Processo Civil

A Autotutela como meio legal de defesa de direitos

1 – Introdução

 

                Com a transformação do Estado como meio provedor de direitos, a sociedade foi sendo obrigada a buscar a solução de seus conflitos através da atuação deste mesmo aparato estatal, consubstanciado hoje, principalmente, no Poder Judiciário. Este mesmo Estado, sendo o garantidor de direitos, impõe deveres aos indivíduos, para que os mesmos não interfiram nos direitos de outrem. Dessa forma, o Estado usa a Ordem para prover Liberdade aos indivíduos.

 

                No entanto, o Estado não possui os atributos divinos da onipotência, onipresença e onisciência. Tendo em vista que não são atributos humanos, e sendo o Estado uma entidade formada de pessoas humanas e patrimônio específico, é impossível, faticamente, que o Estado possa garantir tudo a todos.

 

                Pensadores como Ludwig Von Mises, diametralmente oposto à atuação estatal, acreditava (assim como hoje acreditam seus discípulos) na validade de um anarcocapitalismo, no qual qualquer pessoa teria o direito de fazer o que quisesse, sendo limitado unicamente pela vontade alheia. Esse pensamento, denominado Libertarianismo, encontra adeptos sobretudo na área econômica (Escola Austríaca da Economia), e não tanto na área sociológica. O principal postulado de organização social deste pensamento seria o Direito Natural.

 

                Já Karl Marx e as correntes derivadas de seus pensamentos viam o Estado como um supridor universal. No entanto, a experiência direta desse pensamento gerou gravíssimas violações aos direitos humanos, o que demonstrou a inexistência de reais direitos resguardados por um Estado que clama por onipresença, onipotência e onisciência.

 

                As bases da Autotutela são o instinto da autopreservação, inerente a todas as formas vivas, e as aplicações do Direito Natural, nome dado ao conjunto de costumes utilizados por uma sociedade e aplicados coercitivamente pela estrutura moral daquela mesma sociedade. O padre Francisco de Vitória (1492-1546), defendendo o direito dos indígenas à sua própria terra, contra a conquista espanhola, utilizou-se de São Tomás de Aquino, ao afirmar que ninguém, fosse batizado ou não, poderia perder seus direitos arbitrariamente.[1]

 

                Este mesmo Direito Natural foi substituído, no final da Idade Moderna e no início da Idade Contemporânea, pelo Positivismo, que visava regulamentar todos os aspectos da vida social através de um órgão centralizador, o Estado. Governantes da época apreciavam (assim como hoje apreciam) um sistema que controlasse a vida alheia, pois sendo todo sistema humano possuidor de falhas, os próprios governantes se aproveitariam das falhas do sistema para não serem vítimas do mesmo.

 

                As principais formas de Autotutela são o exercício da força física, moral e econômica. Embora sejam mal vistas pela sociedade atual, posto que são ilegítimas no atual Estado Democrático de Direito, foram largamente utilizadas até a Idade Moderna, sendo na verdade padrão comportamental até hoje em sociedades mais distantes da civilização ocidental.

 

                A Autotutela hoje é instituto estudado pelo Direito Processual, e é definida por Daniel Amorim Assumpção Neves sendo “a forma mais antiga de solução de conflitos, constituindo-se fundamentalmente pelo sacrifício integral do interesse de uma das partes envolvida no conflito em razão do exercício da força pela parte vencedora. […] é a única forma de solução alternativa de conflitos que pode ser amplamente revista pelo Poder Judiciário¸ de modo que o derrotado sempre poderá judicialmente reverter eventuais prejuízos advindos da solução do conflito pelo exercício da força de seu adversário.[2]

 

 

2 – A Autotutela no Direito Brasileiro

 

                O direito brasileiro adota a excepcionalidade da Autotutela, ou seja, apenas quando prevista na norma jurídica é que a Autotutela poderá ser exercida, ainda que paralelamente à relação jurídica processual. Os principais diplomas que permitem a Autotutela no Brasil são a Constituição da República, o Código Civil, o Código Penal, o Código Penal Militar e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

 

                Na Constituição da República, art. 9º, vemos que “É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.  § 1º – A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.  § 2º – Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.” Este texto demonstra que o exercício do direito de greve, assim como os outros direitos, não é absoluto, sendo o mesmo limitado pelo atendimento de necessidades da coletividade e pela proibição do abuso do direito.

