Processo Civil

As modernas teorias do conflito e promoção da cultura da paz em face da contemporaneidade

Resumo:

O texto aborda didaticamente as modernas teorias do conflito e sua preocupação com promoção da cultura da paz dentro do contexto contemporâneo, quando se utilizou dois filmes recomendados Beleza Americana (1999) e a Guerra dos Roses (1989). Identificou-se, enfim, uma evolução do conceito e da caracterização de conflito.

Résumé

Le texte traite des théories didactiquement modernes de conflit et préoccupation avec la promotion culture de la paix dans le contexte contemporain, en utilisant deux films recommandés American Beauty (1999) et la guerre des Roses (1989). Il a été constaté enfin une évolution du concept et la caractérisation des conflits.

Sumário: 1. Introdução. 2. Conflito. 3. Conceito & paradigma. 4. Concepção moderna sobre o conflito. 5. Conclusão 6. Referências.

1.Introdução.

Vigem sérias dificuldades para se compreender os elementos que integram o conflito submetido ao julgador e a sociedade. Ademais, o julgamento preconizado dentro do clássico direito processual vem perdendo progressivamente o prestígio[1], eficácia e respeito principalmente porque ainda há de se enfrentar a árdua batalha do cumprimento da sentença, para se então chegar finalmente, a entrega efetiva da prestação jurisdicional a quem de direito, ou pelo menos, ao vencedor na demanda.

O presente texto humildemente pretende abordar as principais teorias do conflito tidas como contribuições doutrinárias relevantes para a promoção da cultura da paz e da busca da efetividade processual. Pois, afinal a consensualidade substitui com grande vantagem a coercitividade da execução forçada seja a do título judicial ou extrajudicial.

Como contextualização dos conflitos contemporâneos foi tomada como premissas os dois filmes “Beleza Americana” e a “Guerra dos Roses” que adiante comentaremos.

As teorias do conflito serão abordadas em sua concepção clássica, por meio de perspectiva sociológica e moderna em contraposição aos seus conceitos e enfoque de jurisdicionalização.

O homem, como é sabido, tem vocação natural e característica para a sociabilidade e possui singularidade de formação e comportamento. Calcado em sua natureza social e da inata inclinação para vida em sociedade, repousa também a origem do Direito e do Estado.

Afinal, Aristóteles já afirmava o homem é animal social[2] e, observamos que na sua interação contínua e dinâmica, ele transforma e é igualmente transformado.

Sabe-se ser natural a existência de atritos nas relações intersubjetivas e até mesmo intergrupais sejam marcadas por divergências das mais variadas espécies (emocionais, sociais, políticas, ideológicas, familiares, profissionais e afetivas) as quais podem ser definidas exatamente como a gênese matricial de um dos fenômenos mais recorrentes na sociedade, ou seja, o conflito.

A existência de interesses contrapostos e até mesmo antagônicos na sociedade humana traz a imperiosa necessidade proteção contra a barbárie, daí a criação de normas capazes de regular as relações humanas e aplicar sanções aos infratores seja pelo proposital descumprimento, seja ainda pelo culposo infringir e seja qual for o Direito (há de se recordar que poderão as normas[3] ser positivas e escritas bem como consuetudinárias).

Extrai-se, deste conceito o mais famoso brocardo de que não há sociedade sem direito (ubi societas, ibi jus[4]). Mesmo assim, a mera existência de uma ordem jurídica revela-se insuficiente para concretizar o ideal de justiça, pois o Direito é operado pelos homens, e se a estes não couber a ação promotora dos ideais eleitos como importantes e reconhecidos pelo grupo social, será inútil o vasto catálogo de normas jurídicas existentes.

O meio de resolução deste impasse se dá pelo surgimento evolutivo das técnicas de solução de conflitos que vai desde a autotutela, autocomposição, a arbitragem e a jurisdição.

Contudo, com o fortalecimento do Estado responsável pela capacidade de organização político-institucional com o objetivo de reconhecimento e proteção universais dos seus cidadãos, sucedendo-se um incremento de seu poder centralizador na disciplina das relações privadas e, ipso facto, a relevante participação da jurisdição como meio de solução dos litígios.

Com o incremento do desenvolvimento da tecnologia de comunicação e informação e que empreende maior dinamicidade socioeconômica e científica constatou-se a necessidade de se ter órgãos consolidados, com independência e imparcialidade e capazes de solucionar as lides, mais complexas presentes na teia social.

A jurisdição enquanto monopólio estatal para a distribuição de justiça e que não invalida o uso de meios adequados e consensuais para a composição de conflitos trazendo o valor da consensualidade como poderoso instrumento na garantia, promoção e concretização de direitos pautados no texto constitucional vigente.

Apesar de ainda existir a supervalorização dos métodos oficiais e tradicionais de distribuição de justiça, a esperança depositada nas providências do Judiciário tem sido frustrada seja por sua morosidade e seu caráter burocrático e fragmentário.

O processo judicial nem sempre é capaz de resolver todas as diferenças existentes entre os indivíduos e nem promover a pacificação social almejada.

Neste contexto avulta-se a crise do sistema judicial brasileiro principalmente pela incapacidade de não cumprir e respeitar a garantia de acesso à justiça, especialmente quando não é capaz de adequadamente aos anseios dos jurisdicionados e a explosão de litigiosidade[5] em massa, particularmente após a década de 1990.

Acontece que os instrumentos de viabilidade da jurisdição, a saber: o direito de ação e o processo por vezes se revelam por serem vinganças peculiares tornando o Judiciário mero aplicador da lei abstrata e impessoal, além de ser o palco de embates pessoais, odiosos e até bizarros.

Quando não se descamba numa loteria jurídica onde as interpretações diferenciadas e até opostos sobre o mesmo diploma legal fazem surgir resultados e julgamentos contraditórios e díspares diante da mesma questão fática e questão jurídica.

Ademais, os órgãos jurisdicionais brasileiros não conseguiram acompanhar adequadamente o acelerado processo de globalização que desenfreou a litigância reprimida.

Neste contexto interagem ainda as empresas, empregadores, empregados, consumidores, fornecedores e o Estado num célere ritmo que potencializa ainda mais o surgimento de lides e litígios, afogando os tribunais brasileiros num mar de processos, baseados em legislações processualistas, burocráticas e protelatórias.

Verifica-se igualmente o insuficiente número de magistrados, serventuários e bens insuficientes para cumprir as garantias constitucionais para os processos judiciais e administrativos.

Apesar de a jurisdição ter como fim a pacificação social bem como a solução do caso concreto submetido ao Estado-Juiz observa-se uma distorção de valores na condução da composição das lides.

O escopo jurídico do processo que significa a realização do direito material, reforçando a instrumentalidade do processo, a paz e a ordem devem ser facorecidas pela imposição da vontade do Estado. O mais elevado interesse que se satisfaz através do exercício da jurisdição é, pois, o interesse da sociedade.

A realização do direito objetivo e a pacificação social são escopos da jurisdição em si mesma e, não das partes.

O Estado aceita a provocação do interessado e a sua cooperação, instaurando-se o processo e conduzindo-o até o final, na medida em que apenas o interesse deste em obter a prestação jurisdicional coincidir com aquele interesse público de atuar a vontade do direito material e, com isso, pacificar e fazer justiça.

Reprise-se que é dupla a função da jurisdição, a pacificação social e a justa composição do caso concreto. O maior problema se evidencia quando se dá o desvirtuamento do labor jurisdicional para atender apenas o segundo objetivo.

Muitas vezes se esquece de que a aplicabilidade das funções da jurisdição em cada ato processual sendo o processo como um meio afiado que ceifa seu caráter instrumental e o impede de viabilizar a dialética dos interesses, na qual a demanda oferece uma resposta compositiva da controvérsia, de forma condenatória, constitutiva ou declaratória.

O conflito judicializado ao invés de ser pacificado da forma mais fácil e célere, se agrava por sua morosidade e elevado custo.

Em outra via, é possível a solução pacífica pode ser alcançada por meio não-judiciais, com o intuito de acessar à justiça (e, não apenas ao Judiciário) pondo fim ao conflito de interesses em si, promovendo a pacificação social com o reequilíbrio das relações sociais antes em crise.

Com o aumento das interações humanas naturalmente aumentou-se os litígios e mesmo sob os auspícios da resolução científica e tecnológica, o que trouxe mercadores, consumidores, com a massificação das mídias e informações, configurou-se uma litigiosidade acirrada numa velocidade nunca antes observada.

A intensa dinâmica pós-moderna potencializou as relações sociais e as necessidades humanas quanto à garantia de direitos subjetivos que cabe a cada cidadão ou pessoa jurídica ou pessoa moral que detenha, além do expressivo incentivo à cultura da judicialidade.

O resultado final é um Judiciário em crise sem conseguir atender satisfatoriamente às demandas que lhes são submetidas em face da qualidade da prestação jurisdicional, especialmente quanto à duração do processo e o grau de satisfação dos jurisdicionados.

Tanto assim que a EC45/2004 veio patentear o princípio da duração razoável do processo. Assim a pacificação social será atingida pelo devido processo legal que deve compreender e documentar a exata compreensão do conflito e sua possível solução.

Torna-se imperioso o domínio das teorias do conflito que procura a resolução consensual dos conflitos mediante a instrumentalização de técnica de pacificação, sejam estas judiciais ou não.

O manejo responsável das divergências humanas não poderia esquecer o estudo ainda que sintético da fundamentação jurídica que corresponde a um autêntico farol de Alexandria[6] na Ciência do Direito.

É verdade que o Direito disciplina essencialmente algumas formas de resolução de conflitos de interesses principalmente com enfoque à jurisdição como mecanismo dissipador de contendas.

Isto porque tanto o magistrado, mediador e árbitro e, até mesmo, as partes ao conhecerem os aspectos teóricos do nascimento e exteriorização de conflitos de interesses, passam a ser qualificados como sujeitos.

A confecção de parâmetros teóricos viabilizará a contextualização sociológica e psicológica com o uso da metodologia lógica dedutiva para a exposição e compreensão dos dados oficiais e revisão bibliográfica.

