Direito Penal

A violência doméstica e a mulher transexual

Hoje em dia no Brasil, a violência doméstica ainda atinge um número alarmante de mulheres por ano. Uma mulher brasileira a cada 15 segundos sofre com a violência doméstica. Tal situação, afronta não apenas o Estado, mas compromete o sentimento de dignidade e justiça de toda sociedade e, por isso, cabe a todos mudar essa realidade. (BRASIL, 2010).

A violência doméstica faz vítimas diárias no Brasil, tal situação vê-se por vezes agravada quando se trata de violência doméstica sofrida por mulher transexual.

Isso porque, atualmente dados confirmam que o Brasil é o país que mais mata travestis e transexuais. Segundo pesquisa feita por Organização Não Governamental, entre janeiro de 2008 e março de 2014, foram registradas 604 mortes no país![i]

Outro dado bastante preocupante é que a expectativa de vida do transexual no Brasil é de 35 anos, que corresponde quase a metade da média nacional.[ii]

No que diz respeito à violência doméstica, estabelece o artigo primeiro da Lei nº 11.340 de 7 de agosto de 2006 (BRASIL, 2006):

Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Em que pese a lei tenha criado mecanismos efetivos no combate e prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, nota-se que as mulheres transexuais não se encontram especificamente inseridas nesta proteção.

A doutrina não é unissona quanto a possibilidade de aplicação da Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha) aos casos onde a violência doméstica é praticada contra mulher transexual,  principalmente por conta da dificuldade de reconhecer como mulher, a pessoa que, mesmo tendo sido submetida a cirurgia de redesignação sexual, ainda não promoveu a retificação do registro civil.

Para Gomes e Bianchini (2006), “no caso de cirurgia transexual, desde que a pessoa tenha passado documentalmente a ser identificada como mulher (Roberta Close, por exemplo), terá incidência a lei Maria da Penha”.

Contudo, externando outra linha de entendimento, em recente decisão, o juiz de direito Danniel Bomfim, do Tribunal de Justiça do Acre, considerou que o sexo biológico de nascimento masculino não pode impedir que se reconheça a identidade sexual feminina de vítima, concedendo a uma mulher transexual medida protetiva com base na Lei Maria da Penha. (BRASIL, 2016a).

Sendo assim, nota-se que atualmente a situação da mulher transexual ainda carece de tutela legal específica, sendo aplicada em determinados casos a Lei Maria da Penha a critério do magistrado.

 

 Deste modo, constata-se que as transexuais encontram-se em situação de vulnerabilidade por dois motivos: um em virtude da discriminação pelo gênero feminino e outro pela condição de transexual. Sendo, de várias formas, vítimas de violência, especialmente no âmbito doméstico e familiar.

Referências:

______. Lei Maria da Penha: Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006, que dispõe sobre mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Brasília: 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm>. Acesso em 17 de agosto de 2017

______. Tribunal de Justiça do Acre. Decisão inédita assegura medida protetiva de urgência a transexual vítima de violência doméstica. Rio Branco: 2016a. Disponível em: <http://www.tjac.jus.br/noticias/decisao-inedita-assegura-medida-protetiva-de-urgencia-a-transexual-vitima-de-violencia-domestica/>. Acesso em 17 de agosto de 2017

GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Aspectos criminais da Lei de Violência contra a Mulher. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8916>. Acesso em 17 de agosto de 2017

 

Autora: Isabella Mª Zandavalle, graduanda em Direito, na décima fase da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Como citar e referenciar este artigo:
ZANDAVALLE, Isabella Mª. A violência doméstica e a mulher transexual. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direitopenal-artigos/a-violencia-domestica-e-a-mulher-transexual/ Acesso em: 19 abr. 2024