Sociologia

Socialismo – Cole

Marcel Damato Belli*

 

 

COLE, G. D. H. Ideologias Políticas Cap.3 – Socialismo. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1981. 140 p.

 

Por natureza o homem se organiza em sociedade, seja para suprir as lacunas de suas habilidades de sobrevivência, dependendo, então, das de outros para tornar plena a capacidade da comunidade, ou simplesmente pela necessidade de ter outros seres com quem conviver. Seja qual for a razão, a organização social sempre foi origem de diversos conflitos, tanto ideológicos quanto marciais na história. Volto meu olhar agora para o sistema chamado “Socialismo”, que gerou, durante mais de um século, enormes conflitos, desentendimentos e mesmo uma das mais tensas situações pela qual a humanidade já passou: a Guerra Fria.

 

Este modo de organização social, se é que pode ser chamado assim, teve vários pensadores que criaram inúmeras variações – tanto leves quanto extremamente singulares. Os seus inúmeros idealizadores, tão iluministas quanto os reacionários capitalistas, acreditavam que o desenvolvimento científico e das técnicas de produção seria a panacéia da humanidade. Tendo os meios de produção em completa eficiência, pensavam eles, nõa haveria como não proporcionar uma vida completamente melhor para todos.

 

Não podemos deixar de observar, neste momento, como eles não poderiam estar mais errados. A capacidade de produção alimentícia, hoje, é para mais de dez bilhões de pessoas, porém o seu maior problema é a má distribuição: países como os Estados Unidos da América consomem muito mais do que deveriam, gerando um grande vácuo em outras partes do globo. Mesmoa produção tecnológica hoje alcança patamares nunca antes imaginados e ainda gera “bolsões” de desenvolvimento e outros de atraso.

 

Por confiarem neste pensamento iluminista, onde os homens, com o avançar da ciência, tornar-se-iam mais racionais e mais “humanos”, não haveria como a sociedade não metamorfosear-se em completa “utopia”, pois, assim que ajustados os parâmetros sociais, o homem, agora mais racional do que nunca, não teria como não cooperar para o bom funcionamento desta estrutura.

 

”Eram ‘socialistas’ acima de tudo, porque colocavam a ênfase principal nos arranjos sociais como causas operativas do bem e do mal viver, e do vício ou virtude individuais”. (COLE, 1981, p.70)

 

Dois dos maiores pensadores, Owen e Saint-Simon, acreditavam que a educação era a chave para o futuro, e, principalmente, a educação racionalista, seriam primordiais na formação do caráter e outros fatores para formarem uma nova sociedade. Outros, no entanto, como Fourier, acreditavam que modificar a natureza humana, porque os seus caprichos, apetites e paixões trabalhariam para uma sociedade melhor, uma vez que ela estivesse organizada corretamente.

 

Fundamentalmente, estes “socialismos utópicos” tinham como finalidade promover felicidade e bem-estar humanos mediante a promoção do bom comportamento. Alguns autores afimavam que o pior mal da sociedade como estava era a competição que o meio capitalista propriciava, induzindo o homem a digladiar-se contra si mesmo; outros afirmavam que o problema seria a quantidade de privilégios sociais que algumas classes recebiam em detrimento de outras, o que geraria um profundo sentimento de amargura.

 

O argumento utilizado para denunciar um problema social depende do que os pensadores desejavam derrubar. Contra o antigo regime, totalitarismo, atacavam os sistemas de privilégios sociais; contra o sistema capitalista, atacavam a competição. Independente do que desejavam derrubar, a unanimidade era em torno de denunciar a expoliação dos verdadeiros produtores de riquezas, os explorados proletários, exigindo uma sociedade de cooperação em prol da evolução, não de antagonismos e conflitos incessantes.

 

Marx, um dos maiores, se não o maior ícone do socialismo, atacava todos estes pontos já citados anteriormente, alguns em maior grau outros em menor, mas acreditava que isto ocorreria, independente da vontade do homem ou não, pois há um movimento confluente de forças para este fim. Tambéma creditava ser inexorável a revolução da prole, independente de haver um lado bom ou ruim.

 

Saint-Simon acreditava que um maior esclarecimento do povo levaria a uma sociedade ulteriormente justa, onde, para isto, o conhecimento humano e o progresso da ciência levariam a uma sociedade de altíssima produção e, pelo conhecimento social gerado, igualitária distribuição. Marxistas, no entanto, acreditavam que o caminho correto seria incitar no proletariado o sentimento de serem uma classe que deveria dominar mas estava sendo contida, que isto seria um atalho para o advento da nova sociedade sem classes.

