Direito Constitucional

Considerações sobre a Política Nacional de Mobilidade Urbana

Elisson Ricardo Dias Pereira[1]

Diante do impasse estabelecido acerca da legalidade ou não do serviço prestado pela empresa de transporte “Uber”, a Lei nº 12.587, que trata sobre a Política Nacional de Mobilidade Urbana, é um importante instrumento que irá servir como parâmetro de regulação dos mais diversos tipos de transportes, assim como fornecer subsídios para o melhor entendimento sobre essa emergente forma de transporte urbano.

Nesse sentido, segundo o art. 1º da referida lei, a Política Nacional de Mobilidade Urbana é instrumento da política de desenvolvimento urbano, que tem como objetivo a integração entre os diferentes modos de transporte e a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas no território do Município.

Assim, segundo esse Diploma Legal, o transporte urbano pode ser classificado, primeiramente, se são motorizados ou não e, secundariamente, quanto ao seu objeto, características do serviço e quanto à natureza do serviço. Quanto ao objeto, o transporte urbano pode ser de passageiros ou de carga, quanto à característica do serviço, o transporte pode ser tanto individual como coletivo e em relação à sua natureza, o serviço pode ser público ou privado.

Por outro lado, a política de mobilidade urbana está assentada em uma tríade formada por princípios, diretrizes e objetivos que servirão como elementos norteadores da atuação do Poder Público, tendo em vista o momento de necessidade de concretização dessas políticas visando o melhoramento das condições de mobilidade.

Dessa forma, o art. 5º estabelece nove princípios que irão reger a política de mobilidade urbana, tais quais: a) acessibilidade universal; b) desenvolvimento sustentável das cidades, nas dimensões socioeconômicas e ambientais; c) equidade no acesso dos cidadãos ao transporte público coletivo; d) eficiência, eficácia e efetividade na prestação dos serviços de transporte urbano; d) gestão democrática e controle social do planejamento e avaliação da Política Nacional de Mobilidade Urbana; e) segurança nos deslocamentos das pessoas; f)  justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do uso dos diferentes modos e serviços; g)  equidade no uso do espaço público de circulação, vias e logradouros; h) e, por fim, eficiência, eficácia e efetividade na circulação urbana.

Diante disso, José Alencar Oliveira Júnior (2012, p. 22) traz o seguinte entendimento acerca desses princípios acima referidos:

A efetividade dos princípios dependerá, em grande parte, da capacidade de repactuação do contrato social para se viver em sociedade e nas cidades, a partir de políticas públicas concebidas e implantadas com base nesse conjunto de princípios positivados na Lei nº 12.587/2012. Acredita-se que algumas cidades evoluirão mais ou menos rápido no sentido de reorganização da vida social em prol de uma mobilidade urbana resultante do amplo processo de discussão com o conjunto da sociedade.

Já as diretrizes determinam as práticas que deverão ser implementadas e estimuladas pelos entes federativos com o objetivo de corresponder aos mandamentos inseridos nos princípios já destacados.

Destarte, a política de mobilidade urbana é composta pelas seguintes diretrizes: a) integração com a política de desenvolvimento urbano e respectivas políticas setoriais de habitação, saneamento básico, planejamento e gestão do uso do solo no âmbito dos entes federativos; b)prioridade dos modos de transportes não motorizados sobre os motorizados e dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado; c) integração entre os modos e serviços de transporte urbano; d) mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas na cidade; e) incentivo ao desenvolvimento científico-tecnológico e ao uso de energias renováveis e menos poluentes; f)priorização de projetos de transporte público coletivo estruturadores do território e indutores do desenvolvimento urbano integrado; g) e a integração entre as cidades gêmeas localizadas na faixa de fronteira com outros países sobre a linha divisória internacional.

Por último, a Política Nacional de Mobilidade Urbana estabelece os objetivos, entendidos como a finalidade atribuída aos entes federativos. Nesse sentido, são cinco os objetivos prescritos na lei: a) reduzir as desigualdades e promover a inclusão social; b) promover o acesso aos serviços básicos e equipamentos sociais; c) proporcionar melhoria nas condições urbanas da população no que se refere à acessibilidade e à mobilidade; d) promover o desenvolvimento sustentável com a mitigação dos custos ambientais e socioeconômicos dos deslocamentos de pessoas e cargas nas cidades; e) e, por último, consolidar a gestão democrática como instrumento e garantia da construção contínua do aprimoramento da mobilidade urbana.

