Direito Civil - Obrigações

Direito Das Obrigações – Parte IV

Direito Das Obrigações – Parte IV

 

 

Otávio Goulart Minatto*

 

Pagamento em consignação:

 

Conceito:

 

O pagamento em consignação é uma espécie de pagamento especial, feita de forma indireta. O devedor não só tem o dever de pagar como tem o direito de fazê-lo, pois isto o interessa na medida em que o exonera da obrigação.

 

“Considera-se pagamento, e extingue a obrigação, o depósito judicial ou em estabelecimento bancário da coisa devida, nos casos e forma legais” (art. 334). A consignação consiste no depósito da coisa devida pelo devedor, por ele mesmo ou em seu nome, judicialmente ou extrajudicialmente, com o objetivo de liberar o devedor da obrigação quando o credor age em mora. Quando o credor rejeita o pagamento sem justificativa aceitável, pode o devedor consigná-lo, cobrindo-se dos efeitos que o efetivo pagamento lhe causaria. A consignação é forma indireta de pagamento. Por isso, ela só cabe quando não é possível fazer o mesmo de forma direta.

 

Se a recusa do credor é justa não se pode consignar o pagamento, pois essa recusa caracteriza que o devedor não esta apto para se exonerar da obrigação. A consignação comprova a mora accipiendi, o que não acontece quando a recusa é justa. Se não houver recusa não há no que se falar em consignação, pois o credor irá aceitar o pagamento quando lhe oferecido.

 

Objeto da consignação:

 

O art. 334 não especifica o que se pode depositar ou não. Sendo assim, entende-se que pode ser tanto dinheiro quanto bens móveis ou imóveis.  O objeto pode ser ainda certo ou incerto. O depósito só é possível nas obrigações de dar. É ilógico pensar neste instituto nas obrigações de fazer e de não fazer. “Se a coisa devida for imóvel ou corpo certo que deva ser entregue no mesmo lugar onde está, poderá o devedor citar o credor para vir ou mandar recebê-la, sob pena de ser depositada” (art. 341).

“Se a escolha da coisa indeterminada competir ao credor, será ele citado para esse fim, sob cominação de perder o direito e de ser depositada a coisa que o devedor escolher; feita a escolha pelo devedor, proceder-se-á como no artigo antecedente” (art. 342). Não é lógico prejudicar o devedor pela mora accipiendi. Se o credor não determina o objeto do pagamento, não ficará o devedor eternamente a espera da escolha, fará ele a mesma.

 

Fatos que autorizam a consignação:

 

O art. 335 enumera os fatos que autorizam a consignação:

 

a) Inciso I: “Se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma”. Este inciso refere-se à hipótese de obrigação portável.  Cabe ao devedor provar que efetivamente ofertou o pagamento. Ao credor, por sua vês, cabe apresentar causa justa para a recusa.

 

b) Inciso II: “se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos”. Este inciso refere-se à dívida quesível. Neste caso, basta o devedor apenas demonstrar que o credor não foi em busca de seu pagamento.

 

c) Inciso III: “Se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil”. A simples incapacidade não é motivo suficiente para que se faça a consignação. Deve ser impossível também efetuar o pagamento ao representante do credor. Só assim é possível a consignação, pois, nesse caso, fica comprovada a impossibilidade de se pagar diretamente. O caso da ausência é difícil de ser observado, pois tal instituto só pode ser decretado por sentença, que estabelece um curador para o ausente. Existindo um curador não há porque não fazer o pagamento diretamente para ele.

 

d) Inciso IV: “Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento”. “Quando a consignação se fundar em dúvida sobre quem deva legitimamente receber, não comparecendo nenhum pretendente, converter-se-á o depósito em arrecadação de bens de ausentes; comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano; comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os credores; caso em que se observará o procedimento ordinário” (CPC, art. 898). Se a residência do credor é em local perigoso ou desconhecido, quando a dívida é portável, o devedor não tem a obrigação de arriscar a sua vida para efetuar o pagamento. Nas três hipóteses, o devedor não é prejudicado por não se saber quem é o verdadeiro credor. Seu depósito é suficiente para que seja exonerado da obrigação, não participando da discussão sobre quem receberá seu pagamento Se a dúvida quanto quem é o credor não for razoável, o juiz fará o indeferimento da petição inicial, por falta de interesse de agir do autor.

 

e) Inciso V: “se pender litígio sobre o objeto do pagamento”. Estando as partes disputando em juízo o objeto do pagamento é ilógico pensar que uma delas pode se exonerar da obrigação em disputa.

 

Requisitos de validade da consignação:

 

“Para que a consignação tenha força de pagamento, será mister concorram, em relação às pessoas, ao objeto, modo e tempo, todos os requisitos sem os quais não é válido o pagamento” (art. 336).

 

Requisito pessoal ou subjetivo para a validade da consignação:

 

O pagamento deve ser feito pelo devedor capaz ao verdadeiro credor, também capaz. Tem legitimidade ativa para a ação consignatória o devedor, bem como terceiro interessado, ou não, que o faz em nome do devedor. A legitimidade passiva (réu da ação consignatória) recai sobre aquele que pode receber o pagamento e exonerar o devedor. Se esta pessoa for desconhecida, será citada por edital (CPC, art. 231, I) com intervenção, a seu favor, de curador especial (CPC, art. 9°, II).

