Sociedade

União de homossexuais

 

 

Ao longo de dez anos, Celso Ribeiro Bastos e eu comentamos a Constituição Brasileira, pela Editora Saraiva, tendo a obra sido veiculada em quinze volumes. Coube-me, na divisão que fizemos, tecer considerações sobre o capítulo da família.

 

Ao examinar o § 3º, do artigo 226, assim redigido: “§ 3º – Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”, e o “caput” do artigo: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, afirmei, na ocasião, que a Constituição proíbe seja considerada família a união de pessoas do mesmo sexo. À evidência relações patrimoniais, que impliquem obrigações mútuas, podem ser tecidas à luz do Código Civil para que os homossexuais possam se auto-garantir, em caso de falecimento ou separação do par, mas não à luz do direito de família.

 

É o que a Constituição é muito clara. Apenas a união entre um homem e uma mulher é uma entidade familiar, que pode continuar a existir, em caso de separação, se houver prole decorrente da relação matrimonial (§ 4º). Mais do que isto: a Constituição declara, no § 5º, que: “§ 5º – Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.

 

Como se percebe, a lei suprema do Brasil, sobre ter considerado a família como a “base da sociedade”, entende por família somente aquela decorrente ou do casamento ou da união estável entre um homem e uma mulher. E compreende-se, pois, a união de pessoas do mesmo sexo, por força da natureza, é incapaz de gerar filhos.

 

Ora, pretender, por meio de uma ADPF alterar o texto constitucional, modificando um preceito fundamental –tão fundamental que a própria lei afirma ser a família a base da sociedade – é, de rigor, subverter a própria natureza da ação, que só pode ser utilizada para preservar um preceito fundamental e não para modificá-lo.

 

A alegação de que o preceito fundamental da dignidade humana está sendo ferido é uma falácia, visto que os que se unem, sendo do mesmo sexo, podem fazê-lo e se garantir patrimonialmente por contrato civil. O que não permite a Constituição é que seja considerada, tal união, “entidade familiar”.

 

Anos atrás, lia, numa publicação espanhola, interessante decisão do Tribunal Europeu, que não autorizou a adoção de criança por um par de homossexuais franceses, ao fundamento de que o direito da criança sobrepõe-se ao dos que pleiteavam a adoção, pois deve-se dar uma família a uma criança e não uma criança a uma família (na França há casamento entre pessoas do mesmo sexo).

 

E me pareceu acertadíssima a solução dada, à época, pelo Tribunal Europeu, visto que a criança deve ser educada segundo a “opção natural”, de atração entre pessoas de sexo diferente, visto que a denominada “opção sexual” dos homossexuais só ocorre na adolescência ou quando adultos. A adoção pretendida, à época, levaria a ser imposto à criança um tipo de comportamento que a tiraria do caminho seguido pela esmagadora maioria das pessoas, de atração pelo sexo oposto.

 

Tendo eu participado da redação da lei da ADPF (9882/99), juntamente com Gilmar Mendes, Arnoldo Wald, Celso Bastos e Oscar Corrêa, entendo que não poderia esta ação ser utilizada, visto que o preceito fundamental a ser preservado (a família como base da sociedade), se procedente fosse, estaria manifestamente dilacerado.

 

À evidência, neste artigo, reitero apenas o que já escrevi há mais de 10 anos, interpretando o que está na lei maior do nosso país.

 

 

* Ives Gandra da Silva Martins, Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU.

Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. União de homossexuais. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/uniao-de-homossexuais/ Acesso em: 19 abr. 2024