2.Conflito

O primeiro questionamento que surge: é saber, se o conflito é problema do Direito? Não é função precípua da Ciência do Direito o estudo do conflito.

Trata-se de fenômeno constatável na vida em sociedade, de forma que as Ciências Sociais, a Sociologia e a Pedagogia traçam o estudo até mesmo a Matemática[7] que visa sistematizar logicamente desde a sua origem e causas.

Há grande variedade de premissas que podem ser abordadas bem como vige um complexo enquadramento metodológico.  A missão da seara jurídica é compor as controvérsias, mas não visa ao estrito estudo das causas motivadoras da litigância.

Para tanto, se recorre à Sociologia do Direito e as ciências afins que se preocupam em implementar uma política pública de pacificação de conflitos.

Não há possibilidade de desaparecimento ou total solução absoluta de conflitos e nem mesmo negar-lhes a sua função social. Pois seria negar-lhes o direito de evoluir, refletir e adaptar-se às novas realidades e buscar soluções antes não previstas.

Não deve o conflito ser encarado como a demonização das pessoas, o que corrobora com a afirmação de Sartre de que “o inferno são os outros” [8], mas o conflito é possível de ser evitado.

Pois cada indivíduo é dotado de características próprias que em certo momento são capazes de colidir com interesses, pretensões e direitos do outro indivíduo, quando surge fatalmente a divergência capaz de polarizar a relação social antes estabilizada.

Todas as sociedades e relacionamentos interpessoais experimentam conflitos, seja no processo diário de interação. O que reforça a noção de que o conflito não é anormal ou disfuncional, é puro fato da vida.

Porém, o conflito pode transcender ao comportamento competitivo e adquirir o propósito adicional de infligir dano físico ou psicológico ao oponente. É quando temos a dinâmica negativa e prejudicial do conflito que atinge seu custo máximo (destruindo o seu oponente).

A maioria das culturas ocidentais recepciona o conflito negativo seja por sua existência ou funcionalidade. O conflito concretiza diversas faces e facetas que dispõe a humanidade sofrendo influência midiática, das desigualdades sociais e a luta pelo poder.

Descabe, portanto a rotulação maniqueísta e meritória do conflito possui a mesma frivolidade de se saber o gênero dos anjos.

3.Conceito & paradigma

As interações sociais ocorrem em qualquer povo, por duas formas básicas a cooperação e o conflito. O primeiro resulta de modelos ideais de interatividade movidos basicamente pela não resistência aos interesses e aos direitos de determinadas pessoais.

Dessa forma, deduz-se a regra do adimplemento espontâneo e voluntário de obrigações e a exata compreensão da legalidade e legitimidade dos outros em exercer sua titularidade e atuar sobre os bens da vida a estes correlacionados.

O conflito é a negação da cooperação e, segundo Norberto Bobbio qualquer grupo social, qualquer sociedade histórica pode ser definir a qualquer momento, de acordo com as formas do conflito e de cooperação entre os diversos atores que nesta surgem.

O processo de definição do fenômeno envolve dois elementos fundamentais, a saber: a declaração da estrutura social  com seus respectivos componentes e o vínculo que os une.

O conflito possui caráter polissêmico e transdisciplinar, quando há de se considerar os diferentes enfoques[9].

Ainda que a maioria das definições sobre conflito tome como referencial o elemento de conduta, é possível enxergar a definição de conflito pelo ponto de vista linguístico, jurídico, sociológico, antropológico, cultural, psicológico ou comportamental.

O conflito é vocábulo oriundo do latim conflictu e significa o embate de pessoa de pessoas que luta. Altercação, barulho, desordem ou tumulto.

Já em Psicologia corresponde a tensão produzida pela presença simultânea de motivos contraditórios segundo a psicanálise[10]. Há em todo conflito um desejo reprimido, inconsciente. Já em sociologia nos remete a competição consciente de indivíduos ou grupos sociais que visem à sujeição ou a destruição do rival.

A literalidade do termo “conflito” engloba uma gama de definições e, por vezes, até distantes e pode ser resumidas no dissenso e na contradição de ideias.

A essência do conflito é a oposição, a divergência de opiniões e pleitos que, necessariamente, numa primeira leitura são incompatíveis e inconciliáveis.

É inegável que o mero dissenso não expressa toda a densidade gnosiológica que o conflito requer. Do ponto de vista jurídico, utilizam-se sinônimos tais como contenda, controvérsia, em regra, relacionada ao interesse, sendo que estes envolvem necessariamente insatisfação que, por sua vez, gera tensão.

Há ideias e desejos contrapostos cujo objeto é um bem de vida. Dinamarco expõe que os conflitos podem ser entendidos como: situações em que uma pessoa, pretendendo pra si determinado bem não pode obtê-lo, seja porque (a) aquele que poderia satisfazer a sua pretensão não a satisfaz, sejam porque (b)no próprio direito proíbe a satisfação voluntária da pretensão (por exemplo: a pretensão punitiva do Estado que não pode ser satisfeita mediante um ato de submissão do indigitado criminoso.

Tendo em vista que o processo seja o meio hábil para instrumentalizar o direito material, que é o objeto do litígio coube a Teoria Geral do Processo delimitar o conceito de conflito que é aplicável ao direito processual.

Constata-se também que os três institutos diferentes que possuem afinidade com as controvérsias. O conflito, nesse contexto, distingue-se de insatisfação, da pretensão e da lide.

A insatisfação tem nítida natureza espiritual e surge bem no âmago do indivíduo que é contrariado no seu interesse. Trata-se de sentimento latente que pode ser agasalhado apenas no âmbito das emoções do homem. Por vezes, o insatisfeito pode até nem demonstrar a sua contrariedade ou pode evoluir para pretensão.

Já a pretensão reflete a insatisfação materializada. É intenção externada de satisfação de um interesse. Segundo Francesco Carnelutti, a pretensão é um ato não um poder; é algo que alguém faz, não algo que alguém tem. É uma manifestação, mas não uma superioridade de tal vontade.

Por derradeiro, a resistência cuja manifestação se exterioriza da pretensão do opositor, a qual tem o fim de limitar ou eliminar a pretensão de seu adversário.

Do exposto da conjugação de conceitos de conflito, interesse, pretensão, insatisfação e resistência nasce a chamada lide tida como um conceito intersubjetivo de interesse qualificado por uma pretensão resistida.

Aliás, o conceito de lide[11] esboçado por Carnelutti é por vezes muito complexo, em especial, por ser a exteriorização de um fenômeno social, sendo muito valiosa sua contribuição para a Teoria Geral do Processo.

Pode-se então, afirmar que o conflito de interesses traduz-se em incongruência de vontades. Na lição de Didier Jr. afirma:

“Na verdade, a lide não é característica da jurisdição. Se assim fosse, seria muito difícil explicar a jurisdição constitucional (controle abstrato de constitucionalidade de les), as ações preventivas, as ações constitutivas necessárias e a jurisdição voluntária”.

Portanto, infere-se que a mera insatisfação não é passível de solução pelo Estado-Juiz porque não é dotada de externalidade e, portanto, não formou uma pretensão resistida.

Frise-se que a lide não é sinônima de processo. A lide é anterior ao processo, sendo a condição indispensável a sua formação. Conclui-se que para os fins jurídicos, o conflito não é propriamente, o que interessa ao Direito, mas a lide em suas reverberações no direito processual.

O conflito é integrante do conceito de lide e possui natureza extraprocessual enquanto que a ide pode ter a natureza tanto extra como também endoprocessual.

Apesar de serem formal e logicamente construídos, os conceitos da Teoria Geral do Processo são insuficientes para dar a devida compreensão sobre a cultura da judicialização e respectivas projeções pacificadoras de conflitos (lides).

A conflitologia ou o estudo dos conflitos apresenta-se em várias áreas do conhecimento humano e, tem-se dedicado aos procedimentos preventivos e resolutivos de conflitos, mas não constitui ramo autônomo de conhecimento.

A conflitologia[12] nasceu em 1950 e em 1960 expandiu-se nas décadas seguintes, por meio de Mary Parker Follet, Kenneth, Building, John Burton, Herbert Kelman, Roger Fischer, William Ury, William Zartman, Adam Curle, Elise Binding e dentre outros.

O referido estudo envolve técnicas específicas que vai desde a Antropologia[13] até a Medicina[14] que visam lidar de diversas formas com os problemas que lhes são submetidos sem se prender as premissas unidirecionadas, mas abeberando-se das possibilidades trans e multidisciplinares a depender dos sujeitos e do local onde o conflito se manifeste.

Para grande parte da história da humanidade o conflito foi encarado como uma patologia social ou pelo menos como manifestação desta. O conflito deveria ser banido a todo custo sob pena de se permitir que a sociedade caminhasse para sua própria destruição.

Vários cientistas sociais procuraram uniformizar e diferenciar alguns elementos contidos nos conflitos, tanto no campo da antropologia, sociologia e mesmo da ciência política que se dedicou primeiramente aos conflitos internos.

Tais conflitos podem ser analisados a partir da sua dimensão, intensidade e objetivos. A dimensão se refere aos atores participantes no processo conflituoso em relação ao total da categoria.

Na obra “Aprender a partir do conflito: conflitologia e educação” de autoria de Edward Vinyamata que relatou o seguinte exemplo: “Nos EUA, recentemente, detectou-se que os delitos e os conflitos violentos, em determinadas cidades, ocorriam entre as 10 (dez) horas da noite e as 2 (duas) horas da madrugada. A razão mais próxima pareceu ser a falta de atividade e o compromisso de uma população jovem, com dificuldades para abrir caminho na vida, bem como carente de estímulos sociais”.

A solução não teve nada a ver com um ato de mediação. Formou-se a Liga da Meia-Noite, quer dizer, partidas de basquete em que competiam as equipes de jovens dos bairros onde se produzia o maior número de delitos. A partir de então, os delitos decresceram em mais de 60%.

A compreensão do conflito como fenômeno sócio-jurídico leva em conta a minuciosa análise sobre as sociedades nas quais eles se manifestam. Mas Bobbio os classificou como insuficientes os critérios objetivos que se referem às mudanças desejadas e ao sistema social que abriga o conflito.

