Direito Tributário

As empresas de economia solidária e o desenvolvimento sustentável: da necessidade de uma política tributária social

Daniele Wachholz Timm[1]

Eder Dion de Paula Costa[2]

RESUMO

O tema discutido neste trabalho será a aplicação dos tributos sob as empresas de economia solidária e a necessidade emergencial de uma revisão no sistema tributário para que seja atingida a política social do desenvolvimento sustentável. Perante este aspecto, o objetivo geral da pesquisa é a demonstração que seja realizada, em caráter diferenciado, a incidência tributária no tocante às empresas de economia solidária, tendo em vista a sua relevância para a sociedade. Para tanto, se utilizou neste trabalho de revisão bibliográfica calcada nos conceitos de economia solidária para Paul Singer, Hannah Arendt e Karl Max, dentre outros autores clássicos. Esta pesquisa informará a importância de que se repense a burocracia e o sistema tributário aplicados à coletividade trabalhadora solidária e o sistema tributário, de forma que se contribua em melhoria nas condições sociais e econômicas dos trabalhadores, de forma direta, e do Estado, de forma indireta.

Palavras-Chave: Política Social. Tributação. Economia solidária.

ABSTRACT

This study is to discuss the topic solidarity economy from the standpoint of taxation, placing the appearance of context and the type of problem imputed for taxation for sustainable development. The overall objective of the research is to demonstrate the differential purpose of solidarity companies justifying the need for tax incidence in different character because of their relevance to society. It presents a unique approach to their interpretation, based on arguments of economic sociology and tax law, indicating that such a discussion is food for thought and practice from a current way of taxing that provides sustainability to the solidarity companies. This research will raise the need to rethink solidarity working community, so that departs bureaucratization, with the consequent improvement in tax revenues of thestate.

Keywords: Social policy. Taxation. Solidarity economy.

1 INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, a economia solidária começou a possuir legislação regulamentadora, e essa veio para obstaculizar a sua formalização bem como a sua sustentabilidade de acordo com Singer(2002).

Com a origem de empresas solidárias, iniciativas empreendedoras igualitárias sociais vêm se ampliando consideravelmente, originando também desafios para que as empresas sociais saiam dainformalidade.

Acerca da evolução do tema economia solidária para a reflexão que a pesquisa se propõe a fazer, inicialmente analisa-se os objetivos das empresas solidárias.

Os objetivos estão intrinsecamente ligados ao elemento origem desta economia mista monetária/não monetária e mercantil/não mercantil. Antes de falar em objetivo, convém estabelecer a premissa base das empresas solidárias. Singer (2002, p.1) define a economia solidária

[…] como um modo de produção que se caracteriza pela igualdade. Pela igualdade de direitos, os meios de produção são de posse coletiva dos que trabalham com eles – essa é a característica central.

Para Arendt (2004, p.222) a economia solidária possui

(…) ausência de relacionamento humano e essa preocupação fundamental com mercadorias permutáveis que Marx denunciou como a desumanização e auto-alienação da sociedade comercial que, de fato, exclui os homens enquanto homens e, numa surpreendente inversão da antiga relação entre o público e privado, exige que eles se revelem somente no convívio familiar ou na intimidade dos amigos.

Assim as empresas solidárias surgem em comunidades humildes devido à necessidade ou busca de melhores condições de comercialização ou venda de determinados produtos da região, tendo por objetivo buscar a igualdade, atuando como meio de inclusão social do trabalhador excluído ou de indivíduos menos favorecidos.

Por outro lado, têm-se as empresas particulares. Originam-se da busca por lucro partindo da iniciativa de um empresário, com certo poder aquisitivo.

Traçando-se um paralelo dicotômico quanto a finalidade do exercício da atividade pode-se observar que não há como comparar tais empresas, muito menos equipará-las às pequenas empresas, que é o que tem ocorrido na aplicabilidade de alíquotas de incidência tributária.

