O Codicilo surge no ordenamento jurídico através das Ordenações Filipinas (L. IV, Tít. 86), mencionando tratar-se de testamento no qual não havia a instituição de herdeiro, seguindo entendimento do Direito romano (Institutas do Imperador Justiniano, L. II, Tít. XXV). No tocante à forma de feitura, seguia os ditames existentes para o testamento, podendo, portanto, ser públicos ou particulares, testemunhados por quarto ou três testemunhas, conforme o povoamento do local. Na Consolidação das Leis Civis, Teixeira de Freitas regulou o codicilo nos arts.
Ao tratar do tema, a doutrina define codicilo ou pequeno codex como o documento que traz, em seu bojo, disposições específicas de última vontade, que se relacionam, na maioria das vezes, com o enterro, esmolas de pouca monta, assim como móveis, roupas ou jóias, de pouco valor, de seu uso pessoal. Trata-se de escrito informal, que pode ser escrito pelo codicilante, de próprio punho, e, depois, por ele assinado.
De acordo com o Novo Código Civil:
“Art. 1.881. Toda pessoa capaz de testar poderá, mediante escrito particular seu, datado e assinado, fazer disposições especiais sobre o seu enterro, sobre esmolas de pouca monta a certas e determinadas pessoas, ou, indeterminadamente, aos pobres de certo lugar, assim como legar móveis, roupas ou jóias, de pouco valor, de seu uso pessoal.
Art. 1.882. Os atos a que se refere o artigo antecedente, salvo direito de terceiro, valerão como codicilos, deixe ou não testamento o autor.
Art. 1.883. Pelo modo estabelecido no art. 1.881, poder-se-ão nomear ou substituir testamenteiros.
Art. 1.884. Os atos previstos nos artigos antecedentes revogam-se por atos iguais, e consideram-se revogados, se, havendo testamento posterior, de qualquer natureza, este os não confirmar ou modificar.
Art. 1.885. Se estiver fechado o codicilo, abrir-se-á do mesmo modo que o testamento cerrado.”
Para Clóvis (Código Civil, 3a ed., Livraria Francisco Alves, Rio de Janeiro, 1935, v. VI, p. 113), “o codicilo não é um testamento menos solene, como no direito anterior, em que não se institui herdeiro direto; é um memorandum de última vontade, escrito, datado e assinado por pessoa capaz de testar, que somente conterá disposições sobre o enterro do autor, sobre esmolas e legados de móveis, roupas e jóias não mui valiosas, do uso particular do disponente, e em que, ainda, é lícito nomear ou substituir testamenteiros”. Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado, 3a ed., Borsoi, Rio de Janeiro, 1973, t. LIX, § 5.908, p. 243) enuncia: “Codicilo, diminutivo de codex, pequeno rolo, caderninho, mantém-se através dos tempos, como forma simplificada, inferior, do testamento. Poderes, extensão, exigências formais, variaram, desde o seu aparecimento. Como os testamentos especiais, foi criação imposta pela vida e constitui vitória da voluntas contra a forma”.
De conteúdo limitado e simplicidade na forma, o codicilo é figura em extinção no mundo jurídico. Em verdade, é figura quase que inexistente no cotidiano forense, tendo sido ainda tratado em nosso Código Civil, a nosso ver, mais como recordação histórica que propriamente para aplicação efetiva.
Vencida a etapa do posicionamento histórico do instituto do codicilo, passaremos a discutir a possibilidade de se reconhecer filiação através deste documento.
O artigo 1609, inciso II, do Código Civil prevê que o reconhecimento de filiação pode ser feito através de escritura pública ou escrito particular. É cediço que o testamento é documento hábil para o reconhecimento de filiação. Sendo o codicilo uma subespécie de testamento, pergunta-se: os seus objetos encerram-se no rol listado no artigo 1881 ou existe a possibilidade de uma extensão interpretativa a fim de abarcar, como objeto deste, o reconhecimento de filiação?
Conforme dito acima, o artigo 1609, inciso II, do Código Civil, permite o reconhecimento de filiação através de escritura pública, aquela registrada em Tabelionato de Notas, ou, ainda, por escrito particular, feito pelo reconhecedor.
Desta forma, tratando-se de escrito particular, feito de próprio punho pelo codicilante, assinado por este, confirmando sua autenticidade, não há razão para que não se permita, através do codicilo, o reconhecimento de filhos naturais.
Essa conclusão encontra guarida, inclusive, no princípio universal de que o reconhecimento de filiação deve ser incentivado e facilitado, resguardadas, por óbvio, a veracidade e segurança do ato.
Assim sendo, por ser o codicilo documento particular, desde que atendidos os seus requisitos de existência e validade, é plenamente possível, ainda que não relacionado em seus objetos (artigo 1881, do Código Civil), a efetivação do ato de reconhecimento de filiação através deste instrumento, notadamente pelo princípio de incentivo e facilitação do ato.
*Carlos Leonardo Batista Celani, Acadêmico da 9ª Etapa de Direito da Faculdade de Direito Laudo de Camargo, da Universidade de Ribeirão Preto.