                 No Código Civil, no art. 188, que trata da exclusão da ilicitude de atos danosos a outrem, a norma afirma que “Não constituem atos ilícitos: I – os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido; II – a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente. Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.” A norma assegura que a legítima defesa de um direito não constitui ato ilícito, sendo portanto, legítimo, legal, permitido, assegurado. Também assegura que a destruição de bens para salvaguardar direitos (por exemplo, destruir um local em chamas para salvar pessoa dentro do local) não é ilícita, contanto que seja apenas o necessário para o resguardo do direito. Evita-se aqui também o abuso do direito.

 

                Outro caso do Código Civil está demonstrado no art. 1.210, que trata dos efeitos da posse, ao aduzir que “O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado. § 1o O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse. § 2o Não obsta à manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.” Neste caso, a norma afirma que a pessoa pode usar de meios não excessivos para proteger sua posse, inclusive força física. No entanto, deve haver um imediatismo nas atitudes. Não se permite, portanto, que o possuidor fira direitos de pessoa que ele acredita que poderá, um dia, vir a turbar sua posse.

 

                Há terceiro caso de Autotutela no Código Civil, que é o referenciado com Penhor Legal, previsto no art. 1.467, que afirma que “ São credores pignoratícios, independentemente de convenção: I – os hospedeiros, ou fornecedores de pousada ou alimento, sobre as bagagens, móveis, jóias ou dinheiro que os seus consumidores ou fregueses tiverem consigo nas respectivas casas ou estabelecimentos, pelas despesas ou consumo que aí tiverem feito; II – o dono do prédio rústico ou urbano, sobre os bens móveis que o rendeiro ou inquilino tiver guarnecendo o mesmo prédio, pelos aluguéis ou rendas.” Os artigos seguintes continuam legitimando a Autotutela do ar. 1.467, conforme demonstramos: “Art. 1.468. A conta das dívidas enumeradas no inciso I do artigo antecedente será extraída conforme a tabela impressa, prévia e ostensivamente exposta na casa, dos preços de hospedagem, da pensão ou dos gêneros fornecidos, sob pena de nulidade do penhor. Art. 1.469. Em cada um dos casos do art. 1.467, o credor poderá tomar em garantia um ou mais objetos até o valor da dívida. Art. 1.470. Os credores, compreendidos no art. 1.467, podem fazer efetivo o penhor, antes de recorrerem à autoridade judiciária, sempre que haja perigo na demora, dando aos devedores comprovante dos bens de que se apossarem. Art. 1.471. Tomado o penhor, requererá o credor, ato contínuo, a sua homologação judicial. Art. 1.472. Pode o locatário impedir a constituição do penhor mediante caução idônea.” Fica demonstrado nos artigos acima que aqueles que fornecem serviços de hospedaria e locação têm o direito de exercer a Autotutela sobre os bens dos devedores, evitando-se assim que se sofra prejuízo decorrente de não pagamento. No entanto, essa Autotutela é extremamente rara, pois os arts. 1.468 a 1.472 trazem vários requisitos necessários para se exercer essa mesma Autotutela, ficando confirmado o exercício excepcional da mesma no Direito brasileiro.

