“Uma história das tipologias das formas de governo, como esta, pode ter início na discussão referida por Heródoto, na sua História (Livro III, §§ 80-82), entre três persas-Otanes, Megabises e Dario-sobre a melhor forma de governo a adotar no seu país depois da morte de Cambises.”
“(…) A passagem é verdadeiramente exemplar porque, como veremos, cada uma das três personagens defende uma das três formas de governo que poderíamos denominar de “clássicas” (…). Essas três formas são: o governo de muitos, de poucos e de um só, ou seja, “democracia”, “aristocracia” e “monarquia” (…).”
“(…)De que forma poderia não ser irregular o governo monárquico se o monarca pode fazer o que quiser (…). A posse de grandes riquezas gera nele a prepotência, e a inveja é desde o princípio parte da sua natureza. Com esses dois defeitos, alimentará todas as malvadezas (…).”
“O governo do povo, porém, merece o mais belo dos nomes, ‘isonomia’; não faz nada do que caracteriza o comportamento do monarca (…).”
“Esse foi o parecer de Otanes. Megabises, contudo, aconselhou a confiança no governo oligárquico: ‘Subscrevo o que disse Otanes em defesa da abolição da monarquia; quanto à atribuição do poder ao povo, contudo, seu conselho não é o mais sábio.”
“(…) Tudo o que faz, o tirano faz conscientemente; mas o povo não tem sequer a possibilidade de saber o que faz.”
“(…) Em terceiro lugar, Dario manifestou sua opinião: ‘O que disse Megabises a respeito do governo popular me parece justo, mas não o que disse sobre a oligarquia. Entre as três formas
de governo, todas elas consideradas no seu estado perfeito, isto é, entre a melhor democracia, a melhor oligarquia e a melhor monarquia, afirmo que a monarquia é superior a todas. Nada poderia parecer melhor do que um só homem- o melhor de todos; com seu discernimento, governaria o povo de modo irrepreensível; como ninguém mais, saberia manter seus
objetivos políticos a salvo dos adversários.”
“(…) Otanes condena a monarquia. Defensor da aristocracia, Megabises condena o governo de um só e o governo do povo. Por fim, Dario que defende a monarquia, condena tanto o governo do povo como o governo de uns poucos (usando o termo destinado a descrever ordinariamente a forma negativa do governo de poucos – a oligarquia).”
Neste primeiro capítulo do livro Teoria das formas de governo, de Norberto Bobbio, podemos observar que o autor quis expor a opinião de três persas, Otanes, Megabises e Dario, citados em uma obra de Heródoto, sobre as tipologias de governo. As formas de governo retratadas nessa Discussão Célebre são: a democracia, a aristocracia e a monarquia.
Otanes defendeu a democracia, alegando que o monarca deixaria o poder “subir à cabeça”, fazendo com que cometesse atrocidades. Após concordar com Otanes, Megabises afirma que a oligarquia seria a melhor forma de governo. Alegou que se o poder fosse dado ao povo, a população não saberia usufruí-lo com êxito por não saber o que está fazendo. Por fim, Dario defende a monarquia, pois o monarca (o melhor dos homens) saberia o melhor jeito de governar e defender seu reinado.
Pontos positivos e negativos da democracia, aristocracia e monarquia foram expostos pelos pensadores persas. Entretanto, nota-se que, após a leitura do primeiro capítulo, ainda restam dúvidas sobre qual seria a melhor forma de governo.
BOBBIO, Norberto. A teoria das formas de governo. 10 ed. Brasília: UnB, 2001. p. 39-45.
*Eduardo André Carvalho Schiefler é acadêmico de Direito na Universidade Federal de Santa Catarina