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Ampulheta

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J. A. Almeida Paiva *

 

Todo final de ano, com a chegada das festividades de Natal e Ano Novo, bem como com o período de férias forenses, os advogados sempre se deparam com certas dificuldades e preocupações relacionados com a questão da contagem dos prazos processuais para apresentação de defesas ou contestações, recursos, razões e contra-razões e manifestação nos autos. As férias forenses ou judiciais, segundo doutrina de Pinto Ferreira, “são uma instituição antiga, já existente desde Roma, especialmente para conveniência das partes”, instituída no Império Romano com Marco Aurélio. Pontes de Miranda doutrina que “Férias judiciais são as que se dão, cada ano, aos funcionários judiciais, ou se concedem por turno, de modo que a vida judiciária não se suspenda”.

 

Hoje, o conceito de férias coletivas está mais ligado ao descanso, repouso, pausa para recuperação de energias, um direito que a CF/88 assegura aos trabalhadores rurais e urbanos, assim como a todo ser humano, incluindo juizes, promotores, ministros, desembargadores, funcionários do Poder Judiciário e advogados, sendo que para estes as férias coletivas como estão fixadas atendem mais aos interesses do Poder Público do que da classe de advogados, que consideramos prejudicada.

 

A questão é saber como contar os prazos processuais nos períodos de férias forenses, bem como nos dias em que não há expediente no forum. O problema geralmente toma relevância acentuada na fixação dos dois momentos importantes para a contagem dos prazos, sem os quais, segundo doutrina Moniz Aragão, “não se descobriria se o prazo começou, tampouco se terminou”.

 

 

No conceito de prazo o legislador procurou estabelecer o período de tempo dentro do qual devem ser praticados os atos processuais, isto é, de fixar um espaço que vai do dies a quo (início) até o dies ad quem (término) para que neste lapso de tempo sejam praticados os atos processuais, sob pena de preclusão, ou melhor explicitando perder-se a faculdade de praticá-lo ou tornar o ato ineficaz.

 

O art. 177 do CPC norma que “Os atos processuais realizar-se-ão nos prazos prescritos em lei. Quando esta for omissa, o juiz determinará os prazos, tendo em conta a complexidade da causa”.

 

 

A primeira parte do dispositivo questionado, ao referir-se a “prazos prescritos em lei” refere-se aos denominados prazos legais, enquanto que a segunda parte cuida dos prazos fixados pelo Juiz, e são os chamados de prazos judiciais. O art. 178 já norma que tanto faz se tratar de prazo legal como judicial, eles são “contínuos e não se interrompem nos feriados”.

 

 

Daí, vamos ter outros conceitos importantes para o melhor entendimento do assunto, qual sejam, os de “interrupção” e “suspensão”. A grosso modo o prazo interrompido por qualquer motivo, cessado este ele recomeçará a ser contado; diversamente, em se tratando de prazo suspenso, quando findar o motivo da suspensão, ele voltará a fluir pelo número de dias faltantes.

 

 

Na hipótese de interrupção não há maiores problemas, pois se estamos, v.g., diante de um prazo de quinze (15) dias para a prática de certos atos ( recurso p.ex.) havendo interrupção, findo o motivo desta, não importa quantos dias tenham corrido, pois tudo começará novamente como se nenhum dia tivesse se passado. Exemplo crasso de interrupção de prazo é o do art. 538 do CPC, ao normar que “os Embargos de Declaração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes”.

 

 

Já ao falarmos de suspensão, a situação é diferente; se estamos, v.g., diante de um prazo de quinze (15) dias, e já se fluíram dez (10), por exemplo, em havendo uma causa suspensiva, terminada esta, o interessado terá direito ao saldo dos dias faltantes, que no exemplo dado seria de cinco (5) dias. Em direito processual civil “computar-se-ão os prazos, excluindo o dia do começo e incluindo o dia do vencimento” (CPC 184); há casos em que os prazos começam a ser contados da data da intimação direta ou da ciência da parte e há casos em que a contagem dos prazos começa a ocorrer a partir da juntada do mandado aos autos; esta contagem sempre se inicia vinte e quatro (24) horas da efetivação do ato intimatório.

