Direito Constitucional

Comemoração inusitada. Populismo exótico latino-americano

Unusual celebration.

Latin American exotic population.

Resumo: Persiste a mentalidade autoritária na sociedade brasileira e as referências à ordem rígida, ao ódio ao diferente, principalmente, à negação aos direitos e, ainda, à manutenção do status quo.

Palavras-Chave: Golpe de Estado. Democracia. Regime Totalitário. Ditadura. Tortura. Homicídio. Desaparecimento. Comemoração.

Abstract

The authoritarian mentality in Brazilian society still persists as well as to the rigid order references, to the different hatred, mainly to rights negation and, yet, to status quo maintenance. Keywords: Coup d’Etat. Totalitarian regime. Dictatorship. Torture. Homicide. Disappearence. Celebration.

A manchete de hoje do jornal El País, nos humilha e nos envergonha. “Bolsonaro manda festejar o crime. Ao determinar o golpe militar de 1964, o antipresidente busca manter o ódio ativo e barrar qualquer possibilidade de justiça”. Vide no link:  https://brasil.elpais.com/brasil/2019/03/27/opinion/1553688411_058227.html
Num desgoverno movido a base de polêmicas e absurdos. O Presidente da República instruiu as Forças Armadas para haver comemoração dos cinquenta e cinco anos de Golpe de Estado, ocorrido exatamente em 31 de março de 1964.

 Desta forma, o atual porta-voz da Presidência, o General Otávio Rêgo Barros, confirmou a definitiva inclusão da data na ordem do dia das Forças Armadas, que era realizada até 2010, e suspensa durante o governo de Dilma, a partir de 2011. 

Afinal, além de médico a prescrever cloroquina, o também suposto historiador não considera o ocorrido um golpe militar, e ainda, afirma que os militares se uniram para recuperar e recolocar o país no rumo.  Rumo à que? A ditadura militar que durou vinte e um anos[1]?

Como todo negacionista, afirma que não houve ditadura, repressão nem tortura e, considera que, nesse período, ocorreram avanços políticos e econômicos para o país. Aliás, o mesmo dito representante da Nação, já elogiou e homenageou publicamente o Coronel Carlos Brilhante Ustra[2] que foi o torturador da ex-presidente Dilma Rousseff durante os negros tempos da ditadura e, persiste em elogiar habitualmente ditadores de outros países, tais como o General Augusto Pinochet, do Chile e Alfredo Stroessner do Paraguai.

A referida decisão presidencial acarretou inúmeras reações de parlamentares, de órgãos institucionais e também de representantes da sociedade civil que reagiram com repúdio à comemoração do início da ditadura militar no país.
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão afirmou, em nota, que a determinação de Bolsonaro de comemorar o golpe desrespeita o Estado de Direito: “Festejar a ditadura é, portanto, festejar um regime inconstitucional e responsável por graves crimes de violação aos direitos humanos. Essa iniciativa soa como apologia à prática de atrocidades massivas e, portanto, merece repúdio social e político, sem prejuízo das repercussões jurídicas”.

O Ministério Público Federal recomendou às Forças Armadas que se abstenham de comemorações. Segundo o MPF (Ministério Público Federal), homenagens à ditadura violam os regulamentos e constituem ato de improbidade administrativa, atentando contra os princípios da administração pública: moralidade, legalidade e lealdade às instituições, podendo ser punida, mas forma da lei de improbidade com, desde demissão do serviço público à suspensão dos direitos políticos, além de multas.

Assinala que a democracia não se resume às eleições periódicas, mas ao exercício de todo o poder e que, na Constituição Federal, o crime de tortura é considerado inafiançável e imprescritível, bem como a ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático.

Na terra da garoa, o atual Governador João Dória classificou uma afronta a carta do atual Ministro da Defesa, o General Walter Souza Braga Netto que recomenda uma celebração do golpe militar de 1964. Aliás, o texto fez menção ao “movimento de 31 de março de 1964” quando os militares tomaram o poder ao promover um golpe de Estado. E, complementou que as Forças Armadas tomaram a responsabilidade de acalmar e pacificar o país, para que, hoje, tivéssemos a liberdade democrática.