                  Um quarto caso de Autotutela no Código Civil é o direito de retenção, previsto em diversos artigos do Código. Há direito de retenção: no adimplemento das obrigações (art. 319); na compra e venda com reserva de domínio (art. 527); na locação de coisas (art. 571 e 578); no depósito voluntário (art. 633 e 644); no mandato (art. 664 e 681); na comissão (art. 708); no transporte de pessoas (art. 740, §3º e 742); como um dos efeitos da posse com relação às benfeitorias (art. 1.219 e 1.220); no penhor (art. 1.433, II e 1.455, parágrafo único); e na anticrese (art. 1.423, 1.507, §2º e 1.509 §1º).

 

                A lei penal, tanto civil quanto militar, traz conhecidas formas de Autotutela, conhecidas genericamente como “Exclusão da Ilicitude” ou “Exclusão de Crime” (art. 23, CP e art. 42, CPM) e explicitadas em quatro tipos: o Estado de Necessidade (art. 23, I, c/c art. 24, CP, e art. 42, I, CPM), a Legítima Defesa (art. 23, II, c/c art. 25, CP, e art. 42, II, CPM), o Estrito Cumprimento do Dever Legal (art. 23, III, 1ª parte, CP e art. 42, III, CPM) e o Exercício Regular do Direito (art. 23, III, in fine, CP e art. 42, IV, CPM). Nos dois primeiros casos, o Estado de Necessidade e a Legítima Defesa, a lei traz requisitos diversos para que não se configure um abuso do direito à Autotutela.

 

                A lei penal comum chega a criminalizar a Autotutela, ainda que a razão dos fatos esteja pendente ao agressor, através de um tipo penal chamado “Exercício arbitrário das próprias razões”, no art. 345, que afirma ser crime “Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite: Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência. Parágrafo único – Se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.” O referido artigo afirma que, mesmo sendo legítima a pretensão, é o Estado, e não o indivíduo, que deve realizar feitos de força para atingir a aplicação de direito no caso concreto. Direito esse aplicado mediante o uso do processo. Somente quando a lei permite a Autotutela é que ela poderá ser realizada.

 

                O Direito Administrativo possui, através do STF, dois enunciados de sua súmula (e um gigantesco acervo jurisprudencial), que afirmam que “A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos” (Súmula. 346) e que a “A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.” Dessa forma, a Administração Pública pode usar de seu poder para anular os atos ilegais proferidos pela mesma, aduzindo ainda que desses atos não se originam direitos, haja vista, são ilegais. Como a Administração Pública deve agir estritamente na legalidade, não podendo agir diferentemente da lei, a mesma tem o dever de proferir atos legais, e declará-los nulos se os mesmos forem ilegais.

 

                No Direito Internacional Público, a Autotutela se verifica diretamente na guerra, na qual o Estado age para defender a si mesmo de agressão externa. No entanto, é princípio do Direito Internacional que o Costume tem o mesmo nível de tratado, sendo portanto, a guerra um exercício de um direito estatal baseado no costume. Cabe ressaltar que o costume é a fonte do Direito Natural.

 

                Percebe-se assim que todos os direitos, questionamentos, normas e princípios têm sua origem remota no Direito Natural, e este, por sua vez, se origina no Direito Consuetudinário. Este, por sua vez, tem origem a Autotutela socialmente legítima, ou seja, na Autotutela usada pelos indivíduos e aceita coletivamente pelos indivíduos da mesma comunidade.

 

                Em decisões do STF, percebe-se que o mesmo rejeita veementemente a Autotutela, citando Bobbio, afirmando que “A diferença fundamental entre as duas formas antitéticas de regime político, entre a democracia e a ditadura, está no fato de que somente num regime democrático as relações de mera força que subsistem, e não podem deixar de subsistir onde não existe Estado ou existe um Estado despótico fundado sobre o direito do mais forte, são transformadas em relações de direito, ou seja, em relações reguladas por normas gerais, certas e constantes, e, o que mais conta, preestabelecidas, de tal forma que não podem valer nunca retroativamente. A conseqüência principal dessa transformação é que nas relações entre cidadãos e Estado, ou entre cidadãos entre si, o direito de guerra fundado sobre a autotutela e sobre a máxima ‘Tem razão quem vence’ é substituído pelo direito de paz fundado sobre a heterotutela e sobre a máxima ‘Vence quem tem razão’; e o direito público externo, que se rege pela supremacia da força, é substituído pelo direito público interno, inspirado no princípio da ‘supremacia da lei’ (rule of law).” (BOBBIO, Norberto. As Ideologias e o Poder em Crise, p.p. 97-98)[3]

