Voz da experiência

Alma de Cachoeiro

É sabido que os cachoeirenses são bairristas. Mas alguns conterrâneos têm pudor de expressar abertamente esta característica. Eu não tenho. Sou bairrista
confesso.

Há momentos em que esse bairrismo explode mais forte, como agora, por exemplo, quando a Academia Cachoeirense de Letras acabou de completar cincoenta anos
de existência.

Cachoeiro tem muitas instituições beneméritas, no campo da Cultura, da Educação, do Esporte, do Serviço Social. Mas acredito que a ACL seja o símbolo do
conjunto das instituições.

Não se trata de considerá-la a mais importante. A perspectiva em que me coloco é outra. A ACL é a instituição-símbolo porque a ACL aglutina todas as
instituições. Busca representar todas, conta a história de todas, corporifica e imortaliza tudo que se faz e se fez em Cachoeiro. A Academia tem missão de
resgate, testemunho, compromisso e reverência: resgate das lutas do passado; testemunho dos sonhos do presente; compromisso e reverência para com os
projetos do futuro.

Quando podíamos imaginar, em 1962, que cinco décadas depois estaríamos comemorando o Jubileu de Ouro de nossa Casa de Letras!

Dos irmãos Herkenhoff, que participaram da fundação, dois já partiram para a Mansão do Pai – Pedro e Paulo. O irmão que escreve este texto ainda vive neste
mundo provisório.

Cachoeiro tem alma. Para alcançar o sentido do que seja a alma cachoeirense é necessária uma incursão pelos caminhos da Antropologia.

Antropologia deriva do grego e significa “estudo do homem”. A Antropologia Cultural ou Etnologia estuda as criações do espírito humano, que resultam da
interação social, como notou Emídio Willens. É com a lente do antropólogo que podemos entender o que é a alma cachoeirense.

A alma cachoeirense foi talhada através do tempo. Na política, o grande Jerônimo Monteiro nasceu em Cachoeiro. Nas artes são cachoeirenses astros como
Rubem Braga, Newton Braga, Roberto Carlos, Sérgio Sampaio, Carlos Imperial, Levino Fânzeres, Luz Del Fuego, Raul Sampaio Coco, Jece Valadão, Benjamin
Silva, Narciso Araujo, Frederico Augusto Codeceira, Solimar de Oliveira, Evandro Moreira, João Mota, Marly de Oliveira, Nordestino Filho, Paulo de Freitas,
Athayr Cagnin.

Essa alma cachoeirense é tão intensa e profunda que Rubem Braga escreveu: “modéstia à parte eu sou de Cachoeiro de Itapemirim.”

O grande Rubem não disse: modestia à parte eu sou o curió da crônica; modestia à parte eu sou considerado o maior cronista deste país; modestia à parte eu
elevei a crônica de seu modesto espaço marginal para a condição de gênero literário de primeira grandeza. Rubem Braga compreendeu que mais importante do
que tudo isto era mesmo afirmar: modéstia à parte eu sou de Cachoeiro de Itapemirim.

João Baptista Herkenhoff, 76 anos, magistrado aposentado, professor da Faculdade Estácio de Sá do Espírito Santo, escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br

Como citar e referenciar este artigo:
HERKENHOFF, João Baptista. Alma de Cachoeiro. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2012. Disponível em: https://investidura.com.br/colunas/voz-da-experiencia/alma-de-cachoeiro/ Acesso em: 25 abr. 2024