 

No entanto, cabe citarmos aqui, todos revolucionários, uma vez atingindo o poder, tornam-se, imediatamente, reacionários e fazem tudo que estiver ao seu alcance para manterem o poder em suas mãos – é conveniente citar o terror criado por Robespierre. Uma revolução do proletariado talvez seria um momento de “inversão” de classes, e não de “extinção”, pois, atingido o poder, relegariam os antigos capitalistas e senhores de produção à miséria como vingança ou seja o que for. Não podemos esperar que uma revolução liderada por pessoas infinitamente expoliadas e maltratadas historicamente possa ser o caminho para a redenção.

 

Estes socialistas “utópicos” eram assim chamados porque criam em um paraíso terrestre iminente à queda do capitalismo, o maior sustentáculo da sociedade deturpada em que vivemos.

 

Um grande ponto a ser explorado, é o papel do estado na revolução e o que ele traria: Marxistas acreditavam que o estado era uma ferramenta de expoliação social e um mantenedor do sistema de privilégios de classes, portanto deveria ser derrubado e extinto; os Lassalistas, no entando, acreditavam que o estado era uma ferramenta deveras útil ao progresso social, mediante o estabelecimento do sufrágio masculino.

 

Este foi um momento de rompimento entre duas grandes vias do socialismo. Marx, em seus ensaios, afirmava que, uma vez provada a ineficiência do estado e este sendo derrubado, abriria-se caminho para a sociedade perfeita, o comunismo. O oubro braço, que cria em o estado ser uma ferramenta útil aos planos de um sociedade planificada e igualitária, era totalmente antagônico aos planos marxistas.

 

Porém, um momento de maior democratização e “crescimento” do poder eleitoral das massas estava em questão. A queda do antigo regime estava acontecendo no mundo todo e, agora, com a subida da burguesia ao poder, sabiam que não poderiam relegar novamente a prole ao esquecimento e à total expoliação. Deveriam dar alguma coisa para contentarem-se e, advindo deste pesamento, a democracia – seja ela efetiva ou não – entrou em jogo: era um momento de democratização mundial e, portanto, para as acomodadas proles mundiais, tornou-se, além de tudo, mais fácil tomar o poder através da eleição.

 

Os partidos comunistas começaram a surgir em toda a Europa e até mesmo fora dela, pois, agora, o caminho para a grande maioria dos socialistas, não era mais uma revolução violenta, mas, sim, adquirir o poder pelo voto popular.

 

Eles, os “socialistas eleitorais”, no entanto, só poderiam esperar receber votos se, além de suas metas de revolução social, apresentassem projetos de reforma política e econômica imediatas. Eis que há uma fusão entre os social-democratas alemães e os lassalistas, pois ambos acreditavam que esta apresentação política era uma necessidade.

 

Na Rússia, a iminente revolução burguesa tornou-se uma verdade. O maxismo leninista que surgiu nos primeiros anos do regime bolchevique era profundamente fiel à doutrina de Marx, a não ser por um detalhe: Marx acreditava que a prole deveria ajudar a burguesia a tomar o poder e, numa reviravolta, tomaria, então, o fragilizado sistema político – fragilização, esta, decorrente da revolução – e seus ainda inseguros líderes burgueses, concretizando o início da ditadura do proletariado. Lênin, no entando, acreditava ser possível uma tomada do poder IMEDIATA pela prole, iniciando um período de avanço capitalista sob o poder da nova classe dominante.

 

Essa idéia de Lênin, do “capitalismo de estado”, representava uma leve, à primeira vista, modificação do pensamento marxista, mas, a olhares mais agudos, seria uma mudança tão radical que representava um abandono completo das teorias do alemão.

 

Outro ponto de diferenciação era que Marx sempre doutrinou a ditadura do proletariado como um meio para a sociedade sem classes – embora nunca tenha discorrido em detalhes sobre o assunto -, ou seja: a ditadura era um meio, não um fim. Lênin, no entanto, fez da ditadura o sustentáculo de seu novo sistema social. A remota tese de ditadura do “partido”, desenvolvido por Marx no “Manifesto Comunista”, tornou-se a teoria da completa e absoluta liderança de classes de Lênin.

 

O partido tornou-se uma ditadura das ditaduras, onde, qualquer questionamento feito era considerado traição a todos os trabalhadores e todos os líderes que “tão honerosamente lutaram pela inversão social”.

 

Eis que há uma grande perda ao pensamento socialista russo: a morte de Lênin, em 1924, trouxe consigo a desestabilização do regime. Quem agora seria o líder do sistema? Os dois homens que Lênin tinha como seus pupilos eram Stalin e Trótski.

