Direito Civil - Obrigações

Direito Das Obrigações – Parte V

Direito Das Obrigações – Parte V

 

 

Otávio Goulart Minatto*

 

Inadimplemento das obrigações (disposições gerais)

 

Obrigatoriedade dos contratos:

 

Em regra, as obrigações são cumpridas voluntariamente, seja pelo devedor ou por terceiro. Quando a prestação devida não é efetuada, diz-se que houve o inadimplemento da obrigação.

 

Quando a inexecução da obrigação advém de culpa latu sensu do devedor, diz-se que o inadimplemento é culposo, cabendo ao credor o direito de acionar os mecanismos para pleitear o cumprimento forçado. Quando a inexecução decorre de evento impossível de evitar ou impedir, o inadimplemento é fortuito.

Inadimplemento absoluto:

 

O inadimplemento é absoluto quando o cumprimento não poderá mais ser feito, ou o cumprimento não é mais útil ao credor. A absolutividade é total quando atinge todo o objeto. Absolutividade parcial ocorre quando a obrigação abrange vários objetos e somente uma parcela deles é atingida. O inadimplemento é relativo quando o cumprimento da obrigação é imperfeito, como no caso de mora.

 

“Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado” (art. 389).

Responsabilidade contratual e extracontratual:

 

O art. 389 é o fundamento legal da responsabilidade civil contratual. É a responsabilidade que deriva do contrato. Há também a responsabilidade que não deriva do contrato, mas sim do dever legal. É a responsabilidade extracontratual, aquiliana ou delitual. Em ambas as situações, o inadimplemento pode gerar a obrigação de restituir perdas e danos.

 

Na responsabilidade contratual, o inadimplemento presume-se culposo. Cabe ao inadimplente provar a ocorrência de caso fortuito ou força maior para se eximir da culpabilidade. Por exemplo: O passageiro de um ônibus não precisa provar a negligência do motorista para exigir indenização caso haja acidente envolvendo o mesmo. É o motorista que deve alegar motivo maior para se livrar da culpa. Na extracontratual é o lesado que deve provar a culpa do causador do dano. Por exemplo: O pedestre que é atropelado deve provar que o motorista que o atropelou agiu com culpa para exigir indenização, não precisando o motorista provar que não. Porém, se a obrigação assumida no contrato for de meio, a culpa deve ser provada pelo lesado, mesmo a responsabilidade sendo contratual.

 

A responsabilidade contratual tem origem na convenção. Já a extracontratual tem origem na inobservância do dever genérico de não lesar outrem (neminem laedere).

 

Os absolutamente capazes são os únicos que podem ser partes de um contrato. Por isso, a responsabilidade contratual só atinge essa figura. Já o dever genérico de não lesar a outrem pode ser inobservado tanto por capazes quanto por incapazes. Sendo assim, a responsabilidade extracontratual também atinge tais figuras.

 

A graduação da responsabilidade delitual é muito maior que a contratual, indo a dimensões muito mais amplas.

Perdas e danos:

 

O não cumprimento da obrigação, ou seu cumprimento imperfeito gera a obrigação de indenizar as perdas e danos. O ressarcimento das perdas e danos tem o objetivo de recompor o patrimônio da parte lesada. Por isso, deve ser proporcional ao prejuízo sofrido. A contagem do prejuízo inclui, além, do que se perdeu, o que se deixou de lucrar.

 

“Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplemento desde o dia em que executou o ato de que se devia abster” (art. 390). Nas obrigações constituídas por uma série de abstenções, o credor pode mover ação de cunho cominatório para impedir o reiteramento do devedor de uma dessas abstenções. Se a obrigação for de prestação única, pode o credor, além das perdas e danos, exigir o desfazimento do que foi realizado (art. 251).

