Direito Penal

A teoria da prescrição penal no ordenamento jurídico brasileiro

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Lucas de Cássio Cunha Aranha [1]

RESUMO

Considerando a prescrição penal uma causa de extinção da punibilidade, sendo portanto mecanismo que faz cessar a prerrogativa e a pretensão estatal de punir determinado indivíduo, o presente trabalho é centrado na perspectiva da demonstração tão pormenorizada quanto possível, mas sem o intuito de esgotar, acerca desse instituto, declinando seus variados aspectos, impressões e conceitos, bem como estabelecendo as devidas conexões com o Código Penal Brasileiro, a fim de que se busque a percepção, não só do instituto da prescrição penal, enquanto elemento teórico, mas, sobretudo, de sua materialização quanto à práxis no sistema penal brasileiro. A pesquisa utilizada no deslinde da temática abordada é puramente bibliográfica.

Palavras-chave: Código Penal Brasileiro. Internacionalização. Tratado de Versalhes.

INTRODUÇÃO                                                 

A soberania que se constata, contemporaneamente, dentre os elementos que compõem o Estado Democrático de Direito, é uma das égides sobre as quais está fundamentada a ideia de que ao aparato estatal incumbe a promoção do funcionamento de um jus puniendi que é próprio se si. Depreende-se disso que, ao Estado, somente a ele e de forma indelegável, cumpre agir em relação à punição do indivíduo que comente crimes.

Abarcando a sobredita perspectiva, cumpre pontuar que tal soberania de que goza o Estado não é aspecto meramente dogmático, uma vez que não se trata de inferência absoluta quanto ao poder de que a supracitada figura em comento se reveste. Nesse âmbito é que se preconiza o estudo, em vias de realização, da prescrição penal, elemento que alude, sobremaneira, não só ao exaurimento do jus puniendi inerente ao Estado, mas, sobretudo, à extirpação da pretensão executória que se tenha em relação à pessoa que comete crimes.

Trata-se, a prescrição penal, de uma causa de extinção da punibilidade, uma vez que sua ocorrência, conforme anteriormente citado, faz cessar a prerrogativa estatal de punir ou pretender punir determinado indivíduo. Importante é, também, notar que o decurso do tempo é aspecto primordial para que seja identificada a prescrição.

Nesse âmbito, faz-se imprescindível a posterior abordagem, no âmago do presente trabalho, das espécies de prescrição, uma que alude à pretensão punitiva, outra que faz referência tão somente à pretensão executória, e que serão devidamente elencadas e contrapostas a posteriori.

1 CONCEITUAÇÃO

A prescrição penal relaciona-se diretamente à ideia de renúncia ao jus puniendi por parte do Estado. Como prerrogativa exclusiva do aparelho estatal, o direito-poder-dever de punir surge com o ilícito penal, só podendo ser renunciada por aquele que a detém.

Trata-se de pretensão punitiva de caráter universal, no sentido em que é aplicável a todos que praticaram infração penal e não sendo, desse modo, restrita a um determinado indivíduo.

Tal instituto constitui a punibilidade, que consiste na execução de fato dessa pretensão de punir. Para que o exercício do jus puniendi seja efetivado, o Estado sujeita-se a um certo prazo para cumpri-lo, sob pena de perder o direito de executá-lo. Eis aí que surge a figura da prescrição.

Assim, Cezar Roberto Bitencourt (2010) define prescrição como a perda do direito de punir do Estado, pelo decurso de tempo, em razão do seu não exercício, dentro do prazo previamente fixado.

Visão semelhante é a de GRECO (2015) que conceitua prescrição penal como o instituto jurídico mediante o qual o Estado, por não ter tido capacidade de fazer valer o seu direito de punir em determinado espaço de tempo previsto pela lei, faz com que ocorra a extinção da punibilidade. Por sua vez, CAPEZ (2015) aduz que:

Prescrição é, justamente, a perda da pretensão concreta de punir o criminoso ou de executar a punição, devido à inércia do Estado durante determinado período de tempo.

[…]

O não exercício da pretensão punitiva acarreta a perda do direito de impor a sanção. Então, só ocorre antes de transitar em julgado a sentença final. O não exercício da pretensão executória extingue o direito de executar a sanção imposta. Só ocorre, portanto, após o trânsito em julgado da sentença condenatória.

Ante o exposto, infere-se que a prescrição, de natureza ainda não pacífica entre os doutrinadores, mas que aceita como instituto de direito material pelo ordenamento jurídico vigente no Brasil, encontra-se presente não somente ao longo do processo antes de sentença transitada em julgado, mas também após, em sua execução.

