Direito da Saúde

O direito humano à alimentação adequada, segurança alimentar nutricional e a obesidade infantil

Williana Gomes da Silva [1]

Wilker Jeymisson Gomes da Silva [2]

RESUMO

A obesidade, inclusive a infantil, é uma doença multifatorial, causada, dentre outros fatores determinantes, a inadequação alimentar, sendo contrária aos propósitos almejados pela segurança alimentar, que visa a disponibilidade de alimentos em níveis qualitativos, quantitativos e em diversidade. O objetivo desse estudo foi relacionar a obesidade infantil à insegurança alimentar, no contexto do direito humano à alimentação adequada, partindo principalmente de referenciais bibliográficos, relacionando os temas citados. A conclusão a que se chegou foi de que, diante de todos os fatores geradores, a insegurança alimentar relaciona-se diretamente com as causas da obesidade infantil, transgredindo, assim, o direito humano à alimentação adequada.

Palavras-chave: Obesidade infantil. Segurança Alimentar e Nutricional. Alimentação. Direito Humano à Alimentação Adequada.

1 INTRODUÇÃO

A alimentação, como um fator essencial para o bem-estar, e desenvolvimento humano, é um direito social contido na Constituição Federal, promovido, na atualidade, por meio da segurança alimentar e nutricional. Este direito, embora se encontre no contexto do aumento da produção mundial de alimentos, não se encontra efetivado, pois ainda existe uma parte significativa da população mundial que não tem o suficiente para comer, e boa parte dispõe de alimentos, mas de qualidade duvidosa.

Neste cenário, torna-se necessária a promoção da segurança alimentar e nutricional, no intento de se fomentar o direito humano à alimentação adequada, sendo que a segurança alimentar diz respeito à disponibilidade de alimentos, e o seu viés nutricional, por sua vez, engloba a relação entre o ambiente, os indivíduos que integram sociedade e a alimentação.

Dentre os fatores negativos desencadeados pela alimentação inadequada e insegura, está a obesidade, como uma doença crônica das mais alarmantes na saúde pública mundial, que enseja diversas patologias correlatas, como as diabetes, hipertensão, e doenças cardiovasculares, também em crianças. A obesidade, inclusive a infantil, associa-se com a insegurança alimentar e nutricional, sendo este o objetivo do presente trabalho: analisar a relação da insegurança alimentar e nutricional, no contexto do direito humano à alimentação adequada, com a obesidade infantil.

2 A OBESIDADE INFANTIL

A obesidade, de modo amplo, pode ser conceituada como uma doença crônica, caracterizada pela sua natureza multifatorial, sendo ocasionada pela constância concomitante de fatores ambientais, nutricionais e genéticos em um determinado indivíduo, sendo também caracterizada, notadamente, pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, acarretando inúmeros prejuízos à saúde (ABRANDH, 2010).

Neste mesmo sentido, conforme as lições de Vasconcelos e outros (2011, p. 252) a “[…] etiologia da obesidade é multicausal e reflete a interação de fatores genéticos, fisiológicos (endócrino-metabólicos), ambientais (prática alimentar e atividade física) e psicológicos”. Sob a ótica da Sociedade Brasileira de Pediatria (2012, p. 22), a obesidade é considerada como “[…] uma doença crônica, complexa, de etiologia multifatorial e resulta de balanço energético positivo. O seu desenvolvimento ocorre, na grande maioria dos casos, pela associação de fatores genéticos, ambientais e comportamentais”.

