Apelação Cível. Recurso Adesivo de Apelação. Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Cancelamento de Registro. Alienação de imóvel. Dação em pagamento. Necessidade de outorga uxória. Ilegitimidade de parte. Cerceamento de defesa. Juntada de documento aos autos. Fixação de honorários. Recurso manifestamente protelatório. Litigância de má-fé.
Fernando Machado da Silva Lima*
EGRÉGIA XXXXXXXXCÂMARA CÍVEL ISOLADA
PROCESSO : N° XXXXXXXXXX
APELAÇÃO CÍVEL
APELANTE/APELADO: BANCO XXXXXXXX S/A
APELANTE/APELADO: XXXXXXXXXX
RELATOR : EXMO. DES. XXXXXXXX
PROCURADORA DE JUSTIÇA : XXXXXXXXXXX
Ilustre Desembargador Relator :
Tratam os presentes Autos da Apelação interposta por Banco Bradesco S/A, nos Autos da Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Cancelamento de Registro ajuizada por XXXXXXXXX e do Recurso Adesivo de Apelação interposto por XXXXXXXXX e XXXXXXXXXX.
Em síntese, os Autos informam que :
1. Em sua Exordial, de fls. 3-8, diz a Autora que é casada com o Sr. XXXXXXXXX, desde 24.06.81 e que o casal adquiriu um apartamento, onde reside. Diz que tomou conhecimento de que seu marido alienou o imóvel, através de suposta dação em pagamento, ao Banco Bradesco S/A, e que a Autora não assinou a escritura. Cita o art. 235, item I, do Código Civil Brasileiro, que exige para a validade do ato a outorga uxória. Pede ainda, com fundamento na Lei de Registros Públicos, art. 168, I, 21, que seja registrada, no Registro de Imóveis do 2o Ofício, a existência da presente ação. Junta documentos (fls.
2. O Banco XXXXXXXXX S/A contestou, às fls. 21- 36. Disse que a Autora é parte ilegítima, porque o Sr. XXXXXXXXXXX teria figurado na escritura de dação em pagamento na qualidade de mero procurador do Sr. XXXXXXXXX. Citou doutrina e jurisprudência a respeito. Alegou ainda a falta de capacidade processual da Autora, por falta de consentimento expresso do cônjuge para ingressar com a ação. Disse ainda que o imóvel objeto da dação em pagamento não pertencia ao casal. Transcreveu Certidão do Cartório do 2o Ofício, pela qual o imóvel pertence a XXXXXXXXX, e disse que o Sr. XXXXXXXXXX era apenas procurador. Citou os arts. 530, 531, 532, 533 e 534 do Código Civil. Citou doutrina, a respeito da aquisição da propriedade. Disse que sem a efetivação do registro do título aquisitivo, não existe o requisito da publicidade, para a validade contra terceiros. Citou ainda os arts. 676, 856 e 859 do Código Civil. Citou doutrina. Juntou documentos (fls.
3. Às fls. 57-
4. Termo de Audiência, às fls. 95- 97. Às fls. 98- 106, Razões Finais da Autora. Sobre a ilegitimidade de parte, comentou as respostas do Banco, mostrando que este tinha conhecimento de que o apartamento pertencia a XXXXXXXXX. Disse que os depoimentos de XXXXXXX e XXXXXXXXX demonstraram que o marido da Autora não era mero procurador na transação do imóvel em questão. Repisou argumentos anteriores, a respeito da falta de capacidade processual da Autora e a respeito da necessidade de transcrição no registro de imóveis, para que a Autora pudesse postular a anulação do negócio. Disse que o Réu não pode inovar na lide, e argüir a existência de benefício do casal.
5. Às fls. 111- 112, disse o Réu que tomou conhecimento de que a respeito do imóvel objeto da presente demanda, foi gravado um impedimento judicial, por determinação do MM. Juízo, e que não existe nos Autos nenhum despacho nesse sentido. Pediu que o Processo fosse chamado à ordem, para determinar que aquele impedimento fosse desconsiderado.
6. Às fls. 115- 122, Razões Finais do Réu. Alega irregularidades processuais, com a juntada de documento sem a manifestação da parte contrária. Trata da questão do impedimento judicial constante da Certidão do Cartório do 2º Ofício. Repisa os argumentos referentes à ilegitimidade de parte e da falta de capacidade processual da Autora. Repisa que o imóvel jamais pertenceu à Autora e a seu esposo e que a Autora tinha conhecimento das dívidas do casal.
7. Às fls. 125-
8. Às fls. 130- 134, o Parecer da Ilustre Representante do Parquet. Relatou o processo. Disse que a Autora tem legitimidade de ação, por falta da outorga uxória. Disse que o Sr. XXXXXXXXX, marido da Autora, era proprietário do imóvel, que não podia ser alienado sem o consentimento da Autora. Cita o art. 235, I, do Código Civil. Cita doutrina. Manifesta-se pela procedência da ação.