 

A verdade que a história não conta é o fato de o mais cotado a assumir o papel do novo líder de estado ser Trótski, por sua proximidade de idéias com Lênin e profunda amizade com o antigo ditador. Stalin, no entanto, utilizou-se de meios no mínimo inteligentíssimos para chegar ao poder. Fotos onde havia Lênin, numa cama de hospital, rodeado por Stalin e Trótski, tiveram tratamento para que a imagem deste fosse retirada. Todos os momentos registrados historicamente com a presença de “Bronstein” (alcunha do pupilo mais próximo de Lênin) começaram a ser apagados. Stalin usou-se dessa modificação histórica para mostrar ao povo como ele era o mais próximo de Lênin, como ele havia ajudado o antigo líder nas horas de necessidade e como ele era o principal ao lado do antigo ditador. Trótski começava a ser aceito pelo povo como um impostor e um invasor da “santitude” de Lênin.

 

Forçado a deixar o país, Bronstein foge para o México, onde, após tentar fundar a Quarta Internacional – uma alternativa ao sistema stalinista da Terceira Internacional – é assassinado por Ramón Mercader, um agente disfarçado, enviado por Stalin para assassinar o ex-companheiro de Lênin.

 

Stalin, novo líder do regime ditatorial russo, acreditava que o Ocidente nada tinha a ensinar à Mãe Rússia, do que tecnologia e, portanto, iniciou uma aceleração do sistema industrial do país.

 

Pode-se dizer que o sistema stalinista foi uma auto-defesa ao repúdio mundial que a Rússia sofria por ser “socialista”.

 

O comunismo não se estabeleceria na Europa Ocidental, a não ser que os russos o instaurem através de um movimento armado e sob nenhuma condição estabelecer-se-ia nos Estados Unidos, momento de elucidação, este, que colocara Stalin num beco-sem-saída, por mostrar-lhe que a revolução comunista mundial não aconteceria sob hipótese alguma, principalmente pela imunidade Norte-Americana. O Capitalismo não estava mostrando sinais de rápido colapso por razões internas, como Marx e, posteriormente Lênin, teorizavam acontecer.

 

Chegava-se a um momento de completo desespero para o regime socialista da URSS. Não havia como derrubar o capitalismo e esta já começava a mostrar sinais de colapso.

 

Na verdade, se formos olhar com mais cuidado, não podemos dizr que os Estados Unidos venceram a União Soviética na Guerra-Fria, pois eles também estavam à margem de quebrar: é que a URSS quebrou primeiro. Sustentar um regime de altíssimos gastos internacionais para manter a unidade de uma “nova nação” cheia de conflitos internos (podemos citar a “colcha de retalhos étnicos” que era a Iugoslávia) armados ou não era extremamente dispendioso para uma união internacional que não era capitalista, concorrendo contra uma que era.

 

A abertura econômica, proclamada por Gorbatchev, trouxe um fim ao sonho dos pensadores Socialistas. Remanescentes como Coréia do Norte e Cuba tem seus esforços heróicos diariamente suprimidos pelos Estados Unidos para integrarem-se ao sistema capitalista mundial, principalmente Cuba, com seu embargo econômico, proclamado no episódios da Crise dos Mísseis.

 

Vale, agora, olharmos para trás, na história, para vermos se realmente houve algum sistema socialista implementado que tenha sido, na prática, o resultado da teorização.

 

Oras, em todos eles, podemos citar que a planificação resultou em profunda miséria nacional. Ela mesma foi implementada por ditaduras extremamente fortes. Seja Rússia, Cuba ou Coréia do Norte, as ditaduras sempre estiveram presentes, talvez para segurar um sistema econômico-social extremamente frágil, frente ao povo acostumado com o capitalismo.

 

Em nenhum dos casos de implementação das bases do pensamento socialista, no entanto, houve realmente a extinção das clases, tão aspirados pelos teorizadores do movimento contra o laissez-faire.

 

Mesmo Cuba, hoje, um dos maiores símbolos do heróico esforço para se manter um sonho de seu ditador, está em frangalhos e é apenas questão de tempo até cair. Nos tempos da Guerra-Fria, seu sistema pseudo-socialista era mantido por uma gorda mesada enviada pela URSS. Hoje, no entanto, sem a grande “Mãe” para os sustentar, tiveram de arranjar um novo meio de arranjarem dinheiro para se manterem no sistema que adotaram. Eis que surge hugo Chávez, um líder militar com basicamente a mesma história de Fidel Castro, com planos de tornar a Venezuela em uma república socialista em pleno quintal Norte-Americano.

 

Chávez, que hoje tem seu país sustentado pelo dinheiro petrolífero, mantém uma singular relação com seu maior algoz, George W. Bush, pois precisa do dinheiro da venda do petróleo, mas ainda tem planos de derrubar o império Norte-Americano e o “império” brasileiro, reformando completamente o cenário internacional.

 

 

 

*Acadêmico de Direito da UFSC.

 

 

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Como citar e referenciar este artigo:
BELLI, Marcel. Socialismo – Cole. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/resumos/sociologia/socialismo/ Acesso em: 29 mar. 2024