Entende-se que, os objetivos e natureza de empresas particulares são totalmente diversos, de um lado a vida capitalista e, de outro, a melhoria para uma comunidade por meio de uma empresa que o própria nome já diz: “solidária”. Tal atividade deveria ser incentivada e a tributação deveria ser entendida como um meio de política social invés de igualar a exploração empresarial. Assim, o objetivo geral da pesquisa é demonstrar a finalidade diferencial das empresas solidárias justificando a necessidade de incidência tributária em caráter diferenciado devido a sua relevância parasociedade.

O referencial teórico utilizado refere-se a conceitos desenvolvidos e até mesmo criados e criticados por Singer, ao longo de sua trajetória acadêmica como professor, economista e Secretário Nacional de Economia Solidária, tais como: economia solidária, objetivos, tipos, tributação, política social. As empresas de economia solidária têm objeto peculiar, que vão além da simples exploração capitalista que desenvolve atividade empresarial em busca de auferir lucros e vantagens. O que tem se discutido em audiências públicas e fóruns, principalmente, é a “equiparação” de empresa solidária à pequena empresa quanto à forma de tributação, sendo que os objetivo de ambas são totalmente diversos.

Destarte, não há que se falar em tributação de forma igualitária, em um discurso meramente arrecadatório, já que o que se verifica na economia solidária é o aspecto social/humano – que visa proporcionar melhores condições a uma determina comunidade/sociedade – dentro do que se denomina política social, ao contrário do que buscam as empresas particulares, que trabalham em meio à exploração de pessoas de condições inferiores que, por necessidade, se submetem a ser meros “empregados”, visando a busca por lucro, segundo o entendimento de Singer (2002) acerca do assunto.

Este artigo está estruturado em cinco seções. A primeira contém a introdução do tema proposto, na segunda seção serão analisadas as empresas de economia solidária, bem como seus tipos. Em seguida, a terceira seção tratará dos procedimentos metodológicos aplicados neste estudo. A quarta seção, por sua vez, dividida em quatro subseções, buscará apresentar as soluções para o problema aqui exposto. Finalmente, a última seção tecerá acerca das considerações finais do tema estudado.

2 EMPRESAS DE ECONOMIASOLIDÁRIA

De acordo com Singer (2002, p. 10),

Economia solidária é outro modo de produção, cujos princípios básicos são a propriedade coletiva ou associada do capital e o direito à liberdade individual. A aplicação desses princípios une todos os que produzem numa única classe de trabalhadores que são possuidores de capital por igual em cada cooperativa ou sociedade econômica.

Pela citação acima, ficam claros os princípios básicos da economia solidária formada por uma classe única de trabalhadores: a liberdade individual defendida como direito basilar e a formação de propriedade coletiva ou associada do capital.

A economia solidária surgiu, conforme Singer (2002), em meados do século XIX, após o capitalismo industrial, como meio de reação ao crescente número de desemprego causado devido a invenção de máquinas fabris, tendo iniciado pelas máquinas a vapor.

Devido a origem de tal economia, que visou sempre os mais necessitados, enfrentou reação por parte dos capitalistas e grandes empresários, desta forma, não possuiu legislação favorável específica aplicada a elas.

De acordo com Singer (2002), até a Revolução Francesa não havia regulamentação, tendo em 1817 Robert Owen -um britânico, proprietário de indústria têxtil- apresentado ao governo um plano para sustento aos pobres, que seria então, a origem dascooperativas.

Entretanto, no Brasil, esta economia baseada na solidariedade chegou no começo do século XX trazida pelos europeus, principalmente na forma de cooperativa, e em meados da década de 90 em forma de associação. (SINGER, 2002).

Em 1980 as empresas solidárias começaram a ser apoiadas por Universidades Federais e hoje são amparadas por meio de projetos e incubadoras tecnológicas, que fornecem e desenvolvem grupos de estudos e pesquisas sobre economia solidária. Estas denominam- se Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCPS). Após surgiu apoio da Fundação Unitrabalho, que reúne as universidades afim de auxiliar os gestores. (SINGER,2002).