Já verificando a intensidade, aponta-se para a disponibilidade que os sujeitos possuem em negociar ou manter inalteradas suas pretensões, alterando-se para o fato de que a violência não é um indicador, válido para a aferição do grau de desenvolvimento. Bobbio et al assinalavam a inexistência, inadequação, a ruptura de normas aceitas por ambas as partes e de regras do jogo.

Sobretudo no campo da Sociologia, a mutação conceitual dos mais diversos teóricos das Ciências Sociais tomou como divisor de águas a negativização do conflito em determinado grupo social.

Aponta-se a formação de teorias clássicas sobre os conflitos em três períodos distintos sobre uma sociologia conflitiva e dentre deles fazer alusão às várias escolas e teses.

Pelas teorizações de Thomas Hobbes[15] na obra “O Leviatã ou Matéria, Forma e Poder de uma Comunidade Eclesiástica e Civil” (1651) propugnava um modelo de sociedade contratual, oposta à natural que evitaria a destruição absoluta do homem.

Segundo o referido filósofo inglês, a ausência da figura do protecionista, naquela época representada pelo soberano, permitiria, com base em tensões, competições e desejos dos homens que se entrasse num estado de guerra entre si, que findaria numa eliminação total da sociedade.

O conflito então deveria ser evitado, posto que latente ao estado natural do homem corresponderia a semente do fim. A ordem, ou seja, a instituição de um Poder exógeno, portanto, é o elemento preventivo do caos.

No mesmo sentido, Augusto Comte[16] em ideia bem próxima a de Hobbes, defendeu a eliminação das ideias opostas como profilaxia à desordem social, entendimento apoiado por Marcos José Diniz Silva.

Comte centrou-se na necessidade da reforma intelecto-moral do homem para que se possa obter uma reorganização da sociedade. O caos social reside no confronto de concepções de mundo, dos modos contraditórios de organizar a mesma sociedade, da expressão dos desacordos. Ou seja, bem similar ao pensamento de Hobbes, Comte pensa nas formas de anular a competição e as ideias incompatíveis.

Seria no estado positivo, dominado pelo cientificismo, no conceito da explosão industrial e seu progressivismo que Comte encontrou o ápice da sociedade humana.·.

Desde que não demorasse nos preconceitos e superstições de estados teológicos e metafísicos, o homem moderno alcançaria o progresso alcançaria a reforma moral que anularia todos os conflitos sociais.

Em um segundo momento encara-se o conflito como anormalidade ou patologia na medida em que a harmonia e coesão atenta contra o censo moral existente no ciclo social, afetando a estabilidade do sistema.

Trata-se da corrente funcionalista também conhecida como estrutural-funcionalista que parte do pressuposto que as estruturas sociais são interdependentes e tem amparo em valores tidos como compartilhados e comuns a todos os membros. Tais valores conferem a referida união.

O conflito deve ser evitado por natureza, pois é estranho à coesão social e, em regra, é externo à própria sociedade, devendo ser eliminado, assim que legitimadas a dominação e a exploração para a manutenção do status quo de pacificação.

O funcionalismo entende o conflito como uma disfunção da ordem social e considera a divisão social do trabalho como fator essencial para a solidariedade da parte para com o todo. Porém, os postulados funcionalistas pecam pela tentativa de explicar as instituições sociais incluindo o conflito quer seja por seus efeitos (quer por ignorar suas causas).

Noutros termos, o conflito representa uma alteração da normalidade de funcionamento de certo sistema social ou de parte dele. Em face do tratamento patológico conferido ao conflito por esta vertente é mesmo impossível compreendê-lo em si, pois a ênfase é dada ao consenso e não à perturbação.

Outra corrente busca em contraposição aos funcionalistas, de fato, dispensar estudos aos conflitos e suas relações com os grupos sociais de forma mais apurada. São conhecidos como as teorias do conflito social que se desdobraram em diversas categorias, mas acertam quanto ao denominador comum que não é o consenso social, o mantenedor da coesão e das estruturas sociais.

Ao contrário, pois atribui a conflituosidade as devidas evoluções dinâmicas e estabilidade necessárias à vida social, focalizando nas bases sociais cujo espelho reside no entendimento de grupos e suas controvérsias tendo suas contradições como referência, as quais, segundo Dahrendorf[17] são impossíveis de serem eliminadas no âmbito das sociedades históricas e são produzidas a todo tempo.

Os teóricos do conflito tanto na perspectiva marxista como na visão de John Stuart Mill[18] asseveram que a pretensa normalidade nunca fora regra em nenhuma sociedade, legitimando a célebre frase do general chinês Sun Tzu[19] de que o principal objetivo da guerra é a paz.

Os postulados basilares das teorias do conflito fundamentam-se na negação da desigualdade como eixo coesivo, pois, segundo seus doutrinadores, naturalmente os grupos mais oprimidos tentarão eliminar a desigualdade (em regra, por intermédio do conflito); no estudo de estruturas, macroestruturas e não tentativa de reduzir privilégios de grupos dominantes para evitar conflitos na vertente marxista.

Para esses teóricos do conflito há análise de natureza mais intencionalista em relação aos conflitos, a exemplo de Max Weber[20] e Georg Simmel[21].

Simmel elencou diversas referências psicossociológicas e fora influenciado por Immanuel Kant, sendo estas influências integrantes dos conflitos, tais como o amor, ódio, o desejo, a aversão, o egoísmo e o sentimento de mútua estranheza organizada sob a matriz formal de tensões.

Simmel foi atuante nos estudos da microssociologia[22] e apresentou o conceito de vergesslshaftung, traduzido em sociação segundo o qual o conflito na determinação do grupo, da dominação e subordinação oscilando entre a pobreza e a individualidade.

Portanto, o conflito é resultado de interações sociais, situando-se na antagonia de comportamentos e sentimentos sua razão de ser, e funcionando como mola propulsora de aperfeiçoamento e progresso.

Simmel formula o conceito de sociação para designar mais exatamente as formas e os modos pelos quais os atores sociais se relacionam. É relevante sublinhar que as interações sociais e as relações de interdependência não representam, necessariamente, a convergência de interesses entre os atores sociais envolvidos.

Demonstrou Simmel que as interações sociais podem configurar previamente as relações conflitivas, relações de interesse mútuo e relações de subordinação (dominação).

O conflito é assim, concebido por Simmel, como algo benéfico porque é o momento que sinaliza o desenvolvimento da tomada de consciência individual, que teria uma função positiva para sociedade como um todo, principalmente à medida que o conflito fosse superado mediante acordos.

Mas, Simmel a respeito do conceito de sreit (que é o termo traduzido como luta e conflito), porém o referido conceito é muito mais profundo que se pode extrair de uma leitura vestibular. O doutrinador alemão encerrou seu conceito de conflito como promotor de formas sociais, sendo considerado como virtuoso dado que permite que as partes envolvidas sejam colocadas num patamar de igualdade.

O conflito uma tensão de contrastes cadencia novas situações e arranjos interacionais, além de propiciar a riqueza de visões e versões das razões psicológicas.

A respeito do contexto de conflito de Simmel, comenta José Oliveira Alcântara Júnior in verbis: “(…) Os conflitos sociais são destacados como socialmente importantes”. São formas prevalecentes nas interações de convivência social. Simmel aponta uma das virtudes do conflito.

Este atributo positivo residiria no fato de que ele – o conflito – cria patamar, tablado social bem à semelhança de um palco de teatro, um espaço onde as partes podem encontrar-se num mesmo plano situacional e, desta maneira, impõe-se um nivelamento.

Uma condição necessária para que as partes, às vezes, ásperas e díspares possam, de fato, efetuar a trama que ele encerra. É um ato estipulador que em outro instante, permitirá a própria superação das dissimilitudes dos litigantes.

O conflito possui a capacidade de constituir-se num espaço social, em que o próprio confronto é o ato de reconhecimento e ao mesmo tempo, produtor de metamorfismo entre interações e relações sociais daí resultantes.

Uma outra característica positiva atribuída, residiria no fato de superar os hiatos e limites socialmente estabelecidos pelos intervalos dicotomizados, ou mesmo, as desigualdades sociais produzidas e estruturadas pelos resultados dos entrelaçamentos ocorridos na sociedade.

Para Simmel, o conflito é a substância existente nas mais diversas relações entre os indivíduos na sociedade. A positividade dos conflitos é endossada pela visão de unidade que fundamenta o eixo explicativo mais complexo.

Ao se associar as lutas aos referenciais negativos, talvez estejamos induzidos a uma determinada visão social de mundo Torna-se problemático atribuir valor negativo aos processos decorrentes do conflito, pois estaríamos desconhecendo de que o conflito é um dos componentes do processo civilizatório. Esse não apenas aniquila, antigas ou novas estruturas, ele (re) cria novas formas, ou as mantém sob determinadas condições.

Compreenda-se assim a importância das premissas de Simmel para o estudo do conflito para que se desmistifique de uma vez por todas a projeção de pacificação dos conflitos irredutivelmente não implica num entendimento de que os conflitos assim desnecessários aos grupos sociais.

O conflito é um fenômeno essencialmente cultural e através deste nasce a possibilidade de se inserir os personagens no mesmo plano de discussão e estar ciente que dele não é possível fugir, especialmente pela alavanca social, para fins já constitucionalmente previstos que é a solução pacífica de conflitos, coaduna com os objetivos propostos.

Assim, quem está na condição de mediador, árbitro, magistrado, promotor de política pública não pode ter a presunção de agir como se o litígio que diante de si se apresenta é uma mutação cancerígena social.

A primeira consideração sobre o conflito que se evidencia o fruto de uma interação social que em algum nível significará mudança em determinado grupo de pessoas ou para determinado indivíduo. A expectativa vai além das raias sociológicas e tangencia os meandros jurídicos.

A guisa de exemplo, o caso de um magistrado que esteja numa audiência judicial, e no momento apropriado para a conciliação, mundo dos conceitos saberá que a condução do litígio baseada no suporte teórico da sua compreensão o habilitará a não somente encerrar a lide, mas também o conflito. Deve haver um estímulo para haver a evolução social a ser mensurada diante de cada caso concreto.