A preocupação[3] com a questão da obesidade dá-se em razão de ser sabido que:

Atualmente, a obesidade é reconhecidamente um problema de saúde pública que atingiu escala mundial, sendo também um dos fatores de risco para várias doenças não transmissíveis, o que aumenta de forma significativa os custos para a saúde pública nos países. Considerando que as verbas destinadas à saúde no Brasil são limitadas, ocorre um grande impasse, pois os índices de obesidade e de excesso de peso têm crescido em um ritmo maior do que os incrementos dos investimentos na área da saúde (SDH, 2013, p. 39)

Nesse passo, a obesidade é uma situação passível de acompanhar o indivíduo desde os seus primeiros comportamentos alimentares, no início de sua formação enquanto ser humano, acompanhando-o, se não transformados os seus hábitos, até a vida adulta e consequente velhice, de tal forma que, nos primeiros anos de vida, a importância da educação alimentar é de imensurável relevância, imputada esta responsabilidade primordialmente aos pais e à família da criança.

Logo,

Ainda que a obesidade seja um problema coletivo, a formação e as transformações dos hábitos pessoais se iniciam nos primeiros anos de vida, em casa, ainda quando criança. São, portanto, os pais os principais responsáveis pela formação de uma pessoa que tem hábitos alimentares mais saudáveis e nutricionalmente adequados (SDH, 2013, p. 31).

Desta forma, analisando a obesidade infantil, situação stricto sensu, contida no arcabouço do gênero obesidade, pode ser dito que esta patologia, qual seja a obesidade infantil, é definida como o acúmulo excessivo de tecido adiposo em indivíduos desde os primeiros meses de vida até o 12º (décimo segundo) ano de vida, cujo desenvolvimento sofre influência de fatores biológicos, psicológicos e socioeconômicos (FRISBERG, 2006, apud BOMFIM e. al., 2016, p. 32).

Assim, este problema de saude infantil foge à esfera meramente privada da criança e seu seio familiar, transcendendo à esfera social e coletiva, haja vista que:

[…] a obesidade também afeta o sistema de saúde pública como um todo. A criança que está acima do peso tem mais chances de ficar suscetível a doenças crônicas não transmissíveis, e de difícil tratamento e sérias consequências para a vida, como, por exemplo, o diabetes e a hipertensão. Associada ao sedentarismo, a obesidade é, assim, um dos maiores problemas de saúde infantil no Brasil atual (SDH, 2013, p. 35).

Desta maneira, sendo uma patologia crônica e, como já mencionado, ocasionada por fatores plúrimos, a obesidade infantil tem a sua causa e o seu desenvolvimento formado por meio da presença de inúmeros elementos constituintes, dentre eles a questão comportamental, que influencia diretamente na causa geradora da doença.

Isto pode ser observado em uma análise perfunctória das relações modernas, em que a tecnologia distancia as pessoas de uma vida saudável, sendo que:

O modo de vida das sociedades modernas facilita o distanciamento de uma vida saudável, mesmo nos segmentos mais ricos da população. O rápido declínio no gasto energético relacionado a trabalhos que demandam menos esforço físico, – somado às atividades sedentárias de lazer (como a permanência de horas em frente à TV, jogos eletrônicos) e o aumento no consumo de alimentos com alta concentração de gorduras, açúcares e sal vêm causando vários tipos de doenças. Essas doenças (obesidade, diabetes, colesterol elevado e hipertensão), originalmente características dos adultos, atualmente já são observadas em crianças e em todas as faixas de renda de nossa sociedade. Nesse contexto, portanto, a promoção de práticas alimentares saudáveis é urgente! (ABRANDH, 2010, p. 157).

A Associação Brasileira Para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica, coadunando com o entendimento acima esposado, obtempera que:

O ambiente moderno é um potente estímulo para a obesidade. A diminuição dos níveis de atividade física e o aumento da ingestão calórica são fatores determinantes ambientais mais fortes. Há um aumento significativo da prevalência da obesidade em diversas populações do mundo, incluindo o Brasil (ABESO, 2016, p. 33).

Logo, estes fatores comportamentais, relacionados diretamente ao ambiente em que o indivíduo está inserido, também são causas geradoras da obesidade no público infantil, causando-lhes, além de prejuízos diretos à saude, danos externos e indiretos, como acessórios da prejudicialidade primária, que é o agravo à saude do ser humano.

