, SIP ou SIM), produzido e transportado em desconformidade com as normas sanitárias específicas, portanto, impróprio para o consumo, está o Município de ……………, não apenas deixando de cumprir com seu dever de ofício (exercer as ações de vigilância sanitária), qual seja, de fiscalizar a produção e a comercialização de leite e adotar as medidas legais cabíveis, objetivando apurar a responsabilidade dos responsáveis pelo fornecimento de leite impróprio ao consumo, mas também praticando expressamente atos que deveria combater.

À vista das normas anteriormente apontadas os réus …………… e …………… além de fornecerem leite não pasteurizado, adicionado de água, e contaminado, ou seja, produzido em desacordo com as normas sanitárias específicas, sem prévia inspeção, não atendem, ainda, à exigência legal que determina o transporte do produto em veículos higiênicos e adequados, com temperatura máxima de 10ºC, conforme se depreende do termo de ocorrência lavrado pelo SIP/POA (fls. 44 dos autos de PIP), colocando em risco a saúde da população do município de …………….

Da mesma forma agiu o Município de …………… colocando em risco a saúde dos consumidores ao deixar de exercer o controle e a fiscalização da produção e transporte do leite fornecido pelos requeridos, com o gravame de ter adquirido e fornecido o leite impróprio para o consumo à população carente e às instituições que presta assistência.

Em relação ao réu …………… tem-se que, ao pasteurizar e efetuar o fornecimento do leite produzido pelo réu …………… em estabelecimento não dotado de serviço de inspeção, por força do contrato particular de prestação de serviço de fls. 83 a 85, da mesma forma que os demais réus, em assim procedendo colocará em risco a saúde da população de ……………, que continuará a consumir leite sem a devida inspeção sanitária (SIF, SIP ou SIM).

O proceder dos réus atenta contra direito básico do consumidor, expresso no artigo 6º, incisos I e X, in verbis “São direitos básicos do consumidor: I – a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;…X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Ademais, não vem cumprindo, o réu Município de ……………, com a obrigação legal de fornecer serviços adequados, eficientes e seguros à população na forma do disposto no artigo 22 do CDC.

O Código de Defesa do Consumidor disciplina:- em seu artigo 12 a responsabilidade independentemente da verificação da culpa do fabricante, produtor e fornecedor pela reparação de danos aos consumidores por defeitos decorrentes da fabricação; – em seu artigo 18 a responsabilidade por vícios de qualidade ou quantidade que tornem os produtos impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam;- já no § 6º, do artigo 18, define como sendo impróprios para o uso e consumo:

II – os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação.

III – os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim que se destinam.

Na espécie em tela, vislumbra-se dupla característica de impropriedade: uma material (produto com coliforme e com água) e formal (ausência de inspeção).Ademais, a conduta dos réus …………… e ……………, qual seja, de fornecer produto impróprio para o consumo (leite sem inspeção sanitária, adulterado e contaminado) constitui crime contra as relações de consumo, tipificado no artigo 7º incisos III e IX da Lei 8.137/90, que já está sendo objeto das medidas penais cabíveis, por parte do Ministério Público do …………, haja vista estar devidamente comprovada a materialidade do delito em face das conclusões do laudo de fls. 42/44, emitido pelo Serviço de Inspeção do ………… – Produtos de Origem Animal – SIP/POA. Igual responsabilidade cabe ao Chefe do Executivo Municipal, que responderá perante o Tribunal de Justiça, em razão de prerrogativa da função.

O Código de Defesa do Consumidor introduz a noção de impropriedade de produtos e serviços, que decorre de várias razões, tais como prazo de validade vencido, produtos deteriorados, alterados, adulterados ou corrompidos, falsificados, avariados, nocivos à vida e à saúde, assim como perigosos e produtos em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação.

Assim, os réus ao produzirem e comercializarem o leite sem a devida inspeção sanitária (SIF/SIP/SIM), em desacordo com as normas sanitárias anteriormente apontadas, ou seja, sem o devido tratamento térmico (pasteurização), com adição fraudulenta de água no percentual de 15,8% e apresentando microrganismos totais e patogênicos acima dos padrões permitidos para o consumo, conforme laudo de fls. 42/44, colocam a saúde e a segurança dos consumidores de …………… em risco.

Portanto, faz-se necessária a defesa do consumidor, nos termos dos artigos 81, parágrafo único e 82 do Código de Defesa do Consumidor, id est, a defesa processual de interesses coletivos (sentido amplo), aos quais se instrumentalizou através das ações civis públicas, consubstanciadas nas Leis Federais nº 7.347/85 (que disciplinou a Ação Civil Pública) e 8.078/90 (que instituiu o Código de Defesa do Consumidor – CDC), onde se ampliou a legitimação ativa, juntamente com o caráter de efetivo acesso e reparação, a iniciar pelo Ministério Público, que tem na essência de seu agir, o interesse público e social, caracterizador das normas consumeristas.

