Direito Empresarial

Sinopse do case: Honorários advocatícios na classificação dos créditos da falência

Géssica Cristine Medeiros da Silva²

José Humberto G. de Oliveira³

1 DESCRIÇÃO DO CASO

A falência possui uma gama de requisitos para que seja decretada, para que seus efeitos tenham eficácia e para a definição de lista de credores. Deste modo, é necessário analisar os principais desses requisitos, principalmente, em relação ao caso em tela, os que dizem respeito ao favorecimento de alguns créditos na fila de recebimento. Será que os honorários advocatícios atrasados têm alguma vantagem sobre os outros?

1.1 Considerações Preliminares

 1.1  .1 Quais as condições gerais para a decretação da falência e seus efeitos?

A falência é um instituto cujo estudo é indispensável, pois como dita o artigo 75 da Lei de Falências, ele tem por objetivo de preservar e otimizar o uso dos bens da empresa. Assim, podemos dizer que a decretação da falência de uma empresa é algo extremamente importante para o sistema financeiro de qualquer país, ainda mais se a falida for uma grande empresa. Desta feita, é necessário que suas condições sejam analisadas.

A sentença declaratória de falência, que é uma sentença diferente das demais, pois ao invés de ser um ato final do processo, lembra Ecio Perin Junior. Isto o referido autor chama de “caráter sui generis”, uma espécie de sentença anormal, segundo o que se tem de definição de sentença.

Em suma, deve-se salientar a condição de insolvência da empresa para haver base ao processo falimentar. Para Fábio Ulhoa Coelho, analisar a relação do ativo e do passivo da empresa diz respeito à insolvência econômica, segundo ele, irrelevante para análise do processo falimentar (COELHO, pág. 317, 2006). Por outro lado, explana sobre a insolvência jurídica, esta por sua vez, pautada na impontualidade injustificada e execução frustrada, que estão na dicção dos incisos do artigo 94 da Lei de Falências.

Ulhoa, ainda ao falar sobre as condições para a decretação falimentar, cita os chamados “atos de falência”: liquidação precipitada, negócio simulado, alienação irregular de estabelecimento, transferência simulada do principal estabelecimento, garantia real e outros (COELHO, pág. 323, 2006). Assim, ratifica que para a decretação de falência basta que um desses atos tipificados seja comprovadamente consumado.

Em atenção à condição preliminar supracitada, os artigos 73 e 94 da Lei n° 11.101 de 2005 tem um rol taxativo dos requisitos para que a empresa tenha sua falência decretada e em um deles vemos a figura da Assembleia Geral dos Credores (inciso I). A AGC tem participação em todo o processo necessário para a decretação da falência e incide piamente para que tal ocorra. Isto posto, a citada Assembleia poderá decidir pela decretação da falência, desde que respeitados os requisitos da lei supracitada.

No que diz respeito à legitimidade para propor a falência, a Lei de Falências, Ecio Perin Junior assevera que ela dependerá da situação. Isto posto, pode ocupar o pólo ativo do pedido de falência o próprio devedor (autofalência); o cônjuge, herdeiro ou inventariante; sócio ou acionista de sociedade e credores.

No que tange à recuperação judicial, o juiz decretará a falência com base nos três requisitos impostos pela letra da lei no artigo 73. Desta maneira, se a empresa não apresenta o plano de recuperação no prazo legal, tem seu plano rejeitado ou descumpre qualquer obrigação colocada no referido plano, terá ela sua recuperação convolada em falência.

Já no artigo 94 da lei em questão, se vê outras condições para a decretação da falência pelo juiz. As condições estão dispostas em três incisos, sendo o terceiro detalhado nas alíneas que vão de “a” a “g”. Este detalhamento traz em sua essência a prevenção contra a fraude.

Decretada a falência, surgem os efeitos da sentença. Há uma dissolução da pessoa jurídica ou da sociedade empresária. Desta feita, o primeiro efeito da sentença falimentar é a inabilitação do falido de exercer qualquer atividade empresarial e, consequentemente, não poderá administrar seus bens ou deles dispor (artigo 103).