 

 

Não se começa contagem de prazo nos feriados, nos sábados, domingos e nas férias forenses Resumindo, citamos Antônio Dall’Agnol, com apoio em Moniz de Aragão, para quem “O ponto inicial do prazo (…) é aquele em que foi feita a intimação. A contagem, que é outra coisa, obedecerá a norma estatuída no texto – refere-se o autor ao disposto pelo art. 184. O ponto final do prazo coincidirá com o último minuto da hora final do expediente forense do dia de seu término”. Dito isto vamos agora falar sobre as férias forenses; a Lei Orgânica da Magistratura em seu art. 66, § 1° estabelece que “férias forenses são as férias coletivas dos juízes de primeiro grau e dos tribunais. Nos tribunais, são de férias coletivas os períodos de 2 a 31 de janeiro e de 2 a 31 de julho de cada ano”. Já as férias forenses nos juízos de primeiro grau são fixadas pelas leis de organização judiciária. No STF seu RI (art. 78) considera como férias os meses de janeiro e julho; e seu § 1º fixa como feriados o período compreendido entre 20/12 a 01/01, os sábados, domingos, feriados e dias que o Tribunal determinar. No STJ, seu RI (art. 81) fixa o período de férias como sendo o de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho; seu § 2º estabelece como feriados o período de 20 de dezembro a 01 de janeiro; o período de 4ª feira a domingo na Semana Santa; 2ª e 3ª de Carnaval; 11 de agosto, 1º e 2 de novembro e 8 de dezembro.

 

 

Nos mesmos períodos também são férias coletivas no STM, TST, TSE, TRF e TER. No Estado de São Paulo são férias coletivas em Segunda Instância os períodos de 2 a 31 de janeiro e 2 a 31 de julho; são de férias forenses (coletivas) em primeiro grau, o período compreendido entre o dia 2 e 31 de janeiro (Lei Complementar Estadual – SP nº 701 de 15/12/1992). Nas férias e nos feriados, a teor do art. 173 do CPC “não se praticam atos processuais. Excetuam-se: I) a produção antecipada de provas (art. 846); II – a citação, a fim de evitar o perecimento de direito; e bem assim o arresto, o seqüestro, a penhora, a arrecadação, a busca e apreensão, o depósito, a prisão, a separação de corpos, a abertura de testamento, os embargos de terceiro, a nunciação de obra nova e outros atos análogos”.

 

O seu Parágrafo único norma que “o prazo para a resposta do réu só começará a correr no primeiro dia útil seguinte ao feriado ou às férias”; exemplificando: se houver uma penhora no período de férias, o prazo para os embargos começará a sua contagem a partir do primeiro dia útil após o término do período de férias. Isto quer dizer que tais atos referidos no art. 173 podem ser praticados nas férias e feriado, mas o prazo para eventual defesa só terá início depois do primeiro dia útil seguinte às férias ou feriados.

 

 

São considerados feriados nacionais os seguintes dias: 1° de janeiro, 21 de abril, 1° de maio, 7 de setembro, 12 de outubro, 15 de novembro e 25 de dezembro, além dos denominados feriados civis e religiosos, fixados por lei federal, bem como os feriados estaduais e municipais, quando previstos em lei. São feriados forenses a teor do art. 175 do CPC, “os domingos e os dias declarados por lei”: 8 de dezembro (dia da Justiça), a terça-feira de carnaval e a sexta-feira santa. Nos feriados, reitera-se não se praticam atos processuais (CPC 173), suspendendo-se os prazos. Como a maioria dos atos processuais não se pratica nas férias, com relação àqueles que podem ser praticados, se comportar defesa ou recurso, os prazos que tiverem incidência no seu curso só começarão a fluir depois do primeiro dia útil após o decurso do período de férias; é curial que se algum prazo estiver fluindo, com o advento das férias ele ficará suspenso e só voltará a contar o período que falta, depois das férias.

 

 

Exemplificando: “Pratício” foi citado para uma determinada ação e tem o prazo de quinze (15) dias para apresentar a defesa (contestação): após decorridos dez (10) dias, v.g., tendo início o período de férias forenses, aquele prazo de quinze (15) dias ficará suspenso a partir do 11º dia e só a partir do primeiro dia útil após o término das férias é que recomeçará a correr o prazo faltante de cinco (5) dias, suspenso pelas férias, para completar o termo legal da defesa segundo norma o art. 179 do CPC: “A superveniência de férias suspenderá o curso do prazo; o que lhe sobejar ou sobrar recomeçará a correr do primeiro dia útil seguinte ao termo das férias”.