Quanto à criança, é salutar que

Estudos sobre preconceito com relação à obesidade na infância demonstraram que essas crianças são avaliadas como preguiçosas, sujas, burras, feias, trapaceiras e mentirosas. Há um aumento dos sentimentos de inferioridade e do isolamento social entre adultos e crianças obesos (ABESO, 2016, p. 38).

Assim, pode-se perceber que a obesidade infantil é um problema grave em nosso país, posto que os números crescem cotidianamente, não acompanhando o quantitativo e a eficiência das políticas públicas combativas, sendo necessária a ação conjunta e multidisciplinar, no intento de se obstar o crescimento da população infantil obesa e, por conseguinte, reduzi-los.

3 DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA E A SEGURANÇA ALIMENTAR

Os direitos humanos versam acerca de condições básicas de vida para todos os seres humanos, visto que a todos deve ser proporcionada uma vida com dignidade. Os direitos humanos fundamentais são caracterizados por possuírem dimensão universal, indivisível e inalienável, além de serem interdependentes e inter-relacionados.

Dentre os direitos humanos essenciais está a alimentação, contida como direito social na Carta Magna, por visar atender a uma das necessidades básicas do homem, que é alimentar-se, tendo este propósito sempre sido alvo de preocupação individual e coletivo. O direito à alimentação foi incluído na Constituição Federal após a Emenda Constitucional 064/2010, passando a figurar como direito social no seu artigo 6°, como um direito individual e coletivo.

O Direito Humano à Alimentação Adequada, em aspectos terminológicos, encontra a sua origem no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, este que se consubstancia no direito que as pessoas têm de acesso regular, de modo permanente e sem restrições aos alimentos, que devem ser disponibilizados com o devido grau de segurança e que sejam considerados saudáveis.

Segundo Ramos (2017), o Pacto mencionado reconhece o direito de toda pessoa a ter um nível de vida adequado, sendo mencionada a alimentação e o direito fundamental de toda pessoa estar protegida contra a fome como um de seus nortes. Para assegurar a efetivação do direito, o Pacto diz ser importanteque haja a cooperação internacional e a adoção de programas quer aprimorem, em termos essencialmente qualitativos, os métodos de produção, de conservação e de distribuição de gêneros alimentícios, assegurando, também, a repartição equitativa dos recursos alimentícios.

A Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006 – Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – traz, em seu art. 2º, a definição da alimentação adequada, para os fins legais, dispondo que:

Art. 2º A alimentação adequada é direito fundamental do ser humano, inerente à dignidade da pessoa humana e indispensável à realização dos direitos consagrados na Constituição Federal, devendo o poder público adotar as políticas e ações que se façam necessárias para promover e garantir a segurança alimentar e nutricional da população (BRASIL, 2006).

O Ministério da Saude (2013, p. 70), define o direito humano à alimentação adequada, em dimensões[4] gerais, como sendo:

[…] direito humano inerente a todas as pessoas de ter acesso regular, permanente e irrestrito, quer diretamente ou por meio de aquisições financeiras, a alimentos seguros e saudáveis, em quantidade e qualidade adequadas e suficientes, correspondentes às tradições culturais do seu povo e que garantam uma vida livre do medo, digna e plena nas dimensões física e mental, individual e coletiva.

Tem-se, quanto à realização do direito humano a uma alimentação adequada, que uma das mais importantes ações para alcançá-la é o desenvolvimento de ações educativas que sejam direcionadas à propagação do tema alimentação e nutrição para a sociedade, tanto no âmbito da educação formal pertinente, do ensino básico e superior, como para o ensino não formal, fora de estabelecimentos educacionais propriamente ditos.

A segurança nutricional, por sua vez, diz respeito a conceito distinto, e tem como um de seus principais marcos a segunda guerra mundial, posto que este fato histórico marcou, de maneira significativa, a evolução dos direitos humanos fundamentais, trazendo consigo a expansão da modernização da agricultura, haja vista que este período pós-guerra ensejou a necessidade de se reconstruir os continentes prejudicados com o ocorrido.

