História do Direito

A codificação europeia

CODIFICAÇÃO

Jus naturalismo e codificação

A partir dos pensadores do direito natural, cria-se um modelo que tem a intenção de ser laicizado, livre do elemento religioso, que seja abrangente. É
também que para a universalização esse não tenha conteúdo em si, sendo apenas um mero modelo de conhecer a realidade.  Há três fatores que vão se
mostrar como empecilho para a aplicação deste modelo jurídico:

– O pensamento jus naturalista sem sempre se mostra estruturado de maneira sistemática. Vejamos Grotius, que possuía obras cheias de citações que não
seguiam uma linha clara de raciocínio, nem eram produzidas de maneira sistemática. Em Hobbes já há certa tendência à sistematicidade geométrica, mas
não é uma característica unânime entre os ius naturalistas.

– A existência de um pluralismo (direito romano da recepção, consuetudinário, real legislado, canônico) impede a efetiva uniformização do direito em
torno do ius naturalle.

– A autonomia do judiciário, possibilitada justamente pela autonomia do juiz, limita o poder real e também a a aplicação do direito natural.

Neste contexto, associado ao ideal iluminista, surge o movimento da codificação, que tem por pretensão varrer o pluralismo jurídico, gerar segurança
jurídica, limitar o poder do judiciário e unificar o direito, asseado nos moldes naturais em torno do monarca.

A codificação é um fenômeno muito importante comparável à recepção do direito romano. Se a recepção torna o direito científico, hermético, elitizado e
escrito; na codificação algo de semelhante proporção está ocorrendo: há a contribuição para o fim gradativo do pluralismo jurídico e abertura ao
positivismo jurídico.

Codificação e ordenação

Há clara diferença entre os dois movimentos:

– As ordenações podem coexistir com o pluralismo jurídico, provocam pequenas mudanças na esfera jurídica, respeitando o passado e o direito
consuetudinário.

-Os códigos são sempre projetos de poder, que limitam a liberdade do juiz, explicando como juiz deve agir e interpretar a norma. Quer-se disciplinar o
meio jurídico, tratando o juiz como simples boca da lei. Voltaire resume bem o sentimento da codificação em “se quer ter boas leis jogas as velhas
fora”. Os códigos, embora nem sempre liberais, costumam representam uma ruptura com o passado e o extermínio do pluralismo jurídico. Há a hipótese
também do código apenas representar um meio de controle social.  Por último, citam-se os códigos como meios de estatização de certas parcelas da vida
social.

ALR – o código prussiano ou fredericiano

-O projeto do ARL se dá como a tentativa de reduzir a complexidade jurídica e a elitização do direito, reunindo todo o direito da Prússia em um único
livro. Como todos os códigos, também deseja exterminar o pluralismo jurídico na região prussiana.

-O ALR tem características bastante peculiares. O monarca Frederico II, um déspota esclarecido, do período de criação do ALR ficou conhecido como o
rei-filósofo, por apresentar em alguns pontos princípios um tanto quanto liberais. Ele permite, de forma bastante livre, sugestões populares
para a elaboração do novo código. Usa-se o termo cidadãos caracterizando o ALR como um sucedâneo de uma constituição. É feito em alemão e tenta-se ao
máximo fazê-lo acessível e compreensível a todos.  O professor Airton menciona de maneira bastante enfática que não se pode mencionar como um código
liberal, pois manteve a ordem social vigente.

– A aplicação do ALR se mostra problemática. Ele não agradava a quase ninguém por ser muito liberal aos olhos dos adeptos da velha ordem e à Igreja e,
ao mesmo tempo, muito conservador no entendimento dos iluministas. O ALR é apenas parcialmente provido, por um sobrinho medíocre de Frederico, em
caráter emergencial, apenas para evidenciar o domínio prussiano sobre partes da Polônia no século XVIII.

-Vale-se ressaltar que no ALR fica claro que a codificação é um movimento que não se restringe a movimentos liberais, mas também se fez presente como
termo de sustentação de monarquias absolutistas.

