Direito Civil

Agravo de Instrumento. Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Registro de Imóveis. Litisconsórcio necessário e facultativo.

Agravo de Instrumento. Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Registro de Imóveis. Litisconsórcio necessário e facultativo.

 

 

Fernando Machado da Silva Lima*

 

 

 

EGRÉGIA XXXXXXXX CÂMARA CÍVEL ISOLADA

PROCESSO :  XXXXXX

RECURSO:       AGRAVO         

AGRAVANTES: XXXXXXXX E OUTROS

AGRAVADO: ESPÓLIO DE XXXXXXXXXXX

RELATORA:  EXMA.  DESA.  XXXXXXXXXXXX

PROCURADORA DE JUSTIÇA: XXXXXXXXXXXX

 

 

 

 

Ilustre Desembargadora  Relatora:

 

 

 

Trata o presente do Agravo interposto por XXXXXXXXXX e XXXXXXXXXXXX, contra Despacho Interlocutório proferido nos Autos da Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Registro de Imóvel ajuizada pelo Espólio de XXXXXXXXXXX.

 

 

Em síntese, os autos informam que:

 

1.       O Espólio de XXXXXXXXX ajuizou Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Registro de Imóvel (fls. 6 a 17) contra os Agravantes. O Inventariante, Sr. XXXXXXXX, alega que no Processo de Inventário, foi requerida a citação da Sra. XXXXXXXXXX, que estava na posse do imóvel inventariado, sito na Tv. XXXXXXX, no. XXX, e que em sua Contestação, alegou que o imóvel havia sido vendido pelo de cujus à Sra. XXXXXX, enteada deste e filha da Sra. XXXXXXX. Alega que a Sra. XXXXXX usou de má-fé na aquisição do bem, passando por cima da cadeia de transferência do imóvel e transferindo o imóvel para o seu nome sem o conhecimento dos herdeiros e talvez do próprio de cujus. Diz que o de cujus abandonou seus filhos. Diz que houve simulação, através de documento particular, constando sua própria enteada como compradora. Diz que o de cujus era pessoa idosa e doente, incapaz e presa fácil para pessoas mal intencionadas. Prova a simulação pelo fato de que o de cujus viveu no imóvel até falecer. Faz a seguir o histórico da cadeia de transferência do imóvel, iniciada com o Sr. XXXXXXXXXX,  e terminada com o Sr. XXXXXXXX (fls. 10 e 11). Alega que o Sr. XXXXXXXXX não poderia ter vendido o imóvel duas vezes. Cita diversas irregularidades que teriam ocorrido na venda do imóvel para a Sra. XXXXXXX. Diz que houve simulação, praticada pelo Sr. XXXXXXX e/ou pela Sra. XXXXXX, para lesar o Espólio. Cita Allan Kardec. Pede perícia no imóvel. Pede imissão de posse. Pede a citação de diversas (sete) pessoas envolvidas na transação. Pede que sejam expedidos ofícios a diversos Cartórios. Pede exame pericial e grafotécnico nos documentos que enumera.

 

 2.      Os Agravantes contestaram a Ação (fls. 22 a 26). Dizem que o Sr. XXXXXXX adquiriu o imóvel de XXXXXXX. Dizem que não existiu a cadeia dominial alegada, mas apenas posseiros de boa fé. Citam os artigos 531 e 533 do Código Civil. Explicam a existência dos dois documentos, um assinado pelo Sr. XXXXXX e o outro, pelo Sr. XXXXX. Citam o art. 935 do Código Civil. Dizem que não houve prejuízo aos diversos ocupantes do imóvel e que a ausência de transcrição dos recibos no Registro de Imóveis configura a ausência de cadeia dominial. Pedem a extinção do processo, sem julgamento do mérito.

 

3.      Às fls. 28 e 29, o Espólio de XXXXXXXXX pede à MMa. Juíza da 23ª Vara sejam ratificados os termos da inicial, prosseguir as citações, de acordo com a inicial e informa endereços.

 

 4.      Pelo despacho constante de fls. 30 e 31, a MMa. Juíza mandou citar todos os requeridos relacionados na Inicial, para contestarem no prazo legal.

 

5.      Os Agravantes, em suas Razões (fls. 2 a 4),  dizem que esse despacho é alheio ao Ordenamento Jurídico Pátrio. Citam o artigo 282 do CPC. Citam o art. 3º do CPC. Dizem que as demais pessoas relacionadas na inicial, com exceção dos Agravantes, não satisfazem os requisitos do artigo 282 do CPC, faltando-lhes interesse e legitimidade para figurarem no polo passivo da relação processual. Dizem que o Agravado propõe ação apenas contra os Agravantes e às fls. 10, letra d, requer a citação dos nominados, sem dizer a razão dessa citação. Diz que a MMa. Juíza desatendeu as normas processuais e decidiu extra petita, porque em nenhum momento existe tal requerimento na Inicial. Pedem o provimento do recurso, para que o Processo possa ter seu curso normal.

 

6.      Às fls. 36 e 37, a MMa. Juíza, após relatar o Processo, informa que determinou a citação das pessoas relacionadas na inicial como litisconsortes passivos porque essas pessoas integraram a relação litigiosa, como partes da cadeia dominial, cabendo somente a estes recusarem a condição de litisconsortes. Junta documentos (fls. 38 a 57).