No entanto, o tema, durante a primeira guerra, mostrava-se em insurgência, entendendo-se que:

Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) o termo segurança alimentar passou a ser utilizado na Europa. Nessa época, o seu conceito tinha estreita ligação com o conceito de segurança nacional e com a capacidade de cada país produzir sua própria alimentação, de forma a não ficar vulnerável a possíveis embargos, cercos ou boicotes devido a razões políticas ou militares (ABRANDH, 2010, p. 11).           

Assim, houve a enfatização da temática a partir do advento da segunda guerra mundial e consequente criação da ONU – Organização das Nações Unidas, pois dentre os direitos humanos que restaram reforçados, a alimentação passou a ser entendida como tal (direito humano), sendo tratada com maior relevância, a partir de então.

Estas novas técnicas modernas, criadas a partir da segunda guerra mundial, voltadas ao aumento da produtividade e industrialização da produção agrícola, acarretaram no aumento significativo da oferta mundial de alimentos, período em que, paralelamente a tal expansão, aumentava-se a população mundial e a população urbana, em razão do aumento do êxodo rural. Desta forma, este processo de urbanização do território brasileiro contribuiu, de maneira direta, com o desenvolvimento da indústria da agricultura, havendo o desenvolvimento e criação de técnicas produtivas inovadoras neste ramo.

Com a evolução histórica e desenvolvimento socioeconômico do país, o conceito de Segurança Alimentar passou a se expandir, paralelamente, perpassando de aspectos que diziam respeito à insuficiência de disponibilidade de alimentos até encontrar uma definição aprimorada nos moldes atuais, em que se acopla o aspecto quantitativo dos alimentos à questão qualitativa.

Isto porque, além de garantir o quantum de alimentos necessário para abastecer a sociedade, também se faz necessária, a partir desta nova ideia, que haja a segurança também em aspectos nutricionais e sanitários, pelo que o conceito expandiu-se, passando a denominar-se como Segurança Alimentar e Nutricional. Assim, pode ser entendido que “A evolução conceitual ocorre em nível internacional e nacional e caracteriza-se como um processo contínuo que acompanha as diferentes necessidades de cada povo e de cada época” (ABRANDH, 2010, p. 12).

Assim, a Segurança Alimentar e Nutricional pode ser entendida como sendo:

[…] a garantia, a todos, de condições de acesso a alimentos básicos de qualidade, em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades básicas, com base em práticas alimentares que possibilitem a saudável reprodução do organismo humano, contribuindo, assim, para uma existência digna […].           

A Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional aduz, em seu art. 3º, que:

Art. 3º A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (BRASIL, 2006).

Assim, a interseção entre a alimentação e a nutrição, quanto aos aspectos de segurança ora tratados, diz respeito, quanto ao primeiro elemento, à questão, da produção e disponibilidade dos alimentos propriamente ditos, assim como a sua comercialização, ao passo que o elemento nutricional relaciona-se aos aspectos de escolha, preparação, consumo e suas consequências para a saude e utilização biológica. Estas dimensões, assim, completam-se mutuamente, sendo necessária a ligação entre os aspectos objetivos do viés alimentar e os elementos que interligam o homem e o alimento, que caracterizam o viés nutricional.

O aspecto qualitativo, próprio do viés nutricional, assim, integra o conceito de segurança alimentar, sendo que

[…] a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é estabelecida no Brasil como a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (MINISTÉRIO DA SAUDE, 2013, p. 25).

Pode ser dito, assim, que “A segurança alimentar é um importante mecanismo para a garantia da segurança nutricional, mas não é capaz de dar conta por si só de toda sua dimensão” (ABRANDH, 2010, p. 14). Justifica-se, por esta razão, a inserção do aspecto nutricional acoplada à segurança alimentar, em razão da essencialidade dos aspectos qualitativos que devem estar presentes.