Infelizmente não temos nada a comemorar e devemos prosseguir na luta cotidiana contra a Pandemia de Covid-19 e laborar pela resistência democrática para que não seja violado o Estado de Direito que é ofendido com manifestações desta natureza espúria.

Novamente, o Brasil tem em sua triste trajetória histórica o registro de nove ou dez golpes de Estado e que nos faz refletir na força da violência como mobilização política. Parece que tal comemoração acena com vindoura possibilidade para preservar o que chamam de democracia.

In litteris: “O termo golpe militar evidencia os militares como os principais agentes da derrubada do presidente Jango. No entanto, estudos apontam a importância do apoio das elites, empresários e da imprensa para a realização do golpe.  “Uma série de documentos foram revelados e mostram uma grande articulação de empresários, da elite e da imprensa para a realização do golpe.

Antes, a sociedade civil sempre aparecia quase como vítima dos militares e os estudos mais recentes mostram uma importante articulação golpista entre os civis”. (In: CAPUCHINHO, Cristiane.  Golpe ou revolução[3]? Historiadores explicam o que aconteceu em 1964. Disponível em  https://educacao.uol.com.br/noticias/2014/03/27/1964-golpe-ou- revolucao.htmAcesso em 31.03.2021)

Dezemone em seu texto intitulado: “1964 e as batalhas de memória 50 anos depois”, realizou um balanço historiográfico diante do significado da deposição do presidente João Goulart e do regime autoritário instaurado em seguidilha. O brilhante articulista enfatizou o uso da repressão e violência política, e também do crescimento econômico como instrumento de suposta manutenção da ordem.

Dentre as versões existentes sobre o que realmente aconteceu em 1964 com o afastamento forçado do Presidente João Goulart são as mais diversas, passando pela revolução na visão dos vitoriosos, golpe, golpe de Estado, golpe militar para os vencidos e, o mais recentemente, golpe civil-militar para boa parte da historiografia. Há, ainda, os que cogitam em contrarrevolução, resgatando assim expressão igualmente adotada pela repressão.

A escolha de cada terminologia implica em predileções interpretativas. E, sejam quaisquer destas, não se pode desconsiderar que um Presidente da República que atendia integralmente todas as prerrogativas constitucionais fora afastado pelo uso da força. Na época, a Constituição Brasileira de 1946[4] fora violada e, a sucessão de Goulart deu-se de modo casuístico, e, sem atender à linha sucessória descrita no próprio texto constitucional.

Enfim, considerar tal movimento como legal ou legítimo, trata-se de equívoco que talvez, não seja superado, quando é considerado como democrático. A democracia, lembremos, não se refere somente ao regime político da vontade da maioria, é onde a vontade da maioria é acatada, mas respeitando-se os direitos das minorias. E, tal fato, inequivocamente, não ocorreu em 1964, por maiores que fossem o apoio recebido pelos golpistas.

São múltiplas e variadas as explicações sobre as causas para o golpe. Carlos Fico, por exemplo, identificou três vertentes, a saber: a primeira, as tentativas de teorização da ciência política; a segunda, as análises filiadas à tradição marxista e, a última, a valorização do papel dos militares.

Entre os tributários da influência da ciência política norte-americana, temos Wanderley Guilherme dos Santos, na obra intitulada “O cálculo do conflito: estabilidade e crise na política brasileira” que foi publicada em 2003 e que recuperou a pesquisa e artigos publicados e divulgados durante a década de setenta.

Aliás, Wanderley considerou que houve certa paralisia decisória do governo de Goulart. A referida imobilidade foi patrocinada e executada pelo então Presidente. Afinal, para o cientista política, a paralisia decisória se dá quando os atores radicalizam suas posições e os recursos de poder se dispersa, entre estes, tornado o sistema político incapaz de resolver os conflitos. E, naquela conjuntura, tal procedimento resultou em golpe.

Na segunda vertente interpretativa do golpe de Estado uma das mais conhecidas, é a do ex-militante comunista que aderiu à luta armada, falecido em 2013, Jacob Gorender[5]. Em sua obra “Combate nas Trevas” sustentou que em princípios de 1964, abriu-se uma situação pré-revolucionária em nosso país, onde deu-se uma ameaça real à classe dominante brasileira e ao imperialismo. E, para tal doutrinador, o golpe de direita se definiu, por isso mesmo, pelo caráter contrarrevolucionário preventivo.