 

Requisito objetivo, ou referente ao objeto:

 

O pagamento deve ser efetuado em sua integralidade. “O depósito requerer-se-á no lugar do pagamento, cessando, tanto que se efetue, para o depositante, os juros da dívida e os riscos, salvo se for julgado improcedente” (art. 337). O devedor deve incluir no depósito a correção monetária referente ao período entre o vencimento da dívida e o efetivo depósito. Se o deposito for de entrega de coisa, devem ser entregues também os acessórios, frutos e produtos que o credor tem direito A jurisprudência tem admitido a discussão em torno do valor depositado, pelas partes. Isto significa que o princípio de que o depósito deve ser líquido e certo não é mais válido. Se o devedor oferecer objeto que não seja o devido, ou descumprir alguma cláusula contratual, poderá o credor, legitimamente, recusar a consignação.

 

Modo do pagamento:

 

O modo será o mesmo que o estabelecido, ou seja, se a obrigação poderia ser paga em várias prestações, também poderá o seu depósito.

 

Tempo do pagamento:

 

O tempo do depósito respeitará o fixado no contrato, ou seja, só pode ser feito após o vencimento da dívida. Se o prazo foi estipulado a favor do devedor, poderá este retirar o depósito a qualquer momento (art. 333). Verificada a condição a que o débito estava subordinado, pode o credor efetuar o depósito (art. 332) A mora do devedor não impede a consignação do pagamento por si só. Se ela não tiver causado nenhuma conseqüência irreversível, poderá o devedor fazer o depósito.  Porém, se neste período o credor tiver demandado o devedor, a consignação não poderá mais ser feita.

 

Lugar do pagamento:

 

O depósito será feito no lugar o qual foi estabelecido para ser o do pagamento (art. 337).

 

Levantamento do depósito:

 

“Enquanto o credor não declarar que aceita o depósito, ou não impugnar, poderá o devedor requerer o levantamento, pagando as respectivas despesas, e subsistindo a obrigação para todas as conseqüências de direito” (art. 338).

 

“O credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o depósito, aquiescer no levantamento, perderá a preferência e a garantia que lhe competiam com respeito à coisa consignada, ficando para logo desobrigados os co-devedores e fiadores que não tenham anuído” (art. 340). Se o credor recusar o depósito e contestar a ação, o levantamento do pagamento só poderá ser feito com a sua anuência. Se assim aceitar, o levantamento corresponderá a um novo crédito, pois o credor permitiu que a quantia lhe fosse tomada após ter sido assegurado o resgate do seu crédito. Ou seja, ele confirmou com a outra parte nova obrigação. Sendo a obrigação nova, ficam desobrigados dela todos aqueles que não compactaram com sua criação, como os co-devedores e os fiadores. 

 

Aceitando o depósito, o credor extingue a dívida, exonerando todas as partes. Um levantamento posterior da quantia depositada pelo devedor representa, da mesma forma, uma nova obrigação assumida.

 

“Julgado procedente o depósito, o devedor já não poderá levantá-lo embora o credor consinta, senão de acordo com os outros devedores e fiadores” (art. 339). O julgamento da procedência do depósito implica na afirmação da exoneração da parte ativa. Por isso um levantamento da quantia depositada representaria a volta da obrigação em questão. Como tal ato afeta os co-devedores e fiadores, que têm interesse em ver a obrigação extinta, o levantamento só pode ser feito com suas anuências.

Disposições processuais:

 

Quando o credor recusa-se a receber o pagamento, o devedor tem duas alternativas:

 

a) Efetuar o depósito extrajudicial em banco aceito pelo credor: No depósito extrajudicial, o devedor deverá apenas comprovar o depósito do pagamento, bem como demonstrar a recusa do credor.

 

b) Ajuizar ação de consignação em pagamento: Essa ação é de natureza declaratória, podendo ser feita mesmo quando houver dúvida sobre o valor exato a ser depositado. Quando a dívida é portável, a ação é proposta no foro do domicílio do credor. Quando querível, no do devedor. Se a ação tratar de aluguéis e encargos, será proposta no foro de eleição e, não o havendo, no lugar da situação do imóvel (CPC, art. 891, parágrafo único).

 

O depósito judicial deverá ser feito no prazo de cinco dias. Se se tratar de prestações periódicas, sendo a primeira consignada, as demais não precisam seguir toda a formalidade, tendo apenas que ser feitas no prazo de cinco dias do vencimento de cada uma. Isso só pode ser feito até o deferimento da sentença.  Essa possibilidade só se estende até a prolação da sentença. Os depósitos futuros não estão sujeitos ao decidido. Caso o credor recuse as novas prestações, mesmo com a sentença proferida obrigando-o a aceitar aquelas que foram depositadas, não pode o devedor aproveitar-se da sentença, devendo ajuizar nova demanda O prazo de resposta do credor é de quinze dias.