Além disso, é regulamentada pelo Código Penal Brasileiro entre os artigos 109 e 118, definida como causa de extinção de punibilidade, segundo o art. 107, IV. Vale ressaltar ainda que essa se constitua como de ordem pública, podendo ser decretada ex officio ou por provocação tanto do Ministério Público quanto da parte interessada.

3 FUNDAMENTOS

O Estado é, notoriamente, aquele que tem o dever de punir e que, ainda que tratemos de ações penais de iniciativa privada, terá sua participatividade “garantida”, na medida em que ao àquele pode ser inerente a possibilidade da concessão de anistia nos casos sobreditos. Observa-se, dessa forma, que o Estado tem o condão, tão somente, de punir; contudo, é algo que não ocorre indistintamente, já que a punição cabe apenas às pessoas que praticam infrações penais.

Mas essa pretensão punitiva estatal pode, também, perder sua essência, e é nesse contexto em que se insere a prescrição penal, enquanto elemento caracterizador da perda da pretensão executória da pena, que ocorrerá na medida em que o Estado se fizer inerte diante do seu poder-dever de punir.

A prescrição, então, tem como alicerce dois fundamentos imprescindíveis, quais sejam eles: Inconveniência da aplicação da pena muito tempo após a prática da infração penal.

O decurso do tempo é elemento que faz exaurir a pretensão punitiva do Estado. Logo, a prescrição tem como cerne evitar que, tempo sido decorrido um longo tempo após a consecução do crime, não havendo sentença transitada em julgado, o indivíduo seja punido, excluindo-o das mazelas do sistema penal.

Os incisos I a VI do art. 109 do Código Penal Brasileiro estabelecem a regulação da prescrição quanto aos prazos, antes da sentença penal transitar em julgado, verbis,

I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze;

II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;

III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;

IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro;

V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;

VI – em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.

Combate à ineficiência: o Estado deve ser compelido a agir dentro dos prazos determinados. Ao Estado, além do jus puniendi, e como adequado efeito daquele elemento, por assim dizer, incumbe que efetive o cumprimento das devidas sanções aos indivíduos infratores dentro de determinado prazo.

Assim, é estabelecido no âmago da lei penal que há prazos prescricionais atrelados às perspectivas das penas definidas. Nesse sentido, convém afirmar que, em não havendo, ainda, sentença transitada em julgado, as penas e seus devidos prazos prescricionais, são dispostos especificadamente no âmbito do Código Penal Brasileiro conforme será posteriormente explicitado com maior clareza. 

O quesito em comento pode ser sem embargo ao seu entendimento, atrelado à perspectiva do direito ao esquecimento, amplamente difundida no âmbito da prescrição, enquanto uma de suas teorias.

O supracitado aspecto é decorrente de que, uma vez que tenha ocorrido determinado fato, e dele decorrido muito tempo desde a execução e cumprimento de pena pelo indivíduo, ou mesmo tendo sido prescrita a pena, a vontade do indivíduo venha a se manifestar de modo que um fato, ainda que seja verídico, não exponha mais o indivíduo perante a sociedade, causando-lhe sofrimento ou transtornos de quaisquer ordens.

Vale pontuar que tal “beneficio” à reputação do indivíduo e à manutenção de sua honra depois de cumprida a pena é realizada no âmbito jurisprudencial, através do Superior Tribunal de Justiça.

O Estado, então, deve agir não só no sentido de promover a punição a quem incumbir com respeito aos prazos estabelecidos legalmente, mas deve, também, prezar pelo restabelecimento do indivíduo.

Atrelando a perspectiva do que podemos chamar de “justo cumprimento dos prazos” à perspectiva da socialização de determinado indivíduo que tenha cumprido pena, certamente se está prezando pela máxima constitucional que deve ser prezada pelo direito penal, em toda sua estrutura punitiva e ressocializadora: a dignidade da pessoa humana.

4 IMPRESCRITIBILIDADE

A prescrição consiste na perda do direito do Estado de punir ou executar a pena em decorrência do decurso do tempo, sendo assim, torna-se inútil a aplicação da sanção penal. A prescrição como causa extintiva de punibilidade está prevista nos termos do art. 107 do CP, e sua regulação se dá mais precisamente através os arts. 109 a 119 do mesmo dispositivo legal.

Há apenas dois de crimes que não são suscetíveis de prescrição, a saber, racismo e terrorismo, ambos contam com previsão constitucional (art. 5º, XLII e XLIV).

