Aspectos Jurídicos do Comércio Eletrônico e Governo Eletrônico
Ana Amelia Menna Barreto de Castro Ferreira *
Abstract:
Considerações Iniciais
O comércio eletrônico, que se traduz em uma evolução na forma tradicional de realização de negócios, introduziu algumas novas conseqüências na atividade mercantil.
Entre suas características básicas podem-se destacar ser uma nova modalidade de venda, que, baseada nas tecnologias de comunicação, transformou-se no principal meio de negociação na sociedade de informação, instituindo um novo conceito de mercadoria
A forma de transação à distância trouxe mais agilidade na atividade comercial, maior velocidade aos atos mercantis, além de reduzir custos administrativos, uma vez que elimina o agente intermediário, presente nas negociações físicas. Porém, a característica mais marcante do CE é desconhecer fronteiras geográficas
As relações comerciais realizadas através da Rede, basicamente ocorrem entre empresas compradoras e fornecedoras – B2B; empresas e consumidor final – B2C; empresas e governo B2G – visando promover integração entre governo e empresas.
As atividades são desenvolvidas através do Comércio eletrônico – e-commerce; Comércio Móvel – m-commerce e o futuro próximo do Comércio Televisivo – t-commerce.
O comércio eletrônico, realidade mundial que se encontra em franca expansão, vem reclamar uma disciplina jurídica adequada , uma vez que a legislação em vigor não enfrenta todas as situações criadas pelo novo ambiente, sendo unânime que a falta de uma legislação específica é o maior empecilho para o desenvolvimento do CE.
Porém, a necessidade de normatizar as condutas na nova plataforma deve ser guiada pelo propósito básico de facilitar o desenvolvimento da atividade .
Aspectos Jurídicos do Comércio Eletrônico
Em relação ao Direito, a formalização da transação eletrônica vem em desencontro à cultura da exigência do suporte físico do papel. Pelo fenômeno típico da tecnologia digital, contratos podem ser realizados sem a presença física dos contraentes, assinados e arquivados digitalmente, sem necessidade de apresentação, ou representação da operação em papel
Desta forma, quando utilizados os meios digitais para a manifestação da vontade, dispensando-se a representação material, é necessário enfrentar a questão da segurança da contratação, pois as partes integrantes da relação jurídica necessitam provar a realização do negócio e seu conteúdo, para garantir-se de eventual descumprimento da obrigação
Aspectos Jurídicos do Documento Eletrônico
A necessidade da renovação dos diplomas legais visa acompanhar a evolução tecnológica para conceder ao contrato eletrônico, uma nova forma contratual, idêntica segurança jurídica do contrato escrito.
Leve-se em consideração que a arquitetura da grande rede se traduz em um mercado que ameaça a privacidade, onde a vulnerabilidade do ambiente eletrônico pode permitir a manipulação de documentos sem o prévio conhecimento dos contraentes.
Portanto, para que se conceda validade jurídica ao documento eletrônico, deve este revestir-se de características intrínsecas ao meio onde foi produzido:
– Integridade – Visa impossibilitar a adulteração de informações, garantindo a preservação do conteúdo durante o transporte na rede, onde a informação recebida tem idêntico conteúdo da enviada
– Confidencialidade – Garante o sigilo das informações, impedindo o acesso a usuários estranhos ao contrato, onde apenas as partes contraentes têm acesso ao teor do negócio celebrado
– Disponibilidade – O documento necessita estar disponível para consulta em ambiente dotado de sistema seguro, que possibilite a qualquer tempo o acesso ao conteúdo pelo usuário autorizado a consultá-la.
Contrato Eletrônico
Os contratos celebrados eletronicamente diferem dos contratos clássicos apenas no que se refere à forma como são firmados, que se distingue pelo meio utilizado – eletrônico
Devem, porém, preencher todos os requisitos aplicáveis às demais espécies de contrato, acrescido de outros específicos da plataforma eletrônica.
Com exceção daqueles em que a lei exige forma especial para sua validade, todos contratos podem ser celebrados eletronicamente, havendo para tanto, a necessidade de cumprimento de alguns requisitos para sua validade .
– Identificação–Consistente na verificação da identidade do remetente
– Autenticação– A assinatura do signatário deve estar autenticada por certificadora, como garantia de validade
– Impedimento de Rejeição– Visa impedir a negação de validade do contrato posto celebrado por meio eletrônico
– Verificação– Devem os contratos ser armazenados em meio eletrônico de forma segura, possibilitando verificação futura por parte dos interessados
– Privacidade– Indispensável estar resguardado em ambiente que garanta privacidade nas comunicações
– Comprovação inequívoca recebimento– Necessária prova do recebimento pelo destinatário
Dificuldades
Sendo certa a impossibilidade da garantia de segurança absoluta na Internet, encontra-se dificuldade quanto assemelhar o contrato eletrônico ao contrato escrito, tendo-se em vista principalmente a ausência do suporte físico do papel
A dificuldade encontrada no armazenamento digital dos contratos diz respeito à natureza da tecnologia, que permite ocorrer manipulação de dados sem vestígios das modificações introduzidas.
