Direito Empresarial

A Nova Lei de Falências e seus efeitos na prática.

A Nova Lei de Falências e seus efeitos na prática.

 

 

Thiago Carvalho Santos*

 

 

I. Notas Introdutórias

 

A gestão empresarial moderna identifica a importância de proporcionar aos seus empregados, parte mais importante do processo de inovação, um ambiente que proporcione a inovação, sendo tal assunto pauta do dia em qualquer empresa que pretenda manter-se viva no mercado.

 

Em vista as tendências comerciais, identifica-se que o crescimento das empresas está atrelado à transformação de novas idéias em mercadorias, bem como o desenvolvimento de peças e máquinas para aumento de produção ou redução de custos, caso contrário tais empresas estariam selando a própria sentença de morte. Tais inovações não teriam outra origem senão a exteriorização do espírito inventivo e criativo das pessoas, no caso em pauta, dos empregados.

 

Contudo, para o direito, o que seriam essas idéias transformadas em mercadoria, peças ou máquinas? Para sanar tal dúvida, importante alguns esclarecimentos e distinções.

 

Necessário distinguir a atividade criativa e inventiva nas empresas, oriundas do espírito criativo de seus funcionários ou prestadores de serviço dentro do universo do Direito a Propriedade Intelectual, subdividida em Propriedade Industrial e Direito Autoral.

 

Conforme o art. 1º, n. 2, da Convenção de Paris: “a proteção da propriedade industrial tem por objeto as patentes de invenção, os modelos de utilidade, os desenhos ou modelos industriais, as marcas de fábrica ou de comércio, as marcas de serviço, o nome comercial e as indicações de proveniência ou denominação de origem, bem como a repressão da concorrência desleal”.

 

Portanto, o Direito a Propriedade Industrial trata dos direitos dos inventores sobre suas invenções, e os dos empresários sobre os sinais distintivos de sua atividade.

 

Neste universo da propriedade industrial encontram-se: a) a invenção; b) o modelo de utilidade; c) o desenho industrial e; d) a marca, os quais serão tratados adiante.

 

Tais bens integrantes da propriedade industrial se materializam no ato da concessão pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI da patente ou registro (desenho industrial e marca).

 

O Direito Autoral, da mesma forma, integra o Direito Intelectual, porque seu objeto é um bem intelectual, tais como a invenção, a marca, o programa de computador, a descoberta científica, a nova espécie vegetal e tantos outros objetos de direito intelectual.

 

São bens integrantes do Direito Autoral, tradicionalmente, as obras literárias, artísticas ou científicas, classificando, assim, as obras intelectuais de que se trata, pelos domínios culturais em que atuam.

 

II. A Propriedade Industrial

 

A Propriedade Industrial é regida pela Lei 9.279/96, aplicando-se as invenções, desenhos industriais, marcas, indicações geográficas e à concorrência desleal.

 

O objeto da propriedade industrial – o invento – há de ser novo, visual ou funcionalmente, e fora do estado da técnica. Os requisitos para a concessão da proteção são: novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

 

Dos bens industriais, a invenção é a única não definida em lei, mas intuitivamente todos sabem o que é uma invenção, uma criação original do espírito humano, porém, traçar seus contornos exatos não é igualmente fácil.

 

Dessa forma, o legislador em seu art. 10 da Lei 9.279/96 vale-se do critério da exclusão, não sendo consideradas invenções: i) descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos; ii) concepções puramente abstratas; iii) esquemas, planos, princípios ou métodos comerciais, contábeis, financeiros, educativos, publicitários, de sorteio e fiscalização; iv) as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou qualquer criação estética (tutelados pelo Direito Autoral); v) programas de computador em si (Direito Autoral); vi) apresentação de informações; vii) regras de jogo; viii) técnicas e métodos operatórios ou cirúrgicos, terapêuticos ou de diagnósticos para aplicação no corpo humano ou animal; e ix) o todo ou parte dos seres vivos naturais e materiais biológicos.

