Direito Constitucional

Audiências Públicas sobre Anencefalia no STF

Audiências Públicas sobre Anencefalia no STF

 

 

Bruno Meotti Figueiredo*

 

 

 

“Anencefalia é definida na literatura médica com a má formação fetal congênita por defeito do fechamento do tubo neural durante a gestação, de modo que o feto não apresenta os hemisférios cerebrais e o córtex, havendo apenas resíduo do tronco encefálico.”(BARROSO, 2004, p.4)

 

A Confederação nacional dos Trabalhadores da Saúde (CNTS) entrou com uma argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) junto ao STF visando tornar inconstitucional a interpretação dos artigos 124, 126 e 128, incisos I e II, do Código Penal onde expõe sobre o tema “aborto” elaborado pelo legislador. Atuando também em defesa dos profissionais da saúde, apóia a idéia de que a antecipação terapêutica do parto seria uma saída benéfica para os casos de fetos anencefálicos, uma vez que tais fetos, pelo que tem se evidenciado, não sobrevivem até o final da gestação e quando sobrevivem ao parto, acabam morrendo horas depois. Não obstante, argumenta que: “A antecipação terapêutica do parto de fetos anencefálicos situa-se no domínio da medicina e do senso comum, sem suscitar quaisquer das escolhas morais envolvidas na interrupção voluntária da gravidez viável.”(BARROSO, 2004, p.4)

 

Essa antecipação terapêutica do parto teria o objetivo de não apenas livrar os pais do sofrimento causado pela certeza da não sobrevivência do feto, como teria o escopo de neutralizar as chances de males à mãe, uma vez que a gestação e o parto de infrutífero poderiam acarretar danos e risco de vida a mãe; além dos nove meses de espera.

 

Essa argüição de descumprimento de preceito fundamental se iniciou em 2004 e mesmo depois de ser considerada procedente essa liminar foi cassada voltando tudo a ser como o legislador havia decidido. Mesmo durante o processo, varias entidades tentaram participar do processo como amicus curiae bem definido por Esther Maria Brighenti dos Santos (2008): “Amicus curiae diz respeito a uma pessoa, entidade ou órgão com profundo interesse em uma questão jurídica levada à discussão junto ao Poder Judiciário.(…)” e ainda “A função histórica do amicus curiae é chamar a atenção da corte para fatos ou circunstâncias que poderiam não ser notados.”

 

Mesmo após a tentativa de entidades como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e Católicas pelo Direito de Decidir tentando participar como amicus curiae, esse pedido foi negado. Porém mais tarde varias entidades foram chamadas para audiências publicas visando uma melhor discussão do tema. Foram chamados para participar a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil; Igreja Universal; Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família, , Instituto de Bioética, Associação de Desenvolvimento da Família – ADEF, Escola de Gente, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, Conselho Federal de Medicina, Sociedade Brasileira de Medicina Fetal, Sociedade Brasileira de Genética Clínica, Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência entre outro mais.. Cada um trazendo seus pareceres e suas argumentações.

 

A Constituição de 88 defende em seu artigo 5ª os direitos fundamentais a liberdade, a autonomia da vontade, a dignidade da pessoa humana, e o direito a saúde. O aborto dos fetos outrora citados contribuiria para o direito de liberdade, uma vez que os pais poderiam optar ou não por essa forma de encerrar as coisas; a autonomia da vontade se encaixaria nessa decisão também; a dignidade da pessoa se uniria ao direito a saúde por parte da parturiente uma vez que não se pode prejudicar alguém com plena autonomia e força pela incerteza de um futuro indeterminado. Todavia o Código Penal entra em conflito com esses direitos mostrando o desejo do legislador em preservar os casos de aborto não descritos como legais, dando severa repreensão penal aos mesmos. Certamente o legislador sabia de casos de anencefalia e dos prováveis riscos a mãe e, mesmo assim; optou por não eximir de culpa quem aplicasse o aborto a tal caso. Seria o STF a autoridade maior para desfazer a competência legislativa do elaborador do projeto do Código Penal?

 

Argumenta Luiz Carlos Lodi da Cruz fazendo referencia àqueles que apóiam a antecipação do parto (2001): “A argumentação é muito clara ao nazismo, que eliminava os defeituosos, os socialmente inúteis e os moribundos. Lamentavelmente ela tem sido ressuscitada no meio médico e jurídico da atualidade, que tem feito ampla propaganda do chamado ‘aborto eugênico’.” Cada vez mais os fetos tem ido para o banco de réus e tem sido julgado como se tivesse praticado algum crime contra a humanidade ou contra determinada nação uma vez que se discute em todo lugar se ele deve ou não ter pena de morte. Mas partindo-se do pressuposto que um simples feto fosse o maior criminoso de todos os tempos no Brasil (onde não existe pena de morte), não teria esse feto o simples direito que é concedido a todos os condenados no Brasil de morrer naturalmente e não de ser subjugado por uma corte de poder? (ALVES JR, 2007,item 30.23)

 

Assim sendo, entendo que não há limites para milagres e quando se tenta dimensionar e limitar o poder de Deus e a habilidade da ciência em promover curas a humanidade dá um salto enorme rumo a um buraco negro onde qualquer luz serve de direção.

 

 

Referências

 

 

BARROSO, Luis Roberto et al. Petição inicial ADPF 54. 2004. Disponível em < http://www.stf.gov.br/portal/geral/verPdfPaginado.asp?id=181767&tipo=TP&descricao=ADPF%2F54>. Acesso em 11 set. 2008.

CRUZ, Luiz Carlos Lodi da. Mais uma homenagem póstuma a Hitler . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2057>. Acesso em: 12 set. 2008.

 

SANTOS, Esther Maria Brighenti dos. Amicus curiae: um instrumento de aperfeiçoamento nos processos de controle de constitucionalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 906, 26 dez. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7739>.

 

 

ALVES JR., Luís Carlos Martins. O direito fundamental do feto anencefálico. Uma análise do processo e julgamento da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1555, 4 out. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10488>. Acesso em: 12 set. 2008

 

 

STF. Argüição de descumprimento de preceito fundamental 54. 2008. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/arquivo/cms/processoAudienciaPublicaAdpf54/anexo/adpf54audiencia.pdf>. Acesso em 7 set. 2008

 

 

            *Acadêmico de Direito na UFSC. Diretor de Publicidade e Propaganda do Portal Jurídico Investidura

 

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Como citar e referenciar este artigo:
FIGUEIREDO, Bruno Meotti. Audiências Públicas sobre Anencefalia no STF. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/audiencias-publicas-sobre-anencefalia-no-stf/ Acesso em: 28 mar. 2024