Política

Pensar em Monarquia

Anônimo (a pedido)

 

 

Pensar seriamente em monarquia no Brasil de hoje geralmente é difícil, primeiramente porque estamos distanciados por mais de um século da monarquia que existiu aqui, além do que há um intenso desligamento histórico, acompanhado de uma gama de versões dirigidas num sentido idealizador da república do 15 de novembro, observada como um grande passo progressista e libertador, o que não foi. Por outro lado, alguns monarquistas tendem a idealizar o Império como uma espécie de perfeição, o que suscita, em discussões gerais, uma incredulidade perfeitamente justificável; há, porém, indícios e provas de que, nas condições de época e lugar, a monarquia brasileira do II Reinado foi bem mais positiva e avançada do que nos parece hoje, e a queda ocorrida em 1889 foi perpetrada de modo ardiloso, por meio de uma operação relâmpago, sendo que a população em geral era bem afinada com o Império e não teve participação no golpe.

 

 

Em segundo lugar, torna-se difícil pensar seriamente em monarquia hoje entre nós em função de um conceito de irreversibilidade da república. Irreversível nada é, mas realmente é uma ingenuidade ou algum tipo de ufanismo de alguns monarquistas acreditar numa hipótese de restauração monárquica no Brasil do presente momento. Curto prazo, embora não seja impossível, é extremamente improvável; médio ou longo prazo, pode ser, mas, de fato, o que todos nós – monarquistas, não-monarquistas, republicanos e apolíticos – devemos observar, em termos de probabilidades futuras, é a questão do que poderá aparecer no decorrer das evoluções de pensamento e idéias. Um erro em que incorrem muitos monarquistas (talvez a maioria) é observar e aclamar a monarquia como uma panacéia que, por si só, vai consertar tudo. A coisa não é assim; na verdade, mesmo eu que sou monarquista não me arvoro a achar que a monarquia tem que ser restabelecida no Brasil, muito menos ser restabelecida na base do é pra já, como pretendem os monarquistas passionais, cujo ufanismo ofusca a percepção do contexto. Entretanto, não há coisas irreversíveis; há, sim, reversões improváveis, ou improváveis em determinada ocasião e lugar.

 

Acreditar numa hipótese de um renascimento monárquico no mundo, alcançando as ex-monarquias em geral e mesmo países que nunca foram monarquias, parece-me um exagero ufanista, em termos de dias atuais; já o futuro é outra coisa, e falo de futuro em termos isentos de prazo. Grandes mutações mentais e ideológicas podem operar no decorrer dos próximos anos / décadas / séculos. As mentes tendentes à visão atida ao momento costumam (e sempre costumaram em todas as épocas) pressupor o futuro com base no momento em que se está vivendo. É uma tendência humana achar que o período presente é o ponto culminante da evolução; assim, muita gente provavelmente diria que a evolução política no mundo há de ser a republicanização total e o enterro definitivo da monarquia; assim se pode pensar em função de um conceito linear de evolução.

 

Mas a História prova que o homem de cada respectiva época muito se enganou em seus conceitos e previsões. Se vier a ocorrer, conforme suponho, uma nova visão de mundo, mais abrangente, menos taxativa, mais liberada, menos dogmática, haverá lugar também para novas concepções de monarquia – e de república -, bem como uma percepção mais aberta dessas duas modalidades.

 

O terceiro aspecto que pretendo citar, em cuja função hoje é difícil entre nós pensar seriamente em monarquia, é justamente um fator a que me referi de passagem, acima, ou seja, a atitude e postura de alguns monarquistas (talvez a maioria), cuja seriedade deixa a desejar.

 

Pelo fato de a monarquia ter sido legada ao rol das coisas não consideradas em termos práticos, ficando observada mais no âmbito das “perfumarias”, parece que se dá um fenômeno psíquico, pelo qual pessoas tendentes ao deslumbramento abraçam a idéia monárquica, mas, naturalmente, sem ir além da “curtição”, muito embora geralmente não se apercebam disso, considerando-se militantes de uma causa; por outro lado, mesmo pessoas cujas tendências monárquicas derivem de outros focos, não ufanos nem deslumbrados, às vezes se contagiam, por “osmose”, desses ares “perfumistas”.

 

Pelo fato, também, de a monarquia ter sido legada ao rol das coisas ultrapassadas e antidemocráticas, passando a ser considerada no âmbito dos elitismos, ocorre também um fenômeno psíquico, pelo qual pessoas tendentes ao conservadorismo fanático – e às vezes egocentrado – abraçam a idéia monárquica, pura e simplesmente porque querem um mundo nos moldes em que sempre haja a dicotomia entre conservadorismo e revolucionarismo (pois sem isso, sem o “inimigo” anti-aristocrático não poderiam sentir-se posicionados na defesa da tradição); tais monarquistas acham realmente que monarquia é “retrô” e, pior, acham isso ótimo. Por outro lado, mesmo pessoas cujas tendências monárquicas derivem de outros focos, não reacionários nem elitistas, às vezes se contagiam, por “osmose”, desses ranços passadistas.

 

O que importa é, pois, desenvolver idéias; o futuro – e a meu ver isto parece nítido – requer novas visões, inclusive novas formas de coisas antigas, não que devam ser tomadas como indiscutíveis e previamente determinadas, mas como alternativas.

Tanto visualizações de futuras estruturações republicanas quanto monárquicas podem – e creio que devam – ser pensadas, para mais tarde serem conhecidas e avaliadas.

Em suma, é importante que surjam idéias, que essas idéias se desenvolvam e amadureçam e, por fim, venham à tona para serem conscientemente avaliadas, discutidas e submetidas ao julgamento da opinião pública. O que pode vir a ocorrer futuramente pode ser uma nova forma de república, mas pode ser também um tipo de monarquia inédito.

 

 

O fato de diversas pessoas estarem pensando, ponderando, criando, enfim, desenvolvendo diversos pensamentos, denota ou prenuncia, para um futuro de prazo ainda incógnito, a tendência ao aparecimento de novas alternativas, uma fase onde as visões, estereótipos e dogmas políticos enferrujados do Século XX serão, enfim, percebidos como obsoletos.

 

 

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Como citar e referenciar este artigo:
PEDIDO), Anônimo (a. Pensar em Monarquia. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/politica/pensarem/ Acesso em: 29 mar. 2024