Direito Tributário

Tributação e educação

Tributação e educação

 

 

Ives Gandra da Silva Martins*

 

 

A Secretaria do Tesouro Nacional divulgou, em meados de julho, que a federação brasileira (União, Estados e Municípios) retirou da sociedade 751,7 bilhões de reais -ou seja, 38,8% do PIB- no ano de 2005, elevando em 4,4% o aumento do bolo tributário arrecadado, se comparado com aquele que partilhou entre as entidades federativas no ano de 2000.

 

Infelizmente, os serviços públicos não melhoraram na mesma proporção, apenas tendo ocorrido em percentual superior aos 4,4% a elevação do custo da mão-de-obra oficial, inclusive os benefícios da aposentadoria e seguridade pagos a servidores públicos concursados e contratados.

 

Em outras palavras, o brasileiro dedicou, o produto de quase 5 meses de seu trabalho, principalmente para sustentar os detentores do poder e a incrível e esclerosada máquina administrativa, além dos desvios ilícitos, detectados pelo Ministério Público Federal e pelas CPIs, sem ter havido melhora dos serviços públicos, permanecendo insuficientes os recursos aplicados na educação, cultura, segurança pública e saúde, serviços essenciais, de que infelizmente desfruta em menor qualidade do que os outros países, inclusive se comparados os que existem nas nações em desenvolvimento.

 

Como a média da carga tributária dos países emergentes está em torno de 20%, é de se compreender a revolta do cidadão brasileiro de receber serviços públicos iguais ou inferiores aos cidadãos de outras nações emergentes, e ter que pagar o dobro de tributos para recebê-los.

 

Tenho pelo Ministro Fernando Haddad especial estima e admiração desde que reconheci nele, quando eu presidia o Instituto dos Advogados de São Paulo, em 1985/86, um dos mais brilhantes talentos da nova geração de estudantes da Universidade de São Paulo.

 

Deu ao IASP e à OAB, apoio aos movimentos estudantis que se organizava em prol dos grandes temas da época (diretas já, constituinte exclusiva, etc.). Tem procurado, com seriedade e diálogo, levar adiante teses avançadas na educação superior.

 

Nada obstante, os seus reconhecidos esforços, estou convencido de que há um cenário ainda particularmente dramático, no ensino superior, demonstrados não só pela crise das universidades públicas, como pelo problema maior que assola, atualmente, a universidade privada, onde a inadimplência -por força da drástica retirada de recursos privados, via tributos e da crise econômica que vive a classe média- chega a 40%, nas diversas instituições.

 

Ora, se o Estado não oferta educação universitária suficiente –e os planos de emergência retiraram das vinculações obrigatórias substanciais importâncias, reduzindo o que o constituinte dedicou à educação em 20% -à evidência, os quase 70% de vagas que as universidades privadas oferecem aos estudantes brasileiros deveriam merecer especial atenção, até porque, apesar da vedação absoluta de incidência de impostos e contribuições sociais, estabelecida pela Constituição, é esta insuficiente para cobrir a falta de poder aquisitivo do universitário brasileiro.

 

Neste particular parece-me residir o nó gordio -inclusive ainda não desatado pelo Poder Judiciário- de que a imunidade (proibição constitucional de tributar) não se confunde com isenção (favor fiscal) e de que as entidades privadas sem fins lucrativos que se dedicam ao ensino -e que suportam 40% de inadimplência- estão asseguradas contra a exigência de impostos e contribuições. Esta é a melhor forma de incentivá-las a complementar –e muito- a insuficiência de vagas ofertadas pelo ensino oficial.

 

A resistência governamental em admitir que os conceitos de imunidade e isenção não se confundem, tem levado os agentes fiscais a interpretar, com particular erronia, que as instituições imunes seriam isentas, aplicando-lhes critério, não do Código Tributário Nacional, mas de leis ordinárias e de atos administrativos de duvidosa constitucionalidade, provocando ainda maiores incertezas em setor essencial -mas debilitado pela crise econômica, atestada pelo crescimento nacional pífio perante os grandes emergentes- e instaurando a insegurança jurídica.

 

Estou convencido de que, definitivamente, a educação não pode ser vista como fonte de receita tributária para obtenção de recordes de arrecadação, mas como ponte para o futuro do país, tendo agido bem o constituinte, ao tornar tais instituições, quando organizadas sem fins lucrativos, em instituições imunes de impostos e contribuições, como já decidiu o STF na ADIN 2028.

 

Nada obstante o esforço e o talento indiscutível do Ministro Fernando Haddad, o Brasil continuará perdendo o trem da história. É que o futuro de um país está, fundamentalmente, na educação -como reconhece S.Exa.- e jamais na retirada de recursos da sociedade para sustentar uma estrutura federativa, lamentavelmente superada e ineficiente. Como acredito no Ministro, sei que deve ele ter a mesma preocupação deste velho professor, que leciona desde 1954, e ainda espera ver, um dia, a educação como meta maior de todos os governos.

 

 

* Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: www.gandramartins.adv.br

 

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Tributação e educação. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/tributacao-e-educacao/ Acesso em: 28 mar. 2024