 

                O mesmo STF confirma a opção do Código Civil, em permitir a Autotutela da posse, o que não se configura exercício arbitrário das próprias razões, conforme sua jurisprudência que assim afirma: “EMENTA: Exercício arbitrário das próprias razões: inexistência: manutenção pelo agente de sua posse contra quem – conforme sentença civil transitada em julgado – jamais a detivera. 1. Constitui elemento normativo do tipo do exercício arbitrário das próprias razões (CPen., art. 345) o não enquadrar-se o fato numa das hipóteses excepcionais em que os ordenamentos modernos, por imperativos da eficácia, transigem com a autotutela de direitos privados, que, de regra, incriminam: o exemplo mais freqüente de tais casos excepcionais de licitude da autotutela privada está na defesa da posse, nos termos admitidos no art. 502 C.Civil. 2. Desse modo, saber quem detinha a posse no momento do fato constitui questão prejudicial heterogênea da existência daquele crime atribuído ao agente que pretende ter agido em defesa da sua posse contra quem jamais a tivera. 3. A eficácia no processo penal de sentença civil transitada em julgado, que haja decidido questão prejudicial heterogênea, não depende de que, para aguardá-la, tenha havido suspensão do procedimento criminal.[4]

 

 

3 – A Autotutela e seus elementos, do ponto de vista positivista

 

                Ao se analisar a Autotutela no Direito pátrio, percebem-se elementos em comum entre todas as variantes apresentadas, quais sejam: previsão legal direta ou indireta da Autotutela; proibição de abuso do direito à Autotutela; excepcionalidade do uso da Autotutela; emergencialidade da Autotutela; garantia de direito superior ou equivalente. Vejamos cada um dos elementos.

 

                A previsão legal direta ou indireta se consubstancia em que qualquer exercício da Autotutela está condicionada à existência de lei, ou ato normativo superior à lei, permitindo que se use deste direito. Desta forma, a Autotutela é um direito, quiçá fundamental, previsto em lei e exercitado em casos enunciados pela mesma. No caso da Administração Pública, não há lei determinando diretamente a Autotutela, mas sendo a Administração Pública obrigada a seguir a lei, para que esse fim seja atendido, entende-se que a mesma pode se socorrer de seu poder para declarar nulo, com base na lei, um ato próprio, que viola a mesma ou outra lei.

 

                A proibição do abuso do direito à Autotutela não é novidade, pois a proibição do exercício abusivo de um direito é princípio geral do direito no Brasil e em outros países, pois não se pode conceber o exercício de um direito que viole o direito de outrem.

 

                A excepcionalidade se configura na exemplificação de um rol taxativo, ainda que elástico, de momentos em que se pode usar do poder da Autotutela para se resguardar um direito. Desta forma, a Autotutela no Brasil só é exercida em casos específicos, que visam garantir direitos que o Estado não tem como garantir, pois o mesmo não pode exercer um poder protetor sobre todas as pessoas ao mesmo tempo, sendo inviável e utópico acreditar-se nessa possibilidade.

 

                A emergencialidade é o outro lado da moeda da excepcionalidade. Sendo medida emergencial, cabe à Autotutela garantir direitos, seja pela força física, moral ou econômica, na exata medida em que o Estado não tem como saber sobre futuros atos das pessoas. Destarte, todo ato de Autotutela é emergencial, e visa salvaguardar um direito que pode perecer e causar grave dano, de difícil reparação.