Responsabilidade patrimonial:

 

“Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor” (art. 391). Quando as perdas e danos são decretadas e o pagamento não é feito, a execução será forçada, sendo que todos os bens do devedor respondem pelo inadimplemento, ou seja, uma eventual penhora pode recair sobre qualquer bem do devedor. Contudo, ninguém pode ser preso por dívida civil, exceto o depositário infiel e o devedor de pensão de direito de família.

Contratos benéficos e onerosos:

 

“Nos contratos benéficos, responde por simples culpa contratante, a quem o contrato aproveite, e por dolo aquele a quem não favoreça. Nos contratos onerosos, responde cada uma das partes por culpa, salvo as exceções previstas em lei” (art. 392). Contrato benéfico é o gratuito, ou seja, somente a uma parte este é vantajoso, cabendo a outra apenas os deveres, como a doação. Aquele que não se aproveita em nada com o contrato não deve ser penalizado por agir culposamente. Porém, o não cumprimento doloso gera indenização, pois ninguém pode descumprir deliberadamente uma obrigação contraída livremente. No contrato oneroso, as duas partes estão em igualdade, com direitos e deveres recíprocos. Sendo assim, ambos respondem da mesma forma pela culpa e pelo dolo.

Inadimplemento fortuito da obrigação:

 

“O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado” (art. 393, caput). As partes podem, porém, estabelecer a responsabilização do devedor mesmo que o inadimplemento ocorra sem sua culpa (pacta sunt servanda). As circunstâncias que causaram a impossibilidade de prestação pela parte do devedor, podem ser provocadas por ato de terceiro, do credor, por caso fortuito ou força maior ou por até mesmo ato do devedor, quando não houver culpa do mesmo.

 

Em qualquer dos casos, a exoneração da culpa depende de que:

 

a) A impossibilidade seja objetiva;

b) A impossibilidade seja superveniente e inevitável. Por exemplo: Aquele que celebra uma obrigação de fazer um show em local que está em guerra não pode alegar que não cumpriu a obrigação devido aos perigos da situação do local, pois era ciente das condições do mesmo.

c) A impossibilidade seja irresistível, isto é, fora do alcance do devedor.

 

Modernamente, tem-se adotado a teoria do exercício da atividade perigosa, no qual o caso fortuito ligado à coisa ou à pessoa, como a quebra de uma peça do caminhão que bate, é de responsabilidade do devedor.  Somente o “fortuito externo”, advindo de fenômeno natural, como a chuva, seria escusável nesse caso.

 

 

Mora:

 

Conceito:

“Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer” (art. 394). Embora a mora também se constitua quando o devedor tenta pagar de forma diferente do estipulado, o seu retardamento é o modo mais comum no qual ela se dá. Não é só pelo descumprimento da convenção que a mora acontece. O cometimento de infração à lei também a caracteriza.

 

A súmula 54 do STJ dispõe que “os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual. Na contratual, entretanto “contam-se os juros de mora desde a citação inicial” (art. 405).

 

Nas obrigações de não fazer, não há o instituto da mora, pois “o devedor é havido por inadimplemento desde o dia em que executou o ato de que se devia abster” (art. 390).

 

Mora e inadimplemento absoluto:

 

Quando o retardamento da prestação torna a mesma inútil ao credor, não há mais mora, mas sim o inadimplemento absoluto. Exemplo: de nada adianta ao credor receber o bolo que encomendou para seu casamento um dia depois da festa.

 

A prestação que não interessa mais ao credor é tida como impossível. Não basta que o credor alegue que a prestação não lhe é mais útil, as circunstâncias devem demonstrar isto.

 

Tanto no inadimplemento absoluto quanto na mora, surge a obrigação de restituir as perdas e danos quando tais são provocadas pela culpa do devedor. Contudo, “não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não incorre este em mora” (art. 396). Se a mora deu-se por caso fortuito ou força maior, isto é, não havendo culpa do devedor, este não será responsabilizado pelas perdas e danos. Se a obrigação tornar-se impossível sem a culpa do devedor, também não haverá responsabilização deste. Todo inadimplemento e mora do devedor presumem-se culposos. Porém pode o devedor afastá-la provando que o infortuito não se originou por culpa sua. Já para o credor, o mesmo não vale. A mora deste em receber o pagamento, mesmo sem sua culpa, é sempre de sua responsabilidade. A mora accipiendi não requer a noção de culpa porque se o credor pudesse afastar sua responsabilidade, o devedor seria obrigado a correr com os riscos de reter o pagamento por fato que não foi ocasionado por ele.