 

7.      Sem contra-razões ao Recurso, vieram os Autos a esta Procuradoria.

 

 

É o relatório. Esta Procuradoria passa a opinar:

 

O litisconsórcio pode ser necessário ou facultativo. É necessário, quando a lei ou a natureza da relação jurídica discutida em juízo determinam sua formação, independentemente da vontade da parte. É facultativo, quando não há obrigatoriedade para sua formação.

 

 Na hipótese vertente, pertinente a ação ordinária de anulação de escritura pública e registro de imóvel, estaria configurado o litisconsórcio necessário apenas em relação aos partícipes do contrato que se deseja anular, porque a sentença que dirimir a lide não poderá anular o contrato para um dos contratantes e declará-lo válido para os demais, que eventualmente não fossem partes do processo.

 

Caracteriza-se o litisconsórcio necessário, assim, pelo fato de que o juiz terá que decidir a lide de modo uniforme para todas as partes. Por essa razão, a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo. (CPC, artigo 47)

 

A respeito, o Excelso Pretório tem decidido:

 

 O litisconsórcio necessário tem lugar se a decisão da causa propende a acarretar obrigação direta para o terceiro, a prejudicá-lo ou a afetar seu direito subjetivo. (STF-RT594/248). Do contrário, ele não ocorre. (RTJ 84/267)

 

Há litisconsórcio passivo necessário quando existe comunhão de interesse do réu e do terceiro chamado à lide (STF- 2ª Turma, Ag. 107.489-2-AgRg-SP, rel. Min. Carlos Madeira, j.28.2.86, negaram provimento, v.u., DJU 21.3.86, p.3.962, 1ª col., em.).

 

Não sendo necessário o litisconsórcio, inexiste a necessidade da citação, para garantir a eficácia da sentença.

 

Dispõe o art. 47 do Código de Processo Civil:

 

Art. 47 – Há litisconsorte necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver que decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes.

 

Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar instinto o processo.

 

Entendemos descabida a subsunção da hipótese vertente nas normas suso transcritas, porque nenhum dos incisos se coaduna com os elementos constantes dos Autos. Somente os Agravantes, XXXXXX e seu esposo, XXXXXXXXXXXX, são diretamente interessados na lide, devendo figurar no polo passivo da relação processual, conforme aliás consta da Inicial (fls. 6 e 7), quando o Espólio de XXXXXXXX expressamente indica como réus XXXXXXX e XXXXXXX. As pessoas relacionadas às fls. 15, letra “d”, cuja citação é também pedida, não são réus nem litisconsortes.

 

A citação é a comunicação que deve ser feita ao sujeito passivo da relação processual (réu ou interessado), pertinente ao ajuizamento da ação, para que se possa defender, constituindo portanto pressuposto de validade da relação processual.

 

No tocante à ação anulatória de escritura de compra e venda, devem ser citados como litisconsortes necessários todos aqueles que intervieram na escritura anulanda (RT 534/71)

 

         À evidência, assim, possuem legitimatio ad causam (CPC, artigo 3º), no polo ativo o Espólio de XXXXXXXX e no polo passivo XXXXXX e seu esposo XXXXXXXXX.

 

         Entendemos poderia ser aplicável às outras pessoas relacionadas às fls. 15, desde que comprovassem interesse jurídico, pelo fato de poderem ser reflexamente atingidos pela sentença que vier a ser proferida nos presentes Autos, o artigo 50 da Lei Instrumental, que dispõe sobre a assistência:

 

Art. 50- Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no processo para assisti-la.

 

Somente quem possui legitimidade e interesse processual pode contestar a ação. O terceiro que pretender ingressar no polo passivo da relação processual, como assistente simples, nos termos do suso transcrito artigo 50, ou litisconsorcial (artigo 54), deve demonstrar interesse jurídico na vitória do demandado, não podendo ser admitido se seu interesse for meramente moral ou econômico.

 

         Deve-se observar, ainda, que os Réus apresentaram sua Contestação em 14.10.98, e que o Espólio de XXXXXXXX veio protocolar, em 02.02.99, seu Pedido, que originou o Despacho ora agravado, de 22.03.99, para que fossem feitas as citações daquelas pessoas já referidas, por serem de suma importância para a solução do litígio, no dizer do Patrono do Autor, o que realmente permite a dedução de que deveriam elas ter sido arroladas como testemunhas.

 

Por todo o exposto, esta  Procuradoria de Justiça opina pelo conhecimento do Agravo e pelo seu provimento, para que seja reformado o respeitável despacho hostilizado.

 

 

É o parecer.

 

Belém,      outubro  de 1999

 

 Procuradora de Justiça

 

 

* Professor de Direito Constitucional da Unama

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Como citar e referenciar este artigo:
LIMA, Fernando Machado da Silva. Agravo de Instrumento. Ação Ordinária de Anulação de Escritura Pública e Registro de Imóveis. Litisconsórcio necessário e facultativo.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/estudodecaso/obrigacoes/agravo-de-instrumento-acao-ordinaria-de-anulacao-de-escritura-publica-e-registro-de-imoveis-litisconsorcio-necessario-e-facultativo/ Acesso em: 25 abr. 2024