 

O credor pode alegar que: “I – não houve recusa ou mora em receber a quantia ou coisa devida; II – foi justa a recusa; III – o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV – o depósito não é integral (CPC, art. 896, caput). Se o credor alegar que o valor depositado não é integral, pode o devedor depositar o restante no prazo de dez dias (CPC, art. 896, parágrafo único). A alegação de que o valor não é o integral não impede que o credor levante o pagamento parcial e libere o devedor neste montante (CPC, art. 899, caput e § 1°).

 

A procedente da ação reputa efetuado o pagamento, não incidindo os juros moratórios do período da ação. Se a ação é improcedente, o devedor responde pelos juros do curso da lide, pois se caracteriza o seu retardamento culposo.

 

 

Pagamento com sub-rogação:

 

Conceito:

 

Sub-rogação é a substituição de uma parte da obrigação, sendo que esta nova preserva todas as características da antiga. O terceiro que toma o lugar do credor preserva todos os direitos daquele, como os acessórios da obrigação e suas garantias. A sub-rogação pode ser real ou pessoal. É real quando a substituição é do objeto. O novo toma o lugar do antigo, preservando todos os ônus e atributos deste primeiro. Exemplo: Substituição da coisa gravada pelo testador ou doador com vínculo de inalienabilidade. Já a pessoal ocorre com a substituição do credor por terceiro. Ocorre quando este terceiro solve a dívida do devedor para com o credor, tornando-se, assim, o detentor do direito de ser ressarcido da quantia paga, pelo devedor. A sub-rogação pessoal é uma figura jurídica anômala, pois extingue a obrigação para o credor, que não pode mais exigir nada do devedor depois de ter recebido o pagamento do terceiro, mas preserva a obrigação ao devedor, que passa a dever ao terceiro.

 

Apesar de ser instituto semelhante à cessão de crédito, há certas diferenças para com este. Na cessão, visa-se o lucro, pois o objetivo é transformar o crédito em patrimônio, negociando-o. Por isto, o valor pago é diverso, geralmente, da dívida. Já na sub-rogação, ocorre a exata proporção entre o pagamento efetuado e o valor da dívida, pois o objetivo não é lucrar, mas sim livrar o devedor primário da obrigação com o credor.

 

Espécies:

 

A sub-rogação pode ser legal ou convencional:

 

A legal decorre da lei. Por isso, é independente da concordância da vontade de ambas as partes. O art. 346 define as hipóteses nas quais ocorre a sub-rogação legal:

 

a) Inciso I: “do credor que paga a dívida do devedor comum”. São os casos em que o credor percebe que o seu devedor também é sujeito passivo de outras obrigações e que se estes outros credores executarem seu crédito, o adimplemento da sua prestação, pelo devedor, corre o risco de não acontecer. Acontece geralmente quando este credor tem menos garantias que os demais. “Comprando” todas as dívidas do devedor ele tem certeza de que irá receber seu pagamento preferencialmente, já que não há nenhum outro para receber.

 

b) Inciso II: “do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecado, bem como do terceiro que efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre o imóvel”. Quando há mais de uma hipoteca, aquela estabelecida primeiro terá preferência numa eventual execução. Por isso, é interessante para aquele que se utiliza do imóvel comprar a primeira hipoteca, pois caso o imóvel seja executado, o adquirente do mesmo não o perderá para outro. Essa hipótese não se restringe ao caso da hipoteca. O inciso cita também qualquer relação contratual que dê ao credor qualquer direito sobre o imóvel. A jurisprudência tem ampliado esse entendimento para os casos de anticrese e aos adquirentes de coisa móvel.

 

c) Inciso III: “do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte”. Terceiro interessado é aquele que tem seu patrimônio afetado caso a dívida não seja paga pelo devedor. Para que isso não aconteça, ele pode exonerar o devedor e, conseqüentemente, a si mesmo, pagando a dívida. É o caso do avalista, do fiador, do devedor solidário, do co-devedor de dívida indivisível, etc.  O terceiro não interessado que paga a dívida não se sub-roga como credor, apenas tem o direito ao reembolso.

 

A sub-rogação é chamada de convencional quando é estipulada entre as partes. A manifestação dessa sub-rogação deve ser expressa. Por ter essas características, tal sub-rogação não precisa obedecer nenhuma das hipóteses legais, ocorrendo nos casos nos quais essa mudança não poderia ser feita, mas assim quiseram as partes. O art. 347 define as hipóteses nas quais ocorre a sub-rogação convencional:

 

a) Inciso I: “Quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos”. Esse caso ocorre somente quando o pagamento é feito por terceiro não é interessado, pois a quando o é pela interessado, a sub-rogação o é legal. Devem ser preenchidos os seguintes requisitos: 1) Haja transferência expressa dos direitos; 2) A transferência seja feita até a hora do pagamento, pois se não a dívida é extinta.

A transferência é feita sem a anuência do devedor. É muito semelhante à cessão do crédito, tanto que o art. 348 estabelece que “na hipótese do inciso I do artigo antecedente, vigorará o disposto quanto à cessão do crédito”.  Entretanto não são a mesma coisa, já que a cessão cuida de uma transferência de crédito, enquanto a sub-rogação está relacionada ao pagamento. Os fins são os mesmos, mas os meios não.