 

Quando o devedor está em mora, ele é notificado pelo credor, para que esteja ciente da sua situação e possa purgá-la. No inadimplemento absoluto a notificação não é necessária, já que o cumprimento da obrigação é inviável.

 

Espécies de mora do devedor:

 

Mora ex re:

 

É a declarada pela lei (o credor não precisa fazer nada para caracterizá-la). Há três casos nos quais a mora é ex re. Nos demais, ela é ex persona. São elas:

 

a) “O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor” (art. 397, caput). Todavia, “Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial” (art. 297, parágrafo único). É caso que se refere o parágrafo único do art. 297 é de mora ex persona, pois depende de providência do credor.

 

b) “Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou” (art. 398). É desnecessária a notificação, pois a indenização é evidente. A mora é, pois, presumida.

 

c) Quando o devedor declarar por escrito não pretender cumprir a prestação.

 

Mora ex persona:

 

Quando o credor deve acionar os dispositivos cabíveis para caracterizá-la. A interpelação ou notificação da mora nas relações regidas pela lei civil pode ser feita desde a demanda judicial até por uma simples carta, tendo apenas que resultar de documento escrito.

 

O decreto lei n. 58/37, art. 14, protegendo as pessoas que adquirem imóveis loteados em prestações, dispõe que só incorrerão em mora tais pessoas depois de serem notificadas com o prazo de trinta dias, mesmo que a parcela seja positiva e líquida, com termo certo. É o legislador transformando uma mora ex re em mora ex persona.

 

O decreto lei n. 745/69 impede a rescisão do compromisso de compra e venda de imóvel não loteado, mesmo que haja cláusula resolutiva expressa, sem a notificação no prazo de 15 dias.

 

Tanto no caso do decreto n. 58 quanto no n. 745, a notificação deve ser feita judicialmente ou pelo cartório de registros de imóveis. Nessas hipóteses, a simples citação não é suficiente para constituir a mora, é necessária a interpelação judicial. A jurisprudência, no entanto, tem entendido que a citação feita na própria causa principal produz mesmo efeito.

Mora do devedor:

 

São requisitos da mora solvendi:

 

a) Exigibilidade da prestação: A dívida deve ser líquida e certa. Além disso, a realização tardia deve ainda ser proveitosa ao credor Caso a condição que sujeitava a obrigação não se verificou, ou não houve a escolha a qual o pagamento da obrigação dependesse, não haverá mora, pois não se pode afirmar se o devedor efetivamente devia ou o que devia.

 

b) Inexecução culposa por fato imputável ao devedor.

 

c) Constituição em mora: Este requisito é somente para os casos de mora ex persona, que dependem da ação do credor, pois nos casos ex re, a mora já é constituída desde o fato.

 

Efeitos da mora do devedor:

 

“Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado” (art. 395). Caso a prestação torne-se inútil ao credor, ou seja, haja o inadimplemento absoluto, o credor pode exigir a rescisão do contrato, reclamando as perdas e danos.

“O devedor em mora responde pela impossibilidade da prestação, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou força maior, se estes ocorrerem durante o atraso, salvo se provar isenção de culpa, ou que o dano sobreviria ainda quando a obrigação fosse oportunamente desempenhada” (art. 399). Isto significa que, na mora, o devedor responde por todos os riscos da coisa. A parte do artigo que isenta o devedor caso ele prove não ter culpa é ilógico, pois se assim provar não haverá mora em si.