 

Se pelo art. 173 sabemos que nos feriados e nas férias não se praticam atos, com algumas exceções, o art. 174 relaciona atos e causas que não se suspendem pela superveniência das férias, processando-se normalmente; são os seguintes: I) os atos de jurisdição voluntária, bem como os necessários à conservação de direitos, quando possam ser prejudicados pelo adiamento, lembrando que aplica-se aqui as normas do art. 1.103 do CPC, bem como as ações elencadas no art. 1.112: a) emancipação; b) sub-rogação; c) alienação, arrendamento ou oneração de bens dotais de menores, órfãos e de interditos; e) alienação, locação e administração de coisa comum; f) alienação de quinhão em coisa comum; g) extinção de usufruto e de fideicomisso. Obs.: Quanto aos atos de jurisdição voluntária o legislador não se referiu a procedimentos, razão pela qual filiamo-nos ao lado daqueles que sustentam que praticado o ato de jurisdição voluntária, o respectivo processo ou procedimento suspende-se, por força da regra geral, com endosso do STF (RTJ 91/567) e críticas na doutrina e outros tribunais. II) as causas de alimentos provisionais, de dação ou remoção de tutores e curadores, bem como as mencionadas no art. 275. As ações do art. 275 são as ações de procedimento sumário, tais como:

 

a) as causas cujo valor não exceder vinte (20) vezes o maior salário mínimo vigente no pais; b) as causas, qualquer que seja o valor, relativas a arrendamento anual e de parceria agrícola, de cobrança das quantias devidas aos condomínio pelos condôminos; as ações de ressarcimento por danos em prédio urbano ou rústico; as de cobrança de seguro, relativamente aos danos causados em acidente de veículo, ressalvadas as causas de processo de execução; as de cobrança de honorários dos profissionais, ressalvado o disposto em legislação especial; as ações de acidente do trabalho, com isenção de custas e verbas de sucumbência; as de adjudicação compulsória; a ação discriminatória, as de reparação de danos causados por veículos automotores; as ações entre representante comercial autônomo e representado; as ações de retificação de registro civil, qualquer que seja o motivo; III) todas as causas que a lei federal determinar:

 

a) as previstas na Lei de Falências (Art. 204, DL 7661/45);

b) as ações de desapropriação (Art. 39, DL 3.365/41; c) as ações relacionadas à locação, (despejo, consignação em pagamento de aluguel e acessórios, revisional de aluguel e renovatória de locação (Art. 58, I, L. 8245/91). Além das férias forenses no período de 2 a 31 de janeiro, no Estado de São Paulo também (a exemplo do STF e STJ) não correm prazos no período de 21 a 31 de dezembro, o que vale dizer que nesta ano de 2003, um prazo que terá seu dies a quo no dia 22/12/2003 ele só começará a fluir no dia 02-02-2004, e o prazo que já tivesse começado a fluir anteriormente, ficará suspenso para continuar pelos dias restantes após o período das férias.

 

Todavia se ele começou a fluir determinado dia pretérito aos feriados e a fluência do prazo é alcançada pelo dia 22 de dezembro, suspender-se-á o prazo até 31-01-2004, retornando a partir do dia 2 de fevereiro (dia 1º é domingo) a contagem dos dias subseqüentes.

 

Na Justiça Federal não há férias coletivas em primeiro grau de jurisdição; existe o denominado recesso, que são férias coletivas no período de 20 de dezembro a 06 de janeiro, considerados como feriados, com o mesmo regime jurídico; além deste período, são feriados também na Justiça Federal: a) 2ª e 3ª feira de carnaval; b) de quarta-feira santa até domingo de Páscoa; c) 11 de agosto; d) 1º e 2 de novembro; e) 8 de dezembro; f) (RTJ 83/541; LOJF 62, I; Bol. AASP 1408/304, referências de Nelson Nery Junior, in CPC Com. 6 ao art. 173). Nestes dias, os prazos processuais ficam suspensos. Para concluir, discute-se se o Mandado de Segurança processa-se nas férias e feriados. Entendemos que sim, por força do prazo decadencial de cento e vinte dias previsto no art. 18 da L. 1533/51, que não se suspende em férias e feriados, bem como pelo que norma o art. 17 da mesma lei ao dispor que “os processos de mandado de segurança terão prioridade sobre todos os atos judiciais”, exigindo o seu parágrafo único que “o prazo para a conclusão não poderá exceder de vinte e quatro horas, a contar da distribuição”.

 

 

* Advogado em São Paulo e Professor de Processo Civil

Website: http://www.almeidapaiva.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
, J. A. Almeida Paiva. Ampulheta. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/ampulheta/ Acesso em: 28 mar. 2024