Direito Constitucional

A atuação das Forças Armadas em operações de segurança em eventos de grande porte e na garantia da lei e da ordem

Lorena Alves Aguiar Lopes de Melo[1]

RESUMO

Este estudo é uma análise dos desafios que as Forças Armadas enfrentaram para garantir a segurança da população durante os grandes eventos realizados nos últimos anos, como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. E também sobre as frequentes requisições do Estado bem como a pressão popular para que as Forças Armadas ajudem no combate à criminalidade na cidade do Rio de Janeiro em parceira com as forças auxiliares.

A segurança é um dos principais fatores para o êxito de eventos de grande porte e um ponto extremamente relevante quando se trata de turismo. Portanto, um local seguro é fundamental para que possamos mostrar ao mundo o potencial cultural e turístico da cidade do Rio de Janeiro e do país.

Palavras-chave: Forças Armadas. Eventos. Segurança. Operações. Criminalidade.

Introdução

A Marinha do Brasil, o Exército Brasileiro e a Força Aérea Brasileira são instituições nacionais permanentes e regulares que têm como pilares a hierarquia e a disciplina, atuando sob a autoridade do Presidente da República.

Essas instituições que formam as Forças Armadas, tem como função assegurar a integridade do território nacional; defender os interesses e os recursos naturais, industriais e tecnológicos brasileiros; proteger os cidadãos e os bens do país; e garantir a soberania da nação.

Embora subordinadas ao Presidente da República, as Forças Armadas também atuam sob a direção do Ministério da Defesa, que é responsável pela orientação, supervisão e coordenação das atividades desenvolvidas por essas instituições.

Apesar de ser um país que não se envolve em conflitos externos e por isso é visto como pacífico, é preciso frisar que pacificidade nada tem a ver com passividade. Embora pacífico, o Brasil investe em sua capacidade militar que lhe permite estar preparado para enfrentar ameaças externas convencionais, terrorismo, ataques cibernéticos e em casos específicos, a criminalidade nas cidades brasileiras.

Com planejamento e estratégia, as Forças Armadas investem em operações e exercícios de treinamento conjuntos que buscam analisar e aprimorar a capacidade das tropas. Essa preparação é fundamental para o sucesso das operações destinadas a garantir a proteção do país, principalmente quando se trata da segurança de grandes eventos.

Desenvolvimento

As operações conjuntas que envolvem a Marinha, o Exército e a Aeronáutica são planejadas e coordenadas pelo Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMCFA), essas operações destinadas a garantir a segurança em grandes eventos realizados no Brasil, também são chamadas de ações integradas e a primeira delas aconteceu durante os Jogos Mundiais Militares de 2011 também realizados no Rio de Janeiro. Em 2012, as operações conjuntas foram para garantir a segurança das delegações estrangeiras que participaram da Conferência das Nações Unidas para Desenvolvimento Sustentável, conhecida também como Rio+20. No ano seguinte, as operações conjuntas ocorreram em seis cidades-sede da Copa das Confederações da FIFA, as ações consistiam na defesa do espaço aéreo e marítimo, na segurança cibernética, no controle de explosivos e na prevenção do terrorismo. Também em 2013 durante a Jornada Mundial da Juventude, 8.427 militares atuaram no plano de segurança que visava garantir a integridade dos peregrinos e da comitiva do Papa Francisco.

Apesar da experiência em grandes eventos seguidos, o EMCFA precisou se empenhar ainda mais nas estratégias de defesa, bem como os militares nos exercícios para garantir o êxito dos dois maiores eventos esportivos do planeta: A Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 que tiveram maior concentração das disputas no Rio de Janeiro.

A operação de segurança da Copa do Mundo contou com 35 mil homens do Exército, 13 mil da Marinha e 9 mil da Aeronáutica. Os 57 mil militares foram distribuídos em eixos exclusivos, como controle aeroespacial, marítimo e fluvial, segurança de estruturas estratégicas, defesa cibernética, antiterrorismo e defesa química, biológica, radiológica e nuclear. Porém, 21 mil militares fizeram parte da força de contingencia, que é preparada para agir em caso de eventualidade.

Durante os Jogos Olímpicos de 2016, o governador em exercício na época, Francisco Dornelles, solicitou ao presidente interino Michel Temer o emprego das Forças Armadas para reforçar a segurança de todos os envolvidos (atletas, turistas, autoridades e a população local). Toda a operação de segurança dos jogos contou com a participação de 85 mil profissionais, sendo 47 mil agentes de segurança e 38 mil militares das Forças Armadas. A atuação dos militares foi além das operações de segurança e passou a compor também o patrulhamento em áreas específicas da cidade, pois a Polícia Militar não tinha recursos operacionais (logísticos e humanos) para atender toda a demanda.