Conforme o autor Rogério Greco, “A Constituição Federal, excepcionando a regra da prescritibilidade, elegeu duas hipóteses em que a prescrição punitiva ou mesmo executória do Estado não são atingidas”.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; (…) XLIV – constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;

Ademais, a Carta Magna de 1988 assegurou a prescrição como um direito individual do agente, ou seja, essa se configura como um direito público subjetivo de natureza constitucional do qual os acusados de crimes ou contraversões penais gozam. A CF/88 traz de forma expressa e taxativa os crimes que não estão sujeitos à prescrição, e em observância ao núcleo constitucional intangível (cláusulas pétreas) é vedada a ampliação das hipóteses de imprescritibilidade a partir de emendas constitucionais, visto que não são aceitas EC que objetivam a restrição dos direitos individuais.

5 ESPÉCIES DE PRESCRIÇÃO

O Código Penal vigente trata da prescrição da pretensão punitiva, em seu artigo 109, e da prescrição da pretensão de executória, no artigo 110.

Por meio da prescrição da pretensão punitiva, é observado se o crime cometido pode, na hipótese de ser denunciado dentro do prazo legalmente definido, ou não ser punido pelo Estado, que é titular da pretensão punitiva, sendo o único que pode exigir do Poder Judiciário a prestação jurisdicional demandada na acusação.

Na hipótese do não cumprimento do prazo, a ação penal não poderá ser proposta. A verificação da prescrição da pretensão punitiva é verificada antes do trânsito em julgado da sentença.

A prescrição da pretensão punitiva é disciplinada pela pena abstrata cominada na lei penal incriminadora, podendo o delito ser simples ou qualificado.

O prazo prescricional varia conforme o máximo da sanção abstrata privativa de liberdade, sem levar em consideração pena de multa, quando cominada de modo cumulativo ou alternativo. Através dos incisos do artigo 109 do CP, é possível saber o prazo da prescrição da pretensão punitiva ao verificar o limite máximo da pena imposta e estabelecer a correspondência, como explica a tabela:

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Fonte: CÓDIGO PENAL, 1940                              

Em 2010, o inciso IV do artigo 109 do Código Penal sofreu uma alteração. O prazo prescricional para pena menor que um ano foi modificado para três anos, diferente dos dois anos definidos na redação anterior. A alteração somente poderá ser aplicada para fatos posteriores à vigência da modificação da lei, visto que ao réu valerá a lei penal mais favorável à sua situação.

Conforme o artigo 111 do Código Penal, o período de tempo para o cálculo prescricional começa a contar a partir da consumação, e não do dia em que se deu a ação delituosa.

O artigo regula ainda que no caso de tentativa e nos casos dos crimes permanentes, o prazo começa a contar do dia em que cessou a atividade criminosa e do dia em que cessou a permanência respectivamente.

Na hipótese de bigamia ou falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, começa a contar da data em que o fato se tornou conhecido. Reconhecida a prescrição da pretensão punitiva, deve ser decretada a extinção da punibilidade, nos termos do artigo 61 do CPP.

A existência de uma sentença condenatória é condição básica para que haja prescrição da pretensão executória, pois tal prescrição é subsequente, superveniente ou intertemporal à sentença condenatória.

De modo similar à prescrição da pretensão punitiva, a prescrição da pretensão executória é calculada conforme os incisos artigo 109 do Código Penal, entretanto, não se baseia na pena máxima em abstrato, mas na pena definida na sentença condenatória, ou, no caso de fuga pelo que faltar do cumprimento da pena.

A prescrição da pretensão executória impede de forma definitiva a possibilidade de execução da sanção penal imposta ou da medida de segurança pelo crime cometido.

Após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o direito do Estado de punir é convertido em direito de executar a sanção, que deve ser exercido dentro de um período de tempo.

No caso de o condenado ser reincidente, a base para calcular o prazo prescricional é a pena sentenciada adicionada de um terço. De acordo com Damásio (JESUS, 2015, p.772) é necessário que a reincidência tenha sido reconhecida na sentença condenatória. Ele explica, baseado na Súmula 497 do STF, que no caso de crime continuado, a prescrição é regulada pela pena imposta na sentença e a esta não se acrescenta o acréscimo decorrente da continuidade do crime.

Conforme o artigo 112, I, do Código Penal, a prescrição da pretensão executória começa a correr do dia em que passa em julgado a sentença que revoga a suspensão condicional da pena ou livramento condicional, prova de que durante aquele período, o curso prescricional não estava correndo.