Porém, a obra da tradição marxista de maior influência foi publicada em 1981, pelo cientista político uruguaio René Armand Dreifuss. A obra teve o seguinte título: “1964: A conquista do Estado”, resultante de tese de doutorado defendida na Universidade de Glasgow em 1980. Foi identificado o papel de duas relevantes organizações civis no golpe, a saber: o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e o Instituto de Ação Democrática (IBAD), o que representava o capital multinacional e associado, interessado em colocar o aparelho de Estado a serviço de seus interesses.

A derradeira e terceira vertente é a que mais valoriza o papel dos militares na ocasião. Tal vertente teria se consolidado na década de noventa, quando dos debates que comemoravam trinta anos do golpe, a partir de depoimento de militares aos pesquisadores do CPDOC da Fundação Getúlio Vargas.

E, então, enfatizou-se dois aspectos que estariam sob ameaça no Governo de Goulart, a disciplina e a hierarquia nas Forças Armadas. E, em prol da preservação desses princípios, os oficiais de alta patente agiram e articularam a deposição de Goulart. Verifica-se o empenho ao valor de ordem como sendo contraponto ao caos e à anarquia que se assenhorava de países, representações das mais caras presentes nas memórias dos saudosistas do regime.

Destacou-se, ainda o trabalho de Argelina Cheibub, intitulado: “Democracia ou reformas? Alternativas democráticas à crise política: 1961-1964”, igualmente resultado da tese de doutorado defendida perante a Universidade de Chicago e vinculada à tradição da ciência política, calcada na obra de Dreifuss, os conspirados são vistos como onipotentes. E, assim, a ação não foi analisada em relação aos outros grupos, nem vista como sendo limitada por quaisquer constrangimentos externos.

O foco principal da obra foi estudar as relações existentes entre democracia e reformas e, ainda, a possibilidade de se combinarem. As estruturas econômicas e políticas são encaradas como constrangimentos às ações individuais, sendo também objeto da ação política.

Diferentemente, dos demais autores já citados, não considerou uma crise no sistema populista, mas, sim, a incapacidade dos atores de buscarem alternativas em conformidade com as regras vigentes. Então, as escolhas feitas pelos atores solaparam as possibilidades de reformas dentro das normas e marcos institucionais vigentes. Dessa forma, se deu o acirramento do conflito, criando-se um consenso negativo diante da manutenção de regras democráticas.

Outro autor, Daniel Aarão Reis Filho sustentou que as esquerdas frequentemente aparecem como vítimas quando se cogita da reconstrução da memória do período anterior ao Golpe de Estado e ao longo de todo regime autoritário. Em sentido oposto, este buscou demonstrar que a participação de esquerda no processo de radicalização que culminou no golpe. Segundo Aarão Reis Filho, as esquerdas percebiam os limites impostos pelas leis, e que perpassavam progressivamente, a defender o uso da força, sintetizado em noções tais como “reforma agrária na lei ou na marra”.

Negando veementemente a probabilidade de golpismo de esquerda, e apontando que a mobilização de trabalhadores fora rechaçada pelos setores conservadores, que enxergavam comunismo nas moderadas e capitalistas Reformas de Base[6].

Ainda sobre as causas do golpe de 1964, cabe a referência ao trabalho do professor Carlos Fico[7], no livro “O grande irmão” publicado em 2008 onde colocou em evidência o papel dos EUA, onde expôs, com farta base documental, dois aspectos fundamentais que aparecem unidos nas narrativas. Primeiro, a separação entre uma campanha de desestabilização de Goulart e a conspiração golpista, processos que, para Dreifuss, estariam indissociados.

Mas, conforme indicou Carlos Fico, a companha de desestabilização de Goulart iniciada ainda em 1962 tinha como objetivo enfraquecer o Presidente, de forma que sua influência nas eleições vindouras de 1965 fosse reduzida, seja de um Goulart candidato, seja um presidente feito de cabo eleitoral capaz de transferir votos. Para que se possa ter uma boa noção, foram injetados no Brasil cinco milhões de dólares, que dentre outros fatores, financiou as candidaturas de oposição, numa época em que a eleição presidencial norte-americana consumia onze milhões.