 

O modelo de utilidade é o aperfeiçoamento da invenção, sendo definido pelo art. 9º da Lei como “objeto de uso prático, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma ou disposição envolvendo atos inventivos, que resulte em melhoria no seu uso ou em sua fabricação”.

 

Tal aperfeiçoamento deve representar um avanço tecnológico, que os técnicos da área considerem criativo, pois, se o aperfeiçoamento não possuir tais características, sua natureza jurídica será a de mera “adição de invenção”.

 

Quanto ao desenho industrial, a Lei 9.279/96 o define em seu art. 95: “Considera-se desenho industrial a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial”.

 

Portanto, o desenho industrial é uma alteração visual, ornamental, estética, não ampliando a sua utilidade, apenas o revestindo de aspecto diferente. Temos como exemplo a cadeira de braços projetada em 1899 por August Endell.

 

A marca, por sua vez, é definida pelo art. 122: “São suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais”, sendo classificadas em nominativas, quando compostas exclusivamente por palavras; figurativas, quando consistentes de desenhos ou logotipos (o M do Mc´Donald’s); e mistas, seriam palavras escritas com letras revestidas de uma particularidade (Coca-Cola), possuindo todos os tipos de marcas protegidos igualmente.

 

Diferentemente do direito autoral, que é isento de formalidades, o instituto da propriedade industrial repousa na idoneidade ou veracidade de seu título aquisitivo, de emissão da autarquia federal denominada Instituto Nacional de Propriedade Industrial – INPI.

 

No campo da propriedade industrial, ao contrário do que sucede em matéria autoral, vigora o princípio das formalidades: quem exibe o certificado de registro de uma marca, ou certificado de patente, é titular exclusivo e erga omnes de todos os direitos relacionados ao objeto lá descrito.

 

Dessa forma, é titular de propriedade industrial a pessoa jurídica ou física que ostentar o título aquisitivo do invento, da marca ou do desenho industrial.

 

III. O Direito Autoral

 

A proteção aos Direitos Autorais está prevista na Lei 9.610/98 e conforme exposto acima, tradicionalmente, são objetos de direito autoral as obras literárias, artísticas ou científicas.

 

Enquanto as criações no campo da propriedade industrial dependam do requisito de novidade, objetivamente considerado, as obras protegidas pelo direito de autor têm como único requisito, a originalidade.

 

A originalidade deve ser entendida em sentido subjetivo, em relação à esfera pessoal do autor, ou seja, a novidade representa um novo conhecimento para o próprio sujeito, enquanto que objetivo representa um novo conhecimento para a toda coletividade. Objetivamente novo é aquilo que ainda não existia; subjetivamente novo é aquilo que era ignorado pelo autor no momento do ato criativo.

 

Portanto, possuindo originalidade suficiente para merecer a proteção dos direitos autorais, essa proteção independe de qualquer registro, decorre do próprio ato de criação.

 

A Lei 9.610/98, conforme dispõe o art. 7º da referida lei, pretende proteger as “criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: i) os textos de obras literárias, artísticas ou científicas; ii) as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza; iii) as obras dramáticas e dramático-musicais; iv) as obras coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixe por escrito ou por outra qualquer forma; v) as composições musicais, tenham ou não letra; vi) as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as cinematográficas; vii) as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia; viii) as obras de desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte cinética; ix) as ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza; x) os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência; xi) as adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova; xii) os programas de computador; xiii) as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual.”

 

 

 

Dessa forma, o material no qual a obra venha a ser fixada, seja ele tangível ou não, é irrelevante.

 

Ademais, o artigo da lei ao indicar obras protegidas, o faz com o objetivo de exemplificar, visto que a expressão “tais como” do mesmo demonstra que a enumeração é, apenas, exemplificativa. Comporta outras, além do que ali se escreve. Pois, o campo da criatividade é imenso, infindável e até mesmo desconhecido nas suas possibilidades.

