Direito Ambiental

Protocolo de Quioto – II

por Robson Zanetti*


As
mudanças globais, não somente as climáticas envolvem processos que ocorrem
independentemente, mas estão intimamente interligados. As economias são
fundamentalmente dependentes da capacidade do ambiente em dar suporte e gerar
as pré-condições para o desenvolvimento social e humano (FOLKE e
GUNDERSON,2006). Para o Brasil o desafio de adaptar-se a modificação das zonas
climáticas aumenta, dado o elevado nível de pobreza encontrado no País, que se
encontra altamente suscetível ao aumento do alcance e da ocorrência de doenças
(OMS, 1990) (Estadão Online/2006) (KOVATS et al, 2006). É preciso alavancar as
atividades necessárias a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas,
permitir o crescimento econômico, gerar interesse na iniciativa privada,
propiciar a adaptação das legislações estaduais e municipais e distribuir de
forma mais justa os resultados dessas atividades, através de modelos
democráticos.

Na
primeira versão do relatório oficial de emissões brasileiras, a contribuição
dos setores, como o do agronegócio, foi medida levando em conta as emissões
indiretas na geração de eletricidade (MCT/e&e, 2001), naquele relatório, o
principal contribuinte para as emissões brasileiras foi a mudança do uso da
terra (MCT,2004), que utilizou um modelo baseado em mapas de solo de 1981 e
mapas de vegetação de 1988(MCT,2006a). A maioria dos países-membro do Protocolo
de Quioto, principalmente aqueles do anexo 1, desenvolveram métodos mais
específicos e avançados para monitorar os GEE do setor rural (LOKUPITIYA e
PAUSTIAN,2005), empregando ferramentas que permitem estudar melhorias no setor
rural que vão muito além da contribuição que o setor já presta à
sustentabilidade da sociedade. Agricultores que utilizam as tecnologias e
práticas para aumentar a quantidade de c sequestrado nos solos, contribuem para
reduzir a ameaça representada pelo aquecimento global. Muitos agricultores
parecem estar dispostos a sacrificar inclusive parte de seus lucros em nome de
adotarem uma auto-regulamentação para mitigar os efeitos dos GEE na vida de
todos (KRUSE, SAUTTER e LYNNE, 2005).

Mesmo
nos EUA, país que ainda não aderiu ao Protocolo de Quioto, o programa Parceria
Regional para o Sequestro de Carbono (RCSP – sigla em inglês Regional Carbon Sequestration Partnership), uma parceria de 216 organizações em 40 estados
daquele país, 4 províncias canadenses e 3 nações indígenas, pesquisa o
potencial terrestre de reduzir emissões de CO2 em cada região. Esse programa
evolui constantemente, e cria uma base conceitual e física para a seleção e
validação, através do monitoramento em tempo real de cada unidade geográfica,
das melhores oportunidades para sequestro de carbono. O programa atinge 96% da
área total e 98,5% da área agrícola dos EUA e, investiu US$ 100 milhões em 4
anos para formar parcerias entre universidades, a iniciativa privada,
instituições de pesquisa e outras organizações (LITYNSKI, 2005).

A
matéria orgânica do solo é um dos maiores compartimentos terrestres de carbono
e uma das principais fontes de emissão de CO2, CH4 e outros gases-estufa para a
atmosfera. O solo pode funcionar como uma fonte de emissão ou como um sumidouro
de carbono atmosférico, dependendo do tipo de manejo adotado, podendo essa
matriz vir a desempenhar um importante papel na mitigação dos efeitos negativos
do efeito estufa sobre diferentes processos naturais (SILVA e MACHADO, 2000). A
soja tem um papel importante na retirada de nitrogênio dos solos, tendo um
potencial que chega a 10 vezes o das florestas nativas. Esse aumento da incorporação
de nitrogênio é observável principalmente nas atividades de plantio direto
empregando leguminosas, havendo ainda uma contribuição das culturas regulares
em termos do aumento de carbono nos solos. De fato, O sistema plantio direto é
reconhecido como um sistema de cultivo nas regiões tropicais e sub-tropicais,
que promove a alta produtividade das culturas, principalmente em anos mais
secos, combinada com o menor impacto no meio ambiente pelo eficaz combate à
erosão hídrica (MACHADO et all,2003).

