Judiciário

Deveres e Vedações aos Magistrados na Loman

 

A LEI ORGÂNICA DA MAGISTRATURA NACIONAL (LOMAN) (LEI COMPLEMENTAR nº 35, de 14/03/1979), trata, nos seus artigos 35 e 36, respectivamente, dos deveres dos magistrados e as vedações a eles impostas.

 

Pretendo aqui comentar brevemente cada item dos mencionados dispositivos.

 

      Art. 35 – São deveres do magistrado:

 

      I – Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;

 

O presente dispositivo mistura coisas completamente diferentes, mas podemos interpretá-lo assim: os magistrados são obrigados a cumprir a legislação; são obrigados a praticar os atos do seu ofício, previstos na legislação; têm de cobrar de outrem o cumprimento da legislação e dos atos do ofício; no cumprimento da legislação e dos atos do seu ofício não pode submeter-se a ninguém a não ser à legislação; na ação de obrigar outrem a cumprir a legislação e seus atos do ofício deve agir da mesma forma; a expressão “serenidade” não faz diferença no texto, sendo meramente literária; a expressão “exatidão” visa reforçar o império da Lei.

 

Em resumo, a intenção clara do presente dispositivo é deixar claro que o Judiciário é mero “bouche de la loi”, ou seja, aplicador mecânico e cego das previsões legais elaboradas pelo Legislativo e pelo Executivo. Trata-se de verdadeira “capitis deminutio” do Judiciário.

 

Na época da elaboração da LOMAN havia verdadeiro receio da independência do Judiciário e a referida Lei visava, inclusive, a restringir essa independência.

 

É necessária a revisão cabal dessa Lei, para que se valorize a magistratura.

 

      II – não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar;

 

Os prazos processuais talvez fossem suficientes, por exemplo, na época da edição do CPC, porque o número de processos era ínfimo em relação à época atual. O acesso à Justiça era limitado e, praticamente, “pro forma”.

 

Hoje em dia, com o volume excessivo de processos, não há como algum magistrado manter seu serviço rigorosamente em dia, a não ser que conte com uma assessoria excepcional ou renuncie aos seus horários de refazimento físico trabalhando até à exaustão.

 

Os prazos processuais deveriam ser revistos, aumentando-se-os.

 

A Corte Européia dos Direitos Humanos não estabelece prazos rígidos quanto à “duração razoável dos processos”, uma vez que isso representaria uma irracionalidade. Cada situação de atraso deveria ser analisada observando-se suas especificidades.

 

      III – determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais;

 

Vale para este dispositivo o que foi dito quanto ao tópico anterior.

 

      IV – tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência.

 

Aqui se contemplam duas situações diferentes: tratamento com urbanidade e atender quem nos procure.

 

O dever imposto em primeiro lugar é inquestionável, representando uma obrigação que não se pode minimizar, uma vez que cabe inclusive em qualquer situação da vida pública ou privada, até a nível da boa educação.

 

Quanto à segunda situação, tem de ser analisada “cum grano salis”. O Desembargador MARCUS FAVER, quando de uma de suas últimas atuações no CNJ, entendeu que seria aplicável a disposição em apreço de forma literal. Os magistrados teriam de, praticamente, estar à disposição de quem quisesse com ele avistar-se, interrompendo suas demais atividades. Verdadeira interpretação rigorista do dispositivo, geraria situações absurdas.

 

      V – residir na sede da Comarca salvo autorização do órgão disciplinar a que estiver subordinado;

 

A obrigação de residir na localidade onde trabalhamos tem uma série de vantagens para nosso trabalho. Os casos de autorização para residência em outra localidade devem ser analisados caso a caso, havendo aqueles em que tal se justifica.

 

      VI – comparecer pontualmente à hora de iniciar-se o expediente ou a sessão, e não se ausentar injustificadamente antes de seu término;

 

O ideal é que o magistrado possa ser encontrado facilmente, todavia, mais importante que ser mero cumpridor de horários, é que esteja sempre interessado em resolver os problemas a ele apresentados no exercício do seu cargo.

 

      VIl – exercer assídua fiscalização sobre os subordinados, especialmente no que se refere à cobrança de custas e emolumentos, embora não haja reclamação das partes;

 

A fiscalização dos magistrados sobre seus subordinados é imprescindível, devendo, inicialmente, selecionar pessoas competentes, honestas e de boa-vontade, e, em seguida, trabalhar com elas em ambiente de harmonia, visando o bom atendimento ao público.

 

Com subordinados que não preencham esses requisitos pouco adianta ser rigoroso, pois sua produção será sempre dificultosa.

 

Tenho para mim que os magistrados deveriam poder escolher livremente seus escrivães dentre os servidores de sua equipe.

 

      VIII – manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.

 

O que seja “conduta irrepreensível” é um tema polêmico. Há quem ache até que o uso de terno em qualquer situação seja um dever impostergável…

 

      Art. 36 – É vedado ao magistrado:

 

      I – exercer o comércio ou participar de sociedade comercial, inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista;

 

As situações de acionista ou quotista podem prejudicar ou não a atuação de um magistrado, de acordo com as peculiaridades de cada caso. Se prejudicar, devem os magistrados renunciar a elas.

 

      II – exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração;

 

Entendo que cada caso deve ser analisado dentro de suas peculiaridades. A imposição do CNJ no sentido de impedimento absoluto me parece rigorista.

 

      III – manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério.

 

É salutar que os magistrados sejam também doutrinadores e, portanto, analisem inclusive o Direito aplicado, visando seu aperfeiçoamento. Não deve haver tabu quanto ao estudo do Direito, sob pena de estagnação.

 

 

* Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Como citar e referenciar este artigo:
MARQUES, Luiz Guilherme. Deveres e Vedações aos Magistrados na Loman. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/judiciario/deveres-e-vedacoes-aos-magistrados-na-loman/ Acesso em: 18 abr. 2024