4. Da antecipação da tutela

A via eleita para obtenção da prestação jurisdicional almejada é a Ação Civil Pública com pedido de antecipação de tutela, ante a ofensa a interesses difusos e individuais homogêneos.

O “fumus boni iuris” está suficientemente demonstrado ante os dispositivos legais transcritos e pelo conteúdo dos autos de Procedimento Investigatório em anexo, onde se comprova a existência do direito do consumidor no sentido de ver respeitado o seu direito à proteção à saúde e segurança.

Quanto ao eventual dano e o gravame daí decorrente, é de se levar em consideração que a questão envolve indeterminado número de consumidores, ou seja, todos aqueles que adquiriram e/ou consumiram o produto (leite) em condição imprópria para o consumo.

A demora na prestação jurisdicional ou “periculum in mora” é fator indiscutível, já que a população do Município de …………… consumiu e está consumindo produto impróprio para o consumo, qual seja, leite em desacordo com as normas sanitárias revelando ausência de tratamento térmico, adição fraudulenta de água (15,8%) e padrões microbiológicos acima do permitido (laudo de fls. 42/44), acarretando graves riscos à saúde da população, em especial às crianças, aos idosos e aos carentes (pela distribuição de produto duplamente impróprio para o consumo, ou seja, com vício material em face da contaminação e adição de água, constatados em laudo, e vício formal, em face da ausência de inspeção), a quem são distribuídos pela municipalidade o leite adquirido dos réus …………… e …………….

A concessão da providência só ao final da demanda poderá ser, em alguns casos, inócua, e as consequências desastrosas para a saúde e bem estar da população.

Acrescente-se que o pedido principal da presente Ação Civil Pública refere-se à obrigação de não fazer e de fazer, onde a antecipação da tutela para ela prevista exige menos que a antecipação da tutela prevista nas demais ações de conhecimento.

Veja o que ensina Nélson Néry Jr. In “Código de Processo Civil Comentado”, Ed. RT, 1997, São Paulo, p.673:

“A tutela específica pode ser adiantada, por força do CPC 461 § 3º, desde que seja relevante o fundamento da demanda (fumus boni juris) e haja justificado receio de ineficácia do provimento final (periculum in mora).

É interessante notar que, para o adiantamento da tutela de mérito, na ação condenatória em ação de fazer ou não fazer, a lei exige menos do que para a mesma providência na ação de conhecimento tout court (CPC 273).

É suficiente a mera probabilidade, isto é, a relevância do fundamento da demanda, para a concessão da tutela antecipatória da obrigação de fazer ou não fazer, ao passo que o CPC 273 exige, para as demais antecipações de mérito:

a) a prova inequívoca;

b) o convencimento do juiz acerca da verossimilhança da alegação;

c) ou o periculum in mora (CPC 273, I) ou o abuso do direito de defesa do réu (CPC 273, II)”.

Assim, restando evidenciada a gravidade e urgência da situação, e presentes os pressupostos da prestação jurisdicional antecipada, consoante a previsão do art. 84, §§ 3º e 4º do Código de Defesa do Consumidor, c.c. o artigo 461 e parágrafos, do Código de Processo Civil, requer seja concedida liminarmente a medida determinando-se:

4.1. ao Município de ……………:

4.1.a. abster-se de adquirir e distribuir à população deste município o leite e derivados produzidos pelos réus …………… e …………… e do réu …………… no Município da ………….., bem como de qualquer outra origem que não de estabelecimento devidamente inspecionado;

4.1.b. que promova a necessária vigilância sanitária em todo o município e em especial na propriedade dos réus …….., atuando de forma a efetivamente proibir e coibir o fornecimento de produto de origem animal não inspecionado, notadamente leite, até que estejam de acordo com as normas sanitárias específicas em vigor, ou seja, até que os produtos de origem animal estejam sendo previamente inspecionados por órgão oficial, com produção, transporte/distribuição e comercialização de acordo com a legislação aplicável;

4.2. aos réus ……… e ……. absterem-se de produzirem e fornecerem leite aos consumidores até que comprovem de forma inequívoca possuírem condições técnicas e sanitárias para a produção, distribuição e comercialização de leite e derivados, tudo de acordo com as normas sanitárias específicas em vigor;

4.3. ao réu ……… abster-se de adquirir leite produzido pelos réus ……… e …….. e de fornecer aos consumidores referido produto, por meio da marca “…………….”, até que comprove de forma inequívoca estar o leite adquirido por força do contrato de prestação de serviços de fls. 83 a 85, de acordo com as normas sanitárias em vigor, ou seja estar seu estabelecimento dotado de serviço de inspeção oficial.