Posteriormente, em 2001, surgiu a Rede Brasileira de Economia Solidária, formada por diversas entidades de economia solidária de todo país. E, em junho de 2003, foram criados o Conselho Nacional de Economia Solidária e a Secretaria Nacional de Economia Solidária – SENAES no Ministério de Trabalho e Emprego. (SINGER, 2002).

Em seguida, com o intuito de estabelecer objetivos, estratégias e diretrizes operacionais, fora elaborado o 1º Plano Nacional de Economia Solidária (2015-2019)

? no intuito de promover o direito de produzir e viver de forma associativa e sustentável.

Atualmente, tramita o Projeto de Lei 4685/2012 – aguardando parecer do relator na comissão de constituição e justiça e de cidadania (CCJC) – que dispõe sobre a Política Nacional de Economia Solidária e os empreendimentos econômicos solidários, cria o Sistema Nacional de Economia Solidária e dá outras providências.

Dessa forma, depreende-se a notoriedade de carência de legislação quanto ao assunto abordado, seja quanto à regulamentação ou quanto à tributação em específico.

TIPOS DE EMPRESASSOLIDÁRIAS

Embasado nos conceitos de Paul Singer (2002), como também de França Filho e Laville (2004), entende-se que as empresas de economia solidária apresentam-se, sob seis tipos: cooperativas, associações, empresas autogestoras, grupos solidários, redes solidárias e clubes de trocas.

As cooperativas atualmente são a forma mais comum de empresa solidária no Brasil, sendo consideradas associações de trabalhadores autônomos e, consequentemente, a cooperativa não tem nenhuma responsabilidade sobre o ganho e os direitos sociais de seus próprios sócios. Por vezes, sendo meio de fraude por empresários que com o fim de burlar a legislação trabalhistas fundam cooperativas. Tem por finalidade viabilizar negócio produtivo economicamente perante o mercado, havendo divisão de ganhos entre os membros.

Já as associações, conforme Paul Singer (2002), diferem-se das cooperativas quanto a finalidade, que é proporcionar aos associados assistência social, educacional, cultural, política, defesa de interesse de classe ou filantrópicae quanto, a participação, aqui não há divisão de resultados obtidos.

As empresas autogestoras talvez sejam a principal diferença entre empresas capitalistas e solidárias. Nesta modalidade, a empresa é administrada de forma democrática onde cada membro tem direito a voto de forma igual aos demais sendo todas as decisões tomadas em assembleias e decididas por todos. Para que ocorra autogestão é necessário o interesse dos membros para que todos saibam o que ocorre na empresa e decidirem as soluções para resolução de eventuais problemas. Como diria Singer: “A autogestão exige um esforço adicional dos trabalhadores na empresa solidária: além de cumprir as tarefas de seu cargo, cada um deles tem de se preocupar com os problemas gerais da empresa.” (SINGER, 2002, p. 19).

Grupos solidários, de acordo com Paul Singer (2002), são compostos de comunidades tradicionais – pescadores, quilombolas, índios, quebradeiras de coco, agricultores – organizados na forma de pequeno empreendimento, onde exercem em grupo a atividade que individualmente não seriam capazes de atender ou empresas comandam empresas que se tornaram deficitárias, quando dirigidas por meios convencionais de direção empresarial.

As redes solidárias são formadas por diferentes comunidades e grupos que trabalham em conjunto com a finalidade de fomentar cadeias produtivas de redes. O produto final obtido na rede solidária é resultado de uma organização desde o início, com o fornecimento do material necessário de uma empresa solidária que será trabalhada por cooperados de outra empresa e por fim serem comercializados por feiras ou eventos de economia solidária. Do material até a venda, o produto passa somente por empreendimentos solidários por isto, denomina-se deredes.