 

IV. O desenvolvimento criativo por empregados ou prestadores de serviço

 

Conforme inicialmente ressaltado, as empresas dependem do espírito criativo de seus colaboradores, funcionários e prestadores de serviço para desenvolvimento de novos produtos de sucesso e consequentemente sua manutenção no mercado.

 

Porém, como proteger funcionários da usurpação de suas invenções por empresas e como proteger os investimentos de empresas em desenvolvimentos e pesquisas com o objetivo de identificar um produto de sucesso desenvolvido por funcionários ou prestadores de serviço?

 

No que tange as invenções e os modelos de utilidade, regulados pela lei de propriedade industrial, desenvolvidos por empregados ou prestadores de serviço o art. 88 da referida lei esclarece:

 

“Art. 88 – A invenção e o modelo de utilidade pertencem exclusivamente ao empregador quando decorrerem de contrato de trabalho cuja execução ocorra no Brasil e que tenha por objeto a pesquisa ou a atividade inventiva, ou resulte esta da natureza dos serviços para os quais foi o empregado contratado.

 

Parágrafo 1º – Salvo expressa disposição contratual em contrário, a retribuição pelo trabalho a que se refere este artigo limita-se ao salário ajustado.

 

Parágrafo 2º – Salvo prova em contrário, consideram-se desenvolvidos na vigência do contrato a invenção ou o modelo de utilidade, cuja patente seja requerida pelo empregado ate 1 (um) ano após a extinção do vínculo empregatício.”

 

O “caput” do art. 88 é claro e coerente, pois não deveria ser diferente visto que foi a empresa que investiu e preocupou-se com a contratação de empregado para essa finalidade, qual seja: a que tenha por objeto a pesquisa ou a atividade inventiva, resultante do próprio contrato de trabalho.

 

Portanto, no contrato deverá estar claro o escopo do trabalho do empregado, que será a busca por invenção ou um modelo de utilidade, sob a forma de algo inédito, de um melhoramento ou aperfeiçoamento.

 

Por essa razão, não resta dúvida que a retribuição a ser paga se limita ao salário ajustado, não havendo nenhuma disposição legal sobre o beneficiamento por outros ganhos pela realização da invenção, tratando-se de uma faculdade da empresa, ora empregador, conceder ao empregado, autor do invento ou aperfeiçoamento, participação nos ganhos econômicos resultantes da exploração da patente (art. 89 da lei 9.279/96).

 

Tal liberalidade da empresa deverá ficar exposta em documento particular, contendo o preceito legal supra mencionado e cláusulas pertinentes aos ganhos econômicos derivados da utilização da patente, com a ressalva de após os pagamentos efetuados as partes nada mais poderão reclamar.

 

A empresa deverá adotar medidas de resguardo deixando consignando a finalidade dos pagamentos realizados em documento hábil ou recibo, com a ressalva de que tais valores não se incorporam ao salário do empregado.

 

Quanto ao desenvolvimento, aperfeiçoamentos e invenções exclusivas do empregado serão todas aquelas desvinculadas do contrato de trabalho e não decorrentes da utilização de recursos, meios, dados, materiais, instalações ou equipamentos da empresa (art. 90 da lei 9.279/96).

 

Portanto, as atividades desenvolvidas por empregados que não possuam como finalidade a invenção, ou seja, empregados que realizam atividades diversas a atividades exclusivamente de desenvolvimento e invenção, porém, que ainda assim desenvolveu algo que possa ser objeto de patente, sem dependência da empresa ou recursos e meios que a mesma possui, estaremos diante de uma invenção que pertencerá exclusivamente ao empregado.

 

A Lei 9.279/96, em seu artigo 91 esclarece a última hipótese de proteção dos direitos à propriedade intelectual no ambiente empresarial, onde a propriedade de invenção ou modelo de utilidade será comum, em partes iguais, quando resultar da contribuição pessoal do empregado e de recursos, dados, meios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador.

