Processo Penal

Imbróglio no STF

Resumo: A soltura de importante traficante, um dos chefes de facção criminosa gerou mal-estar no STF, a discussão jurídica paira sobre as balizas interpretativas.

Palavras-Chave: CPP, Pacote Anticrime. Prisão Preventiva. Habeas Corpus. Constituição Federal Brasileira de 1988.

O atual Presidente do STF, o Ministro Luiz Fux ao suspender a liminar concedida por outro ministro, pelo Ministro Marco Aurélio Mello que havia concedido em Habeas Corpus a André Oliveira Macedo, mais conhecido como André do Rap, acusado de tráfico internacional de drogas. Afirmara o ministro que o paciente estava preso sem culpa formada desde 15 de dezembro de 2019, tendo sua custódia mantida em 25 de junho de 2020, no julgamento da apelação.

Cabe ressaltar que o Ministro Fux atendeu a requerimento da Procuradoria-Geral que com base no artigo 4 da Lei 8.437/92 solicitou a suspensão da decisão liminar proferida em HC 191.836 que determinou a soltura de André Oliveira Macedo.

A Procuradoria-Geral da República alegou que a referida liminar viola a ordem pública e suprime a instância e admite o HC sem que tenha ocorrido a interposição de agravo regimental contra a liminar do STJ.

Não errou o Ministro Fux posto que fora instado a manifestar-se. E, não atuou na busca desenfreada por justiçamento. André fora solto na manhã de sábado. E, à noite, quando Fux atendeu ao pedido da Procuradoria-Geral da República suspendeu a liminar, o traficante já teria fugido para o Paraguai[1].

Positivamente, a questão trouxe um desagradável embaraço entre os pares. E, o Ministro Gilmar Mendes ainda atalhou que o Presidente do STF é coordenador de pares e não superior hierárquico. Porém, o Ministro Fux não procedeu nesse sentido.

Realmente, a ratio do artigo 316 do CPP não pode ser desconsiderada. E, a definição do excesso de prazo demanda o juízo de razoabilidade à luz das circunstâncias concretas do caso em análise. E, assim, conforme sustentado pela Procuradoria-Geral da República, a revisão da prisão a cada noventa dias pressupões marcha processual em condições de alterar a realidade serve a qual decretada a prisão[2].

No período entre a confirmação da prisão preventiva pelo Tribunal Regional Federal e o deferimento da liminar pelo Ministro relator do HC 196.836, nenhum fato novo alterou, relativizou ou afastou os concretos motivos que fundamentaram o decreto de custódia cautelar. Ao revés, mantiveram-se hígidos os fundamentos de garantia da ordem pública.

Curiosamente o dono do escritório de advocacia que pediu a soltura do traficante in casu trabalhou no STF trata-se de uma informação trazida pela reportagem da Rádio bandnews FM, trata-se de um ex-assessor. Porém, o HC[3] não foi assinado pelo ex-assessor e, sim, por uma advogada sócia deste. A defesa do traficante já havia tentado anteriormente libertá-lo no STJ, mas sem sucesso.

De qualquer forma, entendo por escorreito o procedimento do Ministro Fux pois atendeu a Procuradora-Geral da República de forma fundamentada e coerente.

Referências:

PACELLI, Eugênio; FISCHER, Douglas. Comentários Ao Código de Processo Penal e Sua Jurisprudência. 6ª edição. São Paulo: Atlas, 2014.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Comentários Ao Anteprojeto de Lei Anticrime. Tripartido em três projetos de lei conforme versão enviada ao Congresso Nacional. Salvador: JusPODIVM, 2019.



[1] Como o STF decidiu no ano passado que é ilegal que um réu inicie o cumprimento da pena antes que todos os recursos sejam esgotados, pela lei, o traficante não poderia ficar preso sem uma sentença condenatória definitiva. A liminar que possibilitou a soltura de André do Rap era provisória e valeria até o julgamento do habeas corpus na 1ª Turma do Supremo, composta por Rosa Weber, Dias Tofolli, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Marco Aurélio. Apesar disso, Luiz Fux determinou a sua suspensão por se tratar de uma “medida excepcionalíssima”, que, segundo ele, “é admissível quando demonstrado grave comprometimento à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas”.

[2] A legislação processual brasileira mudou em 2020 através do Pacote Anticrime, determinando que prisões provisórias sejam revistas a cada 90 (noventa) dias para verificar se há necessidade de manutenção da prisão, o que, segundo Marco Aurélio, não ocorreu no caso de André do Rap. Ao ser libertado neste sábado, André do Rap disse que mora no Guarujá, onde poderia ser encontrado.

[3] O já célebre habeas corpus canguru ou australiano opera uma sucessão de pedidos liminares que tenciona levar o pedido rapidamente ao STF, onde os réus poderosos esperam e muitas vezes conseguem decisões favoráveis que colidem frontalmente com todas as instâncias inferiores do Judiciário. Tornou-se comum a impetração de sucessivos habeas corpus em instâncias superiores mesmo sem que obtenham decisão definitiva na origem. Para tanto, basta o relator do primeiro tribunal acionado indeferir liminarmente a ordem para que um novo HC seja impetrado em instância imediatamente superior, e assim por diante sucessivamente. Portanto, o chamado HC canguru é aquele que caminha de liminar em liminar em saltos pelas instâncias, chegando até a mais alta corte, o STF. Aliás, os cangurus mais abusados saltam direto da primeira instância para a última. Porém, cabe destacar que tamanha subversão não é a regra, posto que retira a autoridade e a jurisdição dos tribunais cujas turmas nem decidiram a matéria. Por essa razão e para debelar a supressão de instâncias, veio o STF editar o enunciado da Súmula 691: Não compete ao STF conhecer o habeas corpus impetrado contra decisão de relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”. A única exceção admitida é quando houver flagrante constrangimento ilegal ao direito de liberdade, ou em situações manifestamente contrárias à jurisprudência do próprio STF. Percebe-se, ainda, que as exceções geralmente são aplicadas restritivamente pelos tribunais superiores.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. Imbróglio no STF. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2020. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/processo-penal/imbroglio-no-stf/ Acesso em: 29 mar. 2024