 

b) Inciso II: “Quando terceiro empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida, sob a condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito”. É a opção do devedor de trocar de credor. Não precisa haver anuência do credor, pois não tem ele como impedir que o terceiro empreste o valor da prestação. Os financiamentos regulados pelo sistema financeiro de habilitação são exemplos deste tipo de sub-rogação.

 

Efeitos da sub-rogação:

 

A sub-rogação produz dois efeitos:

 

a) Liberatório: exonera o devedor para com o antigo credor

 

b) Translativo: é o efeito contido no art. 349, segundo o qual “a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores”.  O efeito translativo aplica-se às duas modalidades de sub-rogação (legal e convencional). Na convencional, entretanto, este efeito pode ser limitado, graças à autonomia especulativa das partes.

 

“Na sub-rogação legal o sub-rogado não poderá exercer os direitos e as ações do credor, senão até a soma que tiver desembolsado para desobrigar o devedor” (art. 350). Se o sub-rogado pagou apenas uma parcela da dívida, terá direito sobre esta, e não sobre a integralidade do valor. Na sub-rogação convencional essa limitação não ocorre, pois as partes podem estipular de forma diversa.

 

Sub-rogação parcial:

 

Pode haver casos em que o terceiro paga apenas uma parte da dívida, sub-existindo o restante. Sendo assim, surgem dois credores: o antigo e o novo sub-rogado. “O credor originário, só em parte reembolsado, terá preferência ao sub-rogado, na cobrança da dívida restante, se os bens do devedor não chegarem para saldar inteiramente o que a um e outro dever” (art. 351).

 

O CC nada fala sobre quem tem preferência quando há mais de um sub-rogado, ou seja, quando mais de um terceiro pagou parcialmente a dívida. Entende-se que, neste caso, todos sujeitam-se à regra de igualdade de credores, não importando a data, origem ou montante de cada um. Sobre todos estes, porém, ainda prevalece o credor originário.

 

 

Imputação do pagamento:

 

Conceito:

 

Imputação do pagamento é quando o devedor possui mais de uma dívida com o mesmo credor. Pode ocorrer que este devedor não tenha dinheiro suficiente para pagar todas as dívidas, mas apenas uma ou algumas delas. Dá-se o nome de impugnação à escolha de quais dívidas serão pagas.

 

“A pessoa obrigada, por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos” (art. 352). É ao devedor que, primeiramente, compete escolher qual dos débitos será pago. Entre o capital e os juros, por exemplo, deve-se pagar obrigatoriamente os juros primeiro, pois os dois débitos são de naturezas diferentes, não podendo o devedor escolher qual quer pagar.

 

Requisitos:

 

a) Pluralidade de débitos, pois se não há opção de escolha não há no que se falar sobre impugnação. Somente é cabível a imputação em dívida única quando ela se desdobrar, como quando há juros. Mesmo assim, nesse caso, os juros seriam pagos por primeiro.

 

b) Identidade das partes, ou seja,  a figura do devedor e do credor deve ser a mesma para todas as obrigações. Estas figuras, porém, não precisam ser uma pessoa só. Pode haver pluralidade, como no caso da solidariedade.

 

c) Igual natureza das dívidas. Os objetos devem ser fungíveis de idêntica espécie e qualidade. Não há imputação quando uma das dívidas é de entregar dinheiro e a outra é de realizar uma prestação.  Não basta a simples fungibilidade das prestações. Elas devem ser fungíveis entre si, ou seja, homogêneas. Não há imputação quando uma das dívidas é de entregar dinheiro e a outra de entregar sacas de café. Apesar dos dois objetos das prestações serem fungíveis, eles não o são entre si.

As dívidas ainda devem ser líquidas (certas, quanto às suas existências, e determinadas, quanto aos seus objetos) e vencidas (exigível pelo advento do termo prefixado). Esse requisito é um tanto quanto inútil, já que a maioria das dívidas é estipulada em favor do devedor, podendo este antecipar o vencimento a bel prazer. A lei permite a imputação do débito vincendo e do ilíquido se assim o credor assentiu.

 

d) Possibilidade de o pagamento resgatar mais de um débito. Deve o pagamento poder saldar mais de uma dívida (separadamente) para que o devedor possa escolher sobre qual delas incidirá o pagamento. Se este somente puder saldar a menor dívida não há no que se falar em imputação, pois não pode o credor ser constrangido a receber pagamento parcial de dívida se assim não foi estipulado. O devedor deverá pagar a menor dívida, a única que ele pode saldar inteiramente.

Imputação por indicação do devedor:

 

O art. 352 assegura ao devedor o direito de impugnar seu pagamento. Porém, essa escolha sofre algumas limitações:

 

a) Não pode a dívida vincenda ser paga se o prazo foi estipulado em favor do credor.

 

b) Não se pode pagar parcialmente uma dívida se o credor assim não consentiu.

 

“Havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar a quitação por conta do capital” (art. 354).

 

Impugnação por vontade do credor:

 

“Não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a reclamar contra a impugnação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido violência ou dolo” (art. 353). Pode, porém, o devedor se opor a esta escolha, desde que não tenha aceitado a quitação, ou se a tiver sob violência e não havendo dolo.