Com a sentença de falência homologada, os bens da empresa serão todos utilizados para o pagamento das dívidas com os credores, este efeito atinge os bens dos sócios participantes de sociedades ilimitadas. Para que haja total proteção a esse procedimento, o juiz nomeará um Administrador judicial, que se encarregará de reunir todos os bens restantes e determinar referido pagto, segundo a hierarquia de recebimento regida pela Lei de Falências.

O corpus creditorum é formado com a manifestação dos credores em até 15 dias, que passam a correr a partir do dia da publicação da sentença falimentar (artigo 7º, §1º).

Dando continuidade, os efeitos da decretação de falência acarretam algumas suspensões, como a do direito de retensão pelo credor, que deverá devolver o bem para o Administrador Judicial. No caso das sociedades, os sócios estarão impedidos de receber do valor de suas quotas ou ações (artigo 116, inciso II). Deste modo, os advogados Ascom Jairo e George Melo lembram que:

Empresas falidas também são submetidas às regras para o recebimento dos créditos devidos. Após a sentença de falência, incidem sobre os credores alguns efeitos jurídicos, como o vencimento antecipado de todos os créditos, a interrupção dos cálculos de juros sobre a massa falida, a formação de uma massa de credores que se habilitarão.

Portanto, decretada a falência, serão suspensos os atos referentes à atividade comercial do falido. Os credores agora deverão aguardar o levantamento dos bens e aguardar na fila pelo adimplemento devido. Além disso, é relevante apontar que:

Para formar se a comunhão de credores impõe-se que todos sejam atraídos pelas vis attractiva do processo falimentar e que este seja indivisível. Não teria sentido que a Lei permitisse a credores desgarrados, postular seus direitos em qualquer juízo ou de qualquer forma. Para evitar isso, sabemos, tornou-se o juízo indivisível e a falência universal.

Por esta via, entende-se que o ato individual da massa de credores contra o falido é vedado, a menos que haja a determinação do cumprimento da obrigação pelo administrador judicial às vistas do juiz responsável.

Além desses efeitos, serão consequência da decisão:

a) que o falido apresente, no prazo máximo de 5 (cinco) dias, relação nominal dos credores, indicando endereço, importância, natureza e classificação dos respectivos créditos, se esta já não se encontrar nos autos, sob pena de desobediência. Vide Súmula 280 STJ, que diz que o artigo 35 do DL 7661/45 (que tratava da prisão administrativa do falido que faltava com seus deveres) foi revogado pela CF/88.

b) nomeará o administrador judicial, que desempenhará suas funções na forma do inciso III do caput do art. 22 desta Lei sem prejuízo do disposto na alínea a do inciso II do caput do art. 35 da Lei 11.101/2005.

c) ordenará a intimação do Ministério Público e a comunicação por carta às Fazendas Públicas Federal e de todos os Estados e Municípios em que o devedor tiver estabelecimento, para que tomem conhecimento da falência .

1.1.2 Quais os critérios de prioridade na classificação dos créditos?

O rol taxativo apresentado no artigo 83 da Lei de Falências busca o respeito ao princípio do par conditio creditorum, que por sua vez, caracteriza-se como o equilíbrio de condições de recebimento dos débitos, ou seja, busca a igualdade em tratamento aos credores.

A classificação dos créditos leva em consideração as classes a que pertencem tais. Desta maneira, os créditos de natureza social e pública derivados de relação trabalhista ou fiscal recebem prioridade na ordem de pagamento, restringindo o princípio da igualdade entre os credores apenas à classe que eles pertencerem. Diante disso, pode-se afirmar que a natureza do crédito é o vetor classificatório.

Frente à classificação dos créditos, os créditos extraconcursais seguem rol taxativo do artigo aqui já citado. Eles fazem parte da inovação trazida pela lei 11.101/05 em busca da proteção ao fornecimento dos serviços e matéria-prima dos empresários em processo falimentar, são estes parte dos créditos considerados extraconcursais que terão preferência no recebimento.

