Sociedade

Apóstolos, acima de fronteiras confessionais


Vamos começar esta
página lembrando o Apóstolo Paulo que, a meu ver, sintetizou o Cristianismo na
epístola que escreveu sobre o Amor. “Ainda que eu falasse todas as línguas dos
homens, isso de nada valeria se eu não tivesse Amor. Ainda que eu distribuísse
todos os meus bens aos pobres, nenhum significado teria esse gesto se eu não
tivesse Amor.”

Podemos colocar o
Apóstolo Paulo no século XXI e, dentro de sua linha de ensinamento, desdobrar
sua palavra: ainda que eu conheça e cumpra todos os artigos do Código de
Direito Canônico, isso de nada valerá se eu não tiver Amor.

O Amor, na lição de
Paulo Apóstolo, é a grande diretriz da vida, é a balança através da qual, com a
medida do Absoluto, pesamos tudo que é relativo. A lei é relativa. O Amor é
Absoluto.

Esta reflexão sobre
Paulo Apóstolo me socorre quando penso nisto que se chama “segundo casamento”.
Casais, cujo primeiro casamento naufragou, e que procuram uma nova morada para
o Amor.

Sem dúvida, o ideal
seria que todos os noivos realizassem a promessa depositada sobre as alianças:
“prometo amar-te até o último dia de minha vida, na alegria e na tristeza, na
saúde e na doença”. Entretanto, somos falíveis, somos mesmo de barro. E nem
sempre os votos solenes têm a possibilidade de durar até a morte. E então?

Parece-me que à luz de
Paulo Apóstolo, se o Amor é a medida de todas as coisas e a medida da própria
lei, o segundo casamento, a segunda tentativa de ser feliz tem as bênçãos de
Deus. O Código de Direito Canônico há se ser interpretado sob a chancela do
preceito do Amor. Não cabem anátemas, não cabem exclusões, cabe o Amor que tudo
compreende, tudo perdoa, tudo subverte, tudo endireita, tudo sintetiza, tudo
explica, na dimensão cósmica de sua abrangência infinita.

Conheço tantos lindos
casais em segundas núpcias. Casais que constróem cada dia, na partilha, na
doação, na responsabilidade, na fidelidade, o Sacramento do Amor.

Depois de reverenciar o
Apóstolo Paulo, vamos  trazer à lembrança três Apóstolos
contemporâneos, um deles já falecido (Reverendo Jaime Wright, evangélico) e
dois deles entre nós porém com a saúde bastante precária: Dom Paulo Evaristo
Arns (católico) e Rabino Henry Sobel (judeu).

Embora seguissem rotas
religiosas diferentes, esses três Apóstolos encontraram sintonia na defesa
desassombrada da dignidade da pessoa humana. Quando o Brasil estava sacudido
pela ditadura, esses três Apóstolos denunciaram a tortura, sofreram toda sorte
de ameaças, colocaram a própria vida em perigo, na defesa dos Direitos Humanos.
O livro “Brasil Nunca Mais”, o mais monumental documentário sobre a tortura no
Brasil, mostra como foram tristes e perigosos aqueles dias e como o templo
católico, o templo evangélico e o templo judeu, sob a liderança desses três
Apóstolos, foram o refúgio dos perseguidos, foram antena capaz de ouvir os
gemidos e as dores dos que eram massacrados.

O Brasil é um país de
jovens. E os jovens frequentemente não têm conhecimento desses fatos.

Os mais velhos têm o
dever de testemunhar sobre o passado, a fim de que se construa o futuro com
segurança.

Às vésperas das eleições
presidenciais, eleições para os Governos Estaduais e eleições para os
Legislativos estaduais e federal, é preciso valorizar a Democracia que
conquistamos e aperfeiçoá-la a cada dia. Há muito ainda por fazer.

João Baptista Herkenhoff,
74 anos, é Professor pesquisador da Faculdade Estácio de Sá de Vila Velha (ES)
e palestrante. Autor de Filosofia do Direito (Editora GZ, Rio,
2010).

E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br

Homepage: www.jbherkenhoff.com.br

Como citar e referenciar este artigo:
HERKENHOFF, João Baptista. Apóstolos, acima de fronteiras confessionais. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/sociedade/apostolos-acima-de-fronteiras-confessionais/ Acesso em: 28 mar. 2024