4.4. da multa e sua destinação Pelo descumprimento da decisão antecipada de tutela, por qualquer um dos requeridos, requer-se a fixação de multa diária, cujo valor se propõe seja fixado no importe de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), com relação ao réus pessoas físicas, e de R$ 1.000,00 (mil reais), com relação ao réu pessoa jurídica de direito público. A multa referida deverá ser recolhida ao Fundo de Reparação dos Direitos Difusos de que trata o art. 13 da Lei de Ação Civil Pública, instituído no Estado do ………… pela Lei nº 11.987, de 05 de janeiro de 1998, regulamentada pelo Decreto nº 4.620/98, publicado no D.O.E. nº 5.300, de 27 de julho de 1998.

4.5. da audiência prévia do município Em razão da determinação da Lei nº 8.437/92, requer-se que a decisão sobre a antecipação da tutela, em relação a pessoa jurídica de direito público, seja precedida de audiência do representante legal da municipalidade.

DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer-se O reconhecimento da procedência das pretensões deduzidas na presente ação, condenando-se:

1. O Município de ……….. definitivamente a abster-se de adquirir e fornecer aos consumidores leite não inspecionado pelos órgãos legalmente previstos na Lei Federal nº 7.889/89, em especial os produzidos pelos réus ……….. e ………., bem como os comercializados pelo réu ………, em razão do contrato de fls. 83 a 85, até que comprovem de forma inequívoca estarem adequados às normas sanitárias federais, estaduais ou municipais quanto a produção, transporte, distribuição e comercialização de leite.

2. O Município de ……… na obrigação de fazer consistente no efetivo controle e fiscalização de todos os estabelecimentos produtores, distribuidores e fornecedores de produtos de origem animal, notadamente leite, dentro do Município, em especial, nas propriedades dos réus ………, ………., ……., objetivando o cumprimento da legislação sanitária federal, estadual ou municipal, relativa à produção, transporte e comercialização de leite e derivados, aplicando as sanções legais cabíveis aos infratores.

3. Os réus ………… e ……….. definitivamente de absterem-se de produzirem, transportarem e fornecerem, aos consumidores, leite sem a devida inspeção sanitária federal, estadual ou municipal, não pasteurizado e em desacordo com as normas sanitárias específicas que tratam da produção, transporte e comercialização de leite e derivados, até que comprovem de forma inequívoca possuírem condições técnicas e sanitárias para tanto.

4. O réu ……. de abster-se de pasteurizar e fornecer, aos consumidores, leite não inspecionado produzido pelos réus ……… e ………….. ou por qualquer outro produtor, e até que comprove sua adequação técnica e sanitária aos serviços de inspeção federal, estadual ou municipal.

5. Todos os réus na reparação de danos materiais e/ou morais aos consumidores decorrentes do fornecimento de produto (leite) impróprio para o consumo, a serem apurados mediante liquidação.

6. Todos os réus a pagarem as despesas processuais e verba honorária de sucumbência, cujo recolhimento deve ser feito ao “Fundo Especial do Ministério Público”, criado pela Lei Estadual nº 12.241, de 28.06.98 (D.O.E. nº 5.305, de 3.08.98) nos termos do artigo 118, inciso II, alínea “a”, parte final, da Constituição do Estado do ………….

7. Da citação, da intimação e do edital.

8. Requer-se a citação do MUNICÍPIO DE ………., na pessoa de seu Prefeito Municipal, para tomar ciência da presente ação civil pública, e pronunciar-se no prazo de 72 (setenta e duas) horas, sobre o pedido de antecipação de tutela e para todos os termos do processo, e a sua intimação para que dê efetivo cumprimento à medida, se concedida.

9. Requer-se, ainda, a intimação dos demais requeridos, para que deem efetivo cumprimento à medida de antecipação da tutela e a citação para todos os termos do processo.

10. Requer seja determinada a expedição do edital de habilitação de eventuais litisconsortes, na forma do artigo 94 do CDC.

11. Das provas, despesas processuais e valor da causa Postula-se seja reconhecida a aplicabilidade na espécie do previsto no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, qual seja a inversão do ônus da prova, em razão da verossimilhança dos fatos e hipossuficiência dos consumidores da relação de consumo ora tratada.

Protesta-se ainda, pela produção de outras provas, eventualmente necessárias, além daquelas já apresentadas no Procedimento Investigatório Preliminar, em anexo, dentre as quais o depoimento pessoal dos réus, a oitiva de testemunhas, cujo rol desde logo é abaixo apresentado, perícias e juntada de documentos.

Dá-se à causa, o valor de R$ …..

Pede Deferimento.

[Local], [dia] de [mês] de [ano].

[Assinatura]

Como citar e referenciar este artigo:
MODELO,. Modelo de Ação Civil Pública – comercialização irregular – leite adulterado. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2014. Disponível em: https://investidura.com.br/modelos/direito-do-consumidor-modelos/modelo-de-acao-civil-publica-comercializacao-irregular-leite-adulterado/ Acesso em: 29 mar. 2024