Direito Tributário

Abusivos Aumentos dos Tributos Municipais Ferem o Princípio da Capacidade Contributiva

 

 

Elaborado em 01/2010

 

Os contribuintes do IPTU e do ISS foram surpreendidos com o elevado aumento da carga tributária no início de 2010, em flagrante desrespeito ao princípio da capacidade contributiva.

 

A Constituição Federal do Brasil de 1988, no § 1º do seu artigo 145, previu que “os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte”, tendo fixado a capacidade contributiva como um dos parâmetros para tributação.

 

O grande tributarista Ruy Barbosa Nogueira afirmou que “princípio da capacidade contributiva é um conceito econômico e de justiça social, verdadeiro pressuposto da lei tributária”. (2)

 

O princípio foi objeto de excelentes artigos por grandes juristas, sendo desnecessário alongarmos aqui, uma vez os estudiosos podem facilmente encontrá-los em site de busca, em “capacidade contributiva”.

 

Há duas vertentes a serem analisadas a respeito dos abusivos aumentos dos tributos municipais em 2010:

 

 

1 – Aumento abusivo do IPTU

 

Em vários municípios, utilizou-se da correção do valor venal dos imóveis para se obter aumento de arrecadação. Nem sempre, porém, é o valor venal do imóvel a base para aumento de receita de seu possuidor.

 

Os proprietários que residem em imóvel próprio, por exemplo, não auferem vantagens financeiras sobre possível valorização do imóvel, exceto no momento de sua venda. Sempre recolhem as parcelas do IPTU com as rendas oriundas de salários e/ou vencimentos, etc. As oscilações do preço de mercado de cada imóvel residencial somente tornar-se-ão em renda para seus proprietários em caso de alienação do mesmo. Sem o produto da venda não haverá aumento da capacidade contributiva.

 

Por outro lado, os proprietários de imóveis em locação poderiam auferir vantagens que justifique o aumento do valor do IPTU de seus bens, o que – entretanto – ocorreria somente quando houvesse substituição do locatário, uma vez que os reajustes do preço do aluguel para os contratos vigentes estão vinculados aos índices legais. Nem sempre a oscilação do valor de mercado vai transformar em entrada de divisas para o possuidor do imóvel em locação.

 

Assim, a capacidade contributiva do contribuinte a ser aferida é a sua real aptidão para recolher ao Fisco, na medida da melhora de seus rendimentos. Ora, se o imóvel não produz renda por si só, como aumentar tributo sobre a propriedade de que o possui? Seu titular tem capacidade econômica pela posse do bem, mas não tem aumento de capacidade contributiva pela oscilação do seu valor de mercado.

 

A efetividade do princípio da capacidade contributiva requer não apenas que a lei preveja simplesmente a base de cálculo do tributo, mas que a hipótese tributária prevista seja reveladora de riqueza do contribuinte, o que não vem acontecendo no caso dos aumentos do IPTU.

 

O aumento desproporcional do IPTU enriquece o erário municipal na mesma proporção que empobrecem os contribuintes atingidos pela exorbitante exação.

 

 

2 – Reajustes do ISS dos Profissionais Liberais

 

Igualmente, o ISS teve aumento real em vários Municípios. Exemplo típico aconteceu em Belo Horizonte, onde em 2009 eram cobrados R$45,00 por profissional liberal que fizesse parte de sociedade para prestação de serviços de profissão regulamentada. Em 2010 esse valor foi aumentado para R$120,00 por profissional, gerando aumento de 166,66%.

 

Ora, em 2009 tivemos a crise financeira mundial, tendo influenciado fortemente o setor de serviços, que não teve sua capacidade contributiva aumentada, quiçá na proporção de 166%.

 

Resta claro que o legislador municipal tem dificuldades de adequar o valor do ISS do profissional liberal à capacidade contributiva de cada classe dos liberais; aumentar em 166% na virada no ano não trará resultados tão justos, como pressupõe o princípio da capacidade contributiva.

 

Sociedade de Médicos, por exemplo, que atendem ao SUS em sua clínica médica, não terão reajustes em seus pelos serviços prestados, de 2009 para 2010, nem em 10%: Como farão para arcar com os 166% de aumento, sem repassá-los ao consumidor (SUS)? Dada à impossibilidade do repasse ocorrerá o empobrecimento dos sócios.

 

Os contabilistas, por exemplo, não terão como repassar tais aumentos; são os verdadeiros agentes de arrecadação tributária, que trabalham “de graça” para o fisco (nos níveis federal, estadual e municipal), e ainda têm solapados seus parcos honorários para satisfazer a ganância da Prefeitura.

 

É o enriquecimento do poder público municipal em detrimento do empobrecimento dos contribuintes prestadores de serviços derivados de profissões regulamentadas.

 

O Ministro LUIZ FUX, ao relatar questão envolvendo tributação, trouxe o ensino de que:

 

“Acréscimo patrimonial, experimentado durante certo lapso de tempo, que só pode ser levado à tributação quando atende aos princípios da isonomia, da capacidade contributiva e da não confiscatoriedade – e, portanto, prestigia a vida, a dignidade da pessoa humana e a propriedade, preservando ‘o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos’ valores supremos que levaram os representantes do Povo Brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte, a inscrevê-los já no Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil.” (3).

 

Os administradores municipais quase não têm como manobrar na área tributária para aumentar a arrecadação municipal, dada à centralização do poder de tributar na esfera federal e a dependência dos municípios dos governos estadual e federal.

 

Continuarão de pires na mão junto ao executivo federal até que haja uma reforma política que respeite o pacto federativo, o que certamente não ocorrerá em 2010.

 

Por falta de opção, os Prefeitos desrespeitaram o princípio da capacidade contributiva e exorbitaram nos aumentos do IPTU e do ISS. O fizeram contando com a falta de mobilização dos contribuintes afetados. Algumas categorias, por prestarem serviços às Prefeituras, optam por não discutir teses tributárias municipais, como os Médicos e os Odontólogos; outras, por inércia de suas lideranças, que se perpetuam no poder coorporativo e se desmotivam no exercício do cargo.

 

Resta aos contribuintes que se sentirem lesados o recurso ao Judiciário, visando fazer prevalecer seus direitos constitucionais.

 

 

NOTAS:

 

(1) CFB/1988, art. 145 –

§ 1º – Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

 

(2) NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Curso de Direito Tributário. 15ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p.12

 

(3) REsp 940759 / SP

 

 

* Roberto Rodrigues de Morais, Especialista em Direito Tributário. Ex-Consultor da COAD

Autor do Livro on-line REDUZA DÍVIDAS PREVIDENCIÁRIAS.

Como citar e referenciar este artigo:
MORAIS, Roberto Rodrigues de. Abusivos Aumentos dos Tributos Municipais Ferem o Princípio da Capacidade Contributiva. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-tributario/abusivos-aumentos-dos-tributos-municipais-ferem-o-principio-da-capacidade-contributiva/ Acesso em: 19 abr. 2024