Ainda não existiu regime verdadeiramente democrático em que não houvesse o direito constitucional de liberdade de expressão, ou que houvesse censura dos meios de comunicação, o que é quer dizer a mesma coisa com diferentes palavras. É um lugar comum, mas nem por isto deixa de ser verdadeiro: A liberdade de expressão é um dos pilares da democracia.
Censura é algo que rima com ditadura, pois sejam elas de esquerda ou de direita têm quase todas as mesmas feições de uma face horrenda: detestam o pluralismo, tanto o pluralismo de partidos políticos como o de ideologias e de expressão dos meios de comunicação.
E esta é a razão pela qual ditaduras possuem “um só líder (Hitler), um só partido (o Partido Nacional Socialista) e uma só nação (a Alemanha, que acabou dividida em duas), ou então um só líder (Stalin), um só partido (Partido Comunista) e uma só nação (a falecida União das Repúblicas Socialista Soviéticas, na realidade uma confederação de nações sob a tirania de uma: a Rússia).
E para completar um só jornal: Pravda (em russo: A Verdade), mas na realidade uma expressão da novilíngua de Big Brother em que as palavras significam exatamente o contrário de seus usos registrados pelos dicionários. Ou então, um só líder (Fidel Castro, El Coma Andante), um só partido (Partido Comunista Cubano) e uma só nação com um único jornal (Granma), pois “mais de um jornal é desperdício de papel”, conforme afirmou El Coma Andante, atualmente El Coma Acostante.
Não se pode negar, no entanto, que o referido jornal tem desempenhado ultimamente um papel importante em Cubanacan,
Mas a censura é uma praga social bem mais antiga do que se pensa…
No século XVII, mais precisamente em 1644, John Milton – autor de Paradise Lost e membro da Casa dos Comuns – publicou Areopagitica, um libelo a favor da liberdade de imprimir sem autorização nem censura. Talvez, este tenha sido o primeiro texto na literatura ocidental reivindicando veementemente a liberdade de expressão. É como não me canso de repetir: Terra é a Inglaterra!
Mas ainda no século XVIII, na França dominada há séculos pelo absolutismo dos Bourbon, não havia uma censura: havia duas: a censura eclesiástica do Segundo Estado (o clero católico) e a censura real do Primeiro Estado (o rei e a nobreza), razão pela qual um membro do Terceiro Estado (todos os excluídos dos dois primeiros), chamado François Marie Arouet, publicava seus escritos em francês, mas na Holanda e sob o pseudônimo de Voltaire.
No Brasil, durante o Estado Novo, havia uma censura que tanto dava pra rir como pra chorar: os censores de Vargas censuravam quase tudo, desde escritos que acreditavam ser um risco para a segurança nacional até programas humorísticos e letras de samba.
Com o retorno da democracia após a Segunda Guerra, acabou a censura. Porém com o advento do período de exceção de 1964, de um modo mais violento entre 1968 e 1975, aproximadamente, voltou a censura prévia dos meios de comunicação. Novamente, com o retorno da democracia, em 1986, e com a nova Constituição de
No governo Lulla (com dois éles), houve uma tentativa de ressuscitar a censura dos períodos de ditadura com o Conselho Nacional de Jornalismo em que meia dúzia de iluminados decidiriam o que devia e o que não devia ser publicado. Mas a reação da opinião pública foi tão forte que as mentes autoritárias de Lulla (com dois eles como Collor) e do PT viram-se forçadas a abandonar a idéia.
Agora, às vésperas das eleições de 2010, apareceu o tal de confecom produzindo uma miniconstituição em que – entre outras barbaridades do ponto de vista jurídico – está a criação de um soviet destinado a censurar tudo o que não for do agrado do Presidente, até literatura de cordel e música sertaneja.
É sabido que 80% do povo acha que tudo que Lula faz é bom ou ótimo e o mesmo índice estatístico é o dos que aprovam a censura oficial. Inacreditável! É como se milhões de cidadãos estivessem implorando: “Amordacem-nos, por favor!” “Mordaça Já!”
Assim sendo, com a maioria da opinião pública extremamente desejosa de ser censurada, estamos correndo o risco de ter o retorno da censura, mas não em um regime ditatorial -o que até seria coerente – porém em um governo soi-disant democrático.
Uma vez Lula disse que queria que seu governo fosse como o de Vargas. Parece que está sendo mesmo um Estado Neonovo ou Novíssimo: uma censura implacável só não exercerá seu poder de castração, se os protestos indignados de uma minoria de 20% não deixarem. Mas, para o governo Lula ficar igual mesmo ao de Vargas, só está faltando o suicídio do Presidente. Aguardemos, pois, ansiosamente.
apêndice: ministério da liberdade de expressão adverte
Tanto do ponto de vista da forma como do conteúdo, excelente peça de propaganda veiculada na TV. Um narrador começa a falar de um monstro que está preso numa prisão de segurança máxima. Um computador regula a temperatura, pois ela não deve baixar de determinado limite.
Mas como todo sistema, por mais sofisticado que seja, pode falhar, há um guarda vigiando 24 horas. De repente, soa o alarme. Vemos o termômetro indicar que a temperatura baixou além do limite de segurança. O guarda, que estava dormindo, acorda sobressaltado, mas é tarde demais: o monstro rompe as paredes de sua cela e faz sua primeira vítima. Aí uma voz fala: não deixe o monstro da censura acordar. Genial!
* Mário Antônio de Lacerda Guerreiro, Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC [Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos]. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Autor de Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000) . Liberdade ou Igualdade? ( EDIPUCRS, Porto Alegre, 2002). Co-autor de Significado, Verdade e Ação (EDUF, Niterói, 1985); Paradigmas Filosóficos da Atualidade (Papirus, Campinas, 1989); O Século XX: O Nascimento da Ciência Contemporânea (Ed. CLE-UNICAMP, 1994); Saber, Verdade e Impasse (Nau, Rio de Janeiro, 1995; A Filosofia Analítica no Brasil (Papirus, 1995); Pré-Socráticos: A Invenção da Filosofia (Papirus, 2000) Já apresentou 71 comunicações em encontros acadêmicos e publicou 46 artigos. Atualmente tem escrito regularmente artigos para www.parlata.com.br,www.rplib.com.br , www.avozdocidadao.com.br e para www.cieep.org.br , do qual é membro do conselho editorial.