Ao falar de créditos trabalhistas como o topo na preferência do pagamento, Sérgio Campinho chama a atenção para o limite de 150 salários mínimos para o valor do crédito, ficando os excedentes na classe dos quirografários, de modo a não favorecer os créditos oriundos dos salários altos de alguns funcionários (CAMPINHO, pág. 408, 2009).

O autor supracitado lembra que créditos regulados pelo Código Tributário Nacional tem preferência em relação a qualquer outro crédito. Deste modo, o autor suscita o que diz o caput do artigo 186 do Código Tributários Nacional: “o crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou tempo de sua constituição, ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho” (CAMPINHO, pág. 411, 2009).

Outro critério utilizado para a classificação dos créditos é se este tem garantia real. Segundo Sérgio Campinho, esta mudança causa grande polêmica, mas por outro lado, veio com o objetivo de diminuir custas com os juros bancários. Isto porque, o pagamento a ser feito para essa classe realizar-se-á através da transação ou alienação do bem dado como garantia.

1.1.3 E os aspectos legais das exceções creditícias?

Dentro das exceções creditícias, pode-se destacar os créditos referentes às transações bancárias. Desse modo, avalia-se que os créditos bancários são dados como privilegiados acima de todos os demais.

Uma das justificativas para tal privilégio seria a questão da relação tributária entre os bancos e o Governo, pautada sobre a razão de este ser um crédito de interesse público. No entanto, há uma justificativa mais realista, que determina a causa como consequência de um grande lobby.

Contudo, Karen Campos Benito em seu artigo Classificação dos Créditos, lembra a Súmula 307 do STJ, que por sua vez, contraria a ordem colocada pelo artigo 83 da Lei de Falência. Isso porque, a Súmula coloca os créditos cambiais como o que deva ser adimplido antes de qualquer outra classe, já que estes são de restituição.

2 POSSÍVEIS DECISÕES

2.1 A impugnação pedindo a reclassificação dos honorários advocatícios deve ser provida;

2.2 A impugnação a reclassificação dos honorários advocatícios deve ser improvida.

2.1 A interposição do recurso pedindo a reclassificação dos honorários advocatícios deve ser provida;

Desde a validação da nova Lei de Falências, existe uma celeuma quanto à classificação dos honorários advocatícios. No entanto, o posicionamento de que eles seriam preferenciais por conta de sua natureza equiparada à dos créditos trabalhistas, ou seja, alimentar, tem se tornado unânime nos tribunais.

A discussão seria por conta do não esclarecimento da referida lei em seu artigo 24, em que apenas fala de crédito privilegiado e não especificando do que realmente se trata a expressão, como ressalta Marlon Tomazette em seu livro Curso de Direito Empresarial: Falência e recuperação de empresas.

Em decisão unânime da 3ª turma do STJ, foi plasmado entendimento de que os honorários advocatícios “não podem ser excluídos das consequências da recuperação judicial, ainda que resultem de sentença posterior, e, por sua natureza alimentar, devem ter o mesmo tratamento conferido aos créditos de origem trabalhista”(BRASIL, REsp n° 1377764, data: 07/05/2014; Relator Min. Luís Felipe Salomão. Terceira Turma).

Vale ressaltar, que os advogados são profissionais liberais e têm por salário seus honorários, vindo deles então os alimentos. Todavia, é importante lembrar-se que há um limite de 150 salários mínimos para o pagamento preferencial de créditos de natureza trabalhista, que está descrito no artigo 83, inciso I da Lei de Falências.

Ainda sobre a subida de classe dos honorários advocatícios, levando em consideração que estes são equivalentes aos créditos trabalhistas em sua natureza alimentar, deve-se citar o artigo 151 que determina o pagamento pelo administrador judicial dos salários vencidos nos três meses anteriores à decretação da falência, assim que houver disponibilidade em caixa.