 

Impugnação em virtude da lei:

 

“Se o devedor não fizer a indicação do art. 352, e a quitação for omissa quanto à impugnação; esta se fará nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro lugar. Se as dívidas forem todas líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a impugnação far-se-á na mais onerosa” (art. 355). A ordem para o pagamento das dívidas quando nenhuma das partes se manifesta é esta:

 

a) Havendo capital e juros, primeiro se paga os juros, como estipula o art. 354.

b) Sendo todas as dívidas da mesma natureza, primeiro são pagas as líquidas e vencidas.

c) Se todas forem líquidas e vencidas, paga-se a mais onerosa primeiro.

 

A dívida é onerosa ao credor quando, por exemplo, rende juros, há algum gravame, pode ser cobrada pelo rito executivo ou é garantida por cláusula penal. Ou seja, quanto mais conseqüências negativas resultarem do não adimplemento de uma dívida, mas onerosa ela é.

 

O CC não esclarece o procedimento quando todas as dívidas são onerosas no mesmo grau. Nesses casos, faz-se analogia ao art. 433, IV, do Código Comercial, dividindo o pagamento proporcionalmente entre todas as dívidas.

 

 

Dação em pagamento:

 

Conceito e características:

 

Dação em pagamento é o acordo feito entre as partes no qual o credor aceita em receber prestação diversa da que lhe é devida, liberando assim o devedor. As prestações devem ter natureza diferente. Não caracteriza dação em pagamento o depósito bancário para pagar dívida de dinheiro.  A dação pode ser feita, se o credor assentir, para a quitação parcial, quando o objeto oferecido é de menor valor que a dívida. Nesses casos, o credor deve esclarecer o débito remanescente.  Não precisa haver coincidência exata entre o valor da dívida e o do objeto da dação. Pode o credor, logo, receber valor superior ao da dívida sem ter que reembolsar o devedor. A dação em pagamento é uma forma indireta de pagamento. É um contrato liberatório.

 

Espécies:

 

a) Substituição de dinheiro por bem móvel ou imóvel (rem pro pecunia);

b) De coisa por outra (rem pro re).

c) De coisa por prestação de fato (rem pro facto); etc.

 

Disposições legais:

 

“Determinado o preço da coisa dada em pagamento, as relações entre as partes regular-se-ão pelas normas do contrato de compra e venda” (art. 357). Poderia-se interpretar, a contrario sensu, que quando o preço  não é determinado, não se aplicariam as regras da compra e venda. Porém, o art. 533 estabelece que nesses casos também se aplicam tais regras.

 

“Se for título de crédito a coisa dada em pagamento, a transferência importará em cessão” (art. 358). Sendo uma cessão de crédito, a dação do título deve ser notificada ao cedido.

 

A extinção da obrigação, pela dação em pagamento, é de caráter imediato. Contudo, pode o credor estipular a extinção mediata, a medida em que os títulos vão sendo pagos. Neste caso, configura-se a datio pro solvendo.

 

“Se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, restabelecer-se-á a obrigação primitiva, ficando sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros” (art. 359). Evicção ocorre quando o credor perde a coisa em virtude de sentença judicial, como quando o devedor não era o dono da coisa dada. Nesse caso, o objeto retorna ao seu verdadeiro dono e a obrigação volta a existir. O direito de terceiro que age de boa-fé é preservado, no entanto. Aquele que comprou imóvel que se livrou da hipoteca, sendo liberado no registro de imóveis, pela extinção da dívida por dação em pagamento não é prejudicado se essa dívida é restabelecida.

 

 

Novação:

 

Conceito:

 

Novação é a criação de obrigação nova para extinguir uma anterior. A novação não produz satisfação imediata do crédito. É, na verdade, modo extintivo não satisfatório, pois o credor não recebe a prestação devida, mas sim adquire outro direito de crédito.

Requisitos da novação:

 

Existência de obrigação anterior (obligatio novanda). “Salvo as obrigações simplesmente anuláveis, não podem ser objeto de novação obrigações nulas ou extintas” (art. 367). As obrigações nulas ou extintas não podem ser novadas porque não se pode novar o que não existe. As obrigações anuláveis têm existências, enquanto não rescindida judicialmente. A novação representa a renúncia ao direito de pleitear a anulação, instituto este que protege as partes em particular em certas ocasiões. Há grande discussão se as obrigações naturais podem ser novadas. Alguns entendem que não, pois ela não pode ser exigida compulsoriamente. Outros vêem que sim, pois a obrigação natural ganha substrato jurídico na medida em que é cumprida. A obrigação sujeita a termo ou a condição existe, logo pode ser novada.

 

A nova dívida pode ser pura e simples ou também condicionada. Sendo pela segunda opção, a novação dá-se com o implemento da condição estabelecida A grande maioria dos doutrinadores permite a novação da dívida prescrita.

 

Constituição de nova dívida (aliquid novi). A inovação pode recair tanto sobre o objeto quanto sobre o sujeito passivo ou ativo. Alterações secundárias na dívida, como exclusão de garantia, alongamento do prazo, estipulação de juros, etc; não constituem novação.