A insegurança advinda pelo formato digital, portanto, não confere força probatória ao documento eletrônico, produzido sem a utilização de tecnologia de segurança.
Segurança
A segurança, chave mestra das operações realizadas na Internet , será alcançada através assinatura digital, considerada vital para o desenvolvimento do comércio eletrônico, sendo a criptografia a tecnologia garantidora do sigilo das comunicações eletrônicas e liberdade de expressão
A utilização da assinatura digital, permitirá que os negócios realizados na nova plataforma passem a oferecer segurança, garantindo que os documentos eletrônicos identifiquem e responsabilizem as partes da operação, protegendo os usuários contra a fraude, vindo a certificaçãoeletrônica equiparar o documento eletrônico ao físico, escrito e assinado
Legislação Brasileira
Verificamos na legislação brasileira a inexistência de um ordenamento regulamentador. Vários projetos de lei se encontram
Reside, porém, a necessidade de regulamentação específica somente em algumas questões de difícil solução, levando-se em consideração que o ordenamento legislativo em vigor não enfrenta todas as possibilidades advindas da arquitetura da grande rede.
Defendemos uma adaptação das normas ambiente eletrônico à nova realidade, um ajustamento de linguagem que garanta o livre desenvolvimento de tecnologias futuras .
Levando-se em consideração que a característica mais revolucionária da Internet é desconhecer fronteiras geográficas, a tendência mundial sinaliza para a adoção de regras internacionalmente aceitas, garantindo a eficácia jurídica das transações internacionais realizadas .
Governo Eletrônico
Atento à necessidade de adaptar-se às novas exigências da sociedade, onde a Internet atua como um novo veículo de comunicação, o Governo se utiliza da rede para informar e prestar seus serviços a comunidade, relatar suas ações, oferecendo transparência dos atos administrativos, bem como uma maior fiscalização , além de proporcionar oportunidade de manifestação pelos cidadãos.
A Rede Governo se transformou no Portal do Governo Brasileiro, a fonte oficial de informações sobre a estrutura organizacional dos órgãos do poder executivo, administração direta, autarquias, fundações , oferecendo cerca de 900 serviços pela Internet.
Registre-se que o Brasil figura entre os 20 países mais adiantados em relação à implantação de ferramentas de governo eletrônico.
Entre as iniciativas em prática, encontra-se o Informativo do Governo Eletrônico, a página eletrônica de compras do Governo Federal – Comprasnet , onde o desenvolvimento serviços na rede significou uma redução custos calculado à ordem de 25% .
O pregão eletrônico foi outra iniciativa do Poder Público, que segundo o Ministério do Planejamento, foram realizado até julho 14 pregões eletrônicos para aquisição de materiais diversos. O comércio B2G se depara com alguns problemas advindos da aplicação da Lei Federal 8.666, pois a mesma não se enquadra aos procedimentos do meio eletrônico
A lentidão da implementação do projeto está principalmente ligada à necessidade de adaptação da máquina pública à essa nova modalidade de compras. Além de residir dúvidas sobre procedimentos que necessitam ser adotados, devem os recursos ser resolvidos na própria sessão de compras, em ambiente virtual
Atualmente encontram-se
Órgãos Federais
Os órgãos federais se encontram bem adiantados em sua legislação administrativa interna, como se demonstra a seguir :
Comitê Executivo Comércio Eletrônico- Portaria Interministerial 47/00 e 72/01 – MCT/DIC/MPOG
Comitê Interministerial de Combate à Pirataria – Decreto de 13.01.01
Secretaria da Receita Federal – IN 156/99 – Certificados Eletrônicos – e-CPF/CNPJ, IN 35/01 – Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica
Ministério Previdência Assistência Social – Portaria 2.744/01 – GPS eletrônica
Ministério da Fazenda – Portaria 95/01- Arrecadação Receitas Federais por Meio de Aplicativo da SRF em ambiente Internet
Banco Central – Resolução 2817/01- Abertura e Movimentação Contas Depósito exclusivamente por Meio Eletrônico
Poder Executivo Federal
O Poder Executivo Federal transita em uma espécie de bolha legislativa, estabelecendo por iniciativa própria, regras válidas para o relacionamento entre seus órgãos como também para com os cidadãos.