O contingente de militares atuantes durante os Jogos Olímpicos de 2016 foi superior ao das Olimpíadas de 2012 em Londres (42 mil homens entre militares e policiais). No Brasil foi a maior operação militar já feita voltada para um grande evento. A mudança no aumento do contingente se deu com os frequentes ataques terroristas que ocorreram na Europa, inicialmente haveriam militares das Forças Armadas somente nos acessos ao aeroporto internacional do Galeão, com a preocupação de possíveis atentados, militares também foram designados para atuar nas áreas de embarque e desembarque dos aeroportos da cidade.

Além das funções inicialmente citadas que são exercidas pelas Forças Armadas, também é missão destas a garantia dos poderes constitucionais constituídos, bem como a atuação na garantia da lei e da ordem que em espaço e tempo delimitados, preservam o exercício da soberania do Estado e a indissolubilidade da Federação.

As operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) são realizadas exclusivamente por ordem expressa do Presidente da República, como dispõe o artigo 142 da Constituição Federal.

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.    

E o artigo 2º do decreto 3897, de 2001: É de competência exclusiva do Presidente da República a decisão de emprego das Forças Armadas na garantia da lei e da ordem.

A decisão também pode ocorrer por motivação ou não dos governadores ou dos presidentes dos demais Poderes constitucionais conforme o § 1º do artigo 1º, do decreto 3897, de 2001:

 § 1º A decisão presidencial poderá ocorrer por sua própria iniciativa, ou dos outros poderes constitucionais, representados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal, pelo Presidente do Senado Federal ou pelo Presidente da Câmara dos Deputados.

As operações de GLO ocorrem quando há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública em situações de perturbação da ordem, como dispõe o artigo 3º também do decreto 3897, de 2001:

Art. 3º  Na hipótese de emprego das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem, objetivando a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, porque esgotados os instrumentos a isso previstos no art. 144 da Constituição, lhes incumbirá, sempre que se faça necessário, desenvolver as ações de polícia ostensiva, como as demais, de natureza preventiva ou repressiva, que se incluem na competência, constitucional e legal, das Polícias Militares, observados os termos e limites impostos, a estas últimas, pelo ordenamento jurídico.

Embora as Forças Armadas atuem de forma episódica, em área restrita e por tempo limitado, as operações de GLO concedem provisoriamente aos militares a faculdade de atuar com poder de polícia até o restabelecimento da normalidade. Essa atuação tem como objetivo preservar a integridade da população, a ordem pública e garantir o funcionamento regular das instituições.

A atuação dos militares em missões de pacificação em comunidades do Rio de Janeiro, é um exemplo de operação de Garantia da Lei e da Ordem. As comunidades localizadas na cidade vivem constantes conflitos armados pela disputa de pontos de tráficos de drogas. A segurança no estado está extremamente fragilizada e a população está cada vez mais desacreditada em chances de melhoria.

Para as Nações Unidas, a segurança é uma condição na qual os Estados consideram que não há perigo de ataque militar, pressão política e cerco.

Segundo a Escola Superior de Guerra – ESG, segurança pode ser definida como estado de garantia de sobrevivência e estabilidade dos indivíduos, comunidades, nações e grupos de nações, em clima que permite o seu desenvolvimento e a realização de seu potencial em um ambiente saudável para gerações presentes e futuras.

Para Arthur Trindade Costa e Renato Sérgio de Lima em ‘Crime, Polícia e Justiça no Brasil’, p.482 e 483:

Segurança pública constitui um campo formado por diversas organizações que atuam direta e indiretamente na busca de soluções para problemas relacionados à manutenção da ordem pública, controle da criminalidade e prevenção de violências. Portanto, não se confunde com o sistema de justiça criminal e nem se resume às organizações policiais, por mais que essas tenham papel central no debate público acerca da área.

A segurança pública deve ser exercida e organizada no âmbito da União, pela Polícia Federal e Rodoviária Federal e no âmbito dos estados pelas Polícias Militares e Civis. E apenas em casos extremos como já dito anteriormente, deve haver a atuação das Forças Armadas.

Nos últimos dez anos, as Forças Armadas atuaram 12 vezes no estado do Rio de Janeiro:

  •  2008: Eleições Municipais
  • 2010 – 2012: Ocupação do Complexo do Alemão
  • 2011: Jogos Mundiais Militares
  • 2012: Rio+20
  • 2013: Jornada Mundial da Juventude
  • 2014: Copa do Mundo
  • 2014 – 2015: Ocupação do Complexo da Maré
  • 2016: Jogos Olímpicos
  • 2016: Eleições Municipais
  • 2017: Votação do pacote de austeridade do Rio de Janeiro
  • 2017: Implantação do Plano Nacional de Segurança do Rio
  • 2017: Operação de Apoio Técnico à Polícia Militar na Rocinha

Com a crise no país e consequentemente o aumento da violência, foi preciso que o Governo apresentasse um conjunto de ações de segurança, criando assim o Plano Nacional de Segurança (PNSP).

