Direito Civil

Consideraçãoes sobre a pretendida desqualificação do perito-avaliador

Consideraçãoes sobre a pretendida desqualificação do perito-avaliador

 

 

J. A. Almeida Paiva *

 

 

“La règle de droit est une règle de condute qui s’impose aux hommes vivant en société, et dont le respect est assuré par l’autorité publique”. (1)

 

   1. Foi levantada na reunião para tratar de assuntos relacionados à Falência da FRBG e demais empresas coligadas, no dia 12 de julho último, na MM. 1ª Vara Cível do Forum Central de São Paulo, uma questão de ordem relacionada à possibilidade do Sr. Perito-Avaliador indicado pelo Dr. Síndico da Massa Falida da FRBG ter trabalhado numa das empresas da falida, o que, em tese, o desqualificaria para o desempenho do mister.

 

   2. Na oportunidade, com exceção – se não nos falha a memória, – do representante da ALBG, todos os demais presentes foram unânimes em sugerir a nomeação de um ou mais nomes totalmente imparciais, alheios às relações com o caso Boi Gordo.

 

   3. O signatário desta chegou a sugerir, no que foi acatado por todos, que se oficiasse à USP e Bolsa de Imóveis de São Paulo, bem como à Universidade Federal de Mato Grosso e CREA de Mato Grosso, solicitando uma lista de 5 ou 6 nomes para que a MM. Juíza pudesse escolher um.

 

   4. No dia imediato encaminhou e-mail ao Dr. Síndico passando os endereços do CREA, 14ª Região de Mato Grosso e da Reitoria da Universidade Federal de Mato Grosso, para que entregasse à MM. Juíza responsável pela Falência da FRBG a fim de ser oficiado conforme reunião de consenso:

 

   CREA – 14ª Região de Mato Grosso Conselho Regional de Engenharia e Agronomia Av. Historiador Rubens de Mendonça, nº 491 78008-000 – CUIABÁ – MT

 

Reitoria da Universidade Federal de Mato Grosso Av. Fernando Corrêa da Costa s/nº – C Ponte 78060-900 – CUIABÁ – MT

 

5. No dia 13, o signatário desta foi procurado pelo Jornal “Valor Econômico” para manifestar sobre o incidente; a entrevista saiu publicada no dia 14 onde a posição do signatário ficou bem clara: “O avaliador tem um papel importante, pois faz o levantamento de todos os ativos” – “Deve ser alguém imparcial”. (2)

 

6. No mesmo dia 14 o ilustre Perito Avaliador, protocolou petição na qual confessa, dentre outras coisas:

 

– “fomos procurados pelo Sr. Lincoln dos Santos Correia…..para conhecer as….. Boigordo…..

 

– “No dia seguinte ao analisarmos cuidadosamente o material de venda….contratos………vimos…. que poderia se tratar de um GRANDE GOLPE FINANCEIRO…..”

 

– “Diante disto, por razões de foro íntimo, de pronto, nos abidicamos… afastanmos da empresa…..”

 

– A partir de setembro de 1996…….nos veio à tona o dever de cidadania e na qualidade de….. sentimos o dever moral de tentar mostrar a população o que era o negócio parceria pecuária suas modalidades…. segurança e resultados operacionais concretos, para assim, elas poderem analisar e refletir melhr sobre aplicação financeira”.

 

– …. fomos o primeiro a ter a coragem e iniciativa de previsível e futuro golpe financeiro….”

 

– “…. em 29/01/1997, na página G3, do Suplemento Agrícola do Jornal O …. assinamos a matéria “INVESTIR EM BOI PODE SER MAU NEGÓCIO, onde tratamos par e passo excl….. negócio “parceria pecuária”…..

 

– Em 30/03/2001……. fomos procurados….. … denunciou seu detrator, eu, por agir por vingança,….”

 

7. Ao elencar os motivos pelos quais deve ser mantida sua nomeação para o cargo de Perito-Avaliador, justifica: “Terceiro, por termos sido o primeiro e grande combatente a esse previsto grande golpe financeiro……”

 

8. O art. 138, II, do CPC, manda aplicar “também os motivos de impedimentos e de suspeição ao perito” e, conseqüentemente ao “Perito-Avaliador”

 

9. “Os motivos indicadores de suspeição são de ordem subjetiva”, doutrina NELSON NERY JUNIOR. (3)

 

