Direito do Trabalho

Novas MPs com efeitos trabalhistas

Novas MPs[1] com efeitos trabalhistas

O atual Presidente da República assinou a Medida Provisória que institui novo BEm (Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda[2]) que permite aos empregadores redução de jornada laboral e redução salarial de seus empregados como forma de enfrentamento da pandemia de coronavírus. A duração inicial do programa público é de cento e vinte dias, podendo ser estendo por maior tempo, a partir de nova Medida Provisória.

O objetivo do programa é prover a preservação de empregos e a manutenção de trabalhadores e, ainda, permitir a continuidade de atividades empresariais, reduzindo, desse modo, o grande impacto econômico das restrições impostas ao funcionamento do comércio e à circulação de pessoas.

A medida também prevê a suspensão temporária de contratos de trabalho junto ao pagamento do benefício, por até 120 dias. Porém, será necessário o preenchimento de certos requisitos, tal como a preservação do valor do salário-hora de trabalho e, ainda, a pactuação de acordo individual escrito entre empregador e empregado.

Com relação à redução de jornada laboral só poderá ser feita nos seguintes percentuais: de 25%, 50% ou 70% e, o pagamento do BEm também se baseará nesses patamares. De sorte que, se um empregado tem sua jornada e seu salário reduzido em 25%, receberá do governo exatamente os 25% do valor que teria direito, caso fosse demitido e passasse a receber o valor do seguro-desemprego[3]. Em tempo, é conveniente frisar que o valor máximo do seguro-desemprego em 2021 foi reajustado para R$ 1.911,84 (hum mil, novecentos e onze reais e oitenta e quatro centavos).

Exemplificado: Na prática, uma pessoa que tem direito a esse teto e que entra em acordo com seu empregador para reduzir sua jornada e seu salário vai receber: 75% de seu salário atual + 25% de R$ 1.911,84; ou 50% de seu salário atual + 50% de R$ 1.911,84; ou 30% de seu salário atual + 70% de R$ 1.911,84.

No caso de haver a suspensão temporária do contrato de trabalho, o empregador deverá continuar pagando todos os benefícios, eventualmente, concedidos ao empregado, o que inclui o vale-transporte, vale-refeição, por exemplo.

O empregado terá ainda seu emprego garantido pelo tempo que durar a suspensão ou a redução de jornada laboral e salário e, após o reestabelecimento da situação, por idêntico período temporal.

Igualmente prevê a MP medidas temporárias como o teletrabalho, antecipação de férias, concessão de férias coletivas, aproveitamento e antecipação de feriados, a formação de banco de horas e postergação do recolhimento do FGTS.

Quanto a suspensão da exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores se refere aos meses de abril, maio, junho e julho de 2021, com vencimento em maio, junho, julho e agosto de 2021. O pagamento poderá ser realizado em até quatro parcelas mensais, com vencimento a partir de setembro de 2021[4].

As medidas que flexibilizam regras trabalhistas são para trabalhadores em regime com CLT, a saber:

*implantação do teletrabalho (home office) sem necessidade de alteração no contrato individual de trabalho;

*antecipação de férias individuais, notificando o trabalhador com antecedência mínima de 48 (quarenta e oito) horas;

*concessão de férias coletivas, sem necessidade de comunicação aos sindicatos da categoria;

*antecipação e aproveitamento de feriados para compensar saldo em banco de horas;

*compensação de jornada, por meio de banco de horas, em caso de interrupção das atividades – compensação poderá ser feita em até 18 (dezoito) meses, a partir do encerramento da calamidade pública, com *prorrogação de jornada em até 2 horas, que não poderá exceder 10 (dez) horas diárias;

*suspensão do recolhimento do FGTS pelos empregadores, com vencimento em maio, junho, julho e agosto, podendo ser pagos pelo empregador sem juros e multa a partir de setembro em 4 (quatro) parcelas;

*suspensão por 6 (seis) meses dos prazos nos processos administrativos que tratam de infração decorrente de não recolhimento de FGTS;

*suspensão de férias para trabalhadores da área de saúde e de serviços considerados essenciais;

*suspensão da obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto de exames demissionais, no caso de trabalhadores em home office;

*acordos individuais entre patrões e empregados estarão acima das leis trabalhistas ao longo do período de validade da MP para “garantir a permanência do vínculo empregatício”, desde que não seja descumprida a Constituição Federal brasileira vigente.