 

Intenção de inovar (animus novandi). O credor deve ter a intenção de novar, pois renuncia o crédito e todos os seus acessórios. Sendo assim, a novação não é presumida. “Não havendo ânimo de novar, expresso ou tácito mas inequívoco, a segunda obrigação confirma simplesmente a primeira” (art. 361). A novação tácita é observada sempre que a nova obrigação for diversa na substância ou na forma da obrigação anterior.

 

Espécies de novação:

 

a) Novação objetiva ou real: Ocorre novação objetiva ou real “quando o devedor contrai com o credor nova dívida para substituir a anterior” (art. 360, I).  A mudança incide sobre a dívida. A novação objetiva pode decorrer da mudança no objeto principal da obrigação, na natureza desse objeto ou na sua causa jurídica. É necessário o animus novandi, caso contrário o que ocorre é a dação em pagamento.

 

b) Novação subjetiva ou pessoal: Ocorre “quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o credor” (art. 360, II). A novação do devedor pode ocorrer sem a anuência deste, ou seja, num acordo entre o credor e terceiro. Este caso denomina-se expromissão. Quando há ordem ou consentimento do devedor, denomina-se delegação.

 

Pode o credor, na delegação, aceitar o novo devedor, mas não abrir mão de seus direitos para com o devedor primitivo. Neste caso a delegação é imperfeita e não há novação. Também se dá “quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao antigo, ficando o devedor quite com este” (art. 360, III).

 

c) Novação mista: Novação mista é quando ocorre, ao mesmo tempo, mudança do objeto da prestação e dos sujeitos da obrigação.

 

Efeitos da novação:

 

“Se o novo devedor for insolvente, não tem o credor, que o aceitou, ação regressiva contra o primeiro, salvo se este obteve por má-fé a substituição” (art. 363). Como a nova obrigação extinguiu a antiga não há no que se falar em se voltar contra o antigo devedor que se encontra totalmente exonerado. Somente far-se-á isto se este devedor agiu de má-fé, pois ninguém pode se aproveitar de sua torpeza.

 

“Operada a novação entre o credor e um dos devedores solidários, somente sobre os bens do que contrair a nova obrigação subsistem as preferência e garantias do crédito novado. Os outros devedores solidários ficam por este fato exonerados” (art. 365). Como a novação extingue a obrigação anterior, todos os co-devedores são exonerados. O acordo feito entre um dos co-devedores e o credor não se estende aos demais que não consentiram.

 

“A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não houver estipulação em contrário, Não aproveitará, contudo, ao credor ressalvar o penhor, a hipoteca e a anticrese, se os bens dados em garantia pertencerem a terceiro que não foi parte na novação” (art. 364). A extinção da obrigação antiga atinge suas garantias e seus acessórios.

 

“Importa exoneração do fiador a novação feita sem seu consenso com o devedor principal” (art. 366).

 

 

Compensação:

 

Conceito:

 

“Se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem” (art. 368). A compensação acontece quando duas pessoas são credoras e devedoras entre si de obrigações diferentes. Uma obrigação é paga pela outra, e as duas são então extintas.

Espécies de compensação:

 

A compensação é total quando o valor das dívidas for igual. Nesses casos, as duas dívidas se compensam mutuamente por inteiro, não restando nada após.

 

Quando o valor das dívidas for desigual, a compensação é parcial. A dívida maior irá compensar a dívida menor, que não existirá mais. Porém, a parcela da maior excedente continua sendo devida pela outra parte.

 

A compensação é legal quando decorre da lei. Ela produz efeitos ipso iure. Opera de forma automática, de pleno direito. O juiz apenas a reconhece, declarando sua configuração, desde que provocado, pois não pode proclamar de ofício. Os efeitos retroagirão ao momento em que foi constituída a segunda obrigação.

 

São requisitos da compensação legal:

 

a) Reciprocidade dos créditos: As duas pessoas devem ser credoras e devedoras entre si. “O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe deve; mas o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado” (art. 371). Como o patrimônio do fiador corre o risco de ser afetado caso o devedor não pague a dívida, é permitido que ele efetue compensação com este débito que não é seu.

 

Terceiro não interessado que paga em nome do devedor não pode compensar uma dívida sua com a do devedor nem com a do credor, pois são partes diversas. Aquele que se obriga em favor de terceiro também não pode compensar esta dívida com uma que tenha com o devedor, pois a obrigação que contraiu foi com o credor, pessoa diferente. Ele pode compensar essa obrigação com uma que tenha com o credor, pois são dívidas entre as mesmas partes.

 

b) Liquidez das dívidas: “A compensação efetua-se entre dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis” (art. 369).

 

c) Exigibilidade das prestações: Todas as obrigações devem ser exigíveis, ou seja, devem estar vencidas. Isto porque só assim pode o credor impor a realização coativa do contracrédito. Dívidas prescritas não podem ser alvo de compensação, a menos que a parte beneficiada não a tenha alegado, pois assim a dívida é exigível. As dívidas condicionais só podem ser compensadas com o implemento da condição. As à termo, só após o vencimento deste.

 

“Os prazos de favor, embora consagrados pelo uso geral, não obstam a compensação” (art. 372). As obrigações alternativas só podem ser compensadas caso a escolha feita pelo devedor cumpra os requisitos.