Trata-se de juiz concentrado na gestão de conflito do que na lide em si, no âmbito processual onde está as partes, não o julgador, concretizando o que se pode chamar de democracia processual e o pluriprocessualismo[23].

Isto não significa que todos os atos do magistrado impliquem sempre a uma solução autocompositiva, dado que em certos casos a heterocomposição jurisdicional será inevitável, mas numa maturidade em saber tanger o conflito de forma que mesmo numa sentença haja em algum grau uma solução pacífica do litígio.

A lição de André Gomma Azevedo[24] é pedagógica ao constatar que progressivamente o juiz passa a ser mais que um prolator de decisões e sentenças para ser também um administrador de processos de resolução de disputar ou gestor de conflitos, analisando as demandas diante de circunstâncias e fatos concretos devem seguir para um processo autocompositivo (como exemplo, a mediação) e quais podem ser resolvidos por heterocomposição sem perda de legitimidade ao estímulo, à perpetuação da litigiosidade mesmo após o trânsito em julgado da decisão.

É interessante o ensino de François Ost[25] sobre os três modelos de Juiz: Júpiter, Hércules e Hermes. O primeiro é alheio às realidades sociais das partes, de orientação mais normativista e reflete um modelo de centralização de poder onde busca sempre em suas decisões assegurar a logicidade do sistema jurídico que opera, tendo a igualdade formal como um norte no tratamento intersubjetivo dos litigantes.

O Juiz Hércules inspirado pelo pensamento do realismo e da jurisprudência sociológica privilegia mais o fato do que a norma, de modo que esta deve ser adequada àquele. Conhecido por ser um verdadeiro engenheiro social opõe-se à tipologia jupiteriana pode dar azo a arbitrariedades e, igualmente, ter em si depositado todo o poder de construção da decisão jurídica e de estabilidade social.

O julgador Hermes[26], por sua vez, socorre-se da hermenêutica jurídica, argumentação e discurso jurídico para elevar os níveis de interação entre as partes e a relação processual.

É cônscio da necessidade de promover a cooperação e, por meio de um discurso racional e dialógico, procura integrar os sujeitos em contenda no contexto da pacificação social. Do contrário tem-se a mera composição da lide sem a devida pacificação social.

Spengler[27] ao utilizar a locução “tratamento de conflitos” ao invés de “resolução”, baseado na premissa sociológica de que os conflitos sociais e as suas causas não podem ser espargidas, eliminadas ou elucidadas pelo Judiciário e que o termo “tratamento” indicaria apenas uma resposta satisfativa ou medida terapêutica[28], mas não será ora aplicado.

Afinal o Judiciário não busca em si, dissipar as causas do conflito, mas por fim a ele mesmo. Isso não significa que você não possa pôr fim ao conflito, especialmente quando utilizadas as técnicas adequadas para que as partes saiam satisfeitas com as soluções propostas.

Seria até ilógico afirmar que mesmo após a atuação de um juiz mediador ou conciliador e houvesse a concordância plena dos envolvidos no conflito em encerrá-lo, mediante um processo racional de convencimento, que a disputa ainda permaneceria.

Ademais, as discussões sobre a exata terminologia que compatibilizem conceitos jurídicos e sociológicos levaria a uma percepção sem propósitos práticos, fim esse estranho ao presente texto.

Reconhece-se também que o referido processo psicossociológico proporcionará o acesso às razões suprajurídicas motivadoras das partes, tal qual terá sua postura diferenciada na condução do caso, razão pela qual pode fomentar um modelo cooperativo e consensual de processo em contraposição aos tradicionais comportamentos competitivos e fincados na cultura da sentença.

Existe o firme interesse de ir além da codificação e dos enunciados prescritivos e jurisprudenciais e dissipar a atitude negativista em relação ao conflito resultante de dimensão inexata de seus limites, desprestigiando o exercício de um direito fundamental assegurado constitucionalmente.

Por derradeiro, a noção de um caráter psicológico e ventilado pelas teorias psicológicas como também uma força motriz do conflito subsidia o manejo de situações adversas apresentáveis tanto nas peças judiciais como interrogatório das partes e oitiva de testemunhas.

4.Concepção moderna sobre o conflito.

A partir da segunda metade do século XX vieram as modernas concepções sobre o conflito adotar uma ótica microssociológica e na qual estão envolvidos os sujeitos determináveis ou determinados em contraposição à análise mais aberta defendida pelos sociólogos clássicos.

Há grande diversidade de teorias, escolas e pensadores que se distinguiram na condução da temática, mas se pode enquadrá-los, em dois grandes grupos, a saber: o condutismo (behaviorismo ou culturalismo) e a teoria macro (também conhecida como clássica).

Os condutistas foram liderados por Skinner[29], John Watson e Jacob R. Kantor, conforme a própria nomenclatura já indica detém-se no estudo da psicologia, de conduta realizando análise primária do comportamento individual em sobreposição a do conflito.

Tal corrente é mais que Psicologia Social[30] e reside na aprendizagem por condicionamento e a influência do ambiente no qual o sujeito está inserido.

Os condutistas privilegiam a observação do comportamento e, defendem a não consideração de elementos da ordem psicanalítica ou hereditária que falam ao consciente, processos mentais ou biológicos, não porque não existam, mas em face de serem pertinentes apenas ao campo da individualidade de cada ser humano. Para os condutistas, o conflito nada mais é do que um desdobramento do comportamento humano.

O behaviorismo[31] valoriza o papel do estímulo em determinada situação. O conjunto de resposta a determinado estímulo numa situação específica é chamado de comportamento.

O cerne desta corrente não se situa na ordem propriamente psíquica, mas sim, de reforços dados aos indivíduos.

Nesse sentido com a aplicação da Teoria de Skinner, por exemplo, para que possa compreender um conflito determinado e desencadeado numa relação social, é necessário que se saiba quais são os estímulos específicos dispensados aos atores. De modo que sempre estimulados da mesma forma específica, se obtenha o mesmo resultado.

Desta forma, se pode prever e se evitar os conflitos no futuro, tal qual perscrutar quais tipos de estímulos expõem a gradação de intencionalidade dos que divergem com o fito de eleger a melhor técnica de composição da controvérsia.

Por outro lado, os defensores da Teoria Macro atraem para o centro de sua análise o relacionamento entre os indivíduos e as influências deste na eclosão de conflitos e sua consequente resolução, aliado aos mais diversos fatores exógenos ou endógenos do conflito e não meramente comportamental, conforme defendiam os condutistas.

Portanto, as variáveis sociais e outras eu envolvam a aplicação da noção de ator racional são estudadas pelos clássicos, envolvendo não somente inflexões comportamentais e, sim, uma acepção de conceitos de negociação e oportunidade para tomada de decisões.

Para entender a tese de Skinner[32] verifica-se in litteris: “Suponha-se uma lide entre o autor “A” e o réu “B” que tenha por objeto a discussão sobre a demarcação de um imóvel rural com 10 hectares adquirido mediante a herança do genitor. O réu “B” alega que adquiriu dois hectares do bem quando seu proprietário ainda vive, o vendeu mediante compra e venda sem contrato formal, mas operacionalizada mediante a posse”.

Sabe-se que “A” pertence à família nos moldes tradicionais com origem ortodoxia, religiosa e adepta da defesa, da entidade e nome familiar.

Com a deflagração do conflito e até o momento da audiência judicial de conciliação, “B” insiste em inserir um estímulo em “A” no sentido de que sua família “não tem palavra”.

Nos termos da teoria comportamentalista como A está inserido num meio cujo condicionamento é de que aqueles ali presentes são influenciados e manterem uma posição defensiva em relação aos membros da família é natural que um estímulo de agressão a esse valor repercuta negativamente e induza “A” a um conjunto de reações comportamentais que o façam resistir a “B’.

Esse comportamento pede incluir a dificuldade em se praticar uma postura dialógica de compor o conflito. Cabe ao magistrado identificar esse elemento e expurga-lo na medida do possível, visando remover os obstáculos para a pacificação do conflito.

Quando era vigente a divisão do mundo entre duas grandes potências após o fim da segunda grande guerra mundial, o comportamento das nações vencedoras em relação as conquista fora totalmente redefinido.

Diferentemente do que havia ocorrido com a Alemanha na Primeira Grande Guerra Mundial, os países vencidos, ou seja, a Itália e o Japão, não precisavam mais pagar o humilhante preço da derrota.

Ao revés, após 1945 foram alvos prediletos de planos de recuperação devido aos resultados danosos do conflito mundial. Inaugurava-se desta forma, um novo imperialismo, não mais caracterizado pela agressiva ocupação física e bélica dos derrotados e, sim, imposto pela ocupação de influência, sendo menos onerosa e bem mais eficaz, além de duradoura.

Nesse cenário, a cultura norte-americana, disseminada através da expressão “american way of life” seria a arma mais poderosa, até mais que as duas bombas atômicas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki.

O cinema fora muito bem manejado no sentido de servir como meio apropriado para transmitir mundialmente os valores e a cultura dos Estados Unidos da América.

No filme Beleza Americana o modo norte-americano de viver está presente e vivo no script, nas falas e atitudes dos personagens, bem como na organização da imagem exibida e também nos enquadramentos e montagem.

O filme representa uma crítica contundente e irônica ao american way of life. A narrativa gira em torno de um homem de meia idade que, de certa forma, já se considerava morto. Casado com uma mulher, corretora de imóvel, obcecada pela ideia de projetar sempre uma imagem sucesso.

O personagem é pai de uma típica adolescente  americana, sendo corroído diariamente pelo tédio e frustração, vivendo em plenas aparências.

Já na primeira sequência do filme, o protagonista já se mostra se masturbando durante o banho, o momento que o próprio personagem considera ser o ápice de seu dia.

Após, é possível visualizar o personagem observando a esposa quando descobre o passado e se reconhecia feliz. Depois, enfoca-se a filha do casal que está realizando busca na internet sobre possibilidades cirúrgicas de aumento de seios.