Os principais itens da MP sobre o home office[5] são os seguintes:

*o empregador não precisa alterar o contrato para implantar o teletrabalho e a posterior volta ao trabalho presencial;

*o empregado deve ser informado da mudança com no mínimo 48 (quarenta e oito) horas de antecedência;

*um contrato escrito, fora o contrato tradicional de trabalho, deverá prever aspecto relativos à responsabilidade da aquisição, manutenção e fornecimento de equipamento tecnológico para teletrabalho e o reembolso de despesas arcadas pelo empregado;

*quando o empregado não dispuser do equipamento necessário para o trabalho remoto, o empregador poderá disponibilizá-lo de modo que depois seja devolvido pelo empregado;

*se o empregado não dispuser de equipamento e a empresa não puder fornecê-lo, o tempo normal da jornada de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador;

*libera o teletrabalho também para estagiários e aprendizes[6];

*como regra geral, o home office não implica em controle de jornada. A exceção é quando existe previsão expressa e em sentido contrário por meio de acordo ou convenção coletiva;

*em caso de os trabalhadores terem sua jornada de trabalho efetivamente controlada, poderão ter direito a horas extras.

A MP autoriza a suspensão de realização dos exames médicos ocupacionais[7], clínicos e complementares. Resta suspensa por 120 (cento e vinte) dias a obrigatoriedade de realização dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto dos exames demissionais, dos trabalhadores que estejam em regime de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância. Os exames deverão ser feitos até 120 (cento e vinte) dias após o fim da validade da MP.

Continua mantida a obrigatoriedade de realização de exames ocupacionais e de treinamentos periódicos aos trabalhadores da área de saúde e das áreas auxiliares em efetivo exercício em ambiente hospitalar, os quais terão prioridade para submissão a testes de identificação do coronavírus.

O exame demissional poderá ser dispensado caso o exame médico ocupacional mais recente tenha sido realizado há menos de 120 (cento e vinte) dias.

Fica suspensa, pelo prazo de 60 (sessenta) dias, a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais, previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho. Esses treinamentos poderão ser realizados no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após o fim da MP.

A MP traz regras específicas para os profissionais de saúde[8]. Fica permitido aos estabelecimentos de saúde prorrogar a jornada de trabalho e adotar escalas de horas suplementares entre a 13ª e a 24ª hora do intervalo interjornada, sem que haja penalidade administrativa, garantido o repouso semanal remunerado.

Essas medidas podem ser adotadas pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias, por meio de acordo individual escrito, inclusive para as atividades insalubres e para jornada de 12 horas por 36 horas de descanso.

As horas extraordinárias poderão ser compensadas no prazo de 18 (dezoito) meses, contado do fim do prazo da MP, por meio de banco de horas ou remuneradas como hora extra.

Ressalve-se que o empregado deve concordar expressamente com as medidas.

Nem todas as medidas previstas na MP dependem de concordância do empregado. A alteração do regime de trabalho presencial para teletrabalho poderá ser efetuada a critério do empregador, bastando o aviso com antecedência mínima de 48 horas. A instituição de banco de horas também independe de concordância do empregado.

O funcionário não pode se recusar a aceitar as determinações que venham do empregador, que tem o poder de direção do negócio e prerrogativa de tomar as decisões.

Porém, em caso de coação[9] do funcionário, os atos podem ser invalidados na Justiça, até se houver demissão, caso o trabalhador não aceite as condições impostas pela empresa, alertam advogados trabalhistas.

Os acordos firmados de forma individual prevalecerão sobre os acordos coletivos[10]. Já os sindicatos podem tentar a reversão das medidas na Justiça, em caso de haver desrespeito aos direitos previstos na Constituição Federal brasileira vigente.



[1]  https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-1.045-de-27-de-abril-de-2021-316257308

 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2021/Mpv/mpv1046.htm

[2] O salário-hora do trabalhador não poderá ser reduzido. Empregadores devem comunicar ao sindicato trabalhista e ao Ministério da Economia no prazo de até 10 dias a partir da data de celebração do acordo coletivo ou individual. O trabalhador permanecerá empregado durante o tempo de vigência dos acordos e pelo mesmo tempo depois que o acordo acabar. Por exemplo, um acordo de redução de jornada de 90 dias de duração deve garantir ao trabalhador a permanência no emprego por mais 90 dias após o fim do acordo. Caso o empregador não cumpra, ele terá que pagar todos os direitos do trabalhador, já previstos em lei, além de multas.

[3] O seguro-desemprego integra o Programa do Seguro-Desemprego, destinado a prover assistência financeira temporária ao desempregado dispensado sem justa causa, bem como auxiliar o trabalhador na manutenção e busca de emprego, por meio de ações de intermediação de mão-de-obra e qualificação profissional. O seguro-desemprego é pago ao trabalhador entre 3 a 5 parcelas, dependendo do tempo que ficou empregado. Receberá 3 parcelas do benefício quem trabalhou, no mínimo, 6 meses; 4 parcelas se comprovarem no mínimo 12 meses; e 5 parcelas a partir de 24 meses de registro profissional

[4] O FGTS é direito autônomo dos trabalhadores urbanos e rurais, de índole social e trabalhista, não possui caráter de imposto nem de contribuição previdenciária. O FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, foi criado pela Lei 5.107/66, hoje revogada pela Lei 8.036/90, com o objetivo de acabar com a estabilidade e ao mesmo tempo criar vantagens como o levantamento, mesmo em caso de pedido de demissão, de valores que eram depositados ao longo do tempo em que o empregado prestava serviço para o empregador. Em outras palavras, o FGTS “se constitui em uma poupança destinada à subsistência do trabalhador que deixa o emprego”.