 

d) Fungibilidade dos débitos: Os débitos devem ser fungíveis entre si, ou seja, devem ser coisas fungíveis de mesma espécie.  Exemplo: dívida de sacas de café não se compensa com de sacas de milho. Se o contrato especificar a qualidade, a compensação só pode se dar entre produtos da mesma. “Embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, objeto das duas prestações, não se compensarão, verificando-se que diferem na qualidade, quando especificada no contrato” (art. 370). É convencional quando estipulada pelas partes.

 

Conceito e características da compensação convencional:

 

A compensação convencional ocorre quando as partes concordam em fazê-la, dispensando certos requisitos para que a mesma seja legal.  Podem as partes, por exemplo, compensar dívidas ilíquidas ou de diferente qualidade, conforme pactuarem. Pode a compensação resultar da vontade de apenas uma das partes, como no caso de o devedor compensar uma dívida vincenda sua. Ocorre, aí, a compensação facultativa. O limite da compensação convencional é quando este ato contrariar o fim econômico-social do contrato, a boa-fé e os bons costumes.

 

Conceito de compensação judicial:

 

A compensação judicial ocorre, principalmente, nas hipóteses nas quais há procedência da ação e da reconvenção, ou seja, ambas as partes vencem e são vencidas ao mesmo tempo. O juiz determina que o pagamento final seja compensado pelo o que cada parte ganhou

Dívidas não compensáveis:

 

“Não haverá compensação quando as partes, por mútuo acordo, a excluírem, ou no caso de renúncia prévia de uma delas” (art. 375). É a chamada exclusão bilateral. Pode haver renúncia unilateral do direito de compensar. Porém, esta só pode ser feita após o surgimento do crédito que seria compensado e antes de todos os requisitos da compensação estarem presentes. De qualquer forma, os direitos de terceiros são preservados da renúncia.

 

Não havendo interesse público envolvido, nada impede que a renúncia seja feita previamente. A renúncia não precisa ter fórmula específica, basta apenas ser clara, podendo tanto ser expressa quanto tácita. A diversidade de causa devendi (o por quê de ter se constituído o crédito) não é motivo para a incompatibilidade de compensação.

 

“A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, exceto:” (art. 373, caput).

 

a) Inciso I: “Se provier de esbulho, furto ou roubo”. Como constituem atos ilícitos, não podem ser objeto de compensação. Exemplo: aquele que empresta dinheiro a terceiro não compensa seu crédito roubando a mesma quantia deste. Contudo, pode a vítima de tais atos optar por uma compensação do que pela devolução do valor subtraído. A não possibilidade poderia beneficiar o autor do ato infracional.

 

b) Inciso II: “Se uma se originar de comodato, depósito ou alimentos”. O comodato e o depósito representam a confiança mútua. É a garantia de que o pagamento será feito com a restituição da coisa. Manter o objeto não é compensar o pagamento, pois o dever de restituir permanece. O art. 638 permiti a compensação do depósito somente se for compensado com outro depósito. A dívida de alimento não pode ser compensada porque seu pagamento presume a sobrevivência da outra parte. Se a pessoa pudesse compensar tal dívida, poderia causar a não alimentação da outra, fim este que a dívida de alimentos tenta impedir.

 

c) Inciso III: “Se uma for coisa não suscetível de penhora”. A impossibilidade de se penhorar significa que o objeto não pode ser alienado. A compensação de tal objeto resultaria justamente na sua alienação à outra parte.

 

“Não se admite compensação em prejuízo do direito de terceiro. O devedor que se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste, não pode opor ao exeqüente a compensação, de que contra o próprio credor disporia” (art. 380). Se após o credor tiver penhorado seu crédito para com o devedor, este se tornar credor daquele, não poderá ser feita a compensação. Isto porque o terceiro que se envolveu na penhora sairia prejudicado. Se a penhora tiver sido feita após a constituição dos créditos recíprocos, a compensação poderá ser feita, pois já teria o terceiro consciência da situação do crédito.

Outras regras sobre a compensação:

 

O efeito extintivo estende-se aos acessórios, pois cessa a dívida principal. O art. 1020 do CC de 1916 dispunha que “o devedor solidário só pode compensar com o credor o que este deve a seu coobrigado, até ao equivalente da parte deste na dívida comum”.  Como o novo Código nada fala sobre o assunto, o mesmo entendimento é utilizado, chamado de princípio da reciprocidade.

 

“O devedor que, notificado, nada opõe à cessão que o credor faz a terceiros dos seus direitos, não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão teria podido opor ao cedente. Se, porém, a cessão lhe não tiver sido notificada, poderá opor ao cessionário compensação do crédito que antes tinha contra o cedente” (art. 377). Depois não há compensação porque não existe reciprocidade entre o cedido e o cessionário, no caso.

 

“Quando as duas dívidas não são pagáveis no mesmo lugar, não se podem compensar sem dedução das despesas necessárias à operação” (art. 378). A contrariu sensu, entende-se que quando as dívidas são pagas no mesmo lugar, o desconto dessas despesas é permitido.

 

“Sendo a mesma pessoa obrigada por várias dívidas compensáveis, serão observadas, no compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação do pagamento” (art. 379).

