Direito Constitucional

Prós e Contras a Eutanásia Negativa: O Caso Eluana

Prós e Contras a Eutanásia Negativa: O Caso Eluana

 

 

Mario Guerreiro *

 

 

 

Na Itália, Eluana Englaro, vítima de um desastre de automóvel, estava em estado de coma vegetativo há 17 anos. Seu pai, após 10 anos de batalha judicial, conseguiu no Supremo Tribunal italiano o direito de desligar os aparelhos que a mantinham viva.

 

Este episódio causou uma comoção na opinião pública e uma crise política entre o presidente da República, Giorgio Napolitano, e o primeiro-ministro, Silvio Berlusconi. Aquele havia emitido um decreto-lei destinado a impedir o desligamento dos aparelhos, mas este – num gesto pouco freqüente em regimes parlamentaristas republicanos – recusou-se a ratificar o decreto.

 

Berlusconi, que é chefe de governo – não chefe de Estado como Napolitano – anunciou a aprovação, de seu conselho de ministros, de um decreto de artigo único estabelecendo que “a alimentação e a hidratação não podem ser suspensas quando a própria vida depende delas.”

 

No entanto, para que o decreto-lei formulado por Berlusconi tivesse efeito de lei, teria que ser assinado por Napolitano. Como não foi, Berlusconi o enviou para o Senado onde ele detém a maioria. O texto entrou em pauta segunda-feira, 9/2/2009, e grande era a expectativa em toda a Itália.

 

Enquanto o Senado não decidia, os médicos deram início aos preparativos para a eutanásia. Este processo devia durar uma semana podendo ser interrompido, caso o Senado aprovasse o decreto do primeiro-ministro. E nestes dias de espera muitas manifestações pró eutanásia e contra eutanásia estavam ocorrendo em todo o país.

 

Trata-se de um caso interessante de um ponto de vista ético e jurídico, pois ele reacende a antiga polêmica da eutanásia.

 

Em geral, seus adversários alegam que a chamada “a morte piedosa” não difere de um homicídio doloso, pois se tira a vida de um indivíduo humano, mas é despropositada a única alegação cabível para se tirar a vida de alguém: a legítima defesa.

 

Os favoráveis à eutanásia, por sua vez, alegam que se trata de um caso especial: tira-se a vida de um ser humano, mas uma vida puramente vegetativa e sem esperança de uma vida plena, supondo que seja o caso de um coma irreversível, como era o de Eluana Englaro.

 

Além do que se poderia chamar de um padecimento inútil da parte do paciente, há o sofrimento da sua família, e isto para não falar nas despesas hospitalares causadas por um paciente em coma durante anos a fio.

 

Mas ainda há uma terceira posição entre os partidários da eutanásia e seus adversários: Os que são contra a assim chamada eutanásia positiva, mas a favor da eutanásia negativa.

 

No primeiro caso, trata-se de fazer uma intervenção médica no paciente destinada a tirar sua vida mediante a aplicação de alguma substância que tenha a capacidade de agir rápido e com o menor sofrimento possível. [Foram justamente essas duas características que o Dr. Guillotin, médico humanista, acreditava que seu inovador instrumento, a guilhotina, possuía].

 

Qualquer que fosse a tomada de posição em relação ao caso Eluana, teríamos de levar em consideração que se tratava de um caso típico de eutanásia negativa. Não era o caso de uma intervenção médica visando a provocar a morte do paciente, mas sim de suspender um tratamento sem o qual o paciente teria uma morte natural.

 

Na segunda-feira, 9/2/2009 e no quarto dia do processo de interrupção do tratamento médico, quando o decreto de Berlusconi ainda não tinha sido votado pelo Senado, faleceu Eluana.

 

Confesso não ter entendido o caso em questão. Se o decreto de Berlusconi estabelecia que “a alimentação e a hidratação não podem ser suspensas quando a própria vida depende delas”, ele estava desejando proibir uma forma de eutanásia negativa. E se o pai de Eluana teve de recorrer ao Supremo, de modo a conseguir a interrupção do tratamento, isto indica que esta mesma forma não era permitida ou, no mínimo, era uma vexata quaestio no direito italiano.

 

 

 

* Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC [Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos]. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Autor de Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000) . Liberdade ou Igualdade? ( EDIPUCRS, Porto Alegre, 2002). Co-autor de Significado, Verdade e Ação (EDUF, Niterói, 1985); Paradigmas Filosóficos da Atualidade (Papirus, Campinas, 1989); O Século XX: O Nascimento da Ciência Contemporânea (Ed. CLE-UNICAMP, 1994); Saber, Verdade e Impasse (Nau, Rio de Janeiro, 1995; A Filosofia Analítica no Brasil (Papirus, 1995); Pré-Socráticos: A Invenção da Filosofia (Papirus, 2000) Já apresentou 71 comunicações em encontros acadêmicos e publicou 46 artigos. Atualmente tem escrito regularmente artigos para www.parlata.com.br,www.rplib.com.br , www.avozdocidadao.com.br e para www.cieep.org.br , do qual é membro do conselho editorial.

 

 

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Como citar e referenciar este artigo:
, Mario Guerreiro. Prós e Contras a Eutanásia Negativa: O Caso Eluana. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2009. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/pros-e-contras-a-eutanasia-negativa-o-caso-eluana/ Acesso em: 19 abr. 2024