Sociedade

Olim Piadas de mau gosto no Rio em 2016

 

Grande euforia tomou de assalto o Rio, e não era um mais um grande arrastão. O povo na rua. Gente enrolada na bandeira nacional. Patriotismo mais exaltado do que o dos argentinos às vésperas da invasão das Ilhas Falkland, que eles insistiam e ainda insistem em chamar de Malvinas e proclamar que são deles.

 

Tudo isso porque o Rio derrotou Chicago, Madri e Tóquio na acirrada disputa pela sede das Olim Piadas em 2016. Inacreditável! Unbelievable! Incroyable! Ungläublich!

 

Isto significa dizer que para o COI (Comitê Olímpico Internacional), o Rio – uma Chicago dos anos 30, mas sem Elliot Ness e Os Intocáveis – está mais apto do que a Chicago de hoje patrocinada por Barack Obama, que a capacidade econômica e administrativa nipônica, bem como o know-how turístico espanhol são inferiores aos da Bruzundanga de Lima Barreto.

 

 Porém, temo que no Rio as Olimpíadas nada mais serão que Olim Piadas. E de muito mau gosto. E não sou só eu e o Muricy – o técnico do Palmeiras numa arrasadora entrevista na TV – que pensam assim: um dos jornais econômicos mais respeitados do mundo não se mostrou nem um pouco entusiasmado com a péssima escolha do COI.

 

Na edição da semana passada, a respeitada revista britânica The Economist alertou para os altos custos das Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro. A referida publicação duvida que os US$ 14,5 bilhões estimados, só para as obras de infraestrutura, sejam “utilizados de maneira produtiva”.

 

Além disso, fez uma afirmação capaz da causar espécie, mesmo nos brasileiros mais aficcionados dos esportes e mais politicamente alienados: foram gastos quase US$ 50 milhões para pagar o apoio de Pelé e de Paulo Coelho aos Jogos. Uau!

 

Supondo que esta estarrecedora observação do The Economist seja verdade – e não tenho motivos para desconfiar da idoneidade jornalística dessa tradicional revista da imprensa especializada – nunca o espírito esportivo e o amor pela “Cidade Maravilhosa” foram tão bem remunerados.

 

Mas isto fez parte do marquetingue para impressionar a mídia internacional e o COI, assim como Lula tem gasto bilhões para promover a escolha do Brasil para um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Convenhamos que uma potência bélica como o Gigante Adormecido não pode continuar ausente do referido órgão!

 

Duas hipóteses para a surpreendente vitória: Movidos por interesses meramente politiqueiros, os membros do Comitê Olímpico ou Olimpiadístico resolveram fazer a primeira Olim Piada numa cidade da América do Sul. A outra hipótese é tão infamante que – tal como a Copélia do Toma Lá, Dá Cá da TV Globo – prefiro não comentar. Não obstante, est’outra parece muito mais provável.

 

Imagine só se a competentíssima administração pública brasileira conseguirá terminar as fabulosas obras prometidas, quando até agora só foram concluídas 10% das obras do PAC (Plano para Alavancar a Companheira) e outras tantas só existem em fachadas ou foram apontadas como suspeitas de graves irregularidades pelo TCU (Tribunal de Contas da União), um tribunal de mentirinha que só pode exercer mesmo o jus sperniandi, o inalienável direito de espernear.

 

A despesa total das Olim Piadas já tem um orçamento de R$ 28.000.000.000,00 -vinte e oito bilhões de reais, é mole ou quer mais?! -Deve ser maior do que o destinado à Educação. E como sabemos, obras públicas sempre fazem um orçamento por baixo, que costuma aumentar muito ao longo dos trabalhos e, às vezes, termina quase o dobro do orçamento inicial.

 

Quem financia as Olim Piadas? Os governos municipal, estadual e federal, com uma participação da iniciativa privada de Eike Batista, que acabou de comprar de Eduardo Paes a Marina da Glória, para ancorar seu pequeno iate, mas cujas ações de seu conglomerado de empresas estão entre as menos valorizadas na Bolsa. Será que ele está acreditando que o megaevento das Olimpiadas vai alavancar a Bolsa e ele ser beneficiado como “carona” (free-rider)?!