9. Às fls. 135- 153, documentos referentes ao Agravo interposto pelo BancoXXXXXX contra a decisão da Mma. Juíza, pertinente ao registro do impedimento judicial no Cartório do Segundo Ofício, e que foi julgado improcedente pela Terceira Câmara Cível Isolada, em julgamento realizado em 13.11.98.
11. O Banco XXXXXXXX S/A interpôs, às fls. 162- 167, Embargos de Declaração, alegando falta de motivação da Sentença, e que várias questões jurídicas teriam deixado de ser apreciadas.
13. O Banco XXXXXXXXXX apelou (fls. 171- 196). Alega preliminarmente cerceamento de defesa, pertinente à juntada de documentos aos Autos, sem que a Mma. Juíza tenha aberto prazo para que o ora Apelante sobre eles se manifestasse. Cita jurisprudência. Alega, ainda, a nulidade da Sentença por falta de motivação. Cita doutrina e jurisprudência. Volta a abordar a questão da ilegitimidade de parte da Autora. Cita doutrina. Insiste na tese de falta de capacidade processual da Apelada. Alega direito adquirido, em decorrência do registro do ato da dação em pagamento no Cartório de Registro de Imóveis. Cita doutrina, Constituição, Código Civil. Alega ainda que agiu de boa-fé, com base no art. 490 e seu parágrafo único, do Código Civil. Cita doutrina.
16. Às fls. 229-
17. Às fls. 242, Contra-Razões do Banco ao Recurso de Apelação pertinente à verba honorária.
18. Distribuído o Processo, vieram os Autos a esta Procuradoria, para exame e parecer.
É o relatório. Esta Procuradoria passa a informar:
O exame do presente litígio demonstra claramente o intuito do Banco Bradesco S/A de utilizar todos os recursos e expedientes possíveis, apenas com a finalidade de protelar a decisão judicial.
É claro que a possibilidade da interposição dos recursos corresponde a uma necessidade da Justiça e a uma exigência psicológica do ser humano, refletida em sua inconformidade com a decisão judiciária que lhe é desfavorável, mesmo porque a simples possibilidade do recurso aumenta, ainda, o sentimento de segurança das partes, pelo fato de que a decisão estará sempre sujeita ao julgamento de outro magistrado, o que obrigará o juiz da causa a melhor fundamentar o seu julgamento. Mas o problema é o abuso do recurso, interposto com finalidade meramente protelatória, e não resta dúvida de que cabe aos juízes reprimir atos dessa natureza, que não apenas ofendem o interesse das partes, mas também e principalmente o interesse público, porque obstruem as vias judiciárias, retardam os processos e contribuem para o descrédito do Judiciário. A Lei 9.668/98 expressamente incluiu o recurso manifestamente protelatório como uma das hipóteses de litigância de má-fé, estabelecendo ainda que o juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.
A litigância de má-fé interfere, portanto, de forma nociva, no correto desenvolvimento da relação jurídica processual estabelecida, e os meios postos à disposição do magistrado, para coibi-la, são antes de mais nada, instrumentos destinados a preservar a dignidade da Justiça, sem a qual o processo jamais poderá atingir sua verdadeira finalidade. O magistrado, verificando a existência da litigância de má-fé, deverá aplicar a pena prevista na lei, para que o processo não se torne um instrumento contrário à Justiça, sendo usado apenas para protelar, através dessas manobras simplesmente burocráticas e maliciosas, a efetivação do direito subjetivo da parte.
Não resta dúvida, pelo simples exame do presente Processo, bem como em decorrência dos próprios depoimentos da representante legal e da testemunha do Apelante, que o imóvel realmente pertencia ao casal, e que o marido da Apelada não era um mero procurador, mas o verdadeiro proprietário do imóvel que foi dado em pagamento ao Banco Apelante, e que, conseqüentemente, não poderia esse ato jurídico ser válido sem a outorga uxória.
Por essa razão, caem por terra todas as preliminares do Banco Apelante, e se demonstram descabidos os inúmeros recursos manejados, em defesa de direito que se afigura inexistente. A respeito das preliminares, esta Procuradoria deixa de examiná-las individuadamente, limitando-se a endossar integralmente os conceitos emitidos pela Apelada, em suas Contra-Razões, de fls. 207- 227.
Tem assim inteira razão a Apelada, quando afirma que, tendo sido demonstrado que o imóvel era de propriedade do casal, não poderia haver alienação sem o consentimento da mulher e que esta teria, portanto, legitimidade para requerer judicialmente a anulação do negócio realizado ao arrepio da lei, consoante estabelecem os arts. 248, II, 249 e 235, do Código Civil.
Quanto ao Recurso da Apelada e de seu advogado, no pertinente à verba honorária, esta Procuradoria se manifesta pela sua procedência, tendo em vista o alegado às fls.
Ex Positis, esta Procuradoria de Justiça se manifesta, considerando o exame de todos os elementos do Presente, pela improcedência do pedido do Banco Apelante, para que seja mantida a r. Decisão recorrida, por seus próprios fundamentos. No pertinente à verba honorária, opina pelo provimento da Apelação.
É O PARECER.
Belém, março de 2.000.
* Professor de Direito Constitucional da Unama
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