Destacam-se entre elas :
MP 2.026/00 – Institui Modalidade de Licitação- Pregão
MP 2.182/01 – Reedição n. 18 da MP 2.020
Decreto 3.555/00 – Aprova Regulamento Pregão
Decreto 3.893/00 – Nova Redação Dispositivos Regulamento Pregão
Decreto 3.697/00 – Regulamenta Artigo da MP
Decreto 3.587/00 – Normas Infra Estrutura Chaves Públicas
Decreto 3.714/01 – Remessa Documentos Meio Eletrônico
MP 2.200/01 – Infra Estrutura Chaves Públicas Brasileira – ICP
Decreto 3.872/01 – Comitê Gestor da ICP-Brasil
MP 2.200-01 e 02 – Reedição MP 2.200
Projetos de Lei
São inúmeros os Projetos de Lei
– Legislação Internacional – Certificação Digital
Na Comunidade Européia, nenhuma das 13 nações criou hierarquia única ou uma raiz nacional.
Na Itália foi adotado o modelo de múltiplas raízes do Governo e do mercado, visando estimular a competição , onde operam 12 empresas certificadoras credenciadas
A Austrália não criou uma raiz nacional, possibilitando que a agência governamental crie classes de certificados, cuja definição de requisitos variam de acordo com as necessidades
Nos Estados Unidos as empresas privadas fornecem o serviço certificação digital, lembrando que cada Estado possui sua legislação própria
O Canadá opera com uma raiz própria. Limitada porém ao Governo e não nas relações entre Governo e iniciativa privada
Brasil
Através da Medida Provisória nº 2.200, reeditada por duas vezes com alterações, o Governo institui a Infra Estrutura de Chaves Públicas Brasileiras – ICP Brasil, para garantir autenticidade, integridade e validade jurídica documentos em forma eletrônica.
Sinteticamente, informamos abaixo sua estrutura :
– Composição : Autoridade Gestora Políticas
Autoridade Certificadora Raiz
Autoridade Certificadora
Autoridade de Registro
Autoridade Gestora Políticas
Comitê Gestor – Coordenação Casa Civil
Composição: 7 representantes órgãos governamentais, 5 representantes sociedade civil
Funções: coordenar implantação e funcionamento da ICP
Estabelecer política, critérios e normas técnicas para o credenciamento das AC e das AR
Estabelecer política certificação da AC Raiz
Autoridade Certificadora Raiz – AC Raiz
Executora das normas aprovadas pelo Comitê Gestor
Primeira autoridade cadeia certificação
Exercida pelo ITI – Instituto Nacional de Tecnologia da Informação, elevado a condição de autarquia federal
Funções: emitir, expedir, distribuir, revogar e gerenciar os certificados da AC
Fiscalizar, auditar, aplicar sanções e penalidades as AC e AR
Autoridade Certificadora – AC
Órgãos e Entidades Públicas – pessoas jurídicas de direito privado
Funções: emitir, expedir, distribuir revogar e gerenciar certificados de chave pública
– Funciona com base material e técnica da confiança da ICP Brasil
– Gerencia os certificados de chave pública em todo ciclo de vida
Autoridade Registradora – AR
Entidades operacionalmente vinculadas à determinada AC
Funções: identificar e cadastrar usuários, na presença destes, encaminhar solicitações de certificados às AC e manter registro de suas operações
Implementa a interface entre usuário e a autoridade certificadora
Principal Função: identificação do usuário, validação da solicitação
Submissão da solicitação de certificado à AC
Diferenças entre a Medida Provisória 2.200 , o Projeto de Lei nº 1.589 e o Substitutivo nº 4.906
– Estrutura Administrativa
PL– Entidades certificadoras
– Entidades credenciadoras
MP– autoridade certificadora raiz
Autoridade certificadora
Autoridade registradora
– Credenciados como AC
PL 1.589– Tabeliães e entidades certificadoras privadas
Substitutivo–– pessoas jurídicas de direito público ou privado
MP –órgãos e entidades públicas e as pessoas jurídicas de direito privado art. 8
– Certificadoras – Validade Jurídica
PL1.589 – monopólio cartorial
Somente a certificação por tabelião faz presumir sua autenticidade
certificação por particular não gera presunção de autenticidade perante terceiros
Substitutivo– não obriga usuário usar certificadora credenciada para que o documento tenha validade jurídica. Vinculada à tecnologia de criptografia assimétrica
MP–monopólio governamental da chave raiz
vincula validade jurídica ao credenciamento da empresa certificadora na ICP
– Credenciamento AC
MP – utilização processo certificação ICP
PL – entidades certificadoras públicas e privadas atuam sem autorização do Estado
qualquer empresa ou órgão pode atuar como emissor certificado eletrônico
entidade credenciadora – fiscaliza as certificadoras que desejarem se credenciar
Conclusão
A Certificação Digital no Brasil, regulada através da Medida Provisória nº 2.200 , se encontra em vigor e submete ao prévio credenciamento do governo a atividade de certificação, vinculando a validade jurídica ao credenciamento de empresas certificadoras.
* Advogada. Mestranda e Pós-Graduada em Direito Empresarial e em e-Lawyer. Professora em Pós-Graduação e Palestrante na área do Direito e Tecnologia da Informação. Presidente da Comissão de Direito e Tecnologia do Instituto dos Advogados Brasileiros
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