Outro tema relevante analisado por Carlos Fico foi a da participação dos EUA no golpe e ainda a mobilização militar em apoio aos golpistas conhecida como a operação Brother Sam[8]. Comprova-se o apoio e financiamento dos EUA à campanha de desestabilização do governo Goulart e mais importante, comprovasse ainda a disposição do governo estadunidense numa eventual invasão do Brasil em apoio aos golpistas, caso ocorresse algum tipo de resistência mais incisiva.

Como tal resistência não aconteceu, a operação Brother Sam foi desmobilizada antes de chegar ao litoral brasileiro. Isso não significa que o golpe aconteceu por causa dos norte-americanos, mas, sim, que o governo daquele país tivesse interesse, na conjuntura tensa da Guerra Fria[9], em afastar qualquer possibilidade de esquerdização ou até mesmo comunização do Brasil. Nos termos da época: o medo da “cubanização”, isto é, do país seguir o mesmo caminho da ilha caribenha.

Enfim, ao analisar o passado histórico recente e, ainda promover a reconstrução de narrativas, poder-se-á progredir na construção de uma sociedade diferente, e que se aproxime das experiências exitosas de amadurecimento democrático que foram afastadas em 1964.

Infelizmente, constata-se a persistência cruel da mentalidade autoritária, ainda presente no seio da sociedade brasileira. E, juntamente à essa mentalidade, comparecem as referências à ordem, ao ódio ao diferente, principalmente à negação de direitos e à manutenção do status quo. Assim, conseguimos entender as práticas como violência, tortura e desumanidade que tanto vitimam em favelas, nas periferias e que se alastram no lar, vitimando mulheres, companheiras e a prole.

Referências

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CAPUCHINHO, Cristiane. Golpe ou revolução? Historiadores explicam o que aconteceu em 1964. Disponível em:  https://educacao.uol.com.br/noticias/2014/03/27/1964-golpe-ou-revolucao.htm Acesso em 31.3.2021.

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DREIFUSS, René. 2964. A conquista do Estado. Petrópolis: Vozes, 1981.

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Obs: Gostaria de deixar patente meus sinceros agradecimentos e homenagens a todos historiadores e as testemunhas da vida política, social e econômica desse país. O historiador é extremamente importante para toda a sociedade, pois tem a nobre missão de analisar criticamente o passado e, ainda, resgatar e preservar a memória do povo. Um povo sem memória é um povo sem história e, nunca será uma autêntica nação.

Autores: Gisele Leite

Ramiro Luiz Pereira da Cruz



[1] A Comissão da Verdade em seu relatório contém uma lista que reúne mortos e desaparecidos políticos durante a ditadura militar brasileira de 1964. A investigação da Comissão Nacional da Verdade (CNV), por comissões estaduais da verdade, por entidades de direitos humanos e pelos próprios familiares das vítimas. Há quatrocentos e trinta quatro mortes e desaparecimentos computados, no período de 1964 a 1988, dos quais a maioria ocorreu no período da ditadura. Segundo o relatório “Brasil: Nunca Mais” pelo menos 1.918 prisioneiros políticos atestaram ter sido torturados entre 1964 a 1979. O documento ainda descreveu 283 formas diferentes de tortura utilizadas na época pelos órgãos de segurança. Em 2014, um relatório final foi divulgado listando o nome de pessoas que foram mortas ou desaparecidas durante o regime. 191 assassinadas e 243 desaparecidas, ou seja, 434 pessoas no total. Segundo a organização internacional não governamental de direitos humanos, a Human Rights Watch, aproximadamente 20 mil pessoas foram torturadas no período brasileiro.

[2] Carlos Alberto Brilhante Ustra (1932-2015) foi coronel do Exército Brasileiro, ex-chefe do DOI-CODI do II Exército (de 1970 a 1974), um dos órgãos atuantes na repressão política, durante o período da ditadura militar no Brasil (1964-1985) e torturador condenado. Utilizava o codinome Dr. Tibiriçá. Em 2008, Ustra tornou-se o primeiro militar condenado pela Justiça Brasileira pela prática de tortura durante a ditadura militar. Apesar de reformado, continuou politicamente ativo nos clubes militares e pela defesa da ditadura militar e em suas críticas anticomunistas. Escreveu dois livros de memórias, intitulados: “Rompendo o silêncio” em 1987 e “A Verdade Sufocada” de 2006. Em junho de 2012, Ustra também fora condenado a indenizar por danos morais a esposa e a irmã do jornalista Luiz Eduardo Merlino, morto em 1971. Merlino foi preso no dia 15 de julho daquele ano, em Santos, e morto quatro dias depois. A versão oficial da sua morte, fornecida pelos agentes do antigo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), foi a de que ele se suicidou enquanto era transportado para o Rio Grande do Sul.