5.1 Subespécies de prescrição da pretensão punitiva (ppp)

As divisões da pretensão punitiva na prescrição, levando em conta o momento processual no qual houve a prescrição e os critérios de cálculo do prazo utilizados, são: PPP propriamente dita (É a calculada tendo em vista a maior pena possível para o caso em questão); PPP intercorrente ou superveniente à sentença condenatória (É a que leva em conta a pena fixada pelo juiz para o cálculo do período prescricional. Só é aplicável nos casos em que já houve uma decisão em primeira instância, mas não se deu ainda o trânsito em julgado); e PPP retroativa (Calcula com base na pena efetivamente fixada, aplicando-se para trás, até a data do recebimento da denúncia ou da queixa; ou entre esta data e a da consumação do crime).

Vejamos um exemplo da prescrição retroativa, artigo 110, §2º, processado por lesão corporal leve (art. 129, caput), Antônio vem afinal a ser condenado ao mínimo legal, ou seja, 03 (três) meses de detenção. A sentença condenatória transita em julgado para a acusação.

Apelando ou não o réu, pode ser averiguado se ocorreu a extinção da punibilidade pela prescrição retroativa. Suponha-se que a denúncia tenha sido recebida em 04/04/80, vindo a ser publicada a sentença em 10/05/1982. Data da prática do crime: 02/01/80.

A partir da data do cometimento do crime estava correndo o prazo prescricional da pretensão punitiva, regulado pelo máximo da pena abstrata. Como esta é de um ano de detenção, tal prazo era de 4 anos.

Passados 3 (três) meses da data do fato a denúncia foi recebida (04/04/1980). Interrompeu-se o prazo prescricional (artigo 117 do CP). E a partir da data em que a denúncia foi recebida outro prazo de 4 anos começou a correr. Pouco mais de dois anos, porém, contados do recebimento da denúncia, foi publicada a sentença condenatória (10/05/82).

Houve nova interrupção do prazo prescricional de 4 anos. No momento em que transitou em julgado a sentença condenatória para o MP, ou foi improvido o seu recurso, surgiu a possibilidade de ser verificada a ocorrência da prescrição retroativa.

E ela realmente ocorreu entre a data do recebimento da denúncia (04/04/80) e a da publicação da sentença condenatória (10/05/82). Importante ressaltar que, a extinção da punibilidade, pela prescrição retroativa, nos moldesdo artigo 110, §2º do CP, ocorreu no dia 03/04/82, dois anos depois do recebimento da denúncia. Observe que o fato de ter havido trânsito em julgado para a acusação ou de ter sido improvido o seu recurso é que nos leva a ter como norte a pena concreta.

6 CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS

Segundo lições de Fernando Capez (2011), as circunstâncias judiciais não têm influência junto ao cálculo da Prescrição da Pretensão Punitiva pela pena abstrata, por mais favoráveis ou contrários que sejam, tendo em visto que o Código Penal estabelece em seu artigo 59 os critérios gerais de fixação de pena previstos.

Eles são levados em conta na primeira fase de fixação de pena, impedindo que a pena saia de seus limites legais. Ela não poderá ficar abaixo do mínimo e nem exceder o máximo previsto.

Desse modo, havendo circunstâncias judiciais favoráveis ou não, não importará, pois, a prescrição terá seu cálculo baseado no máximo previsto pelo tipo penal e, ainda que todas essas circunstâncias inclinassem para agravá-la, ela não poderia ser estabelecida além do máximo cominado (CAPEZ, 2011). A pena não poderá restar superior ao máximo cominado no tipo incriminador nessa fase.

7 CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES E ATENUANTES

As circunstâncias agravantes e atenuantes – dispostas nos artigos 61 e 62 do Código Penal (nominadas) e artigos 65 e 66 (inominadas) – não possuem a capacidade de fazer com que as penas sejam computadas além de seus respectivos limites legais por mais absurdas que possam parecer e pela repercussão social que podem trazer.

Por este motivo, ao se analisarem as circunstâncias agravantes e atenuantes faz-se o mesmo raciocínio das já citadas circunstâncias judiciais ao dizer que ambas não influenciam no prazo prescricional, o qual, em sua generalidade trabalha com o máximo da pena cominada ao tipo ilícito.

Imagine-se a situação de Caio, maior de 21 anos e de conduta social ilibada, envolve-se em uma situação de extrema agressividade em razão de um gracejo jogado por seu irmão enquanto passava nos corredores da universidade. Incomodado com a conduta, tamanho é o descontrole emocional de Caio que este além de desferir vários golpes de canivete na vítima enquanto essa se encontrava de costas, ainda lhe ateia fogo, terminando, assim, por matá-lo.