Ademais, é necessário também citar o artigo 24 do Estatuto da Advocacia (Lei n. 8.906?1994), que prevê a necessidade de habilitação dos créditos decorrentes de honorários quando se constatar a ocorrência de concurso de credores, falência, liquidação extrajudicial, concordata ou insolvência civil, como afirmou a Ministra Nancy Adringhi da 3ª Turma do STJ em seu voto a favor da igualdade entre a natureza do crédito dos honorários advocatícios e os trabalhistas.

2.2 A impugnação a reclassificação dos honorários advocatícios deve ser improvida

O principal argumento para a definição da classificação privilegiada do crédito dos honorários advocatícios como sendo igual à do crédito trabalhista é o fato de ele ter natureza alimentar ou ser o salário específico desse profissional liberal. Todavia, é prioridade compreender que os salários atrasados que compõem o crédito trabalhista são oriundos de uma relação empregatícia. Esta, por conseguinte, é levada em consideração pela natureza também social e que leva o empregado a uma situação de hipossuficiência em relação ao empresário.

É exatamente a questão da falta de hipossuficiência na relação, que Marlon Tomazette justifica seu posicionamento a favor da classificação dos honorários advocatícios:

Acima dos quirografários existem várias classes de credores, dentre as quais seria possível enquadrar os honorários nas classes “privilégio geral” e “trabalhistas”. A nosso ver, a classificação mais adequada é como equiparado a crédito com privilégio geral, tendo em vista a ausência de hipossuficiência na relação (TOMAZETTE, Pág. 536, 2014).

Além disso, a decisão proferida pelo STJ inclui os honorários contratuais e sucumbenciais. Por outro lado, no ponto de vista do Ministro Luiz Fux, os honorários sucumbenciais não podem ser equiparados aos créditos trabalhistas, já que aqueles são aleatórios e incertos e “dependem do êxito dos seus patrocinadores” (Recurso Ordinário no Mandado de Segurança 17.536/DF).

Neste diapasão, os honorários advocatícios não seriam natureza alimentar, visto que, não se configuram como algo regular em valor e nem em periodicidade, de maneira que não tornam-se algo isoladamente essencial. Desta forma, devem ficar na Classificação Geral dos Credores.

REFERÊNCIAS

COELHO. Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2006

TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial, volume 3: falência e recuperação de empresas / Marlon Tomazette. – 3. ed. – São Paulo: Atlas, 2014.

BENITO, Kelen Campos. Classificação do Créditos. Revista Âmbito Jurídico, 2012. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7693>. Acesso em: 24 de Abr. de 2016.

JAIRO; MELO, George. O que acontece quando é decretada a falência de uma empresa?. Acesso em: < http://www.jgm.com.br/2013/08/o-que-acontece-quando-e-decretada-a-falencia-de-uma-empresa/>. Acesso em: 20 de Abr. de 2016.

RICCI, Henrique. Honorário advocatício é crédito com privilégio geral. Revista Consultor Jurídico, 2014. Dispovível em: < http://www.conjur.com.br/2013-set-12/henrique-ricci-honorario-advocaticio-credito-privilegio-geral#_ftn1_5878>. Acesso em: 25 de Abr. de 2016.

BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1377764. Relator: Min. Luis Felipe Salomão . 07/05/2014. Nome do periódico, local, data, v., n.

STJ – Resp 566190/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHT, 3ª TURMA, julgado em 14/06/2005, DJ 1º/7/2005, P. 514.

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 1.       Case a apresentado à disciplina

 2.       Aluna do 6º período de Direito Noturno da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco- UNDB

 3.       Professor Mestre, orientador.

 

Como citar e referenciar este artigo:
SILVA, Géssica Cristine Medeiros da; OLIVEIRA, José Humberto G. de. Sinopse do case: Honorários advocatícios na classificação dos créditos da falência. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/empresarial/sinopse-do-case-honorarios-advocaticios-na-classificacao-dos-creditos-da-falencia/ Acesso em: 19 mar. 2024