ABGB – Código Austríaco

Airton menciona muito rapidamente este código. Apenas fala que ele se desenvolveu de maneira paralela ao ALR na Áustria, que foi regido pelos
princípios do absolutismo esclarecido e tenta da mesma forma derrubar o pluralismo jurídico vigente em território austríaco. O resumo da Luísa e
Gabriela somam algumas informações importantes: que este código, diferente dos demais, preserva ainda certa autonomia do juiz, e mostra-se como o único
ainda vigente. Concentra-se em matérias de direito civil e possibilidade o uso do direito natural para resolução de conflitos não prescritos no código.

Código Napoleão ou Code Civil Francês de 1804

Tratado pelo Airton como possivelmente “o código mais influente de todos os tempos, mas não necessariamente para o brasileiro (que segue uma linha mais
próxima ao código germânico)”.  Isso porque é o que interfere mais enfaticamente no extermínio do pluralismo jurídico. O direito real legislado é o
direito como todo, tendo o modelo jus racionalista como modelo básico para a codificação. São citados fatores principais que levaram à codificação na
França, em geral problemas originários do pluralismo.

– A abundância dos direitos leva à insegurança jurídica.

-O judiciário francês é tratado como o “paraíso dos corruptos” com tribunais lentos e justiça cara

-Influência iluminista, que questiona a situação da França, com destaque para Voltaire.

Esse contexto vai levar à codificação. Uma nova constituição que levaria a igualdade e á consequente liberdade. Unifica-se o direito, elimina-se a
tradição, a legislação é unificada. O nome mais citado neste contexto é Cambacéres “o gordinho animado”. Ele cria códigos adaptando-se ao grupo
dominante no contexto Francês revolucionário. Acontece que neste conste contexto, o grupos dominantes alternavam-se com certa frequência: jacobinos,
girondinos, Napoleão. Quando elabora o código civil napoleônico o faz com as seguintes características: cria a ideia de liberdade e autonomia do ser
humano. Princípio da liberdade entre seres humanos. Acessibilidade do código ao povo, sendo escrito em francês. Geração de segurança jurídica pelo fato
de apresentar-se como grande limitador da autonomia do juiz. O código civil francês também é conhecido como código burguês, pois concede grande
liberdade econômica aos indivíduos.  Grande valorização do contrato e da ideia do utenti ac abutenti em relação à propriedade.

Esse direito novo legislado virá a chocar-se com as antigas formas de regime, com o direito canônico e o consuetudinário. Tem-se a visão por certos
setores da sociedade que talvez este código fosse muito liberal. Vão se estabelecer novos códigos. Portalis é um defensor do antigo regime e virá a
falar: “A novidade é brilhante, mas um erro brilhante”. Misturo o direito revolucionário com o consuetudinário e romano. Pothier: “O direito da família
foi longe demais. Os filhos devem respeitar os pais”. O código, para adequar-se, realiza um pequeno regresso. Desautoriza-se o divórcio e em outras
questões da família.

Críticas à revolução francesa e ao ideal iluminista

-Herder: Contesta o ideal iluminista da igualdade entre os homens O ser humano deve ser analisado com um ser espontâneo, livre, autônomo e
singular.

-Burke: Critica a influência francesa no contexto inglês. Contesta a ideia do homem universal. O homem tem identidade própria. A ideia de um
homem universal seria uma violência por si só. Acredita na espontaneidade não no método necessariamente.

Portugal e Marquês de Pombal

No contexto da codificação, Marquês de Pombal impõe a lei da boa razão: “O direito que mais importa é o que o rei legisla”. Deve-se evitar o ius commune como principal fonte de direito. O direito romano só é aceitável se racionalizado pelo direito natural. Proíbem-se citações de
Acurso e Bartolo.

Thibaut

Alemão e liberal. Discorda parcialmente do fenômeno da codificação em questões mais formais que substanciais. A codificação não passaria de uma
imposição francesa, os franceses não tinham nenhum respeito pelos outros povos. Ressalta, contudo, que mesmo assim é possível identificar pontos
positivos na codificação: redução da corrupção no judiciário, acessibilidade do direito e segurança jurídica. Thibaut quer um código civil alemão
próprio baseado no francês.

Savigny

– Biografia: alemão, de classe nobre, conviveu com várias ideias invasões da França à seu país.