O próprio pai a descreve como uma adolescente típica. Irritada, insegura e confusa. E, eu acrescentaria, medonhamente irritante.

Percebe-se que o protagonista está explicitamente insatisfeito com sua vida, e tenta reverter a situação de forma irracional E, sua primeira atitude é demitir-se do emprego que considera medíocre.

Mais, tarde, se vê apaixonado pela melhor amiga da filha, começa a consumir drogas e malhar, o que caracteriza uma redescoberta das maravilhas do mundo adolescente.

Ao se demitir de emprego que mantinha por quatorze anos, o protagonista rompe com o principal princípio moral norte-americano, onde há a exaltação ao trabalho, que deve ser realizado com determinação e afinco. Na carta de demissão o protagonista, chega a ridicularizar o referido princípio.

Já na personagem Jane é fácil constatar a desvalorização do ideal norte-americano, e vê como ingratidão o fato de sua filha não dar valor aos bens materiais que possui.

Percebe-se que a adolescente é, então, o elemento de choque, que vai a contra ao princípio de valorização de sucesso material.

O filme acentua o mecanismo de desconstrução dos ideais do american way of life, e reúne as principais causas dos conflitos que trafegam na trama , quando o protagonista é assassinado, quando momentos antes, quando é tomado por um saudosismo.

O principal conselho é o de apreciar as coisas simples da vida enquanto é tempo, aliás, o protagonista é o único personagem que tem atitude otimista em relação às pequenas felicidades.

Analisando pelo viés moderno da teoria dos conflitos é possível identificar a desconstrução de vários preceitos norteadores da cultura e valores morais norte-americanos.

Mas, através da desconstrução, acaba por reafirmá-los, pois a morte do protagonista pode ser vista como forma de castigo ao personagem que cometera tantos e sucessivos atos imorais no decorrer do filme.

Pareceu-me mais adequado adotar a teoria macro para possível resolução do conflito por considerar os diversos fatores exógenos ou endógenos, do conflito, não meramente comportamental conforme defendiam as teorias condutistas. (In: BELEZA AMERICANA. Direção de Sam Mendes. Jinks/Cohen Company, 1999: DreamWorks International Distribution L.L.C (117 min.), SKLAR, Robert. História social do cinema americano. São Paulo: Cultrix, 1978. )

Conclui-se que uma única teoria não é suficiente para prever todas as condutas, comportamentos e reações das partes, especialmente em conflito, em face da diversidade de elementos envolvidos num embate que transcende à capacidade de se prever o número de probabilidades de ações.

É recomendável a customização contínua e progressiva (e também dinâmica) das técnicas para serem usadas pelo mediador, árbitro, conciliador ou juiz e trazer os fundamentos existentes em outras teorias.

Outro filme que serve de análise é Guerra dos Roses onde o personagem Barbara quer o divórcio, mas o problema crucial é decidir com quem fica a luxuosa mansão, pois ninguém quer ceder em nada.

O advogado de Olivier oferece conselhos, porém é tarde demais. E, o conflito do casal protagonista envolve uma série de sentimentos como o de ódio e vingança.

O casal Oliver e Barbara Rose se conheceu num leilão, e como todo par romântico, houve instantânea atração mútua e os dois ficarem atraídos e apaixonados um pelo outro, culminando no casamento.

Como quase todo casal em início de conjugalidade, começam com dificuldades financeiras, porém o amor é hábil a fazer superar os entraves. Mais tarde, o casal teve dois filhos, sendo um menino e uma menina e continuavam a lutar bravamente por dias melhores.

O tempo passa, os filhos cresceram e enfim, o casal consegue melhorar de vida, e todo o dinheiro que ganhavam era investido no conforto familiar, e na bela mansão.

Mas, o inexorável aconteceu e Barbara não mais se sente atraída por seu marido, e o casal passaram a conviver apesar na mesma casa, mas sem cumprir as obrigações carnais peculiares do casamento, como pelo menos o respeito e lealdade.

E, nesse momento, se vislumbra uma coincidência entre o primeiro filme abordado Beleza Americana onde também o casal vive distanciado e de aparências. Assim como os Roses.

De certa feita, Oliver adoeça e vai para um hospital e fica internado e recomenda avisar a esposa, e ela tem uma decepção ao perceber que já está tudo bem com o marido e, que não morrera.

E, de repente, ela passou a perceber que não tinha mais sentimentos afetivos em relação ao esposo.

Os filhos do casal protagonista passaram a estudar em outra cidade e vida do casal se torna progressivamente mais insuportável, até que Bárbara revela a Oliver que não o ama, mas e deseja a separação.

Oliver então recorre aos conselhos de seu advogado no sentido de buscar a melhor forma de compor a situação, e este indicou, que nenhum dos dois saísse da casa, o que inaugura uma autêntica guerra dos Roses.

Durante a dita guerra há cenas hilárias e até nojentas como quando Oliver urina dentro das panelas de um jantar de negócios oferecido por Barbara, o que a deixa constrangida e enfurecida. Ao ponto de destruir o carro que Oliver tanto estima, tanto os convidados como a vizinhança representam a plateia do espetáculo bizarro de ódio e destruição.

Com a guerra decretada e em andamento, há perspectiva de se destruir tudo que existe dentro da tão valiosa mansão dos Roses.

Então, mais uma vez, o advogado do Oliver intervém, e aconselha o cliente a deixar a mansão, informando que existem mecanismos legais capazes de resolver a situação e resguardar seus direitos.

Porém, Oliver finca pé, e fica irredutível.

Acontecem todas as agressões possíveis, desde violência verbal até a física. Vindo Oliver a insistir e se declarar romanticamente para Barbara.

O engraçado é que diante de uma situação de perigo, quando Barbara fica pendurada por um lustre, e Oliver tenta ajudá-la, mas também fica preso, e que as cordas começam a ceder e diante daquela situação, Oliver tenta convencer a mulher a parar com tudo, mas não adianta.

O interessante é que a mediação proposta por Luís Alberto Warat[33] que aposta na alteridade e na outridade como forma de transformação dos conflitos, e na construção e desconstrução dos conflitos é também pertinente à aplicação de Morton Dewey e, ainda, propiciar o aprender a partir do conflito, reeducando comportamentos, interesses e convivências.

Conclui-se que existem várias formas de um casal optar pela separação e a mediação de família leva em conta que ninguém é obrigado a estar e manter-se vinculado a outra pessoa, se assim não o quiser, ademais, a partilha de bens pode ser feita em separado e não é necessário morar juntos para a preservação de bens.

É possível identificando as causas do conflito, prover a melhor forma de resolução amigável e buscar a melhor situação para ambos respeitando simultaneamente a vida, a dignidade e o patrimônio.

5. Conclusão

O presente texto só permitiu um conhecimento breve, mas não exaustivo em face da farta literatura existente. De fato, a aquisição mental de tais conhecimentos pode determinar o começo de uma nova cultura, a cultura da paz e da consensualidade, onde o consenso e o diálogo substituem a batalha judicial e a adversidade entre as partes,

É possível afirmar que no procedimento de customização das técnicas de mediação e de composição das lides, é cada vez mais intuitivo e menos tecnicista.

Reforçando que o Direito como ciência não pode ignorar, o auxílio precioso das ciências auxiliares no processo de compreensão das demandas, principalmente a Sociologia do Direito, na ramificação da Sociologia do Conflito[34] o que permite uma boa anamnese dos conflitos sociais reduzindo a função jurisdicional para os casos realmente necessários galgando-se, finalmente, a efetiva pacificação dos conflitos.

Na mediação as partes envolvidas se convencem qual é a melhor solução e trilham um procedimento de cooperação e mútuo entendimento e, respeito, que poderá servir de exemplo educativo e trazer fatalmente a justiça para o caso concreto.

O conflito em sua trajetória evolutiva conceitual saiu da negação de cooperação chegando à compreensão epistemológica polissêmica e capaz de equalizar os agudos problemas sociais através de debates dirigidos e redimensionados para apurar suas verdadeiras causas e construir soluções possíveis e legitimadoras.

Conclui-se também que o perfil ideal do julgador contemporâneo deve ser o propenso à mediação e a conciliação, devendo considerar as teorias tanto de ordem funcionalista como as teorias do conflito social, porém, atentando para a necessidade de recorrer às quaisquer tentativas para enfrentar o dissenso transcendendo a noção de anomalia social.

Há de ser ter em mente as mais modernas teorias amparadas nas avaliações comportamentais nas ações conflitivas. Também é possível haver a aplicação da teoria dos jogos pode trazer suporte teórico nos moldes de consensualidade, em face da lógica e binômio inspirador e ganhador/ganhador.

E o CPC/2015 veio introduzir um referencial importante para a constituição da cultura da paz, impondo como primeira audiência das partes a de mediação ou conciliação.

Todo conhecimento advindo das mais diversas searas é muito bem vindo para a construção de uma sólida base teórica sobre os conflitos principalmente pela sortida variedade de abordagens das diferentes teorias do conflito que tentam aplacar a carência de efetividade e celeridade processual, trazendo a desesperança e o descrédito ao Judiciário brasileiro.

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Autora: Gisele Leite



[1] Mas, uma indagação intriga-nos: a valorização dos meios autocompositivos significa a perda de prestígio do julgamento (como meio de composição da lide)? (grifo meu)

Há muito tempo já se verifica o intenso desgaste da função pública estatal de conhecer, processar e julgar os litígios expostos ao Estado-juiz.

Ou seja, o exercício da jurisdição brasileira nos remete ao questionamento se o método de resolução de controvérsias não seria demasiadamente burocrático, lento, pesado e complexo. Dotado de exagerado decisionismo e envolvendo os sujeitos do conflito, revelando grande insatisfação e de frustração dos jurisdicionados e a ensejar a utilização indiscriminada de recursos. (In: LEITE, Gisele. A autocomposição da lide em face do Novo Código de Processo Civil Brasileiro. Disponível:  http://www.prolegis.com.br/a-autocomposicao-da-lide-em-face-do-novo-codigo-de-processo-civil-brasileiro/ Acesso em 18.10.2016).

