—————————————————————-
RECURSO ESPECIAL Nº 622.405 – SP (2004/0011235-9)
R E L ATO R A : MINISTRA DENISE ARRUDA
RECORRENTE : SOCIEDADE AGRO INDUSTRIAL VALE
DO RIO MANSO LTDA E OUTROS
ADVOGADO : JOSÉ MÁRIO PIMENTEL DE ASSIS MOURA
E OUTRO(S)
RECORRIDO : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADOR : PEDRO UBIRATAN ESCOREL DE AZEVEDO
E OUTRO(S)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DÚVIDAS SOBRE
A TITULARIDADE DE BEM IMÓVEL INDENIZADO
EM AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA COM SENTENÇA
TRANSITADA EM JULGADO. PRINCÍPIO DA JUSTA
INDENIZAÇÃO. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA.
1. Hipótese em que foi determinada a suspensão do levantamento
da última parcela do precatório (art. 33 do ADCT), para a realização
de uma nova perícia na eução de sentença proferida
em ação de desapropriação indireta já transitada em julgado,
com vistas à apuração de divergências quanto à localização da
área indiretamente expropriada, à possível existência de nove
superposições de áreas de terceiros naquela, algumas delas objeto
de outras ações de desapropriação, e à existência de terras devolutas
dentro da área em questão.
2. Segundo a teoria da relativização da coisa julgada, haverá
situações em que a própria sentença, por conter vícios insanáveis,
será considerada inexistente juridicamente. Se a sentença sequer
existe no mundo jurídico, não poderá ser reconhecida como tal, e,
por esse motivo, nunca transitará em julgado.
3. “A coisa julgada, enquanto fenômeno decorrente de princípio
ligado ao Estado Democrático de Direito, convive com outros princípios
fundamentais igualmente pertinentes. Ademais, como todos
os atos oriundos do Estado, também a coisa julgada se formará se
presentes pressupostos legalmente estabelecidos. Ausentes estes, de
duas, uma: (a) ou a decisão não ficará acobertada pela coisa julgada,
ou (b) embora suscetível de ser atingida pela coisa julgada, a
decisão poderá, ainda assim, ser revista pelo próprio Estado, desde
que presentes motivos preestabelecidos na norma jurídica, adequadamente
interpretada.” (WAMBIER, Tereza Arruda Alvim e MEDINA,
José Miguel Garcia. O Dogma da Coisa Julgada: Hipóteses
de Relativização, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2003, pág. 25)
4. “A escolha dos caminhos adequados à infringência da coisa
julgada em cada caso concreto é um problema bem menor e de
solução não muito difícil, a partir de quando se aceite a tese da
relativização dessa autoridade – esse, sim, o problema central, polêmico
e de extraordinária magnitude sistemática, como procurei
demonstrar. Tomo a liberdade de tomar à lição de Pontes de Miranda
e do leque de possibilidades que sugere, como: a) a propositura
de nova demanda igual à primeira, desconsiderada a coisa
julgada; b) a resistência à eução, por meio de embargos a ela ou
mediante alegações incidentes ao próprio processo eutivo; e c) a
alegação incidenter tantum em algum outro processo, inclusive em
peças defensivas.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Coisa Julgada
Inconstitucional – Coordenador Carlos Valder do Nascimento
– 2ª edição, Rio de Janeiro: América Jurídica, 2002, págs.
63-65)
5. Verifica-se, portanto, que a desconstituição da coisa julgada
pode ser perseguida até mesmo por intermédio de alegações incidentes
ao próprio processo eutivo, tal como ocorreu na hipótese
dos autos.
6. Não se está afirmando aqui que não tenha havido coisa julgada
em relação à titularidade do imóvel e ao valor da indenização
fia no processo de conhecimento, mas que determinadas decisões
judiciais, por conter vícios insanáveis, nunca transitam em
julgado. Caberá à perícia técnica, cuja realização foi determinada
pelas instâncias ordinárias, demonstrar se tais vícios estão ou não
presentes no caso dos autos.
7. Recurso especial desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça: Prosseguindo no
julgamento, a Turma, por maioria, vencidos os Srs. Ministros José
Delgado (voto-vista) e Luiz Fux, negou provimento ao recurso especial,
nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros
Francisco Falcão (RISTJ, art. 162, § 2º, segunda parte) e Teori
Albino Zavascki votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 14 de agosto de 2007(Data do Julgamento).