A fim de tributar a circulação de energia elétrica a Constituição Federal de 1988 conferiu-lhe caráter de mercadoria fazendo incidir o ICMS (art.
155, § 3º da CF). Inova, pois o conceito tradicional de mercadoria como sendo um bem corpóreo.
Dispõe o art. 155, § 2º, inciso III, da CF que o ICMS “poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços”.
No estágio em que vivemos a energia elétrica tornou-se um bem essencial para o conforto das pessoas, bem como para produção de bens e serviços.
Só que o legislador ordinário inverteu o sentido da norma constitucional, exacerbando a alíquota (25%) incidente sobre o consumo de energia elétrica.
Se é possível ao legislador deixar de implementar o preceito programático do inciso III, do § 2º, do art. 155, da CF não me parece possível que o
legislador infraconstitucional possa dispor em sentido contrário à norma programática. Mas, essa é uma tese de difícil convencimento no Judiciário. O
fisco em geral está habituado a cobrar mais onde há mais facilidade na arrecadação e maior rentabilidade.
A redação original do § 3º retrocitado fazia referência a “nenhum outro tributo”, fato que suscitou dúvida quanto à incidência de contribuições
sociais. Com o advento da EC nº 33/01 a dúvida foi espancada mediante alteração da expressão para “nenhum outro imposto” dentro, aliás, da tradição
legislativa de submeter a energia elétrica ao regime do imposto único.
Além do ICMS incide sobre a venda de energia elétrica as contribuições sociais do PIS/PASEP, da COFINS e da COSIP sendo esta última tributo de
natureza municipal. Apesar de inexistir benefício específico essa contribuição social para a iluminação pública foi considerada constitucional pelo STF
que a qualificou como sendo uma “exação sui generis que se amolda aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade” (RE nº 573675/SC, Rel. Min.
Ricardo Lewandowisk, DJe de 25-5-2009).
A incidência desses tributos e o cálculo por dentro do ICMS faz com que a alíquota real atinja 36,24% contra a alíquota legal de 25%. Os encargos
tributários correspondem a mais de 48% do valor da energia elétrica consumida, o que faz com que esse bem essencial na sociedade atual seja o mais
caro do mundo.
E mais, o preço da energia elétrica distribuída é onerado por nada menos que dez outros encargos financeiros criados pelo Governo Federal e cobrado,
das geradoras de energia, das distribuidores de energia ou dos consumidores.
São eles: CCC – Conta de Consumo de Combustível; RGR –Reserva Global de Reversão; CDE – Conta de Desenvolvimento Energético. CFURH – Compensação
Financeira pela utilização de Recursos Hídricos; ESS – Encargo de Serviços do Sistema; ONS – Taxa do Operador Nacional do Sistema; EER – Encargo de
Energia de Reserva; PROINFA – Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica e P & D – Investimentos em Pesquisas e
Desenvolvimento e Eficiência Energética
Alguns desses encargos financeiros são repetitivos diferenciandose apenas pelo nomem júris, porém, destinados a uma mesma finalidade.
Sem essa avalanche de incidência de encargos financeiros sobre o setor de energia elétrica o consumidor poderia estar pagando um preço bem menor apesar
da exacerbada alíquota de 25% incidente sobre a energia elétrica consumida a título de ICMS.
* Kiyoshi Harada. Advogado em São Paulo (SP). Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP. Professor de Direito Tributário,
Administrativo e Financeiro. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Membro do
Conselho Superior de Estudos Jurídicos da Fiesp. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo. Site:www.haradaadvogados.com.br