 

Mora do credor:

 

Conceito:

 

É quando o credor recusa receber o pagamento no tempo e modo indicado, exigindo-o de forma diferente da estipulada.

 

Requisitos:

 

a) Vencimento da obrigação: É somente então que ela é exigível.

 

b) Oferta da prestação: É através dela que fica revelada a tentativa do devedor de satisfazer a obrigação. Deve-se ter claro que o pagamento foi oferecido, mas o credor o recusou ou não prestou a necessária colaboração para a sua efetivação. A mora accipiendi supõe que o devedor fez o que lhe competia.

 

c) Recusa injustificada em receber: O credor pode se recusar a receber o pagamento com fundamento legítimo, quando, por exemplo, o devedor oferece quantia menor que a estipulada. Para haver mora, o motivo para a não aceitação do pagamento deve ser injustificável legitimamente.

 

d) Constituição em mora: Ocorre mediante a consignação em pagamento.

 

Efeitos:

 

“A mora do credor subtrai o devedor isento de dolo à responsabilidade pela conservação da coisa, obriga o credor a ressarcir as despesas empregadas em conservá-la, e o sujeita a recebê-la pela estimação mais favorável ao devedor, se o seu valor oscilar entre o dia estabelecido para o pagamento e o da sua efetivação” (art. 400). A lei exige que o devedor tenha o mínimo de cuidado com a coisa que forçadamente deve reter. Se o devedor agir com dolo, abandonando a coisa, por exemplo, responderá pela deteriorização desta. Esta solução é tomada porque o direito que o devedor tem de abandonar a coisa colide com o interesse da comunidade, sendo preferível exigir que este cuide da coisa, mesmo que por motivo alheio à sua vontade. As despesas que o credor deve ressarcir são somente as necessárias, previstas no art. 96, § 3°.

 

Mora de ambos os contratantes:

 

A mora simultânea de ambos as partes (nem o devedor comparece ao local para efetuar o pagamento, nem o credor vai para recebê-lo) faz com que a situação permaneça como se nada tivesse ocorrido. Há o cancelamento mútuo das moras. Ninguém pode exigir da outra parte perdas e danos.

 

Se as moras são sucessivas (primeiro o credor não quer receber e depois é o devedor que se rejeita em pagar, ou vice-versa) os prejuízos de cada mora, contabilizados separadamente, serão de responsabilizadade das respectivas partes. Os danos de cada mora não se cancelam, porém nada impede que ocorra uma compensação convencional das perdas e danos.

 

Purgação e cessação da mora:

 

Purgar ou emendar a mora é neutralizar seus efeitos. Ela só é possível se a prestação ainda for proveitosa ao credor, pois se não for, haverá inadimplemento absoluto, não tendo o que se falar em mora. A purgação produz efeitos futuros que neutraliza os produzidos, mas não os apaga.

 

Segundo o art. 400, “purga-se a mora” nas seguintes hipóteses:

 

I – “Por parte do devedor, oferecendo este a prestação mais a importância dos prejuízos decorrentes do dia da oferta”.

 

II – “Por parte do credor, oferecendo-se este a receber o pagamento e sujeitando-se aos efeitos da mora até a mesma data”.

 

As partes podem aceitar a oferta sem a incidência dos juros da mora, renunciando-os. Porém, este ato não significa propriamente a purgação da mora.

 

Entende-se, hoje, que a purgação pode dar-se a qualquer momento da mora, desde que não tenha causado dano à outra parte. O devedor em mora pode até consignar o pagamento, caso o credor não tenha extraído os efeitos jurídicos de tal atraso.

 

A cessação da mora é diferente da purgação. Nela, o efeito não depende daquele que agiu em mora, mais sim da outra parte. Ela decorre da extinção da obrigação. A cessação produz efeitos pretéritos, pois afasta os já produzidos.