[2] Si vis pacem, para bellum é provérbio latino (de autoria de Publius Flavius Vegetius Renatus) que significa que “se quer paz, prepare-se para a guerra”, o que geralmente é interpretado como uma paz através da força, pressupondo que uma sociedade forte será menos apta a ser atacada por inimigos. Esse mesmo provérbio foi utilizado por um fabricante alemão de armas Deutsche Waffen und Munitionsfabriken (DWM) para designar a sua pistola Parabellum.

[3] Desde o começo do século passado, começaram a surgir teóricos que questionavam a distinção entre pensamento e linguagem. Cogitaram se é possível a existência de pensamentos fora da linguagem? Você consegue pensar algo que não seja num conjunto de expressões linguísticas? Ainda que você consiga pensar, essa ideia não será transmissível a outras pessoas, pois a linguagem é o nosso único meio de comunicação. Dessa forma, terminou-se por considerar que a linguagem não é apenas um instrumento de transmissão de pensamentos, mas que existe uma ligação mais profunda entre esses dois elementos. Com isso, o problema da linguagem fora elevado de uma questão de pouca relevância para uma questão filosófica fundamental. Wittgenstein, um dos iniciadores da filosofia analítica que tanto se concentrou no estudo e análise da linguagem, acerca daquilo de que não se pode falar, tem que se ficar em silêncio, ou seja, acerca daquilo que não cabe em palavras, a ciência e a filosofia não têm nada a dizer.

[4] É neste sentido que Ulpiano nos diz: ubi homo ibi societas; ubi societas, ibi jus, que significa, onde está o homem, aí está a sociedade; onde está a sociedade, aí está o direito.  A segunda forma: quid sit iuris, o que é o direito em seu sentido particular, perene, histórico, determinado no tempo e no espaço, positivo, tipificado nos códigos, nas constituições etc. Entende-se que o “direito é a forma, que procura atualizar o conteúdo que é a justiça”, contudo, forma e conteúdos entendidos de maneira dinâmica, atualizando-se no tempo e no espaço.

[5] A banalização dos conflitos de interesses gera a desestabilidade social e diversas formas de violência, uma vez que sem o acesso à Justiça, a sociedade busca formas alternativas de solução, nem sempre dotadas de ética e orientadas pelos caminhos legais. Surge daí, o fenômeno da litigiosidade que é componente perigoso para a estabilidade social visto que já acena seus sinais de deterioração do sistema de resistência da população em solucionar os problemas do cotidiano de forma amigável sem litígio judicial, problema que se revela preocupante na demanda reprimida ou litigiosidade contida oriunda de conflitos de interesses não solucionados.

Com criação dos Juizados Estaduais, Federais e da Fazenda Pública veio a diminuir a litigiosidade contida, porém, criou uma litigiosidade exacerbada. A maior facilidade de acesso à justiça vem ampliar a litigiosidade contida, conforme definiu Kazuo Watanabe. A litigiosidade exacerbada é o contraponto lógico da litigiosidade contida.

[6] O farol de Alexandria era uma torre que foi construída em 280 a.C., na ilha de Faros, situada na baía da cidade egípcia de Alexandria e ligada por mar ao porto para servir como marco de entrada para o porto, e, posteriormente como um farol. Foi considerada uma das maiores produções da técnica da Antiguidade Clássica, e construído pelo arquiteto e engenheiro grego Sòstrato de Cnido a mando de Ptolomeu II do Egito. Foi considerado uma das sete maravilhas do mundo antigo tendo sido destruído por um terremoto em 1323. Autoridades do Egito afirmaram no final de 2015 que transformariam as ruínas subterrâneas da antiga Alexandria, incluindo o farol, em museu subaquático.

[7] O estudo dos jogos a partir da concepção matemática remonta pelo menos ao século XVII com a contribuição de Pascal e Fermat. A teoria da probabilidade, que mais tarde fundamentou o desenvolvimento da estatística e mesmo da ciência moderna. Contemporaneamente os filósofos concordam sobre a impossibilidade de que se tenha a certeza absoluta sobre qualquer objeto de estudo. O princípio da causalidade que sistematizava, assim como o determinismo, as bases da ciência do início do século XX e, fora substituído pela noção de que a certeza não é absoluta, mas apenas uma probabilidade.

[8] Estamos condenados a ser livres, essa é assertiva de Jean-Paul Sartre para a humanidade. O filósofo e escritor francês ao lado do argelino Albert Camus foi um dos maiores representantes do existencialismo. Tal corrente filosófica inspirada em Kierkegaard vem a refletir sobre o sentido que o homem dá à própria vida. Destacou Sartre que a existência humana vem antes da sua essência. Portanto, não nascemos com uma função pré-definida, como uma tesoura, que foi feita para cortar, por exemplo.

O problema de nossos projetos pessoais é que entram em conflito com o projeto de vida dos outros. Eles, os outros, tiram parte de nossa autonomia. Por isso, temos que refletir sobre nossas escolhas para não sair agindo sem rumo, deixando de realizar as coisas em vão, e deixando de definir a existência de cada um. Mas, é pelo olhar do outro que reconhecemos a nós mesmos, com erros e acertos. Já que a convivência expõe nossas fraquezas, os outros são “o inferno”, daí a origem da célebre frase do pensador existencialista francês. O contexto desta frase era uma França devastada pela Segunda Grande Guerra Mundial onde a liberdade não era exatamente a palavra do momento. E, as ideias de Sartre inspiraram uma geração de ativistas, como os revolucionários de Paris, em maio de 1968, que colaboraram a derrubar o governo conservador francês da época.

[9] O referido enfoque mira os valores e explica que os conflitos sobre a qualidade, predominam sobre a análise dos produtos e/ou usuários, trazendo um enfoque de marketing, ou ainda, outro enfoque baseado na fabricação. O conflito é útil para cultivar tais perspectivas diferentes que são essenciais para a introdução bem sucedida de aperfeiçoamento econômico-social e político da humanidade.

[10] Aliás, convém salientar o conceito de conflito psíquico como algo constitutivo do sujeito que pode ser descrito como a oposição de exigências internas contrárias. Apresentou Freud o conflito como um dualismo praticamente irredutível. É sempre considerado e, portanto, é disposto de diferentes formas: entre o desejo e a censura, entre os sistemas e instâncias, entre pulsões e como conflito edipiano. O conflito psíquico guarda estreita relação com o processo de defesa.

[11] Mas, para o processo penal o conceito de lide se mostra problemático, pois duas correntes doutrinárias se assanham explicá-la. A primeira corrente defende ser o litígio exteriorizado no conflito entre o direito de punir do Estado e o direito de liberdade do indivíduo, este consubstanciado no princípio da não culpabilidade. Já a segunda corrente, afirmar não existir lide no processo penal por ter finalidade diversa da constante no processo civil. E, ainda existe uma parcela da doutrina que ainda defende a inexistência da lide tanto na seara cível como na penal, por não ser inerente ao exercício da jurisdição.

[12] O conflito se estabelece por meio da inerência da sociedade no indivíduo e se mantém pela capacidade que o ser humano tem de se dividir em partes, colocando-se em uma relação conflituosa entre as partes do seu eu que se sentem como ser social e os impulsos não absorvidos por este caráter: “o conflito entre a sociedade e o indivíduo prossegue no próprio indivíduo como luta entra as partes de sua essência”.

Sendo o conflito inerente à relação social, podemos aprofundar esta análise simmeliana nos textos da coletânea de Evaristo de Moraes Filho “O conflito” e “A natureza sociológica do conflito”. Paralelamente, o ensaio “O conceito e a tragédia da cultura”, da coletânea organizada por Jessé Souza, pode lançar novas luzes sobre o cultivo do indivíduo e a relação que se estabelece entre os níveis social e individual, neste caso através do conceito de cultura.

[13] O antropólogo pode decidir disputas judiciais baseando-se, por exemplo, na visão etnográfica, às vezes voltada para a compreensão de apenas uma das partes e sem treinamento adequado para equacionar conflitos, ou o jurista avaliando o sentido normativo e o significado de práticas sociais diversas a partir de parâmetros jurídicos locais.

[14] Para Thompson apud Lucena Filho  o conflito de interesses é a situação na qual o julgamento de um profissional acerca de um interesse primário tende a ser influenciado inadequadamente por um interesse secundário. O autor afirma que há uma concordância a respeito de que, de maneira geral, os interesses primários estão relacionados ao dever profissional de proporcionar saúde ao paciente, à integridade na realização de pesquisas e à educação médica.

[15] Thomas Hobbes (1588-1679) foi matemático, teórico político e filósofo inglês. Autor de Leviatã (1651), Do cidadão (1651). E explanou seus pontos de vista sobre a natureza humana e sobre a necessidade de um governo e de uma sociedade fortes. No estado natural, embora alguns homens possam ser mais fortes ou mais inteligentes do que os outros, nenhum se ergue tão acima dos demais de forma a estar isento do medo de que o outro homem lhe possa fazer mal. Por isso cada um de nós tem direito a tudo e, uma vez que todas as coisas são escassas, existe uma guerra constante de todos contra todos (Bellum ominia omnes). No entanto, os homens têm um desejo, que é também em interesse próprio, de acabar com a guerra e, por isso, formam sociedades através de um contrato social.

E, segundo Hobbes, tal sociedade necessita de uma autoridade a qual todos os membros devem render o suficiente da sua liberdade natural, de forma que a autoridade possa assegurar a paz interna e a defesa comum. Este soberano, quer seja um monarca ou uma assembleia deveria ser o Leviatã, uma autoridade inquestionável. A teoria política do Leviatã mantém no essencial, as noções de suas obras anteriores, “Os elementos da lei” e “Do cidadão” (em que tratou a questão das relações entre a Igreja e o Estado). Hobbes defendeu a noção segundo a qual os homens só podem viver em paz se concordarem em submeter-se a um poder absoluto e centralizado.

[16] Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (1798-1857) foi filósofo francês, fundador da Sociologia e do Positivismo que trabalhou intensamente na criação da filosofia positiva. A filosofia positiva de Comte nega que a explicação dos fenômenos naturais, assim como sociais, provenha de um só princípio.  A visão positiva dos fatos abandona a consideração das causas dos fenômenos (Deus ou natureza) e pesquisa suas leis, vistas como relações abstratas e constantes entre fenômenos observáveis.