 

 

Confusão:

 

Conceito e características:

 

“Extingue-se a obrigação, desde que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor” (art. 381). A confusão age sobre a figura do sujeito ativo e passivo, constituindo um impedimentum praestandi. Pode decorrer de ato inter vivos, ou mortis causa. É de ato inter vivos quando há cessão do crédito ao próprio devedor ou quando o devedor se casa com o credor com comunhão universal de bens. Decorre de mortis causa quando o devedor é herdeiro do credor falecido.

 

Espécies de confusão:

 

“A confusão pode verificar-se a respeito de toda a dívida, ou só de parte dela” (art. 392). Pode ocorrer confusão parcialmente ou de modo total. Se for parcial, só libera o devedor no montante da quota, como na compensação.

 

“A confusão operada na pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao mais a solidariedade” (art. 383). Caso haja pluralidade de credores, se um deles morrer, sendo o herdeiro o devedor, a confusão será parcial ou imprópria, tendo o devedor que pagar a quota parte dos outros co-credores. Já no caso de pluralidade de devedores, se o credor morrer, sendo um dos co-devedores o único herdeiro, a confusão é total ou própria para este, que não precisará pagar nada a si mesmo. Entretanto os outros co-devedores continuam a dever, tendo agora que pagar esse devedor que se tornou credor.

 

Efeitos da confusão:

 

A confusão da dívida principal extingue seus acessórios, mas a recíproca não é verdadeira. Se o credor morrer e o herdeiro for o fiador, a garantia da dívida se extinguirá, mas a mesma permanecerá, tendo o devedor agora que pagar para seu antigo fiador.

Cessação da confusão:

 

“Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a obrigação anterior” (art. 384). Exemplo de cessão da confusão: o credor torna-se ausente, dando início à sucessão provisória e depois reaparece.  Nesses casos, não houve uma extinção da obrigação, mas apenas uma neutralização ou paralisação. As partes podem convencionar a não produção dos efeitos da confusão. Isso, porém, somente vale entre elas, não se estendendo a terceiros.

 

 

Remissão de dívidas:

 

Conceito e natureza jurídica:

 

A remissão de dívidas ocorre quando o credor exonera o devedor do cumprimento da obrigação. “A remissão da dívida, aceita pelo devedor, extingue a obrigação, mas sem prejuízo de terceiro” (art. 385). Advêm da vontade unilateral do credor de remitir o devedor. Porém, é condicionada à aceitação expressa ou tácita do devedor, que é livre para se opor e efetuar o pagamento. A remissão é espécie do gênero renúncia, pois, diferente desta, necessita da aceitação do devedor.

 

O art. 386 impõe como requisitos para a remissão a capacidade do remitente (credor) de alienar e a do remitido (devedor), de adquirir. Qualquer crédito, desde que não contrarie o interesse público ou de terceiro, é suscetível à remissão. A natureza da remissão é contratual.

Espécies de remissão:

 

A remissão é considerada total quando exonera o devedor por completo, extinguindo a dívida completamente.  Quando exonera o devedor de somente uma parcela da dívida, diz-se que a remissão foi parcial.

 

A remissão é expressa quando resulta de declaração do credor. É tácita quando o comportamento do credor demonstra que o mesmo não pretende receber o pagamento. A mera inércia ou tolerância do credor, contudo, não faz presumir a remissão, a menos que contrarie a natureza da obrigação. A remissão é presumida quando deriva de expressa previsão legal.

 

A remissão pode ser concedida sob condição ou a termo inicial. Nessas hipóteses, a extinção dá-se no complemento do estipulado.

Presunções legais:

 

“A devolução voluntária do título da obrigação, quando por escrito particular, prova desoneração do devedor e seus coobrigados, se o credor for capaz de alienar, e o devedor capaz de adquirir” (art. 386). Não basta a simples entrega, deve haver a efetiva e voluntária devolução do título. Se o devedor estiver com a posse do escrito da dívida e alega que a pagou, presume-se que assim foi feito (art. 324). Não há necessidade de se provar de que o credor entregou-lhe o título. Agora, se o devedor alega que a dívida foi remitida, deve provar a entrega espontânea do título pelo credor.

 

“A restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida” (art. 387). A entrega do objeto penhorado ao devedor não faz com que este fique desobrigado a pagar a dívida, apenas transforma a garantia real do credor em pessoal.

 

Remissão em casos de pluralidade de devedores:

 

“A remissão concedida a um dos co-devedores extingue a dívida na parte a ele correspondente; de modo que, ainda reservando o credor a solidariedade contra os outros, já lhes não pode cobrar o débito sem dedução da parte remitida” (art. 388). Se a dívida for indivisível, com pluralidade de devedores, a remissão de um não desobriga os outros, que continuarão a ter que a pagar toda a dívida. Após o pagamento, os co-devedores que não foram remitidos poderão exigir a restituição do correspondente à cota do remitido.

 

 

* Acadêmico de Direito da UFSC.

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MINATTO, Otávio Goulart. Direito Das Obrigações – Parte IV. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/doutrina/obrigacoes-doutrina/dtoobrptiv/ Acesso em: 16 abr. 2024