4 A OBESIDADE INFANTIL NO CONTEXTO DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA E SEGURANÇA ALIMENTAR

A questão da obesidade, como uma doença crônica e multifatorial, causada, primordialmente, por razões de cunho alimentar, liga-se diretamente aos objetivos consecutidos pelo plano de Segurança Alimentar e Nutricional. Isto porque:

[…] compreendendo a insegurança alimentar a partir de diferentes tipos de problemas, como obesidade e doenças associadas à má alimentação, aponta-se a relevância do desenvolvimento de programas dentro do SAN, em âmbito federal, para a prevenção da obesidade na primeira infância (RNPI, 2014, p. 23)

Assim, dentro dos programas do plano de Segurança Alimentar e Nutricional, as doenças ligadas aos problemas alimentares, dentre elas a obesidade, constam metas e ações voltadas ao combate destas patologias, posto que as doenças causadas por fatores ligados à alimentação figuram como as maiores responsáveis por morte no Brasil e no mundo.

Em razão das proporções tomadas pelas doenças ligadas à alimentação,

[…] os dados divulgados devem servir de alerta para as autoridades da saúde pública, uma vez que, em síntese, mostra-se um acentuado aumento das doenças não contagiosas (diabetes, hipertensão arterial e doenças cardiovasculares) ligadas à obesidade e aos hábitos alimentares inadequados. Somadas, essas doenças são responsáveis por aproximadamente dois terços das mortes no mundo (SDH, 2013, p. 32).

As doenças ligadas à alimentação devem ser prevenidas e combatidas arduamente desde os primeiros meses de vida, quanto ao público infantil, mostrando-se necessário que a alimentação seja iniciada adequadamente aos indivíduos já em sua primeira infância, que são os primeiros anos de vida da criança, iniciando com hábitos alimentares que devem ser introduzidos desde o primeiro ano de vida, obstando o surgimento de problemas, como a obesidade infantil, por exemplo (ORNELLAS, 1983).

A alimentação adequada, em termos gerais, é um direito social fundamental, embora não tenha saído efetivamente do plano teórico, haja vista que não se encontra concretizado, havendo apenas idealizações que não se efetivam, em razão da insuficiência dos esforços dos cidadãos e do Estado em garantir sua efetivação, dando ênfase à atuação das Organizações Internacionais em conceder ao ser humano o necessário para que se atenue e extinga-se o problema da fome e da má qualidade da alimentação que, dentre outros prejuízos acessórios, causa o crescimento da obesidade e outras doenças congêneres.

À vista disso:

O direito social fundamental à alimentação adequada e à segurança alimentar não se relaciona diretamente apenas no que toca à fome e à desnutrição, possuem relação direita com o excesso de alimentos (crescente índice de obesidade em alguns países) e com a má qualidade do que é oferecido pelo mercado, em nível mundial com o rótulo de alimentação moderna       (MÜLLER, 2014, p. 57).           

O combate à obesidade, inclusive a infantil, está contida no âmbito dos objetivos perseguidos pela Promoção da Alimentação Adequada e Saudável, em consonância com o direito social à alimentação, contido no art. 6° da Constituição Federal. Esta promoção incisiva tem por finalidade:

[…]a melhora da qualidade de vida da população, por meio de ações intersetoriais, voltadas ao coletivo, aos indivíduos e aos ambientes (físico, social, político, econômico e cultural), de caráter amplo e que possam responder às necessidades de saúde da população, contribuindo para a redução da prevalência do sobrepeso e obesidade e das doenças crônicas associadas e outras relacionadas à alimentação e nutrição (MINISTÉRIO DA SAUDE, 2013, p. 32).           

A insegurança na alimentação, também no aspecto nutricional, vai de encontro às finalidades do direito humano à alimentação adequada, haja vista que esta prática, disseminada por diversos elementos configuradores, acarreta patologias graves à população. A inadequação alimentar fere o direito social à alimentação, que deve ser pleno e irrestrito.