[3] Revolução designa uma transformação profunda, um movimento de grandes proporções que rompe com o que existia até então. Geralmente, ela surge das bases da sociedade e envolve um grande número de pessoas, alterando as estruturas políticas, econômicas e sociais. A Revolução Francesa, de 1789, é um exemplo. Ela contou com o envolvimento popular nas cidades e no campo e transformou a ordem vigente. Já os golpes são uma iniciativa de elites políticas, econômicas e militares, não envolvendo a população, mesmo que, às vezes, contem com apoio popular. Dificilmente um golpe promove mudanças profundas. Em geral, eles ocorrem para preservar ou restaurar determinada situação política, como o que nasceu no Brasil em 1964. Uma cúpula militar apoiada por políticos destituiu o presidente João Goulart (1919-1976). Não havia um clamor popular para essa ação, embora parte da opinião pública tenha dado apoio a ela. A ideia era frear as mudanças que se anunciavam. In: TREVISAN, Rita; MOÇO, Anderson. Nova Escola. Revoluções. Disponível em:  https://novaescola.org.br/conteudo/2213/qual-a-diferenca-entre-revolucao-e-golpe Acesso em 31.3.2021.

[4] Durante a vigência da Constituição de 1946, ocorreu o Golpe militar de 1964, quando governava o presidente João Goulart. A partir de então, a carta-magna passou a receber uma série de emendas, que a descaracterizaram. Foi suspensa por seis meses pelo Ato Institucional Número Um e finalmente substituída pela Constituição de 1967, proposta oficialmente pelo Ato Institucional Número Quatro. A Constituição Brasileira de 1946, bastante avançada para a época, foi notadamente um avanço da democracia e das liberdades individuais do cidadão. A Carta seguinte significou um retrocesso nos direitos civis e políticos. Foi a primeira constituição a possuir uma bancada comunista no seu processo constituinte. Depois de seis meses da promulgação da constituição a bancada comunista cai.

[5] Jacob Gorender (1923-2013) foi historiador e cientista social brasileiro. No final da década de 80, quando fui editor da revista Teoria & Debate (uma publicação trimestral ligada ao diretório paulista do Partido dos Trabalhadores), tive a honra de me aproximar desse grande homem. A primeira lembrança que guardo dele é o espírito crítico. Naquele tempo, quando a ortodoxia fanática ainda ditava – por inacreditável que possa parecer – a postura da militância de esquerda, com uma descabida reverência em relação a nomes de criminosos como Joseph Stalin, Gorender ensinava a autonomia intelectual e a razão livre, atributos que carregava pelo menos desde os anos 50 e que lhe cobraram um preço demasiadamente alto.

[6] As reformas de base foi a denominação conferida pelo vigésimo-quarto presidente do Brasil, João Goulart, às reformas estruturais propostas por sua equipe. s propostas da Reforma de Base inspiraram a Constituição brasileira de 1988, que adotou uma parte das suas propostas, como a função social da propriedade, o voto dos analfabetos, a medida provisória e as intervenções do Estado na economia.