-Contexto alemão: Século XIX – Alemanha divida em três zonas jurídicas. Em uma aplica-se o ALR, noutra o Code Francês, e na de Savigny aplicar-se-á o
Direito Romano da Recepção.

-Ideologia: Critica a codificação por tentar mudar uma lógica natural do direito. A codificação em si só é um mal é a tentativa de tentar reorganizar
as relações sociais por meio de um código é um dos projetos mais insanos que o ser humano concebeu na faze da Terra. O direito brota, emana
naturalmente, não se cria.  Problematiza a teoria de Thibaut: Cada nação teria um próprio Volkgeist. O direito defluiu espontaneamente de cada nação.
Deve-se rejeitar o Code Francês.

-O Volkgeist se mostra um tanto quanto incompreensível para Savigny. O povo é ignorante e incapaz de definir o direito. Os governantes eleitos pelo
povo são igualmente incapazes. Ou seja: o espirito do povo não é definido pelo povo. Quem deve definir o direito são os juristas das universidades, mas
essa ainda seria explicação parcial. Savigny procura o Volkgeist. Olha para o cocheiro e para empregada e descarta. Não eles não são fontes do direito.
De repente vira para sua estante e lá esta a verdadeira fonte do direito alemão: o Corpus Iuris Civillis e subsidiariamente os costumes alemães dele
advindos. Defende a manutenção do direito romano da recepção.  Sendo assim, o grande jurista deve ser primeiramente um grande historiador, pois apenas
poderá achar o Volkgeit. O direito não vem de cima para baixo. O bom jurista não deve procurar uniformizar, mas sim conhecer o direito.

No fundo Savigny quer afastar o direito natural, criar uma ciência neutra e objetiva que estuda o direto posto. Traz á tona a ideia do direito
positivo, valorizando o empirismo e a objetividade.

Positivismo jurídico

A partir de Savigny começa-se a desvincular direito e política com o surgimento de uma “ciência pura do direito” que acabará por gerar uma maior
segurança jurídica. O estudo do direito de dará pela interpretação de códigos. Na Alemanha pelas interpretações do direito romano, na França, oque a
legislação diz, na Inglaterra o que o precedente diz.  Criam-se, portanto, em diferentes lugares da Europa, tendências que definem o direito como
ciência neutra e apoiam os códigos.

-Jhering segue uma linha próxima á de Savigny. Fala que assim como um químico, o jurista deve ir ao passado, e buscar de forma objetiva e imparcial o
direito romano. A partir dele, separa o que é atemporal e aplicável, buscando os conceitos jurídicos puros. Estes autores criam uma tradição do código
civil, criando soluções concretas e abrangentes a partir do direito romano, influenciando fortemente o direito atual. Cria-se um direito desvinculado
do direito natural. Em momento posterior discorda de Savygnir falando que o direito surge de conflitos lutas sociais.

Escola dos Germanistas

Começam no século XIX criticas à Savigny e ao positivismo jurídico, por parte dos germanistas. Grimm, Beseler e Gierke que defendem que o espirito do
povo quem define é o povo. Valoriza-se o direito consuetudinário. Quem ataca de forma mais brutal Savigny e Beseler que diz que o mesmo está
desenvolvendo um projeto de usurpação, roubando o direito do povo. Deve-se valorizar as sobras da idade media pela cultura popular.

Gierke aceita diálogos com movimentos dos trabalhadores, defendendo direitos sindicais. Os irmãos Grimm vão defender que o povo faz o direito. Eles
estudam contos, ditos populares, lendas e folclores. Entendiam as noções de justiça contidas nessa história. Lá estarão claras as noções jurídicas que
brotam naturalmente.

Há uma critica a Savigny pela escola histórica germanista. Outros movimentos posteriores também vêm a critica-lo.

Jhering (mudando de opinião) falará que o direito é definido pelos grupos dominantes, o direito é originário de uma luta. Não se deve analisar o
direito em si, mas o mundo real mundo concreto do direito.

Inicialmente busca-se a ciência pura do direito, seguem-se de ideais nacionalistas, com destaque para França, Alemanha e Inglaterra.