Assim, quanto à Insegurança Alimentar (IA):

Diante de uma alimentação inadequada a principal consequência é a IA e a obesidade que constituem uma dimensão de pobreza e de desigualdade social. O consumo alimentar é um indicador importante para a caracterização da pobreza. É relativo presumir que o aumento do rendimento médio dos países mais pobres tenha impacto nos níveis de SAN. Existem inúmeros fatores pelos quais a obesidade pode estar associada à IA, dentre eles estão a falta de acesso à alimentos saudáveis, as escolhas alimentares erradas, a grande quantidade de alimentos ingeridos, a não diversificação da alimentação com consequente baixa qualidade nutricional da dieta (MAZUR; NAVARRO, 2015, p. 37).           

Diante disso, é de se concluir que a obesidade infantil, como uma doença crônica suportada por crianças, é um dos objetivos que deve ser perseguido pelos programas de segurança alimentar e nutricional, para que haja a efetivação do direito social à alimentação, esta última sendo assegurada de maneira adequada, cumprindo, inclusive, com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, insculpido no art. 1°, inciso III, da Constituição Federal.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em termos conclusivos, da partindo das considerações expostas no teor deste trabalho científico, se tornou possível compreender que a obesidade infantil, enquanto doença crônica ocasionada às crianças, relaciona-se com a insegurança alimentar e nutricional, desatendendo os preceitos do direito humano à alimentação adequada.

Como prática plausível para se atenuar a obesidade infantil, em cumprimento à segurança alimentar e nutricional, o aumento da disponibilidade de alimentos adequados e saudáveis e a instituição, principalmente, de regulação, dispondo quanto à publicidade acerca de alimentos e educação alimentar, propagando à população o necessário entendimento das práticas que devem ser adotadas, visando, com isso, a diminuição dos males acarretados, dentre eles a obesidade infantil.

A disseminação e aplicabilidade das políticas públicas tem-se como de fundamental relevância para que se possa ter a efetivação dos parâmetros aceitáveis de alimentação adequada, direcionando os seus objetivos, dentre tantos outros, a atenuar o número de crianças que sofrem de obesidade, posto que este ciclo leva a presumir que, quanto mais crianças obesas existirem, mais adultos obesos existirão no futuro, aumentando-se, nessa lógica, um problema tão sério, como é a obesidade.

6 REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PELA NUTRIÇÃO E DIREITOS HUMANOS (ABRANDH). Direito humano à alimentação adequada no contexto da segurança alimentar e nutricional. Valéria Burity … [et al.]. Brasília, DF: ABRANDH, 2010.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PARA O ESTUDO DA OBESIDADE E DA SÍNDROME METABÓLICA (ABESO). Diretrizes brasileiras de obesidade 2016. 4. ed. São Paulo: ABESO, 2016.

BOMFIM, Natália da Silva; GUILHERME, Cristiane da Silva; SAITO, Jéssica de Almeida; MONTEZANI, Érica. Obesidade infantil: principais causas e a importância da intervenção nutricional. Revista Científica da Escola da Saude. Ano 5, n° 1, p. 31-44, out. 2015/jan. 2016

BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Direito à alimentação adequada. Brasília: Coordenação Geral de Educação em SDH/PR, Direitos Humanos, Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, 2013.

_____. Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm>. Acesso em: 01 fev. 2017.

CONSELHO NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL. Direito humano à alimentação adequada. Disponível em: <http://www4.planalto.gov.br/consea/acesso-a-informacao/institucional/conceitos/direito-humano-a-alimentacao-adequada>. Acesso em 25 ago. 2017.

MAZUR, Caryna Eurich; NAVARRO, Francisco. Insegurança alimentar e obesidade em adultos: qual a relação?. Saúde (Santa Maria), Santa Maria, Vol. 41, n. 2, Jul./Dez, p.35-44, 2015.