Os clubes de Troca são uma das modalidades de economia sem dinheiro de origem francesa, chamado de Systèmes d´´echanges locaux (SEL). Nasceu da necessidade, em situação de crise, de obter-se produtos e serviços por meio de um mercado organizado, com sistema de preços definidos e utilizando moeda própria para as trocas. (FRANÇA FILHO; LAVILLE, 2004).

3 PROCEDIMENTOSMETODOLÓGICOS

Esta pesquisa é do tipo descritiva, documental e qualitativa. Foram utilizados materiais bibliográficos, doutrinários, além de legislações extraídas de sítios eletrônicos e dados comparativos.

O referencial teórico baseou-se em conceitos utilizados por Paul Singer, que dentre outros, podemos destacar a economia solidária, política social e tributação. Além de autores renomados como Karl Marx e Hannah Arendt.

4 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS

Esta seção traz as características das empresas solidárias, bem como os pontos que possibilita diferenciá-las das empresas particulares. Além disso, expõe a solidariedade como princípio constitucional, podendo ser usado como justificativa para a tributação diferenciada das empresassociais.

ECONOMIA SOLIDÁRIA TRIBUTADA DE FORMA SIMILAR A PEQUENAS EMPRESAS

De acordo com Marx e Engels (1999), o atual cenário tributário brasileiro insere as empresas de economia solidária nas mesmas tabelas aplicadas às empresas privadas, tendo sido alvo de discussões, críticas e audiências públicas por todo território brasileiro. No que concerne aos objetivos diferenciadores que impediriam tal equiparação, é notório que as empresas de economia solidária contribuem para o desenvolvimento de pessoas, da comunidade e do município ao qual estão inseridas, ao invés de meramente multiplicar lucros sem objetivo social, tais como as empresas particulares que não têm a preocupação com o lado humano, como denunciavaMarx.

Insere-se, neste diapasão, um discurso construído em torno do objetivo da exploração de tal atividade econômica, criando uma crítica ao sistema de tributar.

Segundo Singer (2002) as empresas de economia solidária enfrentam obstáculos para sua formalização e dificuldades no enquadramento contábil, já que não possuem caráter empresarial e sim social, por meio da solidariedade, buscandoigualdade.

Interligando estes conceitos norteadores, tem-se elucidada a diferença de objetivo e objeto da empresa, sendo o processo de tributação e meio de enquadramento ou até mesmo o sistema burocrático contábil, incompatível com a natureza da empresa de economia solidária. Tal burocratização imposta dificulta a formalização de empresas de econômica solidária, pois não observa o grau de instrução e condições socioeconômicas daqueles que a compõem, que irão repercutir nas relações sociais do trabalho e na estrutura e organização da sociedade.

PRINCÍPIOS NORTEADORES DE EMPRESASSOLIDÁRIAS

Precipuamente, segundo Paul Singer, destacam-se os princípios da solidariedade, autogestão, cooperação e da ação econômica.

O princípio da solidariedade caracteriza-se pela preocupação com outro, vindo a ser concretizado de diversas formas em empresas solidárias, por exemplo, na divisão justa dos resultados, no envolvimento comunitário, preocupação com o meio ambiente, de maneira que aquela comunidade na qual está inserida a empresa possa ajudar cada vez mais associados de maneira saudável e sustentável. Tamanha é a importância deste princípio, que vem entabulado na denominação do tipo empresarial “Empresas de Economia Solidária”. Desse modo, vislumbra-se a finalidade da empresa de cunho social sem finslucrativos.

O princípio da autogestão é caracterizado pela forma deliberativa adotada. Todos os associados são participantes ativos com iguais direito e participação, assim as decisões são tomadas de forma coletiva, por meio de votação onde o grupo decide/contribui para a tomada de decisão ao invés de concentrar o poder de decidir em um indivíduounicamente.

O princípio da cooperação, é de origem primordial, originando o termo “cooperativas”. Tal princípio, visa a união, como meio de força na busca de resultados positivos e não por meio de competição, unindo forças, atributos e capacidades para partilhar com a coletividade os resultados.

