Direito Tributário

A Exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS.

A Exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS.

 

 

Thiago Carvalho Santos*

 

 

Introdução

 

Em recente julgamento no STF, restou praticamente decidida uma dos grandes debates tributários dos últimos anos, o qual discutia sobre a inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins.

 

A maioria dos ministros já votou pela exclusão do imposto, significando uma grande vitória para o contribuinte, impactando, por outro lado, em uma redução do recolhimento aos cofres públicos de mais de R$22 bilhões.

 

Conforme estimativa realizada pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), caso os contribuintes ingressem em juízo pleiteando a restituição dos valores recolhidos indevidamente nos últimos cinco anos, de 2001 a 2005, o Fisco deverá desembolsar aproximadamente R$40 bilhões, os quais seriam devolvidos durante o período de dez anos, tempo médio de uma ação judicial nesse sentido.

 

O entendimento acerca da inclusão do ICMS na base de cálculo da Cofins, antes desta decisão do STF, era considerado pacificado em favor do Fisco, o que acaba por surpreender os procuradores da Fazenda Nacional.

 

O relator do caso, Marco Aurélio Mello, votou pela inconstitucionalidade da inclusão e foi seguido pelos ministros Carmen Lúcia Ricardo Lewandowski, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence, compondo, assim, a maioria.

 

Realizada a identificação da importância do tema, passaremos a discorrer sobre a base legal da referida inconstitucionalidade.

 

A afronta ao artigo 195, I, da Constituição Federal.

 

Para iniciarmos a discorrer acerca do tema, importante identificar aonde o legislador prevê as hipóteses de incidência e base de cálculo da Cofins, para tanto, transcrevemos o art. 195, inciso I, da Constituição Federal:

 

“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:

(…)

b) a receita ou faturamento;”

 

Para conceituarmos o vocábulo “faturamento” necessário atermos no seu sentido técnico-jurídico, o qual decorre de um negócio jurídico, de uma operação, percebendo valores que ingressarão nos cofres daqueles que procedem a venda de mercadorias ou a prestação de serviços.

 

Destarte, a exclusão do ICMS da base de cálculo do Cofins se impunha, pois o seu valor não é abrangido pelo conceito de faturamento, sendo o ICMS receita do Erário Estadual, afinal, nenhum agente econômico fatura o imposto, mas apenas as mercadorias ou serviços.

 

A hipótese de exclusão de um imposto da base de cálculo da Cofins não se trata de fato novo, haja vista a exclusão do IPI realizada acertadamente pelo legislador ordinário, conforme se observa na leitura da alínea “a” do parágrafo único do art.2º da Lei Complementar n.º 70 de 30.12.1991.

 

Portanto, inapelável que o valor do ICMS só configura uma entrada de dinheiro e não receita da empresa, haja vista o ICMS ser uma receita do Estado e não por outra razão tal valor é registrado em livro para fins contábeis.

 

Em reforço a tal assertiva colacionamos trecho do voto do Ministro Marco Aurélio Mello sobre a base de cálculo da Cofins e o termo faturamento:

 

“A base de cálculo da Cofins não pode extravasar, desse modo, sob o ângulo do faturamento, o valor do negócio, ou seja, a parcela percebida com a operação mercantil ou similar. O conceito de faturamento diz com riqueza própria, quantia que tem ingresso nos cofres de quem procede a venda de mercadorias ou à prestação dos serviços, implicando, por isso mesmo, o envolvimento de noções próprias ao que se entende como receita bruta. Descabe assentar que os contribuintes da Cofins faturam, em si, o ICMS. O valor deste revela, isto sim, um desembolso a beneficiar a entidade de direito público que tem a competência para cobrá-lo. A conclusão a que chegou a Corte de origem, a partir da premissa errônea, importa na incidência do tributo que é a Cofins, não sobre o faturamento, mas sobre outro tributo já agora da competência de unidade da Federação.”[1]

 

O eminente Ministro prossegue em seu raciocínio e assevera:

 

“No caso dos autos, muito embora com a transferência do ônus para o contribuinte, ter-se-á, a prevalecer o que decidido, a incidência da Cofins sobre o ICMS, ou seja, a incidência de contribuição sobre o imposto, quando a própria Lei Complementar 70/91, fiel à dicção constitucional, afastou a possibilidade de incluir-se, na base de incidência da Cofins, o valor devido a título de IPI.

(…)

Da mesma forma que esta Corte excluiu a possibilidade de ter-se na expressão ‘folha de salário’, a inclusão do que satisfeito a administradores, autônomos e avulsos, não pode, com razão maior, entender que a expressão ‘faturamento’ envolve, em si, ônus fiscal, como é o relativo ao ICMS, sob pena de desprezar-se o modelo constitucional, adentrando-se a seara imprópria da exigência da contribuição, relativamente a valor que não passa a integrar patrimônio do alienante quer da mercadoria, quer de serviço, como é o relativo ao ICMS.”

 

Diante do exposto, identifica-se que o tema tratado cincunda a base de cálculo da Cofins, o montante ou expressão numérica que sofrerá a aplicação de uma alíquota, portanto, pode-se concluir que, após a decisão prolatada nos autos do Recurso Especial n.º 240.785, a base de cálculo da Cofins (faturamento ou receita) jamais poderá englobar receita ou faturamento de terceiros, sob pena de estarmos desvirtuando a estrutura de arrecadação dos impostos.

 

Tal entendimento é compartilhado pelo ilustre doutrinador Aires Barreto, que diz:

 

“Consiste a base de cálculo na descrição legal de um padrão ou unidade de referência que possibilita a quantificação da grandeza financeira do fato tributário.

Espelha o critério abstrato uniforme e genérico de mensuração das realidades que se pretende medir.”[2]

 

No mesmo sentido, leciona o professor José Eduardo Soares de Melo:

 

“Indico algumas verbas que podem ser consideradas como receitas: rendimentos brutos de aplicações financeiras, lucros e dividendos, juros e descontos, aluguéis, variações monetárias, prêmio de resgate de títulos. Também encartam-se nesta situação o ICMS e o IPI, porque não constituem ingressos patrimoniais pela circunstância de simplesmente transitarem pelo caixa do contribuinte, como meros agentes repassadores dos mencionados tributos.”[3]

 

Assim, o ICMS não poderá integrar a base de cálculo da Cofins, pois o conceito de faturamento não abarca o imposto de competência do Estado, sendo rendimento deste último e não do agente econômico, afinal, ninguém comercializa o imposto, ninguém fatura o imposto.

 

 

* Sócio do escritório Carvalho Santos & Pantaleão Advogados

 

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[1] STF – RE 240.785

[2] Aires Barreto, Base de Cálculo, Alíquota e Princípios Constitucionais, São Paulo: RT, 1986, p. 38.

[3] José Eduardo Soares de Melo, Contribuições Sociais no Sistema Tributário, 3ª Ed., São Paulo, Malheiros, 2000, p. 147.

Como citar e referenciar este artigo:
SANTOS, Thiago Carvalho. A Exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS.. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/a-exclusao-do-icms-da-base-de-calculo-da-cofins/ Acesso em: 19 abr. 2024