Marx: são os interesses de classes que definem o direito e a forma de distribuição que define quem será defendida pelo direito. É o direito que faz que
mesmo que um contrato aparentemente feito por iguais crie-se uma profunda desigualdade que reflete a disposição dos bens.

Direito na Idade Contemporânea

O século XIX é marcado também por teorias racistas, no contesto do neocolonialismo. Precisa-se a justificação da superioridade do europeu. Surgem
vários teóricos. Há a criação dos biótipos dos criminosos natos, por exemplo. Alguns dele escrevem sobre o direito. Um fala que o direito deve ser
relativo a raça, não uniformemente aplicado. Se destaca o movimento institucionalista com Karl Schmidt, Santi-Romano e Hariú. Essa linha defende que
algumas instituições possuem regras próprias e o Estado não tem jurisdição sobre as mesmas.  Surgem varias teoria que atacam a corrente positivista e
àquelas que tem o apelo de defesa de classes oprimidas. Há, portanto, uma série de criticas sobre o que seria o positivismo jurídico.

No século XIX começa uma grande pressão social por política compensatória. Há um crescimento do espaço do direito público em detrimento do privado.
Existe um modelo de estado de interventor, ganhando força gradativamente. Ao mesmo tempo criam-se vários fatores que, portanto, dificultarão a
aplicação do direito codificado. Surgem outras formas de relação jurídica, nem sempre classificáveis. Novas relações econômicas também se fazem
presentes. É conflituosa a distinção entre competências do Estado e distinção do direito privado e público. Surge a ideia de que o Estado talvez
devesse intervir também no direito privado. Fica bem claro isso com a aplicação dos direitos da família, adentrando na esfera doméstica. A discussão da
liberdade não fica só no âmbito do Estado, vai para âmbitos como o econômico e familiar.  Existe a partir da Crise de 29  um desprestígio para com a
visão individualista do direito que não considera um todo social, despreza direitos que se desenvolve paralelamente ao estado. No século XIX, os
pensadores que criticam o positivismo invocam a realidade. Isso não passa de mera banalidade, pois a realidade é subjetiva.

No século 20 anos 30 além da realidade invoca-se o fracasso do liberalismo e a democracia. Alguns jovens começam a escrever teorias para adaptar o
direito e o pensamento jurídico a circunstâncias locais.

Nos anos 20 começa a surgir na Alemanha divergências a respeito dos fins da constituição. Ali se muda a concepção do direito do século XIX. A
constituição defende que o direito deve ter finalidade social. A propriedade deve ter fim social. Florescem leis trabalhistas. Começam a surgir leis
previdenciárias, associadas ao temor social referente à tendências comunistas.

Karl Schmidt propõe analisar a constituição, criticando-a. Diz que não devemos crer que no direito privado centra-se todo o ordenamento. A definição se
dá pelo sistema social, orientado pela constituição. Ele afirma que a constituição é esquizofrênica: junta liberalismo e socialismo. Propõe ignorar a
parte socialista e adotar essencialmente a liberalista.

Institucionalismo  – há polos de poder sobres os quais o Estado não possui jurisdição. Estas instituições são polos de produção normativa própria.
Sabota-se a constituição, a constituição é muito prolixa, trata como direitos fundamentais direitos fundamentais que nada interessem. É embasa na
democracia e isso é um problema. Iguala marido e mulher, pai e filho, empregador e empregado. Em 33 Hitler ganha a eleição e compõe um governo
moderado. Karl Schmidt teoriza sobre os fins do novo governo. Propõe-se a legitimar o novo governo pelo institucionalismo. O positivismo atrapalha a
autonomia do juiz e isso é ruim para uma ditadura. O interessante é ter juízes livres e alinhados com o grupo politico dominante. O direito deve se
basear em princípios, não em leis. Tudo que aconteceu na Alemanha no período nazista se deu de maneira semelhante no Brasil no Estado Novo e Ditadura
Militar.

Como citar e referenciar este artigo:
HOFFMANN, Gustavo Knaesel. A codificação europeia. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2011. Disponível em: https://investidura.com.br/doutrina/historia-do-direito-doutrina/a-codificacao-europeia/ Acesso em: 29 mar. 2024