 

 

Perdas e danos

 

Conceito:

 

É toda a lesão de qualquer bem jurídico, seja o dano material ou moral. O dano é material quando atinge e diminui o patrimônio do lesado. O dano é moral quando atinge bem jurídico, mas que não tenha repercussão na órbita financeira. A indenização de dano material mede-se pelo prejuízo ao patrimônio da parte. Já a de dano moral é arbitrada judicialmente. A apuração do dano, ou prejuízo, é feita por meio da liquidação determinada na lei processual (art. 946). A finalidade da liquidação é tornar prático e possível a efetiva reparação do prejuízo.

 

Dano emergente e lucro cessante:

 

“Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar” (art. 402). Dano emergente é a efetiva diminuição patrimonial sofrida pela vítima para restaurar o bem ao seu estado anterior. A expressão efetiva perda significa que a mesma não pode ser presumida, devendo ser cumpridamente provada. Lucro cessante é a frustração da expectativa de lucro, do que se esperava ganhar com o bem lesado. A razoabilidade do lucro é o que o bom senso indica que a atividade lucraria. O dano indenizável deve ser certo e atual.

 

“Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual” (art. 403). A teoria dos danos diretos e imediatos afasta a possibilidade de se indenizar os chamados “danos remotos”.  Aquilo que dependia do bem lesado, mas também dependia de uma série de outros fatores não pode ter sua inexecução atribuída unicamente à lesão do bem em questão. A dificuldade jurídica existe na definição precisa do que foi afetado direta e imediatamente.

 

Obrigações de pagamento em dinheiro:

 

“As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional” (art. 404, caput). Se o credor teve que ingressar em juízo, além de pagar as custas do atraso, o devedor deve pagar as custas do processo (art. 20, CPC).

 

As perdas e danos têm como objetivo restituir o dano causado pela lesão do bem, logo, “provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar” (art. 404, parágrafo único). Quando a responsabilidade é contratual, “contam-se os juros de mora desde a citação inicial” (art. 405).

 

 

Juros legais

 

Conceito:

 

Juros são os rendimentos do capital. São os frutos civis da coisa. Representam o pagamento pela utilização do capital alheio.

Espécies:

 

Os juros são considerados convencionais quando são ajustados pelas partes, de comum acordo. Quando os juros são previstos ou impostos pela lei, são chamados de legais.

 

Os juros são chamados de compensatórios, remuneratórios ou juros-frutos, quando representam a compensação pela utilização de capital alheio. Devem estar previstos no contrato, não podendo ultrapassar os limites impostos pela Fazenda Nacional (art. 591). O STJ decidiu que os juros remuneratórios praticados nos contratos de mútuo dos agentes financeiros do Sistema Financeiro Nacional não estão sujeitos à limitação do art. 591. Os juros compensatórios são, geralmente, convencionais. Nada impede, contudo, que possam derivar da lei ou da jurisprudência.

 

Quando os juros incidem nos caso de retardamento da restituição ou descumprimento de obrigação, eles são denominados moratórios.

 

Os juros moratórios podem ser tanto convencionais quanto legais. Quando legais, são definidos pela Fazenda Nacional. “Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazendo Nacional” (art. 406). Quando convencionais, podem assumir qualquer valor, porém, nunca superior ao limite legal.

 

“Ainda que se não alegue prejuízo, é obrigado o devedor aos juros da mora que se contarão assim às dívida em dinheiro, como às prestações de outra natureza, uma vez que lhes esteja fixado o valor pecuniário por sentença judicial, arbitramento, ou acordo entre as partes” (art. 407). Os juros moratórios são incluídos também na liquidação.

 

Juros simples são os que são sempre calculados sobre o capital inicial. Já os juros compostos são capitalizados anualmente, integrando o capital. É o chamado juros sobre juros.

Regulamentação legal:

 

Segundo o art. 405, nos casos de responsabilidade contratual, “contam-se os juros de mora desde a citação inicial”.

 

“Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual” (Súmula 54 do STJ).