O Plano Nacional de Segurança é um planejamento que promete combater a criminalidade através da integração entre a União e os estados e tendo como bases para seu êxito, a capacitação, inteligência e ação conjunta. Dentro de cada base foram definidas estratégias de compartilhamento de banco de dados até a criação de um sistema de rastreamento de veículos em todos os estados.

São três os objetivos do Plano Nacional de Segurança Pública:

  • Redução dos crimes de homicídio doloso e da violência contra a mulher. Estruturando-se em etapas de prevenção, investigação, inteligência e integração do Ministério Público e o Judiciário.
  • Combate ao crime organizado (tráfico de drogas e no armamento pesado nas fronteiras com dez países) com a parceria das polícias estaduais;
  • A modernização e otimização do sistema penitenciário;

A cidade do Rio de Janeiro foi a primeira a contemplada com a implementação do Plano Nacional de Segurança, recebendo o reforço temporário da Polícia Rodoviária Federal e das tropas das Forças Armadas.

A primeira área que foi alvo na cidade do Rio, foi a comunidade da Rocinha que contou com a participação de pelo menos 1.100 homens, sendo 550 militares das forças armadas e 550 da Polícia Militar. A atuação das Forças Armadas é essencial para manter a ordem e inibir os ataques dos criminosos enquanto as forças de segurança vasculham as áreas de difícil acesso na comunidade.

Não cabe às Forças Armadas a prisão de criminosos foragidos, o trabalho é preventivo e seu papel fornecer informações de inteligência, fazer mapeamento de áreas de mata e controlar o espaço aéreo, cercar as favelas em pontos estratégicos e controlar os acessos para impedir que suspeitos fujam ou recebam auxílio de criminosos de outras localidades. Enquanto isso os policiais militares fazem incursões à procura de drogas e armas e os policiais civis cumprem os mandados.

Conclusão

O trabalho das Forças Armadas é árduo, embora os militares estejam sempre dispostos a apoiar as operações é preciso que a sociedade conheça mais o papel das Forças Armadas de uma nação e entenda como ocorrem as atividades.

Quando se trata de eventos de grande porte e de garantia da lei e ordem, é preciso um planejamento estratégico de no mínimo dois anos, realizar licitações, captar recursos, analisar os riscos, fazer a manutenção de equipamentos, entre outras atividades que exigem tempo e preparo.

Portanto, as Forças Armadas são essenciais para a manutenção de uma nação. Embora pouco valorizados, os militares carregam em sua essência o dom e a capacidade de servir e proteger a pátria e os cidadãos.

REFERÊNCIAS

– BOTTINO, Alfredo de Andrade. Segurança de grandes eventos: um desafio para as Forças Armadas brasileiras/Cel Alfredo de Andrade Bottino. – Rio de Janeiro : ESG, 2013.

– LIMA, Renato Sérgio; RATTON, José Luiz; AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli – Crime, Polícia e Justiça no Brasil. São Paulo. Ed: Contexto, 2014

– Constituição Federal

– Decreto 3897, de 2001

 http://www.defesa.gov.br/exercicios-e-operacoes/operacoes-conjuntas-1/grandes-eventos

 http://www.defesa.gov.br/index.php/noticias/4238-04-03-2013-defesa-defesa-justica-e-gsi-aprovam-plano-estrategico-de-seguranca-e-defesa-para-copa-do-mundo-2014

 http://www.adesg.net.br/noticias/forcas-armadas-poderao-participar-da-coordenacao-de-seguranca-de-grandes-eventos-internacionais-previstos-para-o-pais

 https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2013/05/09/celso-amorim-forcas-armadas-estao-preparadas-para-atuar-na-seguranca-de-grandes-eventos

http://www.brasil.gov.br/defesa-e-seguranca/2014/05/forcas-armadas-atuarao-com-57-mil-militares-na-seguranca-da-copa-do-mundo



[1] Advogada, especialista em Direito Militar e Direito da Família.

Como citar e referenciar este artigo:
MELO, Lorena Alves Aguiar Lopes de. A atuação das Forças Armadas em operações de segurança em eventos de grande porte e na garantia da lei e da ordem. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2018. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/a-atuacao-das-forcas-armadas-em-operacoes-de-seguranca-em-eventos-de-grande-porte-e-na-garantia-da-lei-e-da-ordem/ Acesso em: 16 abr. 2024