 

Surgem então dúvidas quanto à equipe de desenvolvedores e seus direitos, neste caso, a divisão da propriedade e seus possíveis proventos serão proporcionalmente divididos, formando um bloco entre os empregados e o empregador.

 

Quanto a sua utilização, terá preferência a empresa que ofereceu meios para o desenvolvimento da invenção ou modelo de utilidade, visto que tal posicionamento tem como objetivo resguardar os direitos da empresa frente a uma possível concorrência caso os empregados apresentem tal invenção para empresa concorrente.

 

Por derradeiro, o art. 92 esclarece que tais disposições aplicam-se ao trabalhador autônomo, o estagiário e empresas contratadas.

 

Contudo, tais disposições representam medidas adotadas em um universo restrito, tendo em vista que habitualmente funcionários e empresários não identificam que tal criação merece proteção, nem tão pouco a estipulação contratual de sua utilização nas hipóteses previstas nos arts. 89 e 91 da lei.

 

Quanto ao Direito Autoral no ambiente empresarial adotamos posicionamento idêntico ao ilustre Eduardo Vieira Manso sobre o “merchandising”.

 

Conforme esclarecimentos do próprio autoralista: “merchandising é uma estratégia mercadológica. Visa agilizar os negócios, principalmente os que envolvem compra e venda de produtos para consumo em massa. Com os recursos dessa estratégia, os homens de marketing buscam oferecer o produto certo, em quantidade certa, por preço certo, para que circulem o mais rapidamente possível. A atuação do designer, por exemplo, descobrindo novas formas para produtos tradicionais é uma atividade de merchandising: Emprega a Arte na Indústria, melhorando o produto através da fusão dos elementos beleza e utilidade. Ocorre um aprimoramento de forma, sem alterar necessariamente, a função do produto”.

 

A aplicação do merchandising no mercado está vinculada, em regra, com a utilização de criações do Direito Autoral aplicada em produtos, por exemplo, o elefante criado por Maurício de Souza nas latas de massa de tomate; os desenhos Disney em roupas, brinquedos, itens escolares e etc.

 

Tais exemplos são de obras de direito autoral conceituadas e de conhecimento universal, sendo indiscutível a necessidade de autorização e sua devida remuneração (royalties) pela utilização, contudo, obras desenvolvidas por empregados ou prestador de serviços, como personagens para promoção de produtos ou criações do espírito que possam ser utilizadas em produtos, não protegidos pela lei de propriedade intelectual, merecem a mesma proteção pelo direito autoral.

 

Nesta seara, são direitos morais do autor: o direito ao inédito, direito de ter seu nome sempre vinculado      à obra, o direito de se opor a quaisquer modificações que nela se pretendam introduzir, e as outras disposições expressamente previstas em lei especial; sendo tais direitos inalienáveis e irrenunciáveis.

 

Tratando-se de um direito notoriamente autoral, o qual confere ao autor poderes para autorizar ou proibir a fabricação de produtos industriais vinculados a sua obra protegida pelo direito autoral, para que o empresário a utilize é necessário a formulação de um negócio jurídico envolvendo um contrato de licença, visto que os direitos autorais são inalienáveis, não caberia o contrato de cessão de direitos autorais, tão somente uma concessão.

 

Concluímos, portanto, que a preocupação do empresariado quanto a necessidade de inovação e o desenvolvimento de novos produtos deve ser proporcional a preocupação de sua adequação aos preceitos legais, evitando assim a hipótese de desvio do fruto oriundo da atividade intelectual desenvolvido por empregado ou prestador de serviço para concorrentes ou possível demanda judicial de funcionários pleiteando remuneração devida.

 

 

 

* Sócio do escritório Carvalho Santos & Pantaleão Advogados

 

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Como citar e referenciar este artigo:
SANTOS, Thiago Carvalho. A Nova Lei de Falências e seus efeitos na prática.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/empresarial/a-nova-lei-de-falencias-e-seus-efeitos-na-pratica/ Acesso em: 28 mar. 2024