 

A Lei de Usura (Dec. n. 22.626/33) limita os juros a 1% ao mês. Essa lei também proíbe a cobrança dos juros compostos. Porém, o art. 591 do novo CC permite os juros compostos. O art. 406 estipula que a taxa máxima não mais fixa, mas sim variável, conforme o estabelecido pela Fazenda Nacional.

 

A Fazenda vem adotando a taxa SELIC como meio de aferição dos juros legais. Contudo, o STJ não aceita a utilização da taxa SELIC não  para esse fim, pois ela não é juridicamente segura, já que além de determinar os juros trás embutida a correção monetária. O entendimento dominante da jurisprudência é de que deve ser imposto o determinado na Lei da Usura, juntamente com o estabelecido no Código Tributário Nacional, ou seja, 12% ao ano. Entende-se que o novo CC, por ser lei geral posterior, não revoga a lei especial anterior (Lei da Usura).

 

 

Cláusula Penal

 

Conceito:

 

É uma obrigação acessória, na qual se estipula uma pena ou multa com o objetivo de evitar o inadimplemento da obrigação principal. Representa reforço ao pacto obrigacional através da ameaça de uma sanção civil, caso a obrigação não seja cumprida. Chama-se também de pena convencional ou multa contratual.

 

“Incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que, culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora” (art. 408).

 

Natureza jurídica:

 

É um pacto secundário e acessório, pois a sua existência depende da de uma obrigação jurídica. Aplica-se, logo, o princípio de que o acessório segue a sorte do principal. Isto quer dizer que se a obrigação principal é inválida ou nula, também será a cláusula penal. Contudo, a recíproca não é verdadeira. A invalidez da cláusula penal não implica na da obrigação principal.

 

Funções da cláusula penal:

 

A cláusula penal é meio de coerção para que o devedor cumpra a obrigação É também meio de ressarcimento dos danos causados pelo inadimplemento da obrigação. A cláusula penal constitui modo de cobrir os prejuízos que dificilmente poderiam ser provados, bem como livrar-se de sua liquidação.

 

“Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue prejuízo” (art. 416, caput). O caput do artigo 416 mostra porque a cláusula penal é utilizada. Sem ter o ônus de provar o prejuízo sofrido, o credor apenas demonstra que houve o inadimplemento da obrigação. O devedor não pode eximir-se da pena alegando ser ela excessiva, ou desproporcional com o dano causado, pois assim foi fixado o acordo.

 

“Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se o tiver feito, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor provar o prejuízo excedente” (art. 416, parágrafo único). O parágrafo único do art. 416 fala dos casos em que a cláusula não é suficiente para cobrir todos os prejuízos. Nessas hipóteses, cabe ao credor provar o valor das perdas para ser indenizado. Contudo, essa indenização não é imposta em conjunto com a cláusula penal. O valor dessa segunda é descontado no da primeira, pois se busca apenas o ressarcimento dos danos, e não um enriquecimento ilícito do credor.

 

Redução da cláusula penal:

 

“O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal” (art. 412). Caso haja excesso, o juiz determinará a redução do valor, não chegando a declarar a ineficácia absoluta da cláusula.

 

“A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio” (art. 413). Quando a prestação foi cumprida em parte, usa-se o princípio da eqüidade, reduzindo-se proporcionalmente o valor. A redução do excesso não possui uma medição fixa. O juízo é de ponderação, observando-se fatores subjetivos como a natureza e a finalidade do negócio, para se chegar ao valor final. Tal disposição é de ordem pública, podendo a redução ser determinada de ofício pelo juiz.

 

Há diversas leis que estipulam o valor máximo da cláusula penal em situações específicas. Nesses casos, o juiz observa os limites especiais fixados.

 

Espécies:

 

“A cláusula penal estipulada conjuntamente com a obrigação, ou em ato posterior, pode referir-se à inexecução completa da obrigação, à de alguma cláusula especial ou simplesmente à mora” (art. 409).