Apesar de ter bons antecedentes e das agravantes que acima foram citadas (como o emprego de fogo, por exemplo), o limite legal para o prazo prescricional será o do homicídio qualificado (visto que houve motivo fútil) que é de trinta anos.

8 EXCEÇÕES

A aplicação do prazo prescricional não constitui unanimidade ao tocante que sempre se dará ao máximo da pena cominada pelo Código Penal. Como primeira exceção tem-se o artigo 115 que assevera que “são reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)” (BRASIL, 1940).

Quanto ao menor de 21 anos, o Código Civil em nada alterou a redução do prazo prescricional pela metade. Isto porque o benefício de ter uma prescrição mais curta foi estabelecido não em função de sua incapacidade relativa para a prática de atos jurídicos, mas de sua imaturidade e pouca experiência de vida.

Mesmo adquirindo agora a plena capacidade aos 18 anos, isto não significa que deva tornar-se, com essa idade, merecedor de qualquer benesse, não podendo ser esquecido o fato de sua pouca idade, como fator de desestímulo ao seu encarceramento em face do tormentoso sistema carcerário que existe no Brasil.

A segunda exceção erige-se no tocante à reincidência: é pacifico que tal instituto pode aumentar o prazo prescricional executório em 1/3; no entanto, quando se trata de pretensão punitiva havia o embate se aumentaria ou não em 1/3 o prazo prescricional. De maneira inicial, o STJ, em decisão de recurso especial apresentou a seguinte decisão:

PENAL. REINCIDENCIA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ART.110, CAPUT, DO CP. APLICAÇÃO. I. A MAJORAÇÃO PREVISTA NO ART. 110, IN FINE, DO CÓDIGO PENAL, TEM APLICAÇÃO TANTO NA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTORIA (DA PENA), COMO NA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA (DA AÇÃO).”(BRASIL, 1992).

No entanto, em súmula posterior, pacificou o entendimento que “a reincidência não influi no prazo da prescrição da pretensão punitiva” (BRASIL, 2011).

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O instituto da prescrição no processo penal determina um lapso temporal para que o Estado exerça seu legítimo poder punitivo, afastando, dessa forma, a falsa ideia de que a punição penal possui a liberdade de ser aplicada a qualquer tempo, de forma indefinida.

Diante da inércia estatal em exercer seu poder punitivo, dentro do lapso temporal legalmente instituída, o Estado perderá a pretensão punitiva ou, se for o caso, a pretensão executória da pena, sobre o autor de um crime hipotético. Extingue-se, portanto, a possibilidade de punição penal pelo crime praticado.

O estudo e aplicação do instituto da prescrição penal são de grande importância para a dinâmica do sistema punitivo brasileiro. Diante da grande lista de possibilidades de aplicação do instituto, é possível evitar a continuidade de um processo, pois uma vez a prescrição é acolhida, o processo é extinto.

Inúmeras são as justificativas favoráveis ao acolhimento do instituto, dentre elas, impossibilidade de sentença justa pela perda de substância da prova, a teoria da readaptação social, teoria da expiação moral, que presume que o remorso e as atribulações sofridas pelo delinquente no curso do tempo da prescrição caracterizam um substituto da pena, a teoria do esquecimento e a teoria da analogia civilística, fundamentada na aquisição de um direito à impunidade pela inércia dos órgãos do estado responsáveis pela apuração do crime e punição do autor.

Identifica-se, portanto, a prescrição penal como um necessário instrumento limitador ao poder punitivo do Estado, sendo verdadeira garantia fundamental ao cidadão.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei n.º 2.848, de 7 de dezembro de 1940.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. v.1. 15 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 2010.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. v.1. 17 ed. rev. atual. ampl. Rio de Janeiro: Impetus, 2015.

BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. Resp 6814 Pr 1990/0013259-2 n.º 1. Relator: Ministro CARLOS THIBAU.DOU. Brasília, 03 fev. 1992. p 476.



[1] Acadêmico do curso de Direito, da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). E-mail: lucasdicassio@gmail.com

Como citar e referenciar este artigo:
ARANHA, Lucas de Cássio Cunha. A teoria da prescrição penal no ordenamento jurídico brasileiro. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/a-teoria-da-prescricao-penal-no-ordenamento-juridico-brasileiro/ Acesso em: 28 mar. 2024