Processo Civil

Revisão da tese firmada no IRDR

Nos termos do artigo 976, caput, do Código de Processo Civil, é cabível o incidente de resolução de demandas repetitivas, conhecido como IRDR – como nessa monografia usaremos – quando houver simultaneidade de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão de direito e o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:

I – efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;

II – risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

§ 1º A desistência ou o abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente.

§ 2º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono.

§ 3º A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente suscitado.

§ 4º É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva.

A forma isonômica de diferentes processos que versam sobre a mesma questão jurídica, deve ocasionar uma efetiva segurança jurídica e igualdade, sendo esse o principal fundamento desse incidente, como se nota pela simples leitura do dispositivo acima.

O Fórum Permanente de Processualistas Civis (FFPC), por seu enunciado de n° 342, que tem caráter apenas doutrinário, menciona no sentido de que o incidente aqui analisado, aplica-se aos recursos, remessa necessária ou a qualquer processo de competência originária de tribunal.

O art. 986 do CPC permite que, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público ou da Defensoria Pública, o órgão julgador do IRDR possa rever sua decisão, adotando outra tese jurídica.

O procedimento a ser adotado não está regulado em lei. Caberá, assim, aos tribunais, em regimento interno, dispor a respeito.

De qualquer forma, cabe destacar que a revisão de ofício da tese jurídica poderá ocorrer quando da apreciação de outro feito qualquer pelo mesmo órgão julgador do IRDR.

Independentemente, no entanto, dessa possibilidade, pode ser disciplinado um procedimento autônomo no qual qualquer membro do tribunal ou órgão colegiado possa provocar a revisão da tese, assim como a requerimento do Ministério Público ou da Defensoria Pública.

Aqui teríamos um procedimento autônomo de revisão da tese jurídica ao molde do que já dispõe a Lei n. 11.417/06, que cuida da súmula vinculante, regras, inclusive, que podem ser aplicadas de forma analógica.

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO INTERNO – MANDADO DE SEGURANÇA – REVISÃO DE IRDR – NOVA TESE – POSSIBILIDADE. 1) Em razão de decisão desta e. Corte de Justiça pela revisão Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas – IRDR nº 0000901-51.2016.8.03.0000 que serviu de fundamento para denegação do mandmus em questão e, considerando a possibilidade da hipótese dos autos se assentar à nova tese a ser firmada por este e. Tribunal, dá-se provimento a agravo interno que se insurgia contra decisão extinta sem julgamento do mérito. 2) Determinado o sobrestamento de todos os processos que envolvem a matéria debatida no mandamus, deverão os autos aguardar em Secretária até ulterior decisão do Pleno Judicial acerca da revisão do IRDR. 2) Agravo interno provido.

(TJ-AP – AGT: 00001217720178030000 AP, Relator: Desembargador GILBERTO PINHEIRO, Data de Julgamento: 22/08/2018, Tribunal)

E M E N T A AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL. INCORPORAÇÃO DA DIFERENÇA DE PERCENTUAL (6,1%) AOS SERVIDORES PÚBLICOS. DESCABIMENTO. IRDR. TESE FIRMADA PELA NATUREZA DE REVISÃO ESPECÍFICA E SETORIAL DAS LEIS n.º 8.970/09 e 8.971/09. VIOLAÇÃO A SÚMULA VINCULANTE Nº. 37 DO STF. AGRAVO INTERNO PROVIDO. I. Incidente de Recurso de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 0003916-33.2016.8.10.0000, tese firmada: “As Leis nº 8.970/09 e 8.971/09 não possuem caráter de revisão geral e anual, porquanto implementaram reajuste específico e setorial, descabendo o direito dos servidores públicos estaduais à diferença de 6,1%, referente a percentual maior concedido para determinada categoria”. II. Agravo Interno provido.

(TJ-MA – AGT: 00006957020158100099 MA 0356332018, Relator: ANTONIO GUERREIRO JÚNIOR, Data de Julgamento: 30/04/2019, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO ADMINISTRATIVO. PROFESSORA APOSENTADA. GRATIFICAÇÃO DE REGÊNCIA DE CLASSE. LEI ESTADUAL Nº. 2.365/94. PARCELA INCORPORADA AOS PROVENTOS. VALOR DA GRATIFICAÇÃO CONGELADO. DEFASAGEM DEMONSTRADA. MATÉRIA QUE FOI OBJETO DO IRDR Nº. 0026631-20.2016.8.19.0000. EGRÉGIA SEÇÃO CÍVEL DESTA CORTE FIRMOU TESE NO SENTIDO DE QUE “EXISTE DIREITO À REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO” E “O REAJUSTE SERÁ FEITO PELOS ÍNDICES GERAIS APLICADOS AOS VENCIMENTOS DOS PROFESSORES PÚBLICOS ESTADUAIS”. Probabilidade do direito. Decisão que vai ao encontro do decidido no IRDR. Possibilidade de aplicação do decidido para deferimento de tutela provisória. Art. 982 § 2º CPC. Periculum in mora. Agravada possui 77 anos e condicionar o reajuste da parcela ao trânsito em julgado do IRDR seria privar a idosa de uma quantia que pode ajudá-la em sua subsistência. Presentes os requisitos exigidos pelo artigo 300 do CPC. Réus/Agravantes que devem proceder ao reajuste do benefício da Autora/Agravada. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