 

A cláusula penal pode ser compensatória, quando estipulada na hipótese de inadimplemento da obrigação; ou moratória, quando aplicada nos casos de mora do devedor.

A cláusula penal compensatória geralmente possui valor elevado, pois representa a recompensa do grande prejuízo que é o não cumprimento da prestação.

 

“Quando se estipular a cláusula penal para o caso de total inadimplemento da obrigação, esta se converterá em alternativa a benefício do credor” (art. 410). O dispositivo da a oportunidade para o credor escolher entre pleitear a pena compensatória, exigir o ressarcimento das perdas e danos ou exigir o cumprimento da prestação. Tanto a cláusula penal quanto o ressarcimento das perdas e danos tem como objetivo impedir que o credor saia prejudicado com o inadimplemento. Em qualquer uma das hipóteses, o credor tem seu patrimônio preservado.  Por isso só é permitido ao credor escolher uma das soluções. A escolha de mais de uma representaria um enriquecimento ilícito do credor.

 

Em se tratando de cláusula moratória, “quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em segurança especial de outra cláusula determinada, terá o credor o arbítrio de exigir a satisfação da pena cominada, juntamente com o desempenho da obrigação principal” (art. 411). A mora pode ser tanto o atraso da prestação, como o cumprimento de forma diversa da estipulada.

 

Nos casos de cláusulas penais moratórias o valor da multa é geralmente pequeno, pois os prejuízos são referentes a um pequeno atraso, não ao total inadimplemento. Por isso a aplicação da multa conjuntamente com a exigência da prestação da obrigação não caracteriza enriquecimento ilícito do credor. É, na verdade, o modo para ele não sair prejudicado dessa relação obrigacional.

 

Sendo assim, uma mesma obrigação pode ter até 3 cláusula penais diferentes (1 compensatória e 2 moratórias, uma para o caso de atraso e outra para o caso de cumprimento de forma diversa).

 

Quando não há certeza sobre qual é a hipótese estipulada no contrato, costuma-se observar o valor da cláusula para relaciona-la à hipótese provavelmente correspondente.

 

Distinção com institutos afins:

 

Há certa distinção entre pena convencional (imposta na cláusula penal) e multa cominatória ou astreinte: Na pena convencional, o juiz condena a parte ao pagamento da multa da cláusula penal observado o limite do art. 412 do CC. Já na multa cominatória em obrigação de fazer, decorrente de título judicial para garantir a efetividade do processo, o art. 644 é que a regula, instituindo que não há limite para o valor da cominação

 

A cláusula penal também se aproxima do instituto de perdas e danos, porém, na cláusula penal, o valor a ser pago é estipulado anteriormente e, por isso, às vezes não representa o exato ressarcimento dos prejuízos do credor; enquanto que as perdas e danos são decretadas pelo juiz, baseado nos prejuízos alegados e provados. Por isso, representa a exata restituição dos prejuízos.

 

A diferença entre a cláusula penal e a multa simples é que a cláusula penal é uma importância a ser paga caso haja uma infração, com o objetivo de ressarcir o prejuízo do credor, objetivo este que não é o da multa simples.

 

A multa penitencial se aproxima da cláusula penal. Entretanto, a cláusula penal é atribuída em favor do credor. Este escolhe se quer acioná-la ou prefere o adimplemento da obrigação, acrescido as perdas e danos (somente no caso da multa por mora). Já a multa penitencial é estipulada em favor do devedor. É quando se permite que ele, ao invés de cumprir a obrigação, irá pagar tal multa.

 

Há várias distinções entre cláusula penal e arras penitenciais. A cláusula penal é uma coerção para se evitar o inadimplemento, enquanto que as arras facilita o descumprimento da avença, pois as partes sabem qual será a conseqüência do inadimplemento: perda do valor dado, ou sua restituição em dobro dependendo do caso. A cláusula penal pode ser reduzida pelo juiz quando em excesso, o arraz não. A cláusula penal é exigível apenas no inadimplemento ou na mora, já as arras são pagas por antecipação. A cláusula penal existe apenas pela estipulação no instrumento, enquanto que as arras necessitam da entrega de dinheiro ou objeto.