Por fim, tem-se o princípio da ação econômica que enseja destaque diferenciado a economia solidária, por ser a economia solidária formada de iniciativas de motivação econômica, embora sem fins lucrativos, tais como: produção de bens, prestação de serviços, finanças solidárias (crédito) ecomércio.

No entanto, enfatiza-se a finalidade do empresário solidário, qual seja a de agregar melhorias a sociedade e reforçá-la através de discussões acerca da elaboração de legislação específica, de forma que o leve a uma “aprovação” final, por meio de planejamento e elaboração de projetossustentáveis.

TRIBUTAÇÃO E SOLIDARIEDADE SOCIAL: A SOLIDARIEDADE COMO PRINCIPIOCONSTITUCIONAL

De grande valia para um estudo aprofundado, se faz a análise das características mais importantes da solidariedade, que passar-se-á a tratar com estudo do Princípio.

A solidariedade social, abrange os mais diversos ramos do direito. Trata-se de princípio de Direito Positivo, a partir da Constituição Federal de 1988. Segundo Machado (2015, p. 45) o princípio da tributação e solidariedade social é “tão importante quanto o princípio da legalidade tributária foi nos últimos anos.”

Segundo o entendimento deste autor, o tributo tem seu caráter social por meio da redistribuição de renda, na qual é de suma importância a participação ativa do ente estatal, desde que não atue meramente arrecadatória, traçando linha tênue entre solidariedade elegalidade.

A relação entre contribuinte e Estado, torna-se mais frágil ainda no que concerne às empresas solidárias, no que tange a dificuldade de formalização. O princípio da Solidariedade prima pela tributação justa e a redistribuição de renda. Entretanto, a legalidade tem obstaculizado o desenvolvimento sustentável das empresas em questão.

Como asseverado anteriormente, o amparo para tributar de forma diferenciada as empresas solidárias encontra amparo na Constituição Federal (1988) “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa esolidária;”

TRIBUTAÇÃO COMO POLÍTICASOCIAL

Inovações tributárias como políticasocial

A onerosidade da carga tributária brasileira nas últimas décadas tem dificultado o exercício de atividades empresarias, sendo a situação agravada pela crise financeira nos últimos anos.

Desse modo, tem grande relevância a tributação, pois serve como meio de suporte para obter um resultado a longo prazo, que seria desenvolver empresas solidárias sustentáveis.

Outra nota característica do sistema tributário são os incentivos fiscais oferecidos às grandes empresas, isenções ou até mesmo imunidades, tais como aos templos religiosos. Nesta seara de exemplos, não são contribuintes incapazes que na maioria dos casos nem necessitaria de tal “beneficio” para manter-se no mercado.

Segundo entendimento Paulsen (2014), Desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, citado por Cardoso (2014, p. 191):

[…] o Estado Social altera a estrutura e o fundamento da tributação, que se vincula aos seus objetivos, notadamente, de combate às desigualdades sociais e de melhoria da distribuição de renda entre os cidadãos. A partir de então, desenvolve-se uma tributação fortemente centrada na capacidade contributiva, que privilegia os tributos progressivos (principalmente sobre a renda e as heranças) e que se orienta, sempre que possível e necessário, mediante considerações extrafiscais. Tem-se, portanto, uma dupla justificação para a tributação: a tradicional, de se sustentar o aparato estatal; e a novel, de influir diretamente na estrutura social, contribuindo para a efetivação da equidade entre oscidadãos.

O caráter dúplice da tributação consiste em fornecer recursos para o Estado, desta forma, levando ao seu fortalecimento econômico, e também em alterar a situação social, no momento em que procura diminuir as desigualdades de renda doscidadãos.

Da necessidade de política tributáriasocial

Conforme Barbosa (2007), a Economia Solidária é uma realidade no Brasil, empresas de economia solidária são destaque em determinadas regiões, inclusive em alguns casos, com a utilização de moeda própria para comercializarem os produtos, como por exemplo, na Bahia.