No que se refere a essas reformas, destacaram-se no governo João Goulart as seguintes medidas: Reforma agrária: Consistia em promover a democratização da terra, paralelamente à promulgação do Estatuto do Trabalhador Rural, estendendo ao campo os principais direitos dos trabalhadores urbanos. Nessa área, havia um decreto que previa a desapropriação das áreas rurais inexploradas ou exploradas contrariamente à função social da propriedade, situadas às margens dos eixos rodoviários e ferroviários federais e as terras beneficiadas ou recuperadas por investimentos da União em obras de irrigação, drenagem e açudagem. No entanto, a implementação da reforma agrária exigia mudança constitucional, já que o governo pretendia que as indenizações aos proprietários fossem pagas com títulos da dívida pública, enquanto que a Constituição previa indenização paga previamente e em dinheiro; Reforma educacional: visava a valorização do magistério e do ensino público em todos os níveis, o combate ao analfabetismo com a multiplicação nacional das pioneiras experiências do Método Paulo Freire. O governo também se propunha a realizar uma reforma universitária, com abolição da cátedra vitalícia; Reforma fiscal: Tinha como objetivo promover a justiça fiscal e aumentar a capacidade de arrecadação do Estado. Além disso, pretendia-se limitar a remessa de lucros para o exterior, sobretudo por parte das empresas multinacionais, o que foi feito através do decreto nº 53451/64; Reforma eleitoral: consistia basicamente na extensão do direito de voto aos analfabetos e aos militares de baixa patente. Previa-se também a legalização do Partido Comunista Brasileiro; Reforma urbana, entendida como conjunto de medidas do Estado, “visando à justa utilização do solo urbano, à ordenação e ao equipamento das aglomerações urbanas e ao fornecimento de habitação condigna a todas as famílias”. O projeto foi elaborado principalmente por urbanistas ligados ao IAB; Reforma bancária: com o objetivo de ampliar o acesso ao crédito pelos produtores;

[7] Carlos Fico da Silva Júnior é historiador brasileiro, especialista em História do Brasil República e Teoria da história, com ênfase em temas como ditadura civil-militar (Brasil e Argentina), historiografia brasileira, golpe de 1964, memória e violência. Em 2008 recebeu o Prêmio Sérgio Buarque de Holanda de Ensaio Social da Biblioteca Nacional. Foi coordenador da Área de História junto à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) ente 2011 a 2018, presidindo as avaliações dos programas de pós-graduação em História no Brasil.

[8] A Operação Brother Sam foi um movimento da Marinha norte-americana em apoio aos militares que depuseram o governo João Goulart (PTB), no dia 31 de março de 1964. Quando as tropas lideradas pelo general Olímpio Mourão Filho se deslocaram de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, na madrugada do dia 31, havia receio, por parte dos Estados Unidos, de que o golpe falhasse ou que as forças que apoiavam Goulart – inclusive militares – ensaiassem algum tipo de resistência. A Operação Brother Sam foi desencadeada pelo governo dos Estados Unidos, sob a ordem de apoiar o golpe de 1964 caso houvesse algum imprevisto ou reação por parte dos militares que apoiavam João Goulart, consistindo de toda a força militar da Frota do Caribe, liderada por um porta-aviões da classe Forrestal da Marinha dos Estados Unidos e outro de menor porte. Além de todas as belonaves de apoio requeridas a uma invasão rápida do Brasil pelas forças armadas americanas.

[9] A Guerra Fria foi um período histórico de disputas entre os Estados Unidos e União Soviética, que começou no final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, e foi até a extinção da União Soviética em 1991. Durante o período da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos e União Soviética foram aliados na luta contra a Alemanha. Logo após o inimigo ser derrotado, os antigos aliados se transformaram em adversários, dando início a Guerra Fria. Foi um intenso conflito de ordem política, militar, tecnológica, econômica, social e ideológica entre as duas poderosas nações. A guerra é chamada de fria porque não houve verdadeiramente uma guerra ou conflitos de fogo direto entre os EUA e a URSS, dada a inviabilidade de uma vitória em uma batalha nuclear. A corrida armamentista pela construção de um grande arsenal de armas nucleares foi um dos maiores objetivos durante a primeira metade da Guerra Fria. O mundo presenciou importantes episódios que mudaram o estilo de vida de todas as pessoas, como: Aumento da produção de armamento nuclear; Desenvolvimento de redes de espionagem, seja militar ou política; Desenvolvimento da corrida espacial; Formação de alianças militares – OTAN, representando o capitalismo, e o Pacto de Varsóvia, representando o socialismo; Divisão da Alemanha em Ocidental (capitalista) e Oriental (socialista), através do Muro de Berlim.

Como citar e referenciar este artigo:
LEITE, Gisele; CRUZ, Ramiro Luiz Pereira da. Comemoração inusitada. Populismo exótico latino-americano. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2021. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/comemoracao-inusitada-populismo-exotico-latino-americano/ Acesso em: 29 mar. 2024