 

Cláusula penal e pluralidade de devedores:

 

“Sendo indivisível a obrigação, todos os devedores, caindo em falta um deles, incorrerão na pena; mas esta só poderá demandar integralmente do culpado, respondendo cada um dos outros somente pela sua quota” (art. 414). Todos os devedores, mesmo não sendo culpados, arcam com o valor da multa, dividida na quota de cada um. Caso contrário o credor sairia prejudicado pela infração cometida. 

 

Entretanto, após pagar o credor, “aos não-culpados fica reservada a ação regressiva contra aquele que deu causa à aplicação da pena (art. 414, parágrafo único). Dessa forma, é somente o devedor culpado que arca com as conseqüências de sua falta.

 

Se a obrigação for divisível, “só incorre na pena o devedor ou o herdeiro do devedor que a infringiu, e proporcionalmente à sua parte na obrigação” (art. 415).

 

 

Arras ou sinal

 

Conceito:

 

É a quantia ou coisa entregue por uma parte a outra simbolizando a confirmação do acordo entre as partes e, em certos casos, assegurando o não prejuízo de uma das partes pelo direito de arrepender que a outra tem. Cabe apenas nos contratos bilaterais. É o pacto acessório, dependendo da existência de um principal. É impossível imaginar a existência das arras isoladas. Têm caráter real, pois o simples acordo entre as partes não é suficiente para caracterizá-lo. É necessária a entrega de quantia de dinheiro ou objeto.

 

Espécies:

 

As arras são confirmatórias quando sua função é apenas confirmar o contrato pactuado. Nesses casos, “se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, juros e honorários de advogado” (art. 418).

 

Caso a parte prejudicada não se contentar com o valor recebido, achando que não foi totalmente ressarcido, pode “pedir indenização suplementar, se provar maior prejuízo, valendo as arras como taxa mínima”, ou pode ainda “exigir a execução do contrato, com as perdas e danos, valendo as arras como o mínimo de indenização” (art. 419).

 

Percebe-se que as arras não têm nenhuma função específica quando confirmatória. É apenas uma quantia estipulada inicialmente que ajudará no ressarcimento de eventual prejuízo.

 

As arras são chamadas de penitenciais quando têm por função resguardar o direito de arrependimento das partes. Pode a parte infratora decidir por liberar esse valor à outra ao invés do cumprimento da obrigação. O objetivo não é ressarcir os prejuízos da parte afetada, mas sim representar uma pequena punição pelo descumprimento da outra.

 

“Se nos contratos for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á” em benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos os casos não haverá direito a indenização complementar” (art. 420). A devolução em dobro é imposta porque se a devolução fosse simples, estar-se-ia apenas restabelecendo o statu quo ante, sem nenhuma punição à parte que descumpriu com a obrigação. Como a função das arras penitencial não é de ressarcir os prejuízos, não é necessário a prova do prejuízo real para que possam ser exigidos.

 

A jurisprudência estabeleceu certas hipóteses nas quais a devolução das arras é apenas simples, e não dupla, são elas:

 

a) Quando há acordo nesse sentido;

b) Quando a não efetivação do contrato decorre de caso fortuito ou força maior.

Restituição das arras em caso de cumprimento da obrigação:

 

“Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma das partes der à outra, a título de arras, dinheito ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução, ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero da principal” (art. 417). Quando a obrigação se dá normalmente, sem o arrependimento de nenhuma das partes, as arras funcionam como princípio do pagamento.

 

 

* Acadêmico de Direito da UFSC.

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MINATTO, Otávio Goulart. Direito Das Obrigações – Parte V. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/doutrina/obrigacoes-doutrina/direito-das-obrigacoes-parte-v/ Acesso em: 29 mar. 2024