[5] A previsão legal para o teletrabalho aparece no artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que afasta as distinções entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. O parágrafo único do dispositivo, introduzido em 2011, estabelece que “os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio”. A Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) introduziu um novo capítulo na CLT dedicado especialmente ao tema: é o Capítulo II-A, “Do Teletrabalho”, com os artigos 75-A a 75-E). Os dispositivos definem o teletrabalho como “a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”. Assim, operações externas, como as de vendedor, motorista, ajudante de viagem e outros que não têm um local fixo de trabalho não são consideradas teletrabalho.

[6] O menor aprendiz possui vínculo empregatício, devendo ser anotada sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS). O Estagiário não possui vínculo empregatício. Ao aprendiz será garantido o salário mínimo hora, que segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, no ano de 2015, corresponde ao valor de R$ 3,58/hora, podendo assim ser ilustrado: Contrato de 20 horas semanais: Valor Mínimo do Salário será de R$ 369,93 reais; Contrato de 22 horas semanais: Valor Mínimo do Salário será de R$ 406,92; Contrato de 23 horas semanais: Valor Mínimo do Salário será de R$ 425,42; Contrato de 25 horas semanais: Valor Mínimo do Salário será de R$ 462,41; Contrato de 30 horas semanais: Valor Mínimo do Salário será de R$ 554,89; No estágio não obrigatório é compulsória que o estagiário receba bolsa ou outra forma de contraprestação, bem como o auxílio-transporte e seguro contra acidentes pessoais. A eventual concessão de benefícios relacionados a transporte, alimentação, saúde e outros não caracteriza o vínculo empregatício. O trabalho do aprendiz não pode ultrapassar 6 (seis) horas diárias, sendo proibida a prorrogação e a compensação de jornada. No entanto, a jornada pode ser de 8 horas diárias quando o jovem já tiver concluído o ensino fundamental, e quando computado às horas destinadas à aprendizagem teórica. Na situação de contrato de estágio, a jornada será de 4 (quatro) horas diárias e 20 (vinte) semanais para estudantes de educação especial e dos anos finais do ensino fundamental, na modalidade profissional de educação de jovens e adultos.

[7] Exame admissional é uma avaliação médica que deve ser feita antes do funcionário iniciar suas atividades na empresa. O exame médico admissional é obrigatório pelo artigo 168 da CLT e é feito para comprovar que o novo colaborador está apto para exercer sua função. O exame demissional consiste em um exame clínico feito por empresas especializadas em Medicina do Trabalho para verificar a saúde ocupacional do profissional, sendo necessário que ele seja realizado até a data da homologação do contrato desse profissional, para que haja a rescisão do contrato de trabalho.

[8] Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), o conceito de saúde define-se por um estado dinâmico de bem-estar físico, mental, espiritual e social e não apenas a ausência de doenças. São considerados profissionais da saúde toda pessoa que trabalha em uma profissão relacionada às ciências da saúde. – Reconhecer como profissionais de saúde de nível superior as seguintes categorias: 1.Assistente Sociais; 2. Biólogos; 3. Profissionais de Educação Física; 4. Enfermeiros; 5. Farmacêuticos; 6. Fisioterapeutas; 7. Fonoaudiólogos; 8. Médicos; 9. Médicos Veterinários; 10. Nutricionistas; 11. Odontólogos; 12. Psicólogos;13. Terapeutas Ocupacionais. Vide em: Resolução 218 – 97 – Regulamentação das profissões de Saúde.

[9] O assédio moral no trabalho, também conhecido como coação moral, terror psicológico laboral ou mobbing, consiste em comportamento arbitrário que tende a acarretar dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica do trabalhador, ocasionando a degradação do ambiente de trabalho.

[10] Um dos princípios estabelecidos pela Lei nº 13.467/2017 é de que o negociado por intermédio de acordo ou convenção coletiva prevalece sobre a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), salvo nos casos em que a negociação é considerada como objeto ilícito. A Lei 13.467/17, sancionada em 13 de julho de 2017 e em vigor a partir de 11 de novembro de 2019, a chamada Reforma Trabalhista, reformulou substancialmente a abrangência e validade das negociações individuais e coletivas que, nos termos da atual legislação, terão prevalência sobre a lei, salvo nos casos expressos descritos na própria lei.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele. Novas MPs com efeitos trabalhistas. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2021. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-do-trabalho/novas-mps-com-efeitos-trabalhistas/ Acesso em: 29 mar. 2024