 

De onde vem tanto dinheiro? Só pode vir de duas fontes: empréstimos internacionais aumentando nossa dívida externa e do bolso do vampirizado contribuinte que já paga 72 impostos com efeito cascata. Paga muito, mas paga feliz, porque geralmente não sabe que paga. Acha mesmo que imposto é preocupação somente de ricos, i.e. menos de irrisórios 10% da população de pagadores de impostos.

 

E o retorno do investimento? Na melhor das hipóteses, muito pouco ou nada virá sob a forma de dinheiro, supondo que não haja déficit, é claro. A maior parte virá sob a forma de supostos benefícios para a cidade, aumentando uma rede hoteleira raquítica que não tem crescido na mesma proporção em que o crime organizado tem, o que é um excelente marquetingue negativo, afugentando turistas e investidores estrangeiros desse balneário falido chamado “Cidade Maravilhosa”. “Maravilhosa”? Só mesmo para bairristas, saudosistas e deslumbrados. Para os que não são nenhuma dessas coisas: Cidade de Mara Velhosa.

 

Mas nem só de pão vive o homem: vive de circo também. Daí a famosa fórmula romana capaz de satisfazer a gregos, troianos e soteropolitanos: Panes et circenses. Porém, há dois poderosos obstáculos capazes de impedir as massas de assistir aos jogos das Olim Piadas e se sentirem realizadas em seu esportivo espírito patriótico: a grande deficiência de transportes e o caos no trânsito, associados ao salgado preço dos ingressos para os estádios e demais locais de competições.

 

[Isto para não mencionar o transtorno causado ao cidadão carioca, que só terá uma vantagem nas malfadadas Olim Piadas: uma trégua com o crime organizado, seja pelos tanques do exército nas ruas, seja por um pacto feito pelo governo com a criminalidade ou talvez mesmo por ambas as coisas. Mas só durante o megaevento…].

 

E essa é a razão pela qual não se aumentam os preços dos ingressos do Estádio Mário Filho, o Maracanã. Se com preços baixos, quando comparados aos da Itália e da Espanha, eles estão cada vez mais vazios, imagine só se os preços aumentam… Aí mesmo que os clubes de futebol do Rio ficam de pires na mão e vão todos para a terceirona.

 

É claro que nossa eficientíssima e incorruptibilíssima administração pública resolverá esse problema construindo 8 estações de Metrô. Fará em 7 anos o que não fez em 15, bem como duplicará nossa sucateada  rede hoteleira, entre outras notáveis obras prometidas.

 

Meu caro, você ainda acredita em Papai Noel? Se não a acredita no bom velhinho, por que ainda põe seu sapatinho na janela e acredita piamente em mirabolantes promessas de políticos?!

 

Resta aguardar 7 anos, para constatar o grande fracasso.

 

 

* Mario Guerreiro, Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC [Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos]. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Autor de Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000) . Liberdade ou Igualdade? ( EDIPUCRS, Porto Alegre, 2002). Co-autor de Significado, Verdade e Ação (EDUF, Niterói, 1985); Paradigmas Filosóficos da Atualidade (Papirus, Campinas, 1989); O Século XX: O Nascimento da Ciência Contemporânea (Ed. CLE-UNICAMP, 1994); Saber, Verdade e Impasse (Nau, Rio de Janeiro, 1995; A Filosofia Analítica no Brasil (Papirus, 1995); Pré-Socráticos: A Invenção da Filosofia (Papirus, 2000) Já apresentou 71 comunicações em encontros acadêmicos e publicou 46 artigos. Atualmente tem escrito regularmente artigos para www.parlata.com.br,www.rplib.com.br , www.avozdocidadao.com.br e para www.cieep.org.br , do qual é membro do conselho editorial.

Como citar e referenciar este artigo:
GUERREIRO, Mario. Olim Piadas de mau gosto no Rio em 2016. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/olim-piadas-de-mau-gosto-no-rio-em-2016/ Acesso em: 25 abr. 2024