Uma série
de estudos têm mostrado que o uso de Práticas de Manejo Conservacionistas (PMC)
tem um grande potencial em aumentar o seqüestro de carbono no solo e diminuir o
fluxo de gases-estufa para a atmosfera. Entre essas práticas, poderiam ser
citadas: o aumento de áreas cultivadas sob sistema de plantio direto, o
incremento no aporte de carbono ao solo, a permanência de restos culturais nas
áreas de plantio, o controle da erosão, a diminuição do desmatamento, o aumento
dos índices de produtividade como fator relevante à restrição de criação de
novas fronteiras agrícolas, a melhoria da fertilidade do solo como fator
essencial ao aumento da produção de resíduos culturais, a revegetação de solos
degradados e, por fim, apreservação ambiental de solos orgânicos em ambiente de
várzea. Em países industrializados, o uso dessas práticas tem sido cada vez
mais freqüente, sendo necessário, para as condições de solos tropicais, a
identificação e o ajuste dessas práticas conservacionistas. A exaustão dos
estoques de matéria orgânica, além de comprometer a qualidade do solo e a
sustentabilidade dos agroecossistemas, contribui também para o agravamento do
efeito estufa, sendo, desse modo, premente a adoção de práticas de manejo de
maior sustentabilidade, no sentido de preservar e aumentar os teores de carbono
em solos tropicais (SILVA e MACHADO, 2000). A bolsa de Chicago, a Climate
Change Exchange CCX, já comercializa créditos de carbono de atividades de
plantio direto realizadas no nordeste dos EUA, envolvendo cerca de 90 mil ha até
o final de 2006, para projetos de pelo menos 4 anos de duração. Cada hectare de
plantio realizado com a prática do plantio direto, deixa de emitir cerca de 0,5
tCO2eq/ano na atmosfera, correspondendo a R$ 5,00/ha/ano nos valores obtidos
por créditos junto a CCX, e até R$ 20,00/ha/ano nos mercados de trocas
Europeus. É preciso que haja um esforço concentrado dos produtores no sentido
de exigir que o Brasil tome posição no sentido de remunerar os produtores
rurais que realizam a prática no nosso país.

Já na
pecuária, além de estratégias para mitigar as emissões de CH4 metano, existem
práticas de sistemas silvipastoris que integram a produção pecuária com a
florestal, com ganhos para o produtor, o meio ambiente e a economia. Da mesma
forma, vale ressaltar o papel dos sistemas silvipastoris, na formulação de um
modelo sustentável de uso da terra. Os SSP’s, são sistemas de uso da terra onde
se concilia a produção de madeira, para diversos fins (energia, construção
rural, serraria, etc.) e a produção animal no espaço e no tempo (MONTAGNINI,
1992; MACEDO, 2000).

Neste
sentido SMITH & SHERR (2002) salientam que os sistemas agroflorestais (e
dentro destes os SSP’s) possam contribuir para a redução da pobreza em zonas
rurais por meio da obtenção de renda com comercialização de créditos de carbono
advindos de projetos aprovados dentro do contexto do MDL.

No caso
das florestas nativas ou mesmo plantadas, a introdução da pecuária traz ainda
mais vantagens, do ponto de vista do balanço do carbono. A substituição das
queimadas por práticas de desmonte do sub-bosque pode gerar créditos de carbono
pelas emissões evitadas, semelhante ao que ocorre no plantio direto. Além
disso, com a manutenção das árvores dentro dos limites estabelecidos pelo
conceito de florestas adotado pelo Brasil junto ao UNFCCC (áreas com 30% de
cobertura de árvores ou com árvores capazes de atingir mais de 5m ao longo do
tempo), a prática ainda vai receber créditos de carbono pelo crescimento das
árvores ao longo do período de crédito (até 21 anos).

*Advogado. Doctorat Droit
Privé pela Université de Paris 1 Panthéon-Sorbonne. Corso Singolo em Diritto
Processuale Civile e Diritto Fallimentare pela Università degli Studi di
Milano. Autor de mais de 100 artigos e das obras Manual da Sociedade Limitada:
Prefácio da Ministra do Superior Tribunal de Justiça Fátima Nancy Andrighi
e  A prevenção de Dificuldades e Recuperação de Empresas. É também árbitro
e palestrante

Artigo escrito com Ederson Augusto
Zanetti
é engenheiro florestal. Mestre pela Universität di Friburg Alemanha.
Professor convidado na Harper College Chicago/USA.

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Como citar e referenciar este artigo:
ZANETTI, Robson. Protocolo de Quioto – II. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-ambiental-artigos/quioto-ii/ Acesso em: 25 abr. 2024