[17] Ralf Gustav Dahrendorf (1929-2009) foi sociólogo, filósofo e politico alemão radicado no Reino Unido. Em 1957, já depois da sua primeira publicação e com 28 anos de idade, foi convidado para passar um ano no Center for Advanced Study in the Behavioural Sciences, em Palo Alto, na Califórnia. Foi ali colega de Fritz Stern e conheceu entre outros os economistas Milton Friedman, George Stigler, Kenneth Arrow e Robert Solow, todos eles laureados com o Prémio Nobel da Economia. Foi depois professor de sociologia em Hamburgo, Tubinga e Constança.

Entre 1969 e 1970 foi deputado no parlamento alemão pelo Freie Demokratische Partei (Partido livre democrático) (FDP), os liberais alemães, e secretário de Estado no Ministério de Negócios Estrangeiros. Em 1970 tornou-se comissário na Comissão Europeia em Bruxelas. Entre 1974 e 1984 ele foi professor da London School of Economics, onde foi também foi diretor, e entre 1987 e 1997 Decano do St. Anthony’s College na Universidade de Oxford.

Em 1993 ele recebeu o título de lorde da rainha Elizabeth II da Inglaterra, tendo sido feito Barão Dahrendorf of Clare Market na City of Westminster. Pertence desde então à câmara alta do Parlamento britânico (Westminster).

[18] John Stuart Mill (1806-1873) foi filósofo e economista britânico e um dos pensadores liberais mais influentes do século XIX. Defensor do utilitarismo, a teoria ética proposta inicialmente por seu padrinho Jeremy Bentham. Na obra “Ensaio sobre a liberdade” se refere à natureza e aos limites do poder que pode ser exercido legitimamente pela sociedade sobre o indivíduo.  Veio a desenvolver com maior precisão do que qualquer anterior filósofo o princípio do dano. O princípio do dano assegura que cada indivíduo tem o direito de agir como quiser desde que suas ações não prejudiquem as outras pessoas. Se a ação afeta diretamente apenas a pessoa a que está realizando, então a sociedade não tem o direito de intervir, mesmo que se tenha a sensação de que o indivíduo esteja se prejudicando. Afirmou que o despotismo é forma de governo aceitável em sociedades que são atrasadas, porque nestas se observam as barreiras para o progresso espontâneo. O déspota, porém, deve estar revestido e imbuído de bons interesses.

Inspirado por Auguste Comte, Stuart Mill considerou uma alternativa a religião tradicional a religião da humanidade, na qual há uma humanidade idealizada que se torna objeto de reverência e as características moralmente úteis da religião tradicional são supostamente purificadas e acentuadas. A humanidade se torna uma fonte de inspiração ao ser colocada imaginativamente dentro do drama da história humana, que tem um destino ou ponto, ou seja, a vitória do bem sobre o mal. Aliás, Mill colocou, a história como um desdobramento de um grande épico ou ação dramática que termina na felicidade ou miséria, na elevação ou degradação da ração humana. É conflito constante entre o bem e os poderes do mal, dos quais cada ato feito por qualquer um de nós, insignificantes como somos, constitui um dos incidentes. Quando começamos a nos enxergar como participantes desse drama maniqueísta, combatendo ao lado de Sócrates, Newton e Jesus para assegurar a vitória final do bem sobre o mal, os tornamos capazes de maior simpatia e um sentido enobrecido do significado de nossas vidas.

[19] Sun Tzu (544 a.C. – 496 a.C.) foi general, estrategista e filósofo chinês, é muito conhecido por sua obra A Arte da Guerra, composta de apenas treze capítulos de estratégias militares. Também pode ter o nome grafado como Sunzi, foi uma figura histórica cuja existência é questionada por vários historiadores. Tzu significa mestre. Viveu no Período das Primaveras e Outonos da China (722 a.C. até 481 a.C.) como general do Rei Hu Lu. Durante os séculos XIX e XX, A Arte da Guerra de Sun Tzu, ganhou grande popularidade sendo adaptado na prática pelo mundo Ocidental, continuando os seus trabalhos a influenciar as culturas e políticas tanto dos mundos Asiático como do Ocidental.

Alguns historiadores duvidam da existência de Sun Tzu e da data habitual atribuída à sua obra, A Arte da Guerra. O seu cepticismo é alimentado por diversos fatores que incluem possíveis incorreções históricas e anacronismos no texto, tal como a possibilidade da execução das concubinas favoritas do rei. Este cepticismo, que por vezes leva a uma negação total da existência de uma figura histórica de nome Sun Wu (Sun Tzu), tem originado acesos debates entre cépticos e tradicionalistas, em especial na China. A atribuição da autoria desta obra varia entre os historiadores: desde Sun; a um estudioso Chu Wu Zixu; um autor desconhecido; uma escola de pensamento em Qi ou Wu; Sun Pin; e outros.

[20] Karl Emil Maximilin Weber (1864-1920) foi intelectual, jurista e economista alemão sendo também considerado um dos fundadores da Sociologia. Sur irmão fora igualmente famoso o sociólogo e economista Alfred Weber. É considerado um dos fundadores do estudo moderno da sociologia, mas sua influência também pode ser sentida na economia, na filosofia, no direito, na ciência política e na administração. Começou sua carreira acadêmica na Universidade Humboldt de Berlim e, posteriormente, trabalhou na Universidade de Freiburg, na Universidade de Heidelberg, na Universidade de Viena e na Universidade de Munique.  Personagem influente na política alemã da época foi consultor dos negociadores alemães no Tratado de Versalhes (1919) e da comissão encarregada de redigir a Constituição de Weimar. Grande parte de seu trabalho como pensador e estudioso foi reservado para o estudo do capitalismo e do chamado processo de racionalização e desencantamento do mundo.  Mas seus estudos também deram contribuição importante para a economia. Dentre as influências que a obra de Weber manifesta, podemos enxergar também seu diálogo com filósofos como Immanuel Kant e Friedrich Nietzsche e com alguns dos principais sociólogos de seu tempo, como Ferdinand Tönnies, Georg Simmel e Werner Sombart, entre outros.

[21] Georg Simmel (1858-1918) foi sociólogo alemão. Professor universitário admirado por seus alunos, sempre teve dificuldade em encontrar um lugar no seio da rígida academia do seu tempo. Bem antes do tratado sociológico de Max Weber – Economia e Sociedade, a Alemanha já conhecia o desenvolvimento consistente de uma discussão epistemológica voltada para a determinação do objeto, métodos e temas da ciência sociológica, reunindo diversos escritos produzidos em momentos anteriores.  Simmel desenvolveu a sociologia formal, ou das formas sociais, influenciado pela filosofia kantiana (o neokantismo era uma corrente muito forte na Alemanha da época) que distinguia a forma do conteúdo dos objetos de estudo do conhecimento humano. Tal distinção pretendia tornar possível o entendimento da vida social já que no processo de sociação (Vergesellschaftung, termo que cunhou para o estudo da sociologia) o invariante eram as formas em que os indivíduos se agregavam e não os indivíduos em si.

Os processos qualitativos, no entanto, que assumiam tais formas também deveriam ser estudados pela sociologia geral, subproduto da formal, como a concebia Simmel. O autor não conferia aos grupos sociais unidades hipostasiadas, supervalorizadas com relação ao indivíduo (um distanciamento seu com relação à Durkheim, por exemplo). Antes via neste o fundamento dos grupos, daí que as formas para Simmel constituem-se em um processo de interação entre tais indivíduos, seja por aproximação, seja pelo distanciamento, competição, subordinação, etc.

As principais formas de sociação estudadas por Simmel em sua obra são: a determinação quantitativa do grupo: investigação entre o número de indivíduos no seio das formas de vida coletiva, ou seja, o modo como o aspecto quantitativo afeta o tipo de relação social existente. Neste tópico, Simmel mostrou que estar isolado, em uma relação exclusiva entre duas pessoas e, por fim, entre três, produz diferentes tipos de interação entre as pessoas.

Dominação e subordinação: as relações de poder não são unilaterais e é preciso explicar como as formas de comando e obediência estão relacionadas. Dentre os tipos de relação de poder, Simmel destacou a obediência do grupo a um indivíduo, a dominação do grupo ou a dominação de regras impessoais.

O conflito: os indivíduos vivem em relações de cooperação, mas também de oposição, portanto, conflitos são parte mesma da constituição da sociedade. Seriam momentos de crise, um intervalo entre dois momentos de harmonia, vistos, portanto, numa função positiva de superação das divergências. Influenciou assim as concepções do conflito presentes na obra de Lewys Coser e Ralf Dahrendorf. Pobreza: constitui um tipo de relação na qual o indivíduo acha-se na dependência de outros, provocando, ao mesmo tempo, a necessidade de assegurar o socorro social.

A individualidade: ela pode ser de dois tipos. Sua forma quantitativa significa que todo indivíduo possui a mesma dignidade formal, ou seja, são iguais entre si. Mas, do ponto de vista qualitativo, todos procuram afirmar sua singularidade, sua personalidade, diferenciando-se dos demais. (grifo meu)

[22] A obra “Microssociologia” foi escrita em 1908, a Filosofia do Dinheiro pode ser considerada como um dos grandes tratados que analisaram sociologicamente a vida moderna, como O Capital de Karl Marx, A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo de Weber e A Divisão do Trabalho Social, de Durkheim. Dividido em duas partes, este escrito realiza uma ampla abordagem fenomenológica do dinheiro e a partir deste, vai desenhando sua influência e sua relação com os elementos centrais da sociedade contemporânea. (In: Infopedia. Artigos de apoio. Georg Simmel. Disponível em:  https://www.infopedia.pt/$georg-simmel Acesso em 20.10.2016).

[23] O pluriprocessualismo conforme aduz André Gomma de Azevedo busca-se um ordenamento jurídico processual no qual as características intrínsecas de cada processo são utilizadas para se reduzirem as ineficiências inerentes aos mecanismos de solução de disputas, na medida em que se escolhe um processo que permita endereçar da melhor maneira possível à solução da disputa no caso concreto.