(TJ-RJ – AI: 00581735120198190000, Relator: Des(a). DENISE NICOLL SIMÕES, Data de Julgamento: 17/12/2019, QUINTA CÂMARA CÍVEL)

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE REVISÃO PARCIAL DATESEA FIXADA NO IRDR Nº 2016.00.2.024562-9.INTERNAÇÃO EM UTI E FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. COMPETÊNCIA. VARA DE FAZENDA PÚBLICA X JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA.ENTENDIMENTO STJ. DIVERGÊNCIA. INCAPACIDADE CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE DEMANDAR PERANTE O JUIZADO ESPECIAL. LEI 9.099/95, ART. 8º. LEI 12.153/09. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. PROTEÇÃO DO INCAPAZ. INCOMPATIBILIDADE COM OS PRINCÍPIOS REGEDORES DOS JUIZADOS ESPECIAIS. RESTRIÇÃO PARA LITIGAR NO JUIZADO ESPECIAL FAZENDÁRIO. MANUTENÇÃO DA TESE. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1.Cuida-se de pedido de revisão parcial de tese fixada no IRDR 2016 00 2 024562-9 em que a Defensoria Pública do DF requer seja fixada a tese de que a incapacidade da parte autora, por si só, não afasta a competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, inclusive nos casos que envolvam pedidos de internação hospitalar e de fornecimento de medicamentos ou de serviços de saúde. 1.1. Em suas razões assevera que o STJ caminha no sentido oposto do posicionamento das Câmaras Cíveis do TJDFT, ou seja, de que não haveria óbice legal para a participação de pessoa incapaz, devidamente representada, no pólo ativo de demanda ajuizada no Juizado Especial da Fazenda Pública. 1.2. Aponta que a dissonância de entendimentos entre os Tribunais provoca insegurança jurídica, dada a urgência das demandas por serviços de saúde pública e o expressivo volume de ações que aportam todos os dias nas Varas de Fazenda e nos Juizados Fazendários. 2.Adiscussão presente nestes autos cinge-se em analisar a ampliação da competência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública para incluir os incapazes, desde que devidamente representados, nas ações que envolvam internação hospitalar e fornecimento de medicamentos. 3.Nos termos do artigo 27 da Lei nº 12.153/09, aplica-se subsidiariamente aos Juizados Especiais da Fazenda Pública a Lei n.º 9.099/95, cujo art. 8.º proíbe que o incapaz seja parte nas demandas propostas perante os Juizados Especiais. 4.Aproteção conferida ao incapaz é salutar e benéfica afim de garantir-lhes a necessária segurança jurídica na medida em que não se coadunam com os princípios regedores dos Juizados Especiais, quais sejam agilidade, celeridade, rapidez, informalidade, oralidade. 4.1. Nesse sentido, a complexidade que envolvem essas demandas extrapolam os princípios basilares dos Juizados Especiais que são absolutamente incompatíveis à matéria, de altíssima indagação, às quais devem ser apreciadas nas Varas da Fazenda Pública. 5.Por tais considerações, a tese firmada neste tribunal deve ser mantida para consolidar o entendimento que considera inviável a propositura de ação que envolva pedido de internação hospitalar, fornecimento de medicamentos ou de serviços de saúde demandada por incapaz perante os Juizados Especiais. 6.Pedido de alteração parcial de tese fixada em IRDR improvido.

(TJ-DF 20180020022047 DF 0002193-89.2018.8.07.0000, Relator: GILBERTO PEREIRA DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 24/09/2018, Câmara de Uniformização, Data de Publicação: Publicado no DJE : 21/11/2018 . Pág.: 485/487).

Pode-se admitir, outrossim, a possibilidade de ser revista a tese em novo IRDR cuidando da mesma questão jurídica. Teríamos, assim, um incidente de resolução de demandas repetitivas revisional. Tal requerimento, assim, pode ser formulado pelas partes, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública. É esse, inclusive, o entendimento do Fórum Permanente de Processualistas Civis (Enunciado n. 473).

Importa, porém, ressaltar que, na forma do art. 927 do CPC, a alteração de tese jurídica adotada em IRDR “poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese” (§ 2º).

Outrossim, em caso de revisão da tese, pode o tribunal modular “efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica” (§ 3º do art. 927 do CPC).

Tal revisão, por sua vez, deve observar “a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia” (§ 4º do art. 927 do CPC).

Com essa última regra se busca evitar que a tese jurídica seja revista ao sabor da composição do órgão julgador. Daí porque “a necessidade de fundamentação adequada e específica” para se demonstrar, de forma razoável e consistente, a necessidade do afastamento dos fundamentos condutores da tese revisanda de modo a justificar a sua alteração.

Caso não seja assim, a segurança jurídica, proteção da confiança e isonomia serão sacrificados ao sabor da eventual maioria dos membros julgadores em momento posterior a fixação da tese.

Como citar e referenciar este artigo:
SANTOS, André Alvino Pereira. Revisão da tese firmada no IRDR. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2020. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/revisao-da-tese-firmada-no-irdr/ Acesso em: 17 abr. 2024