História do Direito

Satyagraha, Gandhi e os Operadores do Direito

A expressão
“satyagraha” é originária do sânscrito e pode ser traduzida por “ater-se à
verdade”.

Ficou conhecida no
Ocidente como o movimento não-violento liderado por MOHANDAS GANDHI, que
culminou na libertação da Índia da dominação britânica.

GANDHI foi um
político que primou pela ética e pelo espírito de conciliação construtiva, mas
firme na decisão de libertar seu país.

Os textos de sua
autoria e aqueles outros que se escreveram sobre ele noticiam os seus rigorosos
e seguidos jejuns, mas somente na Autobiografia de um Iogue, do “paramahansa”
YOGANANDA se menciona um fato que mostra a fibra sobre-humana daquele gigante
da Política.

Diz aquele autor que,
certa feita, GANDHI submeteu-se a uma apendicetomia sem anestesia, sendo que,
durante a cirurgia, conversou animadamente com os discípulos presentes, não
reclamando de dor ou manifestando impaciência.

Um homem dotado de
tamanho auto-domínio teria condições de enfrentar os maiores sacrifícios e
renunciar ao que quer que fosse para alcançar seus objetivos.

Dizia o “mahatma”
que, para ele, em primeiro lugar, estava Deus; em segundo, sua pátria e, em
terceiro, a família. Sua esposa (KASTURABAI) compartilhava desse pensamento e
foi destacada colaboradora da causa gandhiana.

A lista dos votos
proferidos pelos “satyagrahis” consistia em: 1) não-violência; 2) verdade; 3)
não roubar; 4) celibato; 5) não possuir; 6) trabalho braçal ou manual; 7)
controle do paladar; 8) destemor; 9) respeito igual a todas as religiões; 10)
uso de produtos fabricados no próprio lar; e 11) livrar-se do preconceito
contra os párias.

Se não tivessem
seguido esses preceitos firmemente, teriam desistido da sua empreitada ou então
provocado uma guerra sem precedentes.

Peço licença aos prezados
Leitores para falar um pouco sobre cada um desses preceitos.

1) Não-violência.

GANDHI assimilou do
Jainismo o respeito a todos os seres da Natureza. Quem adota esse entendimento
não acha aceitável que se pratique qualquer tipo de violência.

2) Verdade.

Entendia a Verdade
como uma característica de Deus. A Verdade é o aprofundamento do conhecimento
sobre Deus e Suas Leis.

3) Não roubar.

Nunca querer
apropriar-se do que pertence aos outros.

4) Celibato.

GANDHI e KASTURABAI
renunciaram à sexualidade depois do nascimento do seu quarto filho.

No início da vida
GANDHI era literalmente dominado pelo sexo, mas foi vencendo gradativamente sua
impulsividade, para tanto utilizando força de vontade, conscientização e
alimentação adequada.

5) Não possuir.

Cada um deve
contentar-se em possuir o necessário para sua vida.

6) Trabalho braçal ou
manual.

O trabalho físico dá
saúde, respeito às pessoas que vivem do trabalho braçal e contribui para a
estabilidade emocional.

7) Controle do
paladar.

Entendia que enquanto
a gente não domina o paladar não consegue integral auto-domínio. Dizia que é
mais fácil dominar os instintos (agressividade, sexualidade etc.) do que o
paladar.

8) Destemor.

Como não odiava nada
nem ninguém, não tinha medo algum.

9) Respeito igual a
todas as religiões.

O facciosismo
religioso era uma das piores chagas da Índia.

Também não admitia
nenhum tipo de sectarismo radical em qualquer área que fosse.

10) Uso de produtos
fabricados no próprio lar.

Ninguém deveria
comprar produtos ingleses e sim produzir em casa o que fosse de sua
necessidade. Os britânicos quase faliram com a perda de um mercado importante
para seus produtos.

11) Livrar-se do
preconceito contra os párias.

Uma vez que no
“ashram” onde passou a morar com vários adeptos, fazia questão de, todas as
manhãs, ele mesmo coletar os uniróis das pessoas que ali tinham dormido, fossem
elas de que categoria social fossem.

Em resumo, no nosso
dia-a-dia de operadores do Direito, interessados em bem cumprir nosso mandato,
só conseguimos ficar no meio-termo da programação “satyagraha”.

Pretendermos
alcançar, de inopino, o nível dos “satyagrahis” é quase impossível, mas, se nos
melhorarmos em alguns pontos, nossa atuação terá mais luzes e menos sombras,
porque não há como limoeiro dar uva, nem ananazeiro dar maçã…

*
Luiz Guilherme Marques, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Como citar e referenciar este artigo:
MARQUES, Luiz Guilherme. Satyagraha, Gandhi e os Operadores do Direito. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/historia-do-direito/satyagraha-gandhi-e-os-operadores-do-direito/ Acesso em: 28 mar. 2024