Para a distribuição de justiça que se revela fundamental a existência de um sistema pluriprocessual ou sistema multiportas de enfrentamento de disputas, configurado pela presença no ordenamento jurídico brasileiro de diversos mecanismos diferenciados para o tratamento adequado dos conflitos, de acordo com as circunstâncias de cada situação.

[24] André Gomma de Azevedo é juiz de Direito no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. É autor de vários Manuais de mediação e conciliação do CNJ. Vide suas obras:

AZEVEDO, André Gomma (Org.). Estudos em arbitragem, mediação e negociação. Brasília: Brasília Jurídica, 2002.

_____________ (Org.). Estudos em arbitragem, mediação e negociação. Brasília: Grupos de Pesquisa, 2003. v. 2.

_____________ (Org.). Estudos em arbitragem, mediação e negociação. Brasília: Grupos de Pesquisa, 2004. v. 3.

_____________(Org.). Manual de mediação judicial. 2. ed. Brasília/DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 2010.

_____________ Autocomposição e processos construtivos: uma breve análise de projetos piloto de mediação forense e alguns de seus resultados. In: ______ (Org.). 2004. v. 3.

[25] O barão François Ost nascido em 17 de fevereiro de 1952 é advogado e filósofo do direito. É vice-reitor da Universidade de Saint-Louis em Bruxelas, onde também leciona direito e filosofia do direito. Recebeu em 2001 da Universidade de Nantes, o título de Doutor Honoris Causa.

[26] O belga François Ost em 31.10.2013 em Porto Alegre tratou do tema: Vigiar, punir, perdoar. Direito e variações literárias. O argumento desenvolvido pelo jurista é bem conhecido, não há um único modelo capaz de descrever toda a complexidade que abarca a função de magistrado na contemporaneidade.

Seja pelo viés operacional, seja pela pluralidade de teorias disponíveis para retratar o fenômeno jurídico.

Não é possível cogitar em único modelo de juiz, a partir dos três arquétipos, representam-se as possibilidades de enquadramento da atividade judicante seriam Júpiter, Hércules e Hermes.

O juiz Júpiter é aquele que desempenha sua atividade interpretativa tendo como pressuposto a crença absoluta na teoria do ordenamento jurídico que remonta a Kelsen. Assim a atividade do legislador estabeleceria a atividade interpretativa do juiz.

Por outro lado o juiz Hércules é o que reúne os elementos que caracteriza a postura interpretativa observada no chamado realismo jurídico. Sendo responsável simultaneamente pela decisão do caso concreto litigioso e pela criação da norma jurídica que seria a este aplicado. Não haveria um compromisso em descobrir o direito que as partes tinham no momento da instauração do conflito. Ao contrário, o juiz Hércules, cria a regra no momento da decisão do caso concreto e a aplica. Ost reconhece que a descrição que faz do juiz Hércules é diferente daquela que ficou famoso com Dworkin. Pois o juiz Hércules para Dworkin é antirrealista e, ao mesmo tempo, antijupiteriano.

Já o arquétipo do juiz Hermes seria o modelo mais adequado para o chamado direito pós-moderno, que faz a mediação entre os deuses e os mortais, traduzindo a linguagem divina em humana e, vice-versa. O juiz Hermes é o que hábil a dialogar com todos os códigos e valores que configuram no horizonte da pós-modernidade. Assim é um mutante adaptável. Quem saberá dizer qual será o melhor modelo do juiz? Só o caso concreto, a doutrina e por fim, a história que registra e guarda todos os passos da evolução da justiça.

[27] Oswald Spengler Gottfried Spengler (1880-1936) foi historiador e filósofo alemão e cuja obra “O Declínio do Ocidente” ficou como marco nos debates historiográficos, filosóficos e políticos neoconservadores, da intelectualidade europeia durante o século XX. Sua principal obra fora uma sucesso entre os intelectuais em todo o mundo, uma vez que previu a desintegração da civilização europeia e norte-americana depois de uma idade de cesarismo violento, argumentando por analogias detalhadas com outras civilizações. Seu pessimismo asseverou-se após a Primeira Grande Guerra Mundial.

[28] A noção da chamada Justiça Terapêutica remonta ao ECA, ao ano de 1990. O ECA representou uma autêntica revolução legislativa ao assegurar às crianças e adolescentes os direitos fundamentais de cidadania já previstos no texto constitucional vigente. O ECA rompeu com a doutrina da irregular situação advinda do Código de Menores e passou a adotar a doutrina da proteção integral em consonância com a CF/1988, Convenção sobre os Direitos da Criança apoiado pela Assembléia Geral das Nações Unidas e as regras de Beijing.

[29] Burrhus Frederic Skinner (1904-1990) foi autor e psicólogo norte-americano. Conduziu trabalhos pioneiros em psicologia experimental e foi propositor do behaviorismo radical, e abordagem que busca compreender o comportamento em função das interrelações entre a filogenética, o ambiente (cultura) e a história de vida do suposto indivíduo. A base de trabalho de Skinner foi o comportamento operante. A principal contribuição de Skinner para a Psicologia foi o conceito de Comportamento Operante que descreve um tipo de relação entre as respostas dos organismos e o ambiente.  Diferente da relação descrita no comportamento respondente onde um estímulo elicia/gera uma resposta, o comportamento operante descreve uma relação onde uma resposta que gera uma consequência (ou apenas é acompanhada por essa como no caso do comportamento supersticioso) tem a sua probabilidade de ocorrer novamente em um contexto semelhante modificada pelo efeito desta consequência sobre a interação. Consequências que têm valor de sobrevivência para os organismos têm as respostas que as geraram reforçadas, aumentando a probabilidade de que a mesma volte a ocorrer em um contexto semelhante, ao passo que consequências que trazem prejuízos aos organismos têm as respostas que as geraram punidas, reduzindo a probabilidade de que a mesma volte a ocorrer em um contexto semelhante. Nesse sentido, o behaviorismo radical vai entender o comportamento do ser humano e dos outros organismos como uma interação entre estímulos do ambiente e respostas do organismo, sendo determinado por três tipos de seleção, a saber: filogenética, ontogenética e cultural.

[30] A Psicologia Social estuda o que acontece com o indivíduo quando ele está interagindo com outras pessoas ou na expectativa desta interação. Tal definição é de Aroldo Rodrigues, eminente psicólogo brasileiro. Estuda as manifestações comportamentais suscitas pela interação. A integração social, a interdependência entre os i indivíduos, o encontro social são os objetos investigados por essa área da Psicologia.

[31] Behaviorismo, advindo do behavior que significa em inglês comportamento, também designando comportamentalismo, ou às vezes, comportamentismo é o conjunto de teorias psicológicas que postulam o comportamento como o mais adequado objeto de estudo da Psicologia. A teoria teve sua origem em 1913, com manifesto criado por John B. Watson com a obra “A Psicologia como um comportamentista a vê”. Onde o autor defendeu que a psicologia não deveria estudar processos internos da mente, mas sim, o comportamento, posto que visível e, portanto, passível de observação por uma ciência positivista.

[32] Skinner foi o pensador que levou tão longe a crença na possibilidade de controlar e moldar o comportamento humano. Sua obra é expressão mais famosa do behaviorismo, corrente que dominou o pensamento e a prática da psicologia em escolas e consultórios até os anos de 1950. Os adeptos do behaviorismo costumam se interessar pelo processo de aprendizado como um agente de mudança do comportamento.  “Skinner revela em várias passagens a confiança no planejamento da educação, com base em uma ciência do comportamento humano, como possibilidade de evolução da cultura”.

[33] Luís Alberto Warat busca contribuir para edificação de um modelo de ensino fundado na reformulação das premissas à luz de um direito crítico e reflexivo. Warat, que nasceu em Buenos Aires, foi docente no Brasil por mais de quatro décadas, onde fez história. Nos últimos anos, esteve ligado à Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões. De acordo com seu currículo, foi “Doutor em Direito pela Universidade de Buenos Aires, Argentina; Pós-Doutor pela Universidade de Brasília, Brasil. Professor do Mestrado e Doutorado em Direito na Universidade de Brasília. Foi professor titular de Filosofia do Direito, Introdução ao Direito, Lógica e Metodologia das Ciências na Universidade de Morón e na Universidade de Belgrano em Buenos Aires; professor titular de Lógica e Metodologia de Ciências na Faculdade de Arquitetura e Engenharias da Universidade de Morón. No Brasil, foi professor titular da Universidade Federal de Santa Maria (RS); coordenador e professor de Direito da UNISUL-Tubarão (SC); professor titular de pós-graduação em Direito da UFSC; professor do Mestrado e do Doutorado em Direito na UNISINOS; professor titular de Metodologia e Arbitragem da Faculdade de Direito do Centro de Mediação da Universidade Tuiuti do Paraná.; professor titular do curso de Direito, mestrado e doutorado da UnB, professor emérito da Sesuc Florianópolis; Professor titular do mestrado de UFRJ; Doutor honoris causa da Universidade Federal da Paraíba. Professor convidado do mestrado de direito da URI Santo Ângelo Presidente da Associação Latino-americana de Mediação, Metodologia e Ensino no Direito – ALMMED”. Sua morte se deu em 2010.

[34] Utilizando a sociologia de Bourdieu, Touraine, Foucault, Therbon, Elias, entre outros, consegue-se mapear nove dimensões dos conflitos: “As novas questões sociais mundiais e a violência”; “Microfísica da violência”; “A violência na escola e a juventude”; “A juventude fraturada: A agonia da vida no país do futuro”; “A arma e a flor: Formação da organização policial, consenso e violência”; “A polícia, uma nova questão social mundial”; “Marchas, regressos e contrapassos na educação policial”; “As lutas sociais contra as violências”; e, por fim, “Violências e dilemas do controle social”.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. As modernas teorias do conflito e promoção da cultura da paz em face da contemporaneidade. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/as-modernas-teorias-do-conflito-e-promocao-da-cultura-da-paz-em-face-da-contemporaneidade/ Acesso em: 28 mar. 2024