10. O mesmo e douto NELSON NERY JUNIOR a seguir esclarece que “Fazer considerações apriorísticas sobre qualquer questão deduzida na causa, processual ou material, antes de decidi-la efetivamente, antecipando juízo de valor sobre essas questões, constitui causa de suspeita de parcialidade do juiz, caracterizando prejulgamento”. (4)

 

11. CELSO AGRÍCOLA BARBI, refere-se que a suspeição só acontece “no aconselhamento em casos concretos, entre pessoas e com fatos reais, e não hipotéticos” (5) , isto porque já havia afirmado antes que “o juiz que aconselha a parte a propor ou não propor alguma ação, ou a se conduzir de uma ou de outra forma, se for proposta ação contra ela, toma posição prévia em relação ao direito do litigante, vincula sua opinião.” (6)

 

12. ANTÔNIO DALL’ AGNOL doutrina que “Do juiz se exige imparcialidade” (7) , aconselhando que se tiver dúvida “impõe-se mesmo que decline do conhecimento dela, sem que deva expressar as razões”, referindo-se aos “motivos de ordem íntima”.

 

13. Ora, com todo respeito, não só ao Dr. Síndico que indicou o Dr. Perito-Avaliador, como a este indicado, sem querer discutir seus inegáveis méritos profisionais e o fato de ter ou não sido empregado da falida, sua defesa apresentada às fls. e fls. dos autos da Falência é uma prova quantum satis de sua confissão.

 

14. Se antes havia suspeita apenas, agora, data maxima venia, tem-se a confissão do ilustre e nobre Perito-Avaliador, de que aconselhou a população a não investir na falida, pois “poderia tratar de um GRANDE GOLPE FINANCEIRO” (sic); que “investir em boi pode ser mau negócio”(sic) e reconhece seu status “por termos sido o primeiro e grande combatente a esse previsto grande golpe financeiro”.(sic)

 

15. Se ele foi honesto na confissão e beneficiou os investidores, falando e escrevendo sobre um “caso concreto” , segundo NELSON NERY JUNIOR, CELSO AGRÍCOLA BARBI e ANTÔNIO DALL’AGNOL carece de imparcialidade indispensável ao exercício do cargo, e se for mantido no cargo, certamente muitos recursos irão bater às portas do Tribunal de Justiça ponde em risco todos os esforços que juntos estamos procurando objetivando ajudar a construir um mecanismo capaz de acelerar o andamento e conclusão da falência da Boi Gordo e empresas coligadas.

 

16. Só o fato de ter-se posicionado publicamente contra a falida, ainda que em favor dos investidores, com todo respeito, carece da devida isenção capaz de exercer com imparcialidade seu mister, pondo ainda em risco o destino da falência com possíveis recursos contra sua nomeação.

 

17. Por tais motivos impõe-se o equilíbrio que sempre demonstrou o Judiciário, em todo o curso deste processo falimentar, sugerindo-se que seja oficiado à USP, à BOLSA DE IMÓVEIS em São Paulo e à Universidade Federal de Cuiabá e CREA da 14ª Região em Mato Grosso, pedindo com URGÊNCIA a indicação de 5 ou 6 peritos com profundo conhecimento das áreas e bens (imóveis, móveis e semoventes), sem qualquer vínculo com a falida ou demais empresas do Grupo, para funcionar como avaliadores das áreas e bens da falida, nos Estados de São Paulo e Mato Grosso, respectivamente.

 

São Paulo, 27 de abril de 2004.

 

J. A. ALMEIDA PAIVA Advogado – OAB/SP nº 12.412

 

1) PAUL ROUBIER Théorie Générale du Droit, pág. 25, Paris, 1951; sic JOÃO MESTIERI, A Norma Jurídica, Coord. SÉRGIO FERRAZ, Liv. Freitas Bastos, 1980, pág. 149.

 

2) Jornal “Valor Econômico”, Edição de 14-7-04

 

3) NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERU – Código de Processo Civil, 6ª ed. RT, pág. 491, em Nota 1 ao art. 135, do CPC.

 

4) Idem nota 8

 

5) Cf Comentários ao Código de Processo Civil, vol. i, Tomo II, Forense, nº 741, pág. 565.

 

6) Idem.

 

7) Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 2, ed. RT/2000. pág. 167

J.A. Almeida Paiva

 

 

* Advogado em São Paulo e Professor de Processo Civil

Website: http://www.almeidapaiva.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
, J. A. Almeida Paiva. Consideraçãoes sobre a pretendida desqualificação do perito-avaliador. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-civil/consideracaoes-sobre-a-pretendida-desqualificacao-do-perito-avaliador/ Acesso em: 25 abr. 2024