   

                 A garantia de direito superior ou equivalente significa que a Autotutela não se presta a salvar um bem através da morte de um possível agressor. Os direitos garantidos pela Autotutela têm uma característica de importância sobre o direito contraposto a ele. Assim, quando se recorre à Autotutela, o Estado está permitindo que o indivíduo salve direito superior àquele que está sendo exercido.

 

 

 

4 – Análise de caso: a Autotutela como meio de garantir direitos fundamentais

 

                Pode-se considerar que a Autotutela, por ser exceção, deve ter interpretação restritiva, ou seja, aplica-se a Autotutela apenas quando houver certeza de que ela é cabível. Aplicando-se a Autotutela puramente como se encontra na legislação pátria, ela se configurará de difícil efetivação. Apenas uma interpretação constitucional da Autotutela é que poderá se tornar um modo de efetivação de direitos fundamentais frente à atuação arbitrária de outro indivíduo ou do próprio Estado.

 

                Mudando-se o foco da Autotutela, depreende-se que a mesma é uma forma válida de solução de conflitos, na medida em que a lei assegura sua utilização, ainda que em casos excepcionais. A aplicação da Autotutela deve ser interpretada sob o prisma da interpretação extensiva. Ou seja, as hipóteses são taxativas, descritas na lei, mas sua interpretação pode ser ligeiramente ampliada, para que se possam proteger direito fundamentais que estejam na iminência da violação. Inclusive cabe lembrar que a Autotutela não é crime, se a mesma estiver sendo usada para salvar um direito superior ou igual, ou para a proteção de outro direito, ou se estiver dentro dos limites legais (ainda que genéricos).

 

                O exercício da Autotutela é um corolário dos direitos e garantias fundamentais da Constituição da República, para que mesmo através da Autotutela se possa garantir a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, conforme definidas no art. 5º e seguintes da CRFB. Aplicar a Autotutela na defesa dos direitos fundamentais explicitados na Constituição da República não se constitui ato ilícito, pois a lei não pode declarar ilícito aquilo que a Constituição da República declara como direito.

 

                Sendo assim, havendo conflito aparente de normas, aplica-se o critério hierárquico, determinando-se que se aplique o dispositivo geral constitucional, na garantia da dignidade da pessoa humana. Complementando a diretriz de aplicação da defesa da pessoa, está o art. 12 do Código Civil, que determina que “Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.” Uma interpretação restritiva afirmaria que os termos “Pode-se exigir” se referem à atuação do Poder Judiciário, ou do Poder Público genericamente considerado. No entanto, aplicando-se uma interpretação extensiva, temos na verdade a idéia de que “Qualquer pessoa pode exigir de qualquer outra pessoa que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”. Desta forma, através de uma interpretação constitucionalmente extensiva da Autotutela, estar-se-á declarando, aplicando e efetivando-se os direitos e garantias fundamentais da pessoa humana.

 

 

 

Bibliografia

 

BRASIL. STF. Habeas Corpus nº 91.386.

 

______.______. Habeas Corpus nº 75.169.

 

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2ª Ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2010.

 

WOODS JR., Thomas E. Como a Igreja Católica construiu a civilização Ocidental. Tradução de Élcio Carillo; Revisão de Emérico da Gama. São Paulo: Quadrante, 2008. 



[1] WOODS JR., Thomas E. Como a Igreja Católica construiu a civilização Ocidental. Tradução de Élcio Carillo; Revisão de Emérico da Gama. São Paulo: Quadrante, 2008, pág. 131.

[2] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2ª Ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Método, 2010, pág. 5-6.

[3] Habeas Corpus nº 91.386.

[4] Habeas Corpus nº 75.169.

Como citar e referenciar este artigo:
PINHEIRO, Marcio Alves; SILVA, Geórgia Carvalho; MENDES, Auliete de Paula. A Autotutela como meio legal de defesa de direitos. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-civil/a-autotutela-como-meio-legal-de-defesa-de-direitos/ Acesso em: 19 abr. 2024