As empresas de economia solidária surgem em comunidades humildes, devido à necessidade ou busca de melhores condições de comercialização ou venda de determinados produtos da região. Salienta-se que como o objetivo é buscar a igualdade, atua como meio de inclusão social do trabalhador excluído.

Por outro lado, têm-se as empresas particulares. Originam-se da busca por lucro partindo da iniciativa de um empresário, com certo poder aquisitivo. Neste estudo, aborda-se as empresas de pequeno porte.

Desta forma, pode-se afirmar que não é possível sua equiparação as pequenas empresas. Inicialmente, Singer (2002) defende, em fóruns que participa, que a legislação brasileira quanto ao cooperativismo é obsoleta e o seu trabalho é para mudá-la.

Quanto à legislação, o obstáculo da economia solidária hoje é a burocratização e a determinação de alíquotas de imposto iguais a de empresas particulares. Salienta-se que não se trata de empresa dirigida por um empresário e, sim, de uma empresa solidária dirigida por excluídos da sociedade, logo, não há como exigir o mesmo enquadramento, por conseguinte o maior obstáculo hoje relatado é o enquadramento tributário.

Entretanto, este sistema de economia solidária apesar da inclusão social, não traria “benefícios” a sociedade, se assim não estivesse equiparada às pequenas empresas. Ressalta-se aqui a finalidade arrecadatória do Estado que dificulta diminuir asdesigualdades.

Neste ponto, o Direito Tributário é de suma importância quanto às empresas de economia solidária. No entanto, atua como limitador de gestão colaborando para exclusão social, não reconhecendo a importância do papel político dentro da vida social. Todavia, deveria ser utilizado como meio de política social, por meio de iniciativas empreendedoras, de tabelas, de alíquotas diferenciadas. De forma indireta, o Estado contribuiria para a melhoria da região na qual está situada a empresa.

Neste sentido, Singer (2002, p. 93) ressalta que

A ajuda do Estado será um fator importante para o movimento das cooperativas de produção, por uma série de motivos […] as firmas capitalistas, que concorrem com as cooperativas de produção, também contam com a ajuda do Estado, sob formas usuais de isenções fiscais e crédito favorecido. Portanto, para concorrer em condições de igualdade com estas firmas, as cooperativas de produção precisam do apoio do poder público. (SINGER, 2002, p. 93)

Segundo Yunnus

A pobreza é uma doença crônica. Não pode ser curada com medidas improvisadas. Pode haver medidas de curto prazo, mas é preciso ter em mente uma estratégia de longo prazo quando se dá um rápido passo tático (YUNNUS, 2000, p.133).

Se a economia solidária se origina a partir da necessidade, como medida de melhorar as condições humanas de trabalho e vida, tais empresas não podem ser comparadas ou equiparadas às empresas particulares. As empresas de economia solidária possuem caráter único e básico, solidariedade e igualdade entre os homens.

Resta, porém, examinar o que este sistema tributário e contábil implica na formalização das empresas solidárias, quais as dificuldades de constituição, adequação e de manutenção ao longo do tempo, sendo alvo da alta incidência tributária a qual o país está submetido. Entretanto, como defende Singer (2002), trabalha-se para mudar a legislação e buscar meios de melhoria social por meio da solidariedade e, ao que parece, através deste prévio estudo sem nenhum amparo neste aspecto por parte do Estado.

Desta forma, “na realidade, a proposição do empreendedorismo é um desdobramento da ideologia e institucionalidade neoliberal voltada para a liberalização da economia e a quebra das regulamentações sociais” (BARBOSA, 2007, p.68).