No que diz respeito às categorias e espécies de transporte urbano, a Lei 12.587/2012 traz um conjunto de definições acerca das modalidades de transportes, bem como um rol taxativo dos mesmos. Assim, transporte urbano seria um conjunto dos modos e serviços de transporte público e privado utilizados para o deslocamento de pessoas e cargas nas cidades integrantes da Política Nacional de Mobilidade Urbana. Já mobilidade urbana seria uma condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano.

Em relação às modalidades de transporte, oito categorias destacam-se: transporte público coletivo; transporte privado coletivo;transporte público individual;transporte urbano de cargas; transporte motorizado privado; transporte público coletivo intermunicipal de caráter urbano; transporte público coletivo interestadual de caráter urbano; e o transporte público coletivo internacional de caráter urbano.

De todos as modalidades de transporte urbano previstas na lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana, o Uber se assemelharia ao transporte público individual, já que esta categoria é definida como um serviço remunerado de transporte de passageiros aberto ao público, por intermédio de veículos de aluguel, para a realização de viagens individualizadas.

De outro lado, o serviço de táxi é expressamente regulamentado pela Lei 12. 587/2012, quando trata das diretrizes para a regulação dos serviços de transporte público coletivo. Desse modo, destaca-se o art. 12-A da supracitada lei como exemplo dessa regulamentação, quando enuncia que o direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local.

Assim, fica claro que a natureza do serviço de táxi é uma hipótese de permissão administrativa, na medida em que necessita de uma outorga por parte do Poder Público para o seu pleno funcionamento.

O art. 12 é ainda mais específico, no que diz respeito à necessidade de permissão do Poder Público para o exercício do serviço de táxi, quando diz que, in verbis:

Art. 12.  Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

Em outro contexto, o que gera mais resistência acerca do impasse sobre a legalidade ou não do Uber é o fato de que não há na respectiva lei de mobilidade urbana nenhuma menção e, tampouco regulamentação, sobre a possibilidade de operação dos serviços de transporte privado individual.

Além disso, a natureza do serviço prestado pela empresa Uber é diversa daquela dos taxistas, como assevera Ricardo Barretto de Andrade (2015):

O serviço prestado por meio do UBER possui natureza diversa. Não é aberto ao público, porque prestado segundo a autonomia da vontade do motorista, que tem a opção de aceitar ou não a corrida de acordo com sua conveniência. E não se utiliza de veículo de aluguel, mas de veículo particular.

Assim, como a lei de mobilidade urbana regula apenas os serviços de transporte privado coletivo, caberia apenas à União a tarefa de regulamentação dessa categoria de transporte, uma vez que é competência privativa desse ente federativo legislar sobre trânsito e transporte, como prescreve o art. 22, XI da Constituição Federal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

OLIVEIRA JÚNIOR, J. A. Direito à Mobilidade Urbana: a construção de um direito social. Revista dos Transportes Públicos, n. 127, p. 63-75, Ano 33, São Paulo. Disponível em: <http://issuu. com/efzy/docs/rtp2011-127/1?mode=a_p>. Acesso em: 25 de novembro de 2016.

BRASIL. Lei nº 12.587, de 3 de janeiro de 2012.

RICARDO BARRETTO DE ANDRADE. Uber: o debate sobre o transporte individual de passageiros. Disponível em:  http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI222399,41046-Uber+o+debate+sobre+o+transporte+individual+de+passageiros. Acesso em 25 de novembro de 2016.



[1] Discente do curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão.

Como citar e referenciar este artigo:
PEREIRA, Elisson Ricardo Dias. Considerações sobre a Política Nacional de Mobilidade Urbana. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/consideracoes-sobre-a-politica-nacional-de-mobilidade-urbana/ Acesso em: 29 mar. 2024