MINISTÉRIO DA SAUDE. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Política Nacional de Alimentação e Nutrição. Departamento de Atenção Básica.Básica. 1. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2013.

MÜLLER, Marcela. O direito social fundamental à alimentação adequada e sua proteção no contexto das organizações internacionais. Dissertação de Mestrado.Programa de Pós-Graduação em Direito em Proteção dos Direitos Fundamentais, Universidade de Itaúna. Itaúna, MG: Universidade de Itaúna, 2014.

ORNELLAS, Alfredo; ORNELLAS, Lieselotte H. Alimentação da criança, Nutrição Aplicada. Rio de Janeiro: Atheneu, 1983.

RAMOS, André de Carvalho. Curso de direitos humanos. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.

REDE NACIONAL PRIMEIRA INFÂNCIA (RNPI). Obesidade na primeira infância. Instituto da Infância – IFAN: Ceará, 2014.

SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Obesidade na infância e adolescência: manual de orientação. Departamento Científico de Nutrologia. 2. ed. São Paulo: SBP, 2012.

VASCONCELOS, Maria Josemere de Oliveira Borba, et al. Nutrição Clínica: obstetrícia e pediatria. 6. ed. Rio de Janeiro: Ed. Científica Ltda, 2011.



[1] Nutricionista, com registro no Conselho Regional de Nutrição da 6º região – CRN6. Graduada em Nutrição pela Faculdade Maurício de Nassau – FMN, tendo exercido monitoria da disciplina Nutrição e Dietética II nos semestres 2016.1 e 2016.2. Ex-estagiária do Hospital Estadual de Emergência e Trauma Senador Humberto LucenaHEETSHL. Ex-estagiária da Unidade de Alimentação e Nutrição (UAN) – Domus Hall Entretenimento Ltda. Email: williana_g.silva@hotmail.com.

[2] Pós-Graduando em Direito do Trabalho e Previdenciário pela Instituição de Educação Superior da Paraíba – IESP. Bacharelando em Direito pela Faculdade de Ensino Superior da Paraíba – FESP. Estagiário do Ministério Público de Contas junto ao Tribunal de Contas do Estado da Paraíba. Pesquisador em Direito do Trabalho no Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP. Monitor, atualmente, das disciplinas de Direito do Trabalho I e II, tendo exercido monitoria em Direito Administrativo I e II na FESP – Faculdade de Ensino Superior da Paraíba. Autor de diversos trabalhos científicos na área jurídica. Ex-estagiário da 8ª Vara do Trabalho da Comarca de João Pessoa – Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região. Email: wilkerjgsilva@hotmail.com.

[3] “A Organização Mundial de Saúde (OMS) produziu um relatório a partir das Estatísticas Mundiais de Saúde 2012 (OMS, 2012), documento que afirma ser a obesidade a causa de morte de 2,8 milhões de pessoas por ano. De acordo com o relatório, aproximadamente 12% da população mundial pode ser considerada obesa” (SDH, 2013, p. 32).

[4] “O Direito Humano à Alimentação Adequada tem duas dimensões: o direito de estar livre da fome e o direito à alimentação adequada. A realização destas duas dimensões é de crucial importância para a fruição de todos os direitos humanos. Os principais conceitos empregados na definição de Direito Humano à Alimentação Adequada são disponibilidade de alimentos, adequação, acessibilidade e estabilidade do acesso a alimentos produzidos e consumidos de forma soberana, sustentável, digna e emancipatória” (CONSELHO NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL, 2017).

Como citar e referenciar este artigo:
SILVA, Williana Gomes da; SILVA, Wilker Jeymisson Gomes da. O direito humano à alimentação adequada, segurança alimentar nutricional e a obesidade infantil. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2017. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-da-saude/o-direito-humano-a-alimentacao-adequada-seguranca-alimentar-nutricional-e-a-obesidade-infantil/ Acesso em: 19 abr. 2024