De outro lado, é necessário repensar a organização do Estado, cuja estrutura está moldada de forma mais aproximada ao capitalismo sem preocupação social, bem como as corporações, que visam lucro e crescimento, não importando o contexto humano social em torno de tal atividade explorada. Necessário se faz, também, repensar as políticas de incentivos fiscais de forma a incentivarem o consumo/comércio de produto provenientes de empresassolidárias.

Entretanto, repensando, tal análise exige uma abordagem diferenciada o que foge da proposta inicialmente estabelecida. A tributação é um obstáculo, bem como a burocratização imposta quanto à formalização e à contabilidade das empresas de economia solidária que estão inseridas em legislação, além da aplicação de alíquotas utilizadas sobre empresas particulares e a tabelas de pequenas empresas, não possuindo nenhum apoio ou diferenciação quanto a sua natureza de cunho social.

Sendo assim, “a economia solidária é ou poderá ser mais do que mera resposta à incapacidade do capitalismo de integrar em sua economia todos os membros da sociedade desejosos e necessitados de trabalhar” (SINGER, 2002, p. 114). Da mesma forma, ” na sociedade civil dos novos movimentos sociais, a perspectiva dualista também se reitera e a relação com o Estado é principalmente de distanciamento ou de dificuldades de enfrentamento e disputa (BARBOSA, 2007, p.83).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve como problema de pesquisa a seguinte pergunta: qual a finalidade diferencial das empresas solidárias que justificam a necessidade de incidência tributária em caráter diferenciado devido a sua relevância para a sociedade?

No intuito de responder a esta questão, conclui-se que a tributação diferenciada a tais empresas poderia amenizar as dificuldades de mantê-las em funcionamento, ademais, o Estado poderia utilizar-se da tributação como meio de Política Social na melhoria para os associados e a comunidade em geral, já que os excluídos individualmente não tem como competir com o capital.

Tal assunto, abordado de forma superficial, tem sido alvo de diversos fóruns, audiências públicas e encontros por todo Brasil, com a finalidade de demonstrar a importância da economia solidária e as dificuldades enfrentadas para seu efetivo funcionamento, inclusive com a exclusão das cooperativas ao Simples Nacional, exceto as de consumo até o ano 2014, podendo somente em 2015 optar pelo Super Simples-que seria uma relação entre a exclusão econômica e a ausência de participação política.

Considerando os fatos articulados, o que se observa é que não há enquadramento tributário e nem contábil adequado que colaboram ao desenvolvimento sustentável de empresas solidárias para que saiam da informalidade e se formalizem como cooperativas. Cada vez mais o Estado se organiza para aumentar a carga tributária não observando o caráter social e o princípio constitucional de solidariedade burocratizando sua legalização.

De outro lado, e necessário repensar a capacidade contributiva bem como a legalidade, cuja estrutura está moldada de forma mais aproximada ao modelo capitalista. Necessário se faz, também, repensar coletividade trabalhadora solidária de forma a que sua organização não seja tão burocratizada e o sistema tributário aplicado às cooperativas incentivem a legalização de atividades informais, contribuindo, assim, de forma indireta para a melhoria das condições sociais e econômicas do Estado.

REFERÊNCIAS

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YUNNUS, Muhammad. O banqueiro dos Pobres. São Paulo: Editora Atica, 2000.



[1] Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pelotas (UCPel – 2009); especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Anhanguera ( LFG Uniderp – 2011); especialista em Direito Tributário Empresarial na Universidade Católica de Pelotas (UCPel – 2015)

[2] Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (2004) e professor do Programa de Pós-graduação em Direito do Curso de Mestrado em Direito e Justiça Social da Universidade Federal do Rio Grande – PPGD/FURG;

Como citar e referenciar este artigo:
TIMM, Daniele Wachholz; COSTA, Eder Dion de Paula. As empresas de economia solidária e o desenvolvimento sustentável: da necessidade de uma política tributária social. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2018. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/as-empresas-de-economia-solidaria-e-o-desenvolvimento-sustentavel-da-necessidade-de